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Revista Eletrônica de Enfermagem
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Artigo Original
 
Comerlato EMB, Guimarães I, Alves ED. Tempo de plantar e tempo de colher: as representações sociais de profissionais de saúde e idosos sobre o processo de envelhecimento. Rev. Eletr. Enf. [Internet]. 2007;9(3):736-47. Available from: http://www.fen.ufg.br/revista/v9/n3/v9n3a13.htm
 

Tempo de plantar e tempo de colher: as representações sociais de profissionais de saúde e idosos sobre o processo de envelhecimento

 

Time to plant and time to crop: social representations of health professionals and elderly about the aging process

 

Tiempo de plantar e tiempo de cosechar: representaciones sociales de profesionales de la salud y ancianos sobre el proceso de envejecimiento

 

 

Elizete Maria Bachi ComerlatoI, Iraci GuimarãesII, Elioenai Dornelles AlvesIII

IMestre em Ciências da Saúde pela UnB Brasília/DF. Especialista em Psicologia Clínica. Psicóloga formada na Universidade de Caxias do Sul /RS. Professora titular da UNIGRAN, Dourados, Mato Grosso do Sul, MS, Brasil. E-mail: elizete@dourados.br

IIMestre em Ciências da Saúde pela Universidade de Brasília, Psicóloga, Brasília, DF, Brasil. E-mail: iracigi@gmail.com

IIIProfessor Doutor Titular do Departamento de Enfermagem e do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da Universidade de Brasília, Brasília, DF. E-mail: elioenai@unb.br

 

 


RESUMO

O Brasil vive um processo de transição demográfica pelo aumento da longevidade do ser humano. Este estudo descritivo qualitativo investiga as relações entre as visões compartilhadas e a prática dos profissionais de saúde neste processo, no município de Dourados/MS, no ano 2007. Foram entrevistados 10 participantes, profissionais de saúde e usuários dos serviços de atenção à saúde de idosos. Utilizou-se um software de análise de conteúdo. Os resultados mostram representações sociais divergentes entre as concepções dos participantes, apontando defasagem na assimilação das mudanças ocorridas na realidade do envelhecimento. A falta de qualificação especializada para o cuidado desta população interfere nas práticas de cuidar em saúde, uma vez que o conhecimento científico não se encontra integrado à realidade social. Destacamos a relevância de que os resultados encontrados contribuam para que o conhecimento adquirido acompanhe a evolução da sociedade, como auxiliar no direcionamento de políticas de educação e saúde, integrando o universo consensual e reificado.

Palavras chave: Envelhecimento; Psicologia em Saúde; Qualidade de vida.


ABSTRACT

Brazil is going through a demographic transition process, because the human being longevity. The present descriptive qualitative study investigates the relation between the partaken overview and the health professionals’ practice in this process. Ten participants were questioned, health professional and the users of the service of health attention. Software of content analyses was used. The results show different social representations between the participants’ concepts, pointing to the fault in the assimilation of the changes occurred in the aging reality, and the necessity of qualification to the health care practices of the elderly. The lack of specialized qualification for the care of this population interferes in the practices of taking care in health, once the scientific knowledge one don't find integrated to the social reality. We detached the relevance that the found results contribute so that the acquired knowledge accompanies the evolution of the society, how to aid in the guide of education politics and health, integrating the consensual universes and science.

Key words: Aging process; Behavioral Medicine; Life quality.


RESUMEN

Brasil vive un proceso de transición demográfica, por el aumento de la longevidad del ser humano. Este estudio calificativo descriptivo investiga las relaciones entre las visiones compartilladas y la práctica de los profesionales de salud en este proceso. Fueran entrevistados 10 (diez) participantes, profesionales de salud y usuarios de los servicios de atención a la salud de los ancianos. Se utilizó un software de análisis de contenido. Los resultados muestran representaciones sociales divergentes entre las concepciones de los participantes apuntando un aislamiento en la asimilación de cambios ocurridos en la realidad del envejecimiento. La falta de calificación especializada para el cuidado de esta población interfiere en las prácticas de tener el cuidado en la salud, una vez el conocimiento uno científico no encuentra integrado a la realidad social. Nosotros destacamos la relevancia que los resultados encontraron contribuyen para que el conocimiento adquirido acompañe la evolución de la sociedad, cómo ayudar en la guía de política de educación y salud, integrando los universos consensuales y ciencia.

Palabras clave: Envejecimiento, Medicina de la Conducta, Calidad de vida.


 

 

INTRODUÇÃO

Os países em desenvolvimento vivem atualmente um processo de transição demográfica com o envelhecimento da população, devido ao desequilíbrio entre as taxas de natalidade e mortalidade e o aumento da longevidade. O envelhecimento já não é somente mais uma fase de desenvolvimento individual, porém a sociedade e as ciências da saúde ainda não conseguem desenvolver ações para a assistência dos idosos, compatíveis a um fenômeno psicossocial.

Em Janeiro de 1994, o Congresso Nacional decretou a lei 8.842 referente à Política Nacional do Idoso, e na seção 2, artigo 4, há uma diretriz que exige capacitação e reciclagem em geriatria e gerontologia, dos recursos humanos que prestam serviços aos idosos, enquanto na prática, o atendimento a pessoas idosas ainda é realizado basicamente por especialidades clínicas gerais.

Frente a estes fatos o objetivo desta pesquisa foi identificar as representações sociais de profissionais de saúde e dos idosos usuários de serviços de saúde acerca do envelhecer; e como estas representações relacionam-se com a prática do cuidado ao cliente, para então, analisar e evidenciar os fatores facilitadores e dificultadores para a qualidade de vida na velhice.

Devido a estes fatores, surgiu a preocupação com estudos relacionados à prática dos profissionais e o cuidado com a saúde no envelhecimento. Leituras tornaram-se imprescindíveis para fundamentar a pesquisa, argumentos e críticas.

Nas diversas teorias do desenvolvimento humano, o autor que definiu de forma mais abrangente a seqüência de fases da vida e suas tarefas evolutivas foi Erik Erikson seguindo a teoria inicial freudiana, porém focalizando seu interesse além das experiências infantis e do romance familiar (1,2). Este sustenta a continuidade do desenvolvimento do ser humano mesmo após a puberdade, ao longo do ciclo vital, quando se realizam ações adaptativas e integram-se capacidades. Para este estudo destacam-se duas fases fundamentais: a primeira e a oitava.

Na primeira ocorre o estabelecimento da confiança básica e a base para a confiança no meio e nas experiências relacionais durante a vida, denominada de esperança. No envelhecimento quando se passa a duvidar das próprias capacidades, pelo desgaste orgânico natural à idade, esta esperança tem maior funcionalidade.

O desenvolvimento humano se completaria na oitava fase do ciclo de vida, quando ocorre um sentimento de maior realização na idade avançada, originando um senso de integridade do ego (1). No oriente, em muitos países, reverenciam-se os idosos ao mesmo tempo em que eles permanecem muitas vezes exercendo atividades econômicas e principalmente cuidando de seu bem-estar físico e social.

No ocidente, por sua vez, encontram-se dualidades que variam desde a superproteção incapacitante, que fomenta a dependência do idoso, evoluindo em diferentes níveis de cuidados, até o descaso e situações de desamparo total. Por exemplo, na cultura ocidental, em contraste com a oriental, o jovem é valorizado, sua vitalidade e produtividade econômica, não se atribuindo um papel significativo ao idoso (3).

 

A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS

As raízes

A Teoria das Representações Sociais teve sua origem na Europa, em 1961, com as publicações de Serge Moscovici. A faceta sociológica desta teoria está na concepção das Representações Coletivas de Durkheim, embora haja ainda outros teóricos, coexistindo uma tensão saudável entre o quanto o indivíduo é produto da sociedade e ao mesmo tempo opera e modifica a mesma, como defende Weber (4,5).

Trata-se de uma teoria que investiga e explica a relação recíproca entre indivíduo e sociedade. Esta é uma abordagem dos posicionamentos dos indivíduos frente a situações cotidianas, não como reações singulares, mas sim como re-atualizações de saberes compartilhados por grupos (6).

O cerne da teoria

Para Moscovici o conceito de representação social é: “... um conjunto de conceitos, afirmações e explicações originadas no cotidiano, no curso das comunicações interindividuais. Elas são equivalentes em nossa sociedade aos mitos e sistemas de crenças das sociedades tradicionais; elas até podem ser vistas como a versão contemporânea do senso comum(6). A função da representação social é a construção da realidade, tornando familiar o não-familiar (6). Representar um objeto é internalizá-lo, é conhecê-lo, conferindo um significado natural de nosso universo (5). Ainda, pela teoria coexistem na sociedade moderna dois universos de pensamento: os universos consensuais, onde são feitas as atividades ou práticas sociais cotidianas; e os universos reificados, onde a ciência e o pensamento erudito circulam.

Além disso, Moscovici (5) descreve duas etapas geradoras da representação social: a objetivação que implica na reabsorção das significações tornando real um esquema que era conceitual ou simbólico; e a amarração, ou ancoragem, que introduz o novo no antigo, nomeando o desconhecido, o tira do anonimato e o identifica. A amarração é semelhante a um processo de categorização, atraindo e hierarquizando o objeto para uma rede de significações. É aqui, que a ciência se converte em uma rede de significações que delimita o domínio do fazer.

Por uma visão integral em saúde

Tanto no Ocidente como no Oriente, desde tempos remotos, sabe-se que a vinculação entre corpo e mente, ou comportamento e saúde estão ligadas às reflexões sobre a doença. Neste sentido, a saúde seria o resultado de um longo processo: de ser construída e mantida, e a doença, como a perda da ingenuidade. Cultivar a saúde seria o oposto à ilusão de voltar à saúde, como em um caminho sem volta (7).

A saúde e a doença passaram de uma compreensão mística para científica, conforme a evolução do conhecimento humano. De um ser influenciado somente pelo divino, o homem passou a ser visto em sua existência biológica e mental, transformando-se, então, em um conjunto de porções que interagem entre si (8). Sigmund Freud defendeu que a historicidade do indivíduo tem íntima ligação com seu estado de saúde/ doença. Estudando a dinâmica do aparelho psíquico, pela via humanista, Freud salientou que também existe homeostase no aparelho mental, resgatando a noção hipocrática de pessoa doente, e não apenas de doença (9). “A integralidade sugere a ampliação e o desenvolvimento do cuidar na profissão da saúde, a fim de formar profissionais mais responsáveis pelos resultados das práticas de atenção, mais capazes de acolhimento, de vínculo com os usuários das ações e serviços de saúde e, também, mais sensível às dimensões do processo saúde /doença inscrita nos âmbitos da epidemiologia ou terapêutica”  (10).

Na atualidade, o cuidado está vinculado ao cuidar também com ação de prevenção. A preocupação do profissional necessita abranger não apenas o biológico, mas a totalidade que permeia o cuidado holístico (11). Em uma visão horizontal da interação funcional do organismo, que é fruto de uma história de vida e tem uma natureza social, não apenas orgânica, a promoção da saúde é concebida de forma integral. As semelhanças entre prevenção e promoção de saúde se caracterizam como funções complementares destas, porém a questão principal seria não incompatibilizar as ações. Polônia e Alves (12) apresentam a síntese destes dois conceitos:a promoção atua sobre os determinantes da saúde integral e cria opções saudáveis e de fácil acesso às populações; e a prevenção, por sua vez, atua na redução dos fatores de risco e doenças, além da proteção contra riscos específicos.

Autocuidado

Os estudos em autocuidado remontam ao século passado. Dorothea Orem, enfermeira dos Estados Unidos, em 1958, foi a pioneira no estudo de um modelo conceitual para direcionar as práticas de autocuidado, sendo “...as ações que os indivíduos iniciam e executam pôr si mesmos para manter, promover, recuperar e/ou conviver com os efeitos e limitações dessas alterações... contribuindo para sua integridade, funcionamento e desenvolvimento(13). A expressão autocuidado é usada como sinônimo de cuidado de si, por ações que promovam qualidade de vida. É um comportamento que implica no papel ativo do indivíduo em atividades a fim de manter a vida, a saúde e o bem estar (13).

Qualidade de vida

Qualidade de vida é uma das terminologias mais interdisciplinares da atualidade, servindo como elo em pesquisas das mais diversas áreas do conhecimento, como a sociologia, psicologia, medicina, enfermagem e outras. O WHOQOL Group, da Organização Mundial da Saúde (OMS) que estuda qualidade de vida, a define como a percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações (14).

A qualidade de vida tem componentes subjetivos e objetivos, uma forma subjetiva de compreender a vivência da realidade objetiva. Fleck afirma que esta só pode ser avaliada pela própria pessoa cuja qualidade de vida está sendo medida. No idoso, esta pode ser definida pela determinação, precisão e busca de objetivos de vida, o quê é fomentado por estados anteriores do desenvolvimento (14).

Tempo de Plantar...

A Despolarização dos Profissionais de Saúde/ Usuários

No ponto de intersecção entre a individualidade do sujeito e o processo coletivo de trabalhar com saúde e doença, é onde encontramos o profissional de saúde uno, indivisível, que também constrói suas representações na convivência cotidiana, mas, por outro lado, tem o processo de formação profissional que lhe confere saber e autoridade na área da saúde. O conhecimento e a técnica profissional muitas vezes podem servir como proteção, diluindo sentimentos desconcertantes deste profissional que envelhece.

A organização científica do trabalho inevitavelmente exerce influência na relação particular do profissional com o usuário. A técnica e a padronização não impõem a reflexão sobre o objeto de trabalho, onde o parcelamento das tarefas implica também na fragmentação das relações. Neste ponto, a onipotência da técnica, o modo de fazer de uma prática, se encarrega de cindir e suavizar a identificação e a impotência, entre outros intensos sentimentos mobilizados (15).

As ocupações na área da saúde devem ser pensadas como um conjunto de profissões, sob a ótica do conceito de atenção integral à saúde.

Conhecer a realidade da população alvo permite que as ações sejam direcionadas pela própria demanda, embasadas na realidade social e da relação subjetiva com o paciente. Esta reflexão não visa capacitar todos os técnicos como psicólogos, mas ponderar sobre suas possibilidades de auxílio ao paciente, através da ótica do atendimento integral do indivíduo.

Tempo de Colher:

Envelhecimento

Estudar o processo de envelhecimento e da velhice é uma preocupação que acompanha a evolução da humanidade. Os pioneiros Metchnikoff e Nascher, em 1903 e 1909, respectivamente, estabeleceram os fundamentos da geriatria e da gerontologia, e acreditavam que estas ciências viriam a se transformar rapidamente em um produtivo campo de conquistas científicas. Elie Metchnikoff, sucessor de Pasteur, em 1903 defendeu a idéia da criação da gerontologia, e apesar do interesse para tratar das doenças dos idosos e da própria velhice, os conhecimentos a respeito da fisiologia do envelhecimento não sofreram avanços significativos (16).

A especialidade passou a ser denominada geriatria a partir de 1909, por proposição de Ignatz L. Nascher que estimulou pesquisas sociais e biológicas sobre o envelhecimento e foi considerado o pai da geriatria, em 1912. O trabalho de Marjory Warren, na década de 30, ampliou as investigações da gerontologia, até então restrita aos aspectos biológicos do envelhecimento e da velhice, e seu mérito foi esboçar a avaliação multidimensional e a importância da interdisciplinaridade (16).

O século XX marcou grandes avanços na ciência do envelhecimento. Papaleo Netto (16) enfatizou o limite estabelecido entre senescência e senilidade, ou seja, entre o envelhecimento primário e secundário e os processos patológicos freqüentes e comuns na idade mais avançada da vida, além disto, estabeleceu o envelhecimento saudável, ou bem sucedido e o envelhecimento comum. O efeito do envelhecimento primário ainda encontra-se fora de controle, porém podem-se evitar os efeitos do envelhecimento secundário, que resulta de doença, desuso e abuso do corpo (16).

Diferentes critérios têm igual dificuldade em demarcar o momento de entrada na velhice, como, por exemplo, o marco pode ser a aposentadoria, ou o aparecimento de sinais de dependência, um acidente... como se fosse uma ruptura com o processo vivido até então. De fato, critérios médicos e sociais divergem quanto à entrada na velhice.

 

MÉTODOS

Foi realizada pesquisa descritiva analítica, com o embasamento teórico-científico na Teoria da Representação Social, por meio de entrevista semi-estruturada com palavras e expressões indutoras. Como abordagem metodológica o enfoque qualitativo foi o de análise de conteúdo e com análise quantitativa dos resultados, feita com o auxilio do software HAMLET® de análise de junção de palavras e escalonamento multidimensional.

A análise de conteúdo é uma forma de análise das comunicações, da produção do texto e de seu sentido, ou das variáveis inferidas (17). A metodologia utilizada para o estudo de representações sociais sugere, além da análise freqüencial simples, a análise de co-ocorrência de categorias e palavras, ou a ocorrência simultânea de dois ou mais elementos (palavras-chave) na fala de um participante, a mesma indicada por Bardin e Moscovici (8, 17, 18).

Foram incluídos no estudo 10 participantes, profissionais de saúde e usuários, já idosos ou em processo de envelhecimento, dos serviços de atenção à saúde de idosos em Dourados – MS, no ano de 2007. Por profissional de saúde entende-se o indivíduo que trabalha em serviço de atenção à saúde ou em instituições de ensino, na área de formação destes profissionais. Consideramos em processo de envelhecimento a partir dos cinqüenta anos, que passará a ser denominado pré-idoso (PI). Será considerado como idoso (I), acima de sessenta anos; sendo indiferente o sexo e o grau de escolaridade. Nenhum participante tinha comprometimento cognitivo ou de linguagem, conforme critério de exclusão.

Os participantes foram triados nas respectivas instituições. Do total de pessoas foram selecionados os participantes por sorteio para serem incluídos no estudo, em número proporcional: nas instituições de formação de profissionais de saúde, nas de prestação de serviços de saúde e usuários.

Os profissionais e lideranças foram incluídos na proporção:

1. Formação de profissionais: (3 pré-idosos)

  • UEMS- Universidade Estadual do Mato Grosso do Sul – 1

  • UNIGRAN- Centro Universitário da Grande Dourados – 1

  • UFMS- Universidade Federal do Mato Grosso do Sul - 1

2. Serviços de Saúde Dourados: (3 pré-idosos)

  • PSF- Programa de Saúde da Família - 02

  • Centros de Saúde – 01

3. Usuários: (4: 2 pré-idosos e 2 idosos)

  • Centro de convivência municipal - 2

  • Centro Conviver - 1

  • Associação de Aposentados de Dourados – 1

quadro1

Aspectos éticos da pesquisa

Desde a elaboração do projeto manteve-se o cuidado com os aspectos éticos da pesquisa, sendo esta integralmente aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário de Dourados – UNIGRAN, sob protocolo 005/06, atendendo a Resolução 196/96, do Conselho Nacional da Saúde sobre pesquisa envolvendo seres humanos (19).

Para ser incluído no estudo, o participante assinou o termo de consentimento livre e esclarecido O termo de consentimento foi fornecido em duas vias, sendo que uma ficou com a pesquisadora e encontra-se arquivado. A apresentação do termo esclareceu os objetivos da pesquisa e da utilização dos dados, incluindo também as medidas de proteção à confidencialidade.

Todas as instituições participantes deste estudo foram consultadas pela pesquisadora, solicitando-se autorização formalizada para a realização da pesquisa, visando assegurar os aspectos éticos e o apoio institucional.

Seguiu-se o procedimento técnico de iniciar a entrevista com perguntas mais gerais e dados sociográficos, passando-se para os conteúdos específicos. Foi realizada a testagem do instrumento em um estudo piloto, com a aplicação do instrumento em dois participantes, sendo um usuário e um prestador de serviços em saúde. Após o teste piloto foram consultados dois pesquisadores na área enfatizando as dificuldades encontradas durante a realização, para então, por fim, definir o roteiro de entrevista para a coleta definitiva dos dados.

A leitura flutuante das entrevistas permitiu que categorias fossem definidas, como um procedimento de exploração, de descoberta e direcionamento do sentido do que foi produzido pelo grupo (18).

O Programa de Análise de Conteúdo, HAMLET®, foi utilizado para auxiliar na contagem de palavras, na lista de categorias e na análise de co-ocorrência destas, definido como agrupamento ou clusters, o que permitiu a inferência de representação pela junção das categorias, indicadas por índice de co-ocorrência ou jaccard coeficient.

Os itens da entrevista, ou seja, as palavras, ou expressões indutoras, e as perguntas, foram agrupados em blocos temáticos (Quadro 2) possibilitando a comparação entre representações que emergiram em perguntas com o mesmo sentido.

quadro2

 

RESULTADOS

Colhendo os Frutos:

Bloco Temático I

No item 3 a categoria Trabalho emergiu junto a Corpo para os profissionais, com um índice de co-ocorrência equivalente a 1,0, sugerindo uma visão mais reducionista do idoso; enquanto que para os usuários, as categorias com coeficiente de co-ocorrência 1,0, foram: Ambiente, Cuidar, Família e Religiosidade, indicando a diversidade que os próprios idosos se autodefinem, com uma visão mais integral do idoso. As representações em relação ao idoso que apresentaram co-ocorrência entre os profissionais, Corpo e Trabalho, remetem à concepção mecanicista do corpo-máquina, intimamente ligado á produtividade. Estas representações corroboram o resultado da pesquisa de Veloz (6) que encontraram as representações de perda da identidade física na velhice como estado, e a perda da capacidade de trabalho.

No item 4 as categorias com maior índice de co-ocorrência a respeito do envelhecer para os profissionais, com índice de apenas 0,33 foram Família e Psicológico Motivador, percebendo-se que emerge ainda de forma tênue uma visão mais positiva do envelhecimento, entre os profissionais. Para os usuários as categorias Relações Sociais e Trabalho aparecem correlacionadas, com coeficiente equivalente a 1,0. Porém, encontramos nas respostas referências que não nos permitem inferir a importância atribuída aos relacionamentos sociais estabelecidos no ambiente de trabalho, mas sim às pressões sociais a respeito da velhice e como a pessoa “trabalha”, lida com essa questão.

No item 6 o cluster mostrou a co-ocorrência das categorias Família, Limitações, Motivações e Psicológico Limitante para os profissionais, com um índice de 1,0, indicando uma concepção negativa da velhice. Para os usuários, o cluster teve as seguintes categorias: Envelhecer, Psicológico Motivador, Relações Sociais, Trabalho e Saúde, com um índice de 0,50, sugerindo que os idosos atribuem uma visão mais positiva de sua qualidade de vida a fatores diversos, o que confirma o trabalho do grupo WHOQOL-OLD (14). Neste item nenhuma categoria coincidiu entre profissionais e usuários.

No item 8 quanto à co-ocorrência de categorias o cluster apresentou o mesmo resultado entre os dois grupos de participantes, destacando-se Ambiente e Família, com um índice de co-relação de 0,60. Porém, estas categorias ocorreram com mais freqüência nos corpus dos profissionais.

No item 9 o cluster dos profissionais foi composto pelas categorias Psicológico Motivador e Corpo, com coeficiente de correlação 1,0, indicando que o profissional refere como dificultador ou limitante a ausência de fatores que poderiam facilitar a vida dos idosos. A representação do envelhecimento que surgiu parece ser a de perda de vitalidade e/ou financeira. O cluster dos usuários apresentou as seguintes categorias: Envelhecer, Psicológico Motivador, Saúde e Família; assim, inferiu-se que as categorias correlacionadas representam o desejo do idoso, ou seja, alguns aspectos que considera como ideal para um envelhecimento saudável, ou satisfatório.

Bloco Temático II

No item 2, na análise do cluster, apareceram dados divergentes entre os participantes: Envelhecer, Ambiente e Saúde aparecem correlacionadas neste item para os profissionais, enquanto para os usuários Saúde é substituída por  Religiosidade, em co-ocorrência com Ambiente e Envelhecer, sendo a representação da religiosidade mesclada à noção de saúde. Quando investigou-se a noção de autocuidado, as respostas dos usuários sugerem que a tarefa de zelar por uma vida longa e saudável fica atribuída a Deus, ainda mantendo as antigas concepções místicas sobre saúde, na atualidade.

No item 5, aplicado apenas nos profissionais, o cluster apresentou as categorias Corpo e Aposentadoria, com índice 1,0, sugerindo que quando se refere às condições mais ideais de envelhecimento, o profissional destaca aspectos que abrangem a saúde integral, compreendendo a questão da qualidade de vida.

No item 7 os clusters nos mostraram a co-ocorrência das categorias Afecções e Trabalho; e Família, Religiosidade e Ambiente, para os profissionais, com um coeficiente de correlação de 0,50. O primeiro cluster caracterizou o trabalho dos profissionais de saúde mais relacionado à representação de doença. A categoria Educação não apresentou co-ocorrência com nenhuma outra, em relação ao preparo para o cuidado em saúde do idoso. O cluster nas respostas dos usuários teve um índice de 1,0 com: Envelhecer, Educação, Relações Sociais e Ambiente, sugerindo que além das dificuldades de acesso ao atendimento especializado, sobrevém também o temor aos tratamentos, efeitos colaterais, etc. Corpo e Psicológico Motivador são categorias que também compõem um agrupamento dos usuários com o coeficiente 1,0, indicando a interação da psicossomática relacionada aos cuidados com a saúde, no idoso.

Bloco Temático III

No item 1 o cluster é composto pelas categorias Envelhecer, Corpo e Saúde para os usuários e o seu coeficiente de correlação é 1,0. O agrupamento das falas dos profissionais ocorreu entre as categorias Afecções, Cuidar e Relações Sociais, o que observamos ser uma relação atribuída ao Cuidar, como prevenção às doenças; e os contatos sociais como facilitadores para aquisição de conhecimento auxiliar na promoção de qualidade de vida, que aparece novamente como resultante do estilo de vida, conforme levantado por Veloz (6).

 

DISCUSSÃO

O Saldo da Colheita

Na análise dos dados levantados, os profissionais atribuíram muito mais importância ao apoio familiar do que os próprios idosos. Emerge no discurso dos profissionais, consoante a pesquisas recentes, a preocupação com a perda do vigor físico e da capacidade de trabalho, transparecendo uma representação organicista do envelhecimento ou ainda, mecanicista, ligada ao mito da improdutividade, como se todo velho fosse necessariamente improdutivo.

As categorias que mais se correlacionam nas falas dos profissionais (Família, Saúde, Psicológico Limitante, Psicológico Motivador e Limitações) apontaram para uma representação de bem-estar relacionada à dependência da família e do ambiente, apontando para a concepção negativa de velhice com dependência e exclusão.

Para os idosos foi diferente, mostraram até certo alívio, por já não terem a sobrecarga de responsabilidade sobre a criação e educação dos filhos, podendo desfrutar de uma liberdade conquistada. Em nenhum momento surgiram as categorias Limitações e Psicológico Limitante, sugerindo que as possíveis limitações impostas pelo envelhecimento já se encontrariam internalizadas, provavelmente aceitas. De uma forma geral, os idosos mostraram uma concepção abrangente e positiva do envelhecimento. As categorias correlacionadas (Envelhecer, Saúde, Trabalho, Religiosidade, Relações Sociais e Psicológico Motivador) foram mais diversificadas, com uma visão mais ampla e otimista do próprio envelhecimento.

A categoria Saúde foi a mais freqüente na fala dos idosos como facilitadora das condições de vida. Os participantes referem conquistas de normas e alguns privilégios concedidos legalmente aos idosos (aposentadoria, filas, etc.), embora as condições ainda estejam longe de ser ideais. O grupo de categorias com maior índice de co-ocorrência, entre os usuários, indicaram a questão da independência e da oportunidade de cuidar melhor de si mesmo, investindo na continuidade de seu desenvolvimento, compatível com a teoria de Erikson (1) de que a continuidade do desenvolvimento parece prosseguir ao longo do ciclo vital, quando se realizam ações adaptativas e integram-se capacidades.

Já a categoria Relações Sociais foi a mais freqüente como dificultador das condições de vida dos idosos, entre os profissionais, sugerindo uma concepção de velhice associada a isolamento e marginalização. Para os idosos a principal manifestação foi em relação ao desejo de valorização, e importância do apoio e tratamento afetivo por parte da família.

A concepção de autocuidado pareceu representar um cuidado mais integral em saúde, porém falha no sentido de um papel ativo e educação para o cuidado de si mesmo, denotando a ausência de uma visão de construção de saúde, ou responsabilidade sobre o próprio bem-estar. Especificamente nos usuários, a concepção mística de saúde prevalece.

Quanto à formação e preparo para o cuidado, por parte dos profissionais, emergiu com freqüência a ausência de preparo acadêmico, e a experiência adquirida no tratamento de doenças, apontando para a representação de velhice e também a concepção de saúde associadas à doença, corroborando o resultado de outras pesquisas (8). Enquanto o conhecimento reificado enfatiza a promoção de saúde e a prevenção, a prática do profissional ainda é mais focalizada nas ações curativas.

A concepção de qualidade de vida entre os profissionais indica uma representação que emerge entre as categorias Cuidar e Afecções, ou seja, também o cuidar como prevenir doenças. A qualidade de vida para os idosos apresenta um conjunto de representações mais positivas, indicando novamente uma visão otimista, com a associação às categorias Saúde, Psicológico Motivador e Religiosidade.  

 

CONCLUSÃO

Diante das representações encontradas sobre velhice, cuidado e qualidade de vida, podemos inferir que a falta de qualificação especializada para o cuidado desta população interfere nas práticas de cuidar em saúde. Entre os profissionais de saúde o conhecimento científico sobre o envelhecimento ainda é conceitual, ou encontra-se no domínio universo consensual, pois os elementos do conhecimento não se encontram integrados à realidade social; e somente através do processo de amarração a ciência se converte em uma rede de significações que delimita o domínio do fazer.

A divergência representacional entre as concepções dos profissionais e dos idosos aponta para uma defasagem na assimilação das mudanças que vêm ocorrendo na realidade do envelhecimento. Reafirmamos, por isto, a relevância de que os resultados encontrados contribuam para que o conhecimento adquirido acompanhe a evolução da sociedade; como auxiliar no direcionamento de políticas de educação e saúde, integrando os universos consensual e reificado.

 

REFERÊNCIAS

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Artigo recebido em 23.04.07

Aprovado para publicação em 10.12.07

 

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