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Metodologia das escalas geográficas de poder e gestão aplicada à análise de desenvolvimento em quatro territórios rurais no Brasil
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Metodologia das escalas geográficas de poder e gestão aplicada à análise de desenvolvimento em quatro territórios rurais no Brasil

Aldomar A. Rückert e Anelise G. Rambo

Resumos

O presente artigo resulta de um projeto de pesquisa realizado por um grupo multidisciplinar, composto por pesquisadores das áreas de Geografia, Agronomia, Economia, e Sociologia para atender a uma demanda da Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT) do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) (Brasil)  nos anos de 2006 e 2007. Dentre outros objetivos mais abrangentes, a pesquisa visou representar as diferentes escalas de atuação dos atores nos territórios rurais. Apresenta-se aqui as escalas de atuação dos atores em quatro projetos de desenvolvimento geridos por organizações sociais em quatro territórios rurais no Brasil - a Cooperativa Regional de Agricultura Camponesa (CORAC), Seberi, no território “Médio Alto Uruguai” - estado do Rio Grande do Sul; o Sistema de Cooperativas de Leite da Agricultura Familiar (SISCLAF), Francisco Beltrão, no território “Sudoeste do Estado do Paraná”; o Centro de Formação da Agricultura Familiar São José Operário (CENTAF), Silvânia, no território “Estrada de Ferro”, estado de Goiás e a Associação Frutivale, Datas, no território “Vale do Jequitinhonha”, estado de Minas Gerais.  Entende-se que a metodologia das escalas geográficas de poder e gestão, aplicada aos estudos de desenvolvimento territorial, pode contribuir tanto para uma compreensão mais clara de como os territórios são geridos e quem são os atores que interagem no processo de desenvolvimento, quanto no planejamento das ações e dinâmicas territoriais. Isto permite observar-se as potencialidades e fraquezas do território. Estas podem ser desenvolvidas ou reduzidas respectivamene, de maneiras a fomentar o processo de desenvolvimento territorial. Ela pode, portanto, servir como um instrumento para ações de planejamento e dinâmicas territoriais. A identificação dos atores e das escalas de poder e gestão nos territórios rurais foi realizada mediante a aplicação de entrevistas com roteiro semi-estruturado a lideranças de projetos de desenvolvimento.

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Texto integral

A contribuição da metodologia das escalas para os processos de desenvolvimento territorial

A metodologia das escalas geográficas de poder e gestão caracteriza um recurso metodológico que permite observar como os atores locais/regionais – localizados nos âmbitos da sociedade civil, do Estado e do mercado – articulam-se entre si e com as demais escalas de poder e gestão, com vistas à promoção do desenvolvimento de territórios. Considerar a existência de diferentes escalas atuantes em determinados territórios, possibilita a compreensão da densidade e da complexidade oriunda da multiplicidade de poderes neles existentes e atuantes.

Racine; Raffestin; Ruffy (1983) tratam a escala como um filtro que preserva o que é pertinente em relação ao objeto de estudo, permitindo sua compreensão. Castro (1995), por sua vez, afirma que a escala geográfica pode ser considerada como um artifício analítico que dá visibilidade ao real. Porém, vale ressaltar que uma escala não pode ser vista isoladamente de seu entorno, pois perde seu poder explicativo. Para Brenner (2001) os estudos sobre a escala geográfica e sobre processos de reestruturação escalar - seja na contemporaneidade, seja em outros contextos históricos - são poderosos, quando estão situados dentro de uma estrutura sócio-espacial mais ampla que está sintonizada com a rica multidimensionalidade da espacialidade capitalista. Na mesma direção, Purcell e Brown (2005) e Born e Purcell (2006) chamam atenção sobre a armadilha local. Ressaltam que não há, a priori, uma escala adequada, ideal, ao desenvolvimento, nem local, nem regional, nacional ou mesmo global. O alcance dos objetivos a que os processos de desenvolvimento se propõem, estão relacionados ao poder dos atores sobre o território, e isto se dá em diferentes escalas. Assim, é possível concordar com Brenner (2001) quando afirma que a escala geográfica é uma dimensão dos processos sócio-espaciais.

O processo de desenvolvimento territorial local ou local/regional, não pode ser entendido simplesmente como uma resposta endógena aos problemas exógenos pois, conforme Acselrad (2002), a dinâmica do desenvolvimento territorial de escala local se dá pela combinação de fatores em escalas variadas. Não há, portanto, um poder econômico estruturalmente local, privado ou público, mas dimensões locais de múltiplos poderes que se constroem na hierarquia dos tomadores de decisão1.

A densidade institucional e as escalas

Com base no acima mencionado, a densidade institucional2 assume grande importância na análise do desenvolvimento territorial, pois havendo diversos atores – públicos e privados, individuais e coletivos – torna-se possível definir as demandas bem como dinamizar as potencialidades do território. Ocorrendo a existência de múltiplos atores tornar-se-ia possível– ao menos em tese - a realização de ações com características de inovação territorial, promovendo-se processos de desenvolvimento.

É importante mencionar que a metodologia das escalas ganha relevância em razão da multidimensionalidade do poder resultante da descentralização político-administrativa do Estado ocorrida no Brasil a partir do final dos anos oitenta. Nesse sentido, diferentes atores pertencentes ao Estado, à sociedade civil e ao mercado – em diferentes escalas, agem sobre o território, ora estabelecendo relações conflituosas, ora sinérgicas.

Entende-se que considerar estas relações e estes atores torna-se um requisito essencial para a compreensão dos processos de desenvolvimento territorial, pois, quando se analisam múltiplas relações de poder, o território volta a ser importante, não apenas como espaço do Estado-Nação, mas também dos diferentes atores sociais. O território é um produto produzido pela prática social, e também um produto consumido, vivido e utilizado (BECKER, 1983). Ou ainda, o território é produto dos atores sociais, do Estado ao indivíduo, passando por todas as organizações, pequenas ou grandes (RAFESTTIN, 1993).

Com base no que foi mencionado, entende-se enquanto desenvolvimento territorial, as ações, mecanismos, estratégias e políticas endógenas e exógenas, desencadeadas por atores locais/regionais em interação com as demais escalas de poder e gestão, reforçando-se e constituindo-se territórios por meio de novos usos políticos e econômicos. Neste sentido o processo de desenvolvimento das potencialidades locais/regional (ambientais, humanas, econômicas) tornaria os atores mais ativos na intervenção e no uso do território, refletindo-se no desencadeamento de processos de transformações.

Utiliza-se neste artigo, o recorte espacial dos territórios rurais, definidos pela Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Territórios Rurais (PRONAT) executada pela Secretaria do Desenvolvimento Territorial (SDT) do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA). No Pronat, o território rural é considerado como um conceito operacional, um instrumento de planejamento.

um espaço físico, geograficamente definido, geralmente contínuo, compreendendo cidades e campos, caracterizado por critérios multidimensionais, tais como o ambiente a economia, a sociedade, a cultura, a política e as instituições, e uma população, com grupos sociais relativamente distintos, que se relacionam interna e externamente por meio de processos específicos, onde se pode distinguir um ou mais elementos que indicam identidade e coesão do ordenamento social, cultural e territorial (BRASIL, 2004, p.10).

Numa perspectiva analítica, não se trataria aqui de promover um debate entre as diversas correntes do conhecimento que buscam definir o significado deste conceito que tornou-se central em políticas públicas que considerem o espaço geográfico e – nele – os múltiplos territórios e as territorialidades humanas. Trata-se, atualmente, na verdade de um modismo debater qual seja o melhor entendimento deste conceito central. Apenas aponta-se que se trata de um conceito clássico e mesmo fundador da ciência geográfica, o qual porém no pós II Guerra caiu em desuso.

Atualmente há inúmeras correntes que associam território a poder, a identidade, a cultura, às micro e às macro decisões políticas que impactam territórios, etc. Aqui, é suficiente referenciar que podemos aceitar que território é, via de regra, um produto construído, por múltiplos atores com múltiplas identidades regionais que nele disputam poder e recursos. Estaríamos assim mais próximos de uma concepção que associa território à gestão numa perspectiva de entendimento que território(s) são produto(s) da ação política de múltiplos atores e de múltiplas escalas (RAFFESTIN, 1983;1993).

Além disso, no PRONAT os territórios rurais foram definidos a priori, “tendo por base as microrregiões geográficas que apresentam densidade demográfica menor que 80 hab/km² e população média por município de até 50.000 habitantes” (BRASIL, 2004, p.10).

Neste sentido, vale a pena trazer as considerações de Favareto (2006) ao analisar elementos como a nova ruralidade e mudanças institucionais em torno do desenvolvimento rural. O autor afirma que a disseminação da abordagem territorial, tem se dado muito mais “por adição”, do que por uma mudança institucional (FAVARETO, 2006). Da mesma forma, Perafán, (2007), ao estudar políticas territoriais no Brasil e Colômbia, reforça que a abordagem territorial pode ser considerada uma continuação de enfoques passados, principalmente quando envolve políticas públicas que usam o adjetivo territorial, nas quais, não raro, há baixa correspondência e coerência com a proposta teórica.

Nesse sentindo Pecqueur (2005, p.12) afirma que “o desenvolvimento territorial não pode ser implementado por decreto; permanece uma construção dos atores, mesmo que as políticas públicas apropriadas possam estimular e mobilizar esses atores. Essa construção só pode ser concebida como uma dinâmica e, portanto, inserida no tempo”. Assim, no intuito de reconhecer e compreender a dinâmica e a construção dos atores no que é acima definido como territórios rurais será utilizada a metodologia das escalas. Considera-se que esta permite demonstrar como o território é usado, consumido, vivido, e utilizado nas escalas locais, por múltiplos atores e também múltiplas escalas.

A definição das escalas de poder e gestão

A definição das escalas geográficas de poder e gestão, por sua vez, se dá com base em dois critérios: divisões político-administrativas e escalas não institucionalizadas, resultantes da ação ou da gestão dos atores locais/regionais sobre o território. O primeiro refere-se às divisões político-administrativas existentes, referentes ao âmbito municipal, microrregional, estadual, nacional enquanto que o segundo, às escalas de gestão em âmbitos locais e/ou regionais. Estas são definidas pela própria atuação dos atores locais/regionais sobre o território, levando a novos usos políticos e econômicos que tenham reflexos/implicações no desenvolvimento dos territórios rurais.

Dentre os novos usos políticos e econômicos do território, as marcas que os atores locais/regionais imprimem a este definem e redefinem as territorialidades específicas aos grupos sociais presentes. Neste sentido, as diferenças territoriais mais antigas das regiões onde se localizam os territórios rurais pesquisados, além da multiplicidade de diferentes atores presentes, fez com que fosse necessário levantar-se informações através de entrevistas com lideranças de projetos de desenvolvimento sobre as diversas fontes de recursos presentes no território e como estes atores e recursos se fazem presentes em ações de desenvolvimento territorial. Com base nessas informações, encontrou-se as seguintes escalas presentes nos territórios rurais, sendo as duas primeiras institucionalizadas e outras definidas pela ação dos atores locais/regionais:

  • escala nacional: correspondente aos atores que possuem atuação no âmbito nacional;

  •  escala estadual: referente aos atores do estado da federação de cada território pesquisado;

  • escala regional: referente aos atores de cada território rural pesquisado3;

  • escala local/regional: referente aos atores com atuação na área de abrangência dos arranjos institucionais que coordenaram os projetos pesquisados.

Atores pertencentes ao Estado, à sociedade civil e ao mercado

Além das escalas, os atores foram classificados ainda enquanto Estado, sociedade civil e mercado. Ao tomar-se por base as concepções de Bobbio (1986), por sociedade civil entende-se a esfera das relações sociais não reguladas pelo Estado. Este, por sua vez, como o conjunto dos aparatos pelo qual um sistema social organizado exerce o poder coativo. A sociedade civil seria o lugar onde se desenvolvem os conflitos econômicos, ideológicos, religiosos que as instituições estatais têm o dever de resolver. Observa-se que Bobbio não trata do mercado enquanto ator distinto da sociedade civil. Porém, nesta análise, opta-se por esta distinção, devido aos múltiplos objetivos diferenciados que orientam a ação dos atores do mercado e da sociedade civil.

Sendo assim, os atores representantes do Estado referem-se às secretarias, ministérios e órgãos do governo, universidades públicas, empresas estatais, autarquias, financiamentos internacionais públicos (Banco Mundial, BID, FAO, Unicef, etc). Os atores representantes da sociedade civil são sindicatos, associações, cooperativas, representações de classe, fóruns e consórcios de desenvolvimento, ONGs, escolas, universidades comunitárias, confessionais, filantrópicas. Por sua vez, os atores representantes do mercado referem-se a empresas locais, nacionais e multinacionais.

A mensuração da densidade institucional

Para mensurar a densidade institucional, tomou-se por base a interação de atores e escalas em torno dos arranjos institucionais e projetos desenvolvidos nos territórios, como apresenta a tabela abaixo. Quanto mais próximo ao nível 01, maior é a densidade de atores presentes nos arranjos ou projetos e maior tendem a ser as transformações territoriais por eles gerados.

Tabela 01. Níveis de Densidade Institucional

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Fonte: Rückert (2001); Rambo (2006).

Para que se possa melhor visualizar essa densidade institucional, apresenta-se um organograma institucional (BOISIER, 1997)4 referente a cada arranjo ou projeto estudado. Esta figura ilustra quais são os atores presentes, além de ser possível apresentar quais os procedimentos utilizados pelos diferentes atores e quais os recursos - materiais, naturais, financeiros, humanos, de conhecimento, etc. - com que conta cada caso analisado, apresentados a seguir.

Por fim, é importante mencionar que a identificação das escalas, dos atores e da densidade institucional valeu-se da realização de entrevistas a lideranças de projetos de desenvolvimento nos quatro territórios rurais. Estas ocorreram de 11 a 15 de dezembro de 2006. Em cada um dos territórios realizaram-se entre 10 e 15 entrevistas com roteiro semi-estruturado. O roteiro apresentava 10 perguntas que procuravam identificar os atores envolvidos no principal projeto realizado no âmbito de cada território, denominada a idéia-guia, bem como o papel de cada um destes atores na execução do projeto.

O Pronat e os territórios rurais pesquisados

A Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Territórios Rurais (Pronat), criada em 2004 a partir da delimitação dos territórios rurais, tem por objetivo promover o planejamento, a implementação e a auto-gestão do processo de desenvolvimento sustentável dos territórios rurais e o fortalecimento e dinamização da sua economia. Para tal, cada território deve constituir uma Comissão de Implantação das Ações Territoriais (Ciat) que dará origem ao Colegiado de Desenvolvimento Territorial (Codeter). Este é constituído por sindicatos, ONGs, associações comunitárias, fóruns municipais e entidades governamentais com ações no território rural. Tem como papel debater questões pertinentes ao território, formular o Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável (PTDRS), o qual buscará diferentes políticas públicas para implementar as ações pertinentes ao desenvolvimento de cada território bem como mediar a implementação de políticas públicas.

Para a realização da pesquisa, do qual este artigo é resultado parcial, foram escolhidos quatro territórios que contemplassem uma relativa diversidade socioeconômica nas macrorregiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil. Desta forma, buscou-se territórios rurais que estivessem em mudança de perfil socioeconômico, através, por exemplo, da expansão de atividades ligadas ao agronegócio (Estrada de Ferro, GO); que fossem territórios privilegiados em ações e programas públicos para a erradicação da pobreza (Alto Jequitinhonha, MG), e que apresentassem importância inconteste com relação à presença de unidades produtivas de agricultura familiar (Médio Alto Uruguai, RS e Sudoeste do Paraná).

CORAC – Cooperativa Regional de Agricultura Camponesa, Seberi – Médio Alto Uruguai, Rio Grande do Sul

A região do Alto Uruguai caracteriza-se pela colonização agrícola intensa nos anos 1910-1930 em projetos estaduais, principalmente, e privados. Considerada a fronteira agrícola do estado do Rio Grande do sul no período, a região enviou muito cedo – já nos anos 30 – agricultores para colonizar o Oeste catarinense. A densidade demográfica apresentou diminuições a partir dos anos setenta devido ao êxodo rural-urbano e rural-rural para o Centro Oeste e Amazônia. A região se caracteriza pela alta politização dos movimentos sociais onde há sindicatos rurais ativos, cooperativas, movimentos dos agricultores atingidos por barragens e ONGs vinculadas a estas dinâmicas sociais.

Mapa 01. Território rural do Médio Alto Uruguai – Rio Grande do Sul – Brasil

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No território rural “Médio Alto Uruguai” percebeu-se que há certo consenso quanto às ações e projetos de desenvolvimento entre os entrevistados. Para eles as ações devem apoiar os processos de organização e capacitação dos agricultores para qualificação e (re)estruturação das agroindústrias familiares, associada à abertura de canais de comercialização para os produtos da agricultura familiar.

O Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) e a Rede de Comercialização Solidária

O projeto que melhor territorializa a idéia-guia5 em torno do desenvolvimento daquele território, compõe o Programa de Aquisição de Alimentos6 através dos projetos de “Compra Direta com Doação Simultânea” e “Compra e Distribuição de Cestas de Alimentos”. A Cooperativa Regional de Agricultura Camponesa (CORAC), localizada no município de Seberi tem coordenado este programa na escala local/regional. Esta cooperativa, por sua vez, compõe a Rede de Comercialização Solidária, entidade responsável pela administração das ações, congregando quatorze cooperativas integrantes do Codeter. Uma das principais funções da Rede é a de agilizar a troca e a comercialização dos produtos da agricultura familiar, uma demanda apontada pela idéia-guia. A CORAC, em razão de administrar o PAA na escala local/regional, recorre à Rede de Comercialização quando lhe falta algum produto que compõe a cesta de alimentos. Desta maneira, está se constituindo uma rede de comercialização de produtos da agricultura familiar.

Foto 01. Sede da Cooperativa Regional da Agricultura Camponesa – CORAC, em Seberi – Rio Grande do Sul

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Foto: CONTERATO, Marcelo. Dez/2006.

O PAA, como já é possível constatar, foi uma das formas encontradas pelos atores locais/regionais, em parceria com o Estado na escala nacional, de atender a uma demanda da agricultura familiar daquele território, qual seja, a abertura de novos canais de comercialização além do conseqüente fortalecimento de agroindústrias.

A realização dos projetos do Programa acabou gerando uma considerável rede de interação entre atores na escala local/regional. Por outro lado, observou-se que há dois grupos beneficiados diretamente pelos projetos. Os agricultores familiares, que produzem os produtos que irão compor a cesta, o que acaba lhes proporcionando uma renda mínima mensal, a diversificação da produção e das fontes de renda além da agregação de valor à produção. O segundo grupo corresponde às famílias carentes, às escolas e hospitais que recebem as cestas.

No caso dos projetos desenvolvidos dentro do âmbito do Programa pela CORAC, a densidade institucional é de nível 01, porém com um diferencial, pois possui apenas atores da sociedade civil e do Estado, da escala local/regional e nacional. Inexistem os demais atores no nível 01 como o poder estadual e local, instituições/organizações civis/profissionais e/ou empresariais e/ou estrangeiras

Esta característica acaba sendo uma particularidade do projeto, se comparado aos demais analisados neste artigo. A priori, a menor diversidade de atores e escalas, parece não interferir nos resultados esperados. Porém, a longo prazo pode representar um obstáculo à permanência e continuidade deste canal de comercialização da agricultura familiar, uma demanda essencial a ser atendida no território do Médio Alto Uruguai, como aponta a idéia-guia.

Pelo organograma a seguir, dos 13 atores envolvidos, observa-se o predomínio da sociedade civil, representando 85%7, permanecendo o Estado com 15%. Por sua vez, a escala local/regional representa 80% dos atores. Isso demonstra que esta escala possui uma relativa capacidade de organização e mobilização em torno de suas demandas, o que acaba contribuindo para que as políticas públicas de escalas exógenas gerem transformações territoriais mais significativas no território.

Figura 01. Organograma institucional da CORAC - Seberi – Médio Alto Uruguai/RS

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Siglas: ONG de Palmeira das Missões (ASAS), Sindicatos de Trabalhadores Rurais (STRs), Associação de Pais e Amigos dos Exepcionais (Apae), Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua (MNMMR), Companhia Nacional de Abastecimento (Conab).

Fonte: Elaborado com base nas entrevistas, dez/2006.

Os atores apontados no organograma institucional desempenham diferentes funções nos projetos do PAA. A CORAC é o ator central, pois coordena o projeto na escala local/regional. Esta cooperativa realiza as articulações da escala local/regional com a nacional (governo federal/Conab).

Sendo assim, a CORAC é responsável pela organização da produção e recebimento dos produtos que irão compor as cestas. Em seguida, efetua a distribuição destas para as entidades parceiras, as quais as repassam para o público alvo final: as famílias de baixa renda, escolas e hospitais.

Estas entidades parceiras da sociedade civil, ao distribuírem as cestas, acabam comprometendo estas famílias cadastradas no programa, a alguma contra-partida, sendo esta referente a atividades de “animação social”, tais como: atividades culturais e educacionais, incentivando a permanência de jovens e adolescentes nas escolas; atendimento das crianças com necessidades especiais; trabalhos voluntários em hospitais; organização de festas beneficentes; estudos de alternativas de alimentação e moradia para as famílias em situação de fragilidade social; atividades de acompanhamento de jovens; trabalhos em grupo voltados ao artesanato.

O Ministério do Desenvolvimento Agrário - MDA teve sua participação através da disponibilização dos recursos financeiros para a compra dos produtos dos agricultores familiares. No ano de 2006, estavam alocados pelo MDA/secretaria da Agricultura Familiar, R$ 130 milhões (SAF, 2006) ao PAA, sendo que destes, foram destinados R$ 2.539.410,71 ao Médio Alto Uruguai. Estes recursos destinaram-se principalmente ao pagamento dos agricultores fornecedores de produtos, recolhimento e distribuição dos mesmos, pagamento dos funcionários da CORAC envolvidos nestes serviços.

A respeito dos projetos descritos acima pode-se ressaltar algumas particularidades. Ao mesmo tempo em que o Programa beneficia o espaço rural, através da compra de produtos da agricultura familiar, este acaba beneficiando também o espaço urbano. Este último sob duas formas: a primeira através do fornecimento das cestas às famílias carentes e a escolas e hospitais e a segunda forma, através das atividades de animação social, desenvolvidas pelos atores parceiros. Estes resultados são possíveis apenas na medida em que há uma densidade institucional em torno deste programa federal.

Porém, entende-se ser pertinente ressaltar novamente a necessidade da construção de novos canais de comercialização para os produtos da agricultura familiar. Isso se torna necessário, principalmente em razão deste processo depender da renovação dos projetos com o MDA/SAF. Uma vez não renovados, os agricultores acabam correndo o risco de perder esta fonte de renda, o que significaria um retrocesso dentro do que estabelece a idéia-guia.

Para tal, torna-se importante, aumentar a diversidade de atores envolvidos. Buscar novos postos de comercialização que envolvam atores do mercado, reduzindo a dependência de programas governamentais; buscar programas de aquisição de alimentos semelhantes, ampliar a participação de agricultores, a variedade de produtos e os canais de comercialização, além do público que recebe as cestas ou adquire os produtos da agricultura familiar.

SISCLAF - Cooperativa Central de Leite da Agricultura Familiar com Interação Solidária – Francisco Beltrão, Sudoeste do Paraná

A região Sudoeste do Paraná caracteriza-se pela colonização intensiva a partir da década de 40 em projetos estaduais e particulares, de forma semelhante às formas de povoamento do norte do Rio Grande do Sul, com base na pequena propriedade familiar de famílias descendentes de imigrantes agricultores do Rio Grande do Sul e do Oeste catarinense, principalmente. A fronteira agrícola do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina avançou para o sudoeste do Paraná a partir daquela década, acentuando-se nos anos cinqüenta e sessenta. No mesmo ritmo destas regiões dos estados sulinos o Sudoeste foi cenário de emigração para a fronteira agrícola do Centro-Oeste e Amazônia. Seu perfil social é igualmente semelhante àquelas regiões sulinas com a existência de inúmeras organizações sociais atuantes tanto no campo quanto nas cidades.

O Sistema de Cooperativas de Leite - SISCLAF é o projeto do território Sudoeste do Paraná que melhor territorializa a idéia-guia eleita pelos atores atuantes no território. De acordo com o PTDRS, as idéias de sustentabilidade e protagonismo das populações do campo perpassam as discussões e ações no território.

Mapa 02. Território Rural do Sudoeste Paranaense – Paraná – Brasil

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O SISCLAF é composto por vinte e três cooperativas singulares, as Cooperativas de Leite da Agricultura Familiar (Clafs), e abrange vinte e três municípios do Sudoeste8. É formado por mais de 3.750 famílias, produzindo cerca de quatro milhões de litros de leite ao mês. O Sistema foi criado no ano de 2003, porém sua história inicia antes, com a criação das cooperativas familiares em 1998.  

A atividade leiteira caracteriza uma potencialidade da agricultura familiar, pois permite viabilizar economicamente unidades produtivas baseadas em pequenas extensões de terra. Por outro lado, embora seja uma atividade conhecida e comum aos agricultores familiares, esta necessita estruturar a sua cadeia produtiva, em razão de encontrar-se vulnerável a políticas de preço e de comercialização estabelecidas pelas indústrias de processamento.

Foto 02. Recolhimento de leite pela CLAF – Cooperativa de Leite da Agricultura Familiar, na região de Francisco Beltrão, Paraná

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Foto: RÜCKERT Aldomar A. Dez. 2006.

Para a estruturação da cadeia produtiva do leite, com base na experiência do Sistema de Cooperativas de Crédito Rural com Interação Solidária (Cresol), as Clafs criam o SISCLAF no ano de 2003. Este é constituído com o fim de estabelecer um elo entre as Clafs, atuando no seu fortalecimento e expansão. Estabelecendo estratégias de ação em quatro eixos: organização, produção, comercialização e transformação, o SISCLAF tem desenvolvido um trabalho de fortalecimento da agricultura familiar através da cadeia do leite. É importante ressaltar que o Sistema não atua de forma isolada, mas procura interagir com demais atores para atender as demandas da agricultura familiar.

O organograma institucional do SISCLAF aponta uma densidade institucional de nível 01. Ou seja, em torno deste arranjo, há a presença de atores da sociedade civil, do Estado e do mercado; da escala local/regional até a nacional.

Figura 02. Organograma institucional do SISCLAF – Francisco Beltrão - Sudoeste do Paraná

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Siglas: Sistema de Cooperativas de Leite (SISCLAF), Cooperativas de Leite da Agricultura Familiar (CLAFS), Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural (ASSESOAR), Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE), Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) e Associação das Casas Familiares Rurais (ARCAFAR), União Nacional de Cooperativas da Agricultura Familiar (UNICAFES), Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar (FETRAF), Serviço de Apoio Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), Sistema de Cooperativas de Crédito Rural com Interação Solidária (CRESOL).

Fonte: Elaborado com base nas entrevistas, dez/2006.

A Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural (Assesoar) teve importante papel na formação das primeiras cooperativas singulares, sendo esta a entidade autora do projeto das Clafs. Os sindicatos dos trabalhadores rurais - STRs, participam através do fornecimento da Carta de Aptidão necessária ao agricultor para a liberação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf). A Cresol, enquanto banco cooperativo, fornece e repassa os recursos do Pronaf ao agricultor. As prefeituras e secretarias municipais de agricultura participam dos projetos, intermediando o repasse de recursos.

Atores como a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) e Associação das Casas Familiares Rurais (Arcafar) têm sua participação através da realização de pesquisas, elaboração de projetos, de acordo com as demandas do SISCLAF, além da avaliação do trabalho técnicos. Já a União Nacional de Cooperativas da Agricultura Familiar (Unicafes), Federação dos Trabalhadores da Agricultura Familiar (Fetraf) e o Fórum do SISCLAF atuam através da divulgação e disseminação de tais experiências, incentivando práticas cooperativas. Recentemente tem iniciado parcerias com o Serviço de Apoio Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), objetivando-se a realização de cursos de formação e capacitação.

Por fim, o Governo Federal, por meio do MDA/SDT, através do Pronaf, é responsável pelo fornecimento de grande parte dos recursos financeiros utilizados nos projetos do SISCLAF, sendo que a contrapartida local/regional ou mesmo estadual é menos significativa.

Pela figura 5, abaixo, é possível observar uma massiva participação da sociedade civil em torno do SISCLAF. Isso pode representar a organização da mesma em prol de minimizar suas debilidades e atender as suas demandas. O Estado, também apresenta considerável participação, responsável principalmente pela disponibilização de recursos financeiros e pesquisas como, por exemplo, no Projeto de Agroindustrialização de Leite da Agricultura Familiar no Sudoeste do Paraná, no valor de R$ 360.000,00. Isso demonstra que sua participação nos processos de desenvolvimento é imprescindível. Os atores pertencentes ao mercado, neste caso, os laticínios, possuem participação mais discreta, restringindo-se a compra do leite.

Figura 03. Densidade Institucional do SISCLAF: participação dos atores nas escalas de poder e gestão (%*)

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(*) o cálculo da porcentagem é feito com base nos números de atores e refere-se ao total em cada escala

Fonte: Elaborado com base nas entrevistas

Figura 04. Participação das Escalas Geográficas de Poder e Gestão no SISCLAF (%)

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Fonte: elaborado com base em entrevistas

Por outro lado, pode-se evidenciar a participação da escala local/regional e regional representando 84% dos atores, ao lado das escalas nacional e estadual com 17% dos atores, como detalhado na figura 6.

A acentuada participação local/regional demonstra a capacidade de organização e mobilização de seus atores, que buscam parcerias nas demais escalas para atender estas demandas. Vale mencionar a discreta participação da escala estadual, sendo que esta se dá apenas pela sociedade civil, através da FETRAF e de duas redes de cooperativas, como pode ser visualizado no organograma institucional acima. Esta constatação pode apontar para a necessidade de uma integração maior entre políticas públicas federais e estaduais.

Por sua vez, o fato da participação da escala regional, correspondente ao território, se mostrar discreta, ou seja, apenas através da ARCAFAR, pode ser decorrente da recente implantação da política, sendo que a territorialidade e institucionalidade em torno dessa escala estão em formação.

Associação Frutivale,  Datas – Alto Jequitinhonha, Minas Gerais

O Alto Jequitinhonha localiza-se na Mesorregião do Jequitinhonha, uma das dozemesorregiões do estado de Minas Gerais, espaço que inicialmente pertenceu à Bahia (até o final do século XVIII), banhado pelo rio Jequitinhonha e seus afluentes. A Mesorregião é formada por 51 municípios agrupados em cinco microrregiões no norte de Minas Gerais. O Alto Jequitinhona, uma das microrregiões, tem fortes marcas históricas do perído do ciclo do ouro e do diamante tendo sua marca em torno do Arraial do Tijuco, o município de Diamantina, antigo centro da opulência criada pelo extrativismo do diamante seguido pela decadência e a pobreza regional. É uma região amplamente conhecida devido aos seus baixos indicadores sociais e também por ter caracteristicas do sertão nordestino. A maior parte do solo é árido resultado de um regime de secas e enchentes. A maior parte da população da Mesorregião e da microrregião do Alto Jequitinhonha (75%) vive na área rural praticando uma rudimentar agricultura e pecuária.

No território rural do Alto Jequitinhonha, a idéia-guia passa pela geração de trabalho e renda relacionados ao fomento da agricultura familiar. A criação de canais de comercialização foi considerada um objetivo fundamental. O projeto da Associação Frutivale foi elencado como aquele que melhor está territorializando a idéia-guia. Este território rural abrange treze municípios mas sua estrutura central está localizada no município de Datas, onde funcionará um entreposto de insumos, a agroindústria de polpa e a produção das mudas. A Associação está incluída nas ações territoriais do eixo da fruticultura, que junto ao de apicultura e derivados de cana formam os principais eixos de ação para o desenvolvimento do território.

Mapa 03. Território Rural do Alto Jequitinhonha – Minas Gerais – Brasil

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A Frutivale caracteriza uma associação de produtores que contou com recursos de diferentes fontes (prefeituras, Ministério do Desenvolvimento Agrário, Conab e os produtores de morango) para sua estruturação.

Foto 03. Projeto Frutivale: mudas de morangos, Datas, Minas Gerais

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Foto: RADOMSKY, Guilherme. Dez. 2006

A produção de mudas de morango envolve cento e quatorze agricultores familiares e a produção de polpa, duzentos e vinte e quatro. Atualmente, a agroindústria e o entreposto de insumos estão em fase de construção. Já as mudas, em mais de vinte variedades, estão sendo distribuídas entre os associados.

O que justificou a criação da Frutivale bem como a produção de mudas e a construção da agroindústria foi a reduzida expressão econômica da agricultura familiar no Alto Jequitinhonha. Além disso, outro fato que acabou incentivando a realização deste projeto foi a possibilidade de aproveitamento das frutas já produzidas no território, inclusive “as de fundo de quintal” através do PAA.

Assim, os objetivos que o projeto pretende alcançar referem-se ao desenvolvimento da fruticultura, considerada uma fonte alternativa e viável de geração de emprego e renda. Com base nisso, é proposto ainda a criação de redes de parcerias, organizando a produção e a agroindústria.

Pode-se citar alguns pontos fortes deste projeto como clima, solo e água favoráveis; atividade que demanda mão-de-obra; mercado em expansão; facilidade de transporte e insumos; parceria com instituições de pesquisa, caracterizando-se como potencialidades do território. Com base nestas potencialidades e contornando debilidades já foi possível (1) implementar uma área com o plantio de mudas frutíferas, (2) construir uma estufa e parte do prédio da agroindústria de polpa, (3) iniciar a construção do entreposto de insumos, (4) entregar mudas aos agricultores familiares, bem como (5) comercializar morangos com a Conab, através do PAA.

O projeto de produção de mudas, de produção de polpa e a implementação da agroindústria conta com um nível de densidade institucional 01, como é possível observar no organograma institucional que segue.

Os atores representados no organograma desempenham diferentes funções no projetoda Frutivale. A sociedade civil na escala local/regional, como os sindicatos dos trabalhadores rurais, bem com a associação dos agricultores da Frutivale, são responsáveis pela deliberação das ações desenvolvidas na Associação. Os agricultores familiares produtores de morango, além de beneficiários, também fornecem os morangos para a CONAB via PAA. O Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS) de Datas é responsável pela operacionalização das atividades no dia-a-dia da Associação. Já o Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural Sustentável (CEDRS), tem prestado consultoria, participado da tomada e deliberação de decisões.

Na escala regional, a Associação Microrregional de Municípios do Alto Jequitinhonha (Amaje) foi responsável pela elaboração do projeto na área da engenharia civil. Ainda no âmbito da sociedade civil, a Pontifícia Universidade Católica (Puc) é parceira prestando serviços de consultoria empresarial. Dentre os atores do Estado, as treze prefeituras, pertencentes à escala local/regional, prestam diferentes formas de apoio a Associação, como por exemplo, o financeiro. A Emater local de Datas exerce a gerência geral do projeto e a Emater Regional participa através de atividades de mobilização dos associados.

Figura 05. Organograma institucional da Associação Frutivale – Alto Jequitinhonha, Minas Gerais

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Siglas: Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável (CMDRS), Associação Microrregional de Municípios do Alto Jequitinhonha, (AMAJE), Conselho Estadual de Desenvolvimento Rural Sustentável (CEDRS), Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), Pontifícia Universidade Católica (PUC), Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (EPAMIG), Comissão de Implantação das Ações Territoriais (CIAT), Instituto de Desenvolvimento do Norte e Nordeste de Minas (IDENE). A Embrapa e a Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (EPAMIG) têm prestado consultoria técnica e fornecido as mudas. A Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM) disponibiliza apoio em agronomia e extensão rural. Por sua vez, a Comissão de Implantação das Ações Territoriais (CIAT) participa da tomada de decisões, sendo que a Frutivale é o projeto do eixo da fruticultura, proposto pelo plano de desenvolvimento do território. Nesse sentido, o Instituto de Desenvolvimento do Norte e Nordeste de Minas (IDENE) presta apoio institucional ao CIAT.

Fonte: Elaborada com base nas entrevistas, dez/2006.

Já o Ministério do Desenvolvimento Agrário é responsável pela liberação de recursos financeiros para a construção das estruturas físicas e a Conab entra com os recursos de comercialização através do PAA. Por fim, dentre os atores do Estado, as escolas estaduais são as beneficiárias do projeto, pois recebem a polpa de morango para o preparo de sucos na alimentação escolar, além de ajudarem na divulgação do mesmo. Dos atores pertencentes ao mercado, a MAP Frutas é um canal de comercialização em construção e um potencial parceiro para a ampliação dos negócios.

A atuação do Estado não se restringe a disponibilização de recursos financeiros. Vários atores são parceiros na prestação de consultoria técnica, administrativa, participam das tomadas de decisão e na mobilização, o que se torna possível pela organização e mobilização da sociedade civil na escala local/regional. Já a interação e as relações com os atores do mercado tornam-se essenciais para que seja possível a geração de emprego e renda, um dos objetivos do projeto e da idéia-guia.

A figura 09 aponta para um predomínio dos atores do Estado nas escalas nacional e estadual, respondendo por mais da metade dos atores. Por outro lado, na escala local/regional e regional essa realidade se inverte, havendo um predomínio da sociedade civil sobre os demais atores. O mercado apresenta-se mais discreto, com a participação apenas na escala estadual.

Figura 06 Densidade institucional da Frutivale: participação dos atores nas escalas de poder e gestão (%)

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Fonte: Elaborada com base nas entrevistas, dez/2006

Figura 07 Participação das Escalas Geográficas de Poder e Gestão na Frutivale (%=

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Fonte: Elaborada com base nas entrevistas, dez/2006

Vale destacar ainda que a escala local/regional é a que possui a maior participação de atores, ou seja, dos 22 envolvidos no projeto, 08 pertencem a esta escala, representando 36%. Isso parece demonstrar uma organização da sociedade civil em torno de suas demandas, que, ao interagir com as demais escalas, passam a implementar projetos e ações que atendem às demandas territoriais.

Considerando-se a diversidade de atores presentes no projeto da Associação Frutivale, considera-se que o mesmo vem atendendo seus objetivos, colocando-se como uma ação viável que vai de encontro à idéia-guia, ou seja, a implementação de políticas de geração de trabalho e renda para a agricultura familiar, através da criação de canais de comercialização.

CENTAF - Centro de Formação da Agricultura Familiar São José Operário, Silvânia – Estrada de Ferro/Goiás

O território rural Estrada de Ferro localiza-se no estado de Goiás, no planalto central e é composto por 14 municípios distribuídos em duas microrregiões oficialmente denominadas Pires do Rio (10 municípios) e Goiânia (4 municípios). No final do século XIX, a instalação da Estrada de Ferro Goiás possibilita o acesso dos produtos goianos aos mercados do litoral e centro-sul, possibilitando a ocupação de grandes áreas com a produção agrícola, sobretudo, arroz e carne bovina.

No território, a população urbana representa apenas 1,9%. As três principais atividades econômicas dos estabelecimentos rurais da Estrada de Ferro são pecuária (70% das propriedades), seguida pela produção mista de lavoura e pecuária (14,3%) e por último, lavoura temporária (10%). Embora o território seja predominantemente familiar em termos de número de propriedades - são 6.190 empreendimentos familiares ou 71,8% de um total de 8.623 estabelecimentos - há uma grande concentração de terras quando se analisa a área ocupada pelos estabelecimentos rurais. De uma área total de 966.675 hectares, mais de 77% pertencem a médias e grandes propriedades, as quais totalizam 2.433 estabelecimentos. Os 6.190 estabelecimentos familiares dividem os cerca de 22,5% restantes da área do território (PTDRS, 2006).

No território rural Estrada de Ferro a idéia-guia que mobiliza os atores em relação às ações territoriais refere-se ao fortalecimento da agricultura familiar, através da capacitação e da qualificação profissional, gestão da propriedade, baseada em noções de diversificação produtiva, geração de renda, qualidade fitossanitária e cuidados com o meio ambiente.

Mapa 04. Território da Estrada de Ferro – Goiás – Brasil

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Os atores entrevistados ressaltam a necessidade de captação de recursos direcionados à agricultura familiar, de modo a aumentar a inserção de tecnologia na produção, aliada à educação no campo para que a mão-de-obra familiar consiga utilizar tal tecnologia. Isto poderia servir como um estímulo à criação de mais agroindústrias, cooperativas de produção e crédito de agricultores familiares e canais de comercialização dos produtos agrícolas, pecuários e o artesanato

Com base nesta idéia-guia, foi destacado o processo de constituição do Centro de Formação da Agricultura Familiar São José Operário(CENTAF) no município de Silvânia. Este Centro é uma iniciativa da União Brasiliense de Educação e Cultura (UBEC), uma associação civil, confessional de direito privado e de caráter assistencial, educacional, filantrópico e sem fins econômicos, com sede no Ginásio Anchieta em Silvânia, e do CIAT Estrada de Ferro.

A proposta inicial do projeto pedagógico do CENTAF foi apresentada pela UBEC ao CIAT em dezembro de 2005. No Centro o curso técnico inicial seria o de agropecuária familiar. Outros cursos técnicos foram projetados, como o de Agroindústria Familiar, para ser direcionado principalmente para o Arranjo Produtivo Lácteo existente no território, seguidos de curso de artesanato, desenvolvimento sustentável, além de demandas diversas do território. Deverão ocorrer também cursos de curta duração para grupos de agricultores e agricultoras do território correlatos à pecuária leiteira, à apicultura, ao orgânico, ao associativismo, ao cooperativismo, entre outros.

Foto 04. Coopervi - Cooperativa dos Produtores Rurais de Vianópolis e Região

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Foto: SPECHT, Suzimary. Dez/2006.

É importante ressaltar ainda que, pretendendo reduzir sua dependência de recursos externos que o viabilize, estavam previstas recentemente práticas de ecoturismo associado à educação ambiental para grupos escolares, empresariais e familiares, além da prática de turismo educativo para grupos que se interessem por processos de produção alternativos (orgânicos, agroecológicos, homeopatia, artesanato, economia solidária, entre outros).

Observou-se um nível de densidade institucional 01 em torno do CENTAF, como aponta o organograma institucional a segui. Os atores elencados na figura acima cumprem diferentes papéis na constituição do CENTAF. A sociedade civil da escala local/regional, como os sindicatos dos trabalhadores rurais, central de diversas associações, ONGs e cooperativas de crédito enquanto integrantes do CIAT, são responsáveis pela fiscalização do projeto. Além disso, ainda os sindicatos e as associações, junto das cooperativas de produção, prestarão auxílios de diversas ordens, quando possível e/ou necessário, aos futuros alunos.

Figura 08. Organograma institucional do CENTAF - Silvania – Estrada de Ferro/GO

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Siglas: União Brasiliense de Educação e Cultura (UBEC), Universidade Católica de Brasília (UCB), Universidade Estadual de Goiás (UEG), Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia de Goiás (SECTEC), Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR), Ministério da Educação e Cultura (MEC).

Fonte: Elaborado com base nas entrevistas, dez/2006.

Na constituição do projeto do CENTAF, encontravam-se previstas as atividades de diversas organizações e instituições, dentre as Secretarias Municipais da Agricultura para o desenvolvimento de programas/projetos de apoio aos alunos egressos do CENTAF; secretarias municipais de Educação para atuar na sensibilização e mobilização dos candidatos/estudantes; secretarias municipais de Assistência Social que ficariam responsáveis pelo endosso dos candidatos a freqüentar o CENTAF enquanto que prefeituras municipais arcariam com os custos de transporte dos alunos, das propriedades para o Centro e vice-versa.

Na escala estadual, os atores do Estado, como Universidade Estadual de Goiás (UEG) e Secretaria de Estado de Ciência e Tecnologia de Goiás (SECTEC) atuariam em parcerias futuras no desenvolvimento de projetos. A Agência Rural deveria acompanhar o desenvolvimento dos alunos e de suas propriedades. As secretarias estaduais de Educação; Agricultura Pecuária e Abastecimento e a Superintendência de Agricultura Familiar disponibilizariam recursos humanos, além do estabelecimento de diversas parcerias/projetos. A Secretaria Estadual de Agricultura e Abastecimento atuaria também, no fornecimento de recursos tecnológicos.

Já na escala nacional, a Universidade Católica de Brasília (UCB) seria parceira futura principalmente em projetos ambientais, além de prestar assessoria pedagógica e técnica, o mesmo papel do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (SENAR). O Ministério da Educação (MEC) repassaria recursos para a montagem dos laboratórios. A Embrapa participaria com várias sucursais, principalmente a Embrapa leite. O CIAT, através de cooperação técnica-institucional fiscalizaria a participação e estabeleceria convênios com os municípios, para que a UBEC pudesse realizar convênios com o território. Por fim, os recursos financeiros para a implementação do CENTAF seriam disponibilizados pela Secretaria Executiva do Pronaf, partindo da Secretaria do Desenvolvimento Territorial (SDT) do MDA a liberação de equipamentos para o território de modo que este possa conceder os equipamentos para o CENTAF. Vale destacar ainda que haveria a participação de atores do mercado, ou seja, empresas de insumos agrícolas, que disponibilizariam os insumos para aulas práticas dos cursos do CENTAF.

Observa-se que a os recursos financeiros provêm de diferentes fontes, das diversas escalas, com destaque para o Estado, na escala nacional. Desta forma, fica evidenciado que a participação de todos os atores é imprescindível para a concretização dos objetivos e implementação do CENTAF. Ou seja, a densidade institucional de nível 01 está permitindo a elaboração e breve concretização das demandas que foram apontadas na idéia-guia.

A figura 09 demonstra um acentuado predomínio da presença do Estado, nas três escalas geográficas de poder e gestão, no que se refere ao processo de constituição do CENTAF. De um total de 29 atores, 66% são representantes da esfera estatal e 34% da esfera da sociedade civil. Vale ressaltar, que os atores pertencentes ao mercado (fornecimento de insumos), também estão se fazendo presentes como parceiros neste projeto.

Figura 09 Densidade institucional do CENTAF: participação dos atores nas escalas de poder e gestão (%)

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Figura 10. Participação das Escalas Geográficas de Poder e Gestão no CENTAF (%)

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Fonte: Elaborado com base nas entrevistas, dez/2006

Por sua vez, como aponta a figura 10, quanto à participação de cada escala, há um predomínio dos atores na escala local/regional (43%), ou seja, dos 32 atores envolvidos (figura 08), 14 pertencem a local/regional. Além da expressiva participação dos atores locais/regionais e nacionais, a estadual também chama bastante atenção, sendo que nos demais projetos analisados, a participação em número de atores é menos significativa. Isso, no caso do CENTAF, pode representar uma integração maior de políticas e ações do estado da esfera estadual e federal, considerando que os atores da escala estadual pertencem ao Estado. Tal integração é considerada positiva em relação ao desenvolvimento de territórios rurais.

Observa-se assim, que a diversidade de atores presentes, atende as demandas do projeto, sendo que apenas o conjunto enquanto tal, parece ter a capacidade de levar o CENTAF à sua efetiva implementação.

Algumas considerações acerca da metodologia das escalas geográficas de poder e gestão  dos quatro projetos analisados

A partir da caracterização dos projetos dos quatros territórios rurais, CORAC (Seberi, RS); SISCLAF (Francisco Beltrão, PR); Associação Frutivale (Datas, MG); CENTAF (Silvania, GO) pode-se fazer algumas considerações tomando-se por referência os dados resultantes da metodologia das escalas. A seguir, muito brevemente, tentar-se-á apresentar como esta metodologia pode servir enquanto ferramenta para o planejamento das ações e dinâmicas territoriais.

Os quatro projetos analisados apresentaram níveis de densidade institucional 01, com atores da sociedade civil, Estado e mercado, das escalas local, local/regional, regional, estadual e nacional. Contudo, houveram duas exceções.

No caso da CORAC (RS), há a presença de apenas duas escalas - local/regional e nacional - com atores da sociedade civil e Estado. Considerou-se o projeto também de nível 01 em razão de haver a presença da escala nacional. No entanto, ressalta-se que a pouca diversidade de atores e escalas pode representar futuros obstáculos ao projeto, como por exemplo, a sua continuidade após o fim do Programa de Aquisição de Alimentos.

A outra exceção refere-se ao CENTAF (GO) que apresentou apenas três escalas - local/regional, estadual e nacional. Porém, isto decorreu do grande número de atores presentes neste projeto, além do tempo reduzido para a realização da pesquisa de campo, o que não permitiu um aprofundamento maior sobre os projetos. Isto reduz a riqueza de detalhes e informações, porém não interfere, de modo geral, nos resultados finais da análise.

No mais, a partir dos organogramas institucionais e das figuras que apontam os percentuais de participação dos atores, foi possível observar uma predominância da escala local/regional enquanto número de atores envolvidos. A tabela abaixo apresenta comparativamente os quatro projetos, em percentuais.

Tabela 02. Participação de cada escalas nos 4 projetos

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(***) Escala não existente

Fonte: Elaborado com base nos organogramas institucionais.

A significativa participação da escala local/regional, em cada um dos quatro territórios, pode ser reflexo da capacidade de organização e mobilização dos atores em torno de suas demandas. Vale ressaltar ainda que esta escala, somada à regional (quando existente) representa cerca de 50% dos atores envolvidos nos projetos e ações analisadas em cada território.

Quanto à escala regional (correspondente aos territórios rurais), quando é possível identificá-la, visualiza-se que a participação de atores representantes da mesma é pouco expressiva nos casos analisados, sendo de 4% no Sudoeste do Paraná e 9% Vale do Jequitinhonha. Isso pode ser conseqüência do fato da implementação da política dos territórios rurais ser relativamente recente. Por outro lado, aponta para que as futuras ações nos territórios incentivem a construção de uma identidade/territorialidade em torno desta delimitação, de modo que não se constitua mais uma regionalização dentre as muitas já existentes.

A participação das escalas estadual e nacional permanece num patamar semelhante no território Estrada de Ferro (30% e 27% respectivamente) e no Vale do Jequitinhonha (ambos 28%). Realidade oposta foi observada no território Médio Alto Uruguai, onde não há presença da escala estadual, conseqüência de contatos e representações políticas mais diretas com a escala nacional. No Sudoeste do Paraná, a escala estadual representa 13% dos atores enquanto que a nacional 38%.

Quanto à escala estadual e nacional pode-se observar ainda que, exceto no caso do Sudoeste do Paraná, o ator que mais se destaca é o Estado (ver tabela abaixo). Considerando-se que, há uma mobilização local/regional significativa em torno das demandas desta escala nos quatro casos, a participação do Estado pode representar uma relação de sinergia entre escalas, ou ainda, entre sociedade civil local/regional e Estado na escala estadual e nacional.

Considerando ainda que nos quatro projetos, na escala local/regional predominam atores da sociedade civil e na estadual e nacional, atores do Estado, pode-se afirmar que este é um indício do que afirma Bobbio, quando menciona que o papel do Estado está relacionado ao atendimento das demandas da sociedade civil. Considerando real esta premissa, o Estado, também de âmbito municipal, poderia, por exemplo, voltar-se à construção de novos canais de comunicação com a sociedade civil, de modo a melhor atender suas demandas.

Além disso, a discreta participação do Estado na escala estadual em dois territórios aponta para uma necessidade de construção de canais de comunicação entre estes dois níveis de poder – federal e estadual - de modo a somar-se forças e reduzir esforços empreendidos em ações que por vezes, tem os mesmos objetivos, mas ocorrem paralelamente sem interações dos atores políticos.

Tabela 03. Participação das escalas e atores nos quatro projetos examinados

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(***) Escala não existente

Fonte: Elaborado com base nos organogramas institucionais.

Por sua vez, o mercado aparece de forma muito mais discreta. Está presente no Sudoeste do Paraná, na escala local/regional (8%) e no Vale do Jequitinhonha, na escala estadual (5%). Pode-se fazer duas considerações a este respeito.

A discreta participação de atores pertencentes ao mercado pode apontar para a realização de futuras ações de integração entre as experiências e o mercado já que a idéia guia do território do Médio Alto Uruguai e Vale do Jequitinhonha, passa explicitamente pela busca de novos canais de comercialização o que aparece implícito também nos outros dois territórios.

Por outro lado, ressalta-se a importância de se distinguir o mercado dos demais atores da sociedade civil, como apontado anteriormente. A restrita participação de atores do mercado, principalmente enquanto ator protagonista, certamente está relacionada ao seu objetivo: centrado mais na obtenção de lucro e menos na perspectiva social, como no caso dos movimentos sociais. Porém entende-se ser importante uma maior integração com estes atores, pois esta acaba sendo uma forma de viabilizar a idéia-guia mencionada.

Mais especificamente, quanto aos projetos, é possível afirmar que a densidade institucional em torno dos mesmos tem permitido que estes atinjam os objetivos a que vem se propondo. Os diferentes atores e escalas têm cumprido ou assumido diversos papéis, tornando possível atender a demandas dos territórios rurais.

Foi observada ainda a predominância da presença de atores voltados à agricultura familiar, com exceção do CENTAF, que integra diversas áreas. Esta constatação parece, a priori, gerar ações setorializadas. Porém, as ações desenvolvidas nos projetos apontam para uma visão de agricultura, não mais restrita à produção de alimentos, mas sim, a uma agricultura voltada à produção, processamento (leite/SISCLAF; frutas/Frutivale) e comercialização (PAA – CORAC, Frutivale; SISCLAF) negociando com as empresas processadoras.

Por sua vez, o projeto do CENTAF, que engloba uma considerável diversidade de atores quanto à sua área de atuação (atores voltados à educação, assistência social, ciência e tecnologia, assistência rural) expressa bem a visão da dinâmica territorial do desenvolvimento rural. A partir de investimentos na educação, os atores locais/regionais pretendem fortalecer a agricultura familiar através da capacitação, qualificação profissional e gestão sustentável da pequena propriedade, procurando superar uma visão setorial. Os projetos ligados ao PAA (CORAC, Frutivale), também podem ser aqui citados, uma vez que, além de beneficiarem os agricultores familiares, beneficiam famílias carentes, escolas e hospitais.

Enfim, as considerações feitas ao longo deste item, não podem ser consideradas finais, mas sim considerações preliminares ou mesmo iniciais. O tempo reduzido para a realização do trabalho de campo (11 a 15 de dezembro de 2006) não permitiu um aprofundamento maior na pesquisa in loco de cada projeto. As considerações ora trazidas são feitas no sentido de demonstrar a aplicabilidade da metodologia de escalas aos processos de desenvolvimento territorial. O que se pode observar, é que existem diversas escalas de poder e gestão atuando na transformação do espaço, levando a novos usos políticos e econômicos, ou seja, gerando transformações territoriais.

Ao observar-se as escalas e seus respectivos atores, ao lado do papel de cada um no território, é possível perceber sua relevância para os processos de desenvolvimento, além de poder-se elencar e buscar potenciais atores e ações necessários ao alcance dos objetivos a que os projetos se propõem. Como exemplo, pode-se citar novamente o mercado, cuja participação tende a gerar resultados positivos quando se pretende abrir novos canais de comercialização para a agricultura familiar.

Enfim, a análise escalar constitui um método não dicotômico de apreensão da realidade. O método leva em consideração elementos ou atores distintos mas imbricados, que empregam novos usos políticos e econômicos do território. Cada ator possui sua territorialidade, e o recurso das escalas recupera a importância dos atores relegados a posições coadjuvantes nas análises centradas no marco estatal, atribuindo relevância a várias dimensões que interconectadas, influenciam na dinâmica territorial.

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Notas

1   Este artigo é resultado parcial do projeto de pesquisa “Avaliação do desenvolvimento territorial em quatro territórios rurais – Brasil”, realizado sob demanda da Secretaria de Desenvolvimento Territorial (SDT), do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), financiado pelo Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) durantes os anos de 2006/2007. Registra-se os agradecimentos aos professores doutores Sérgio Schneider (coordenador do projeto), Eduardo Filippi, Paulo Waquil, aos pós-graduandos Suzimari Specht, Marcelo Conterato, Guilherme Radomsky e a economista Eliane Sanguiné da Silva que compuseram a equipe. Agradecimentos ao Prof. Dr. Laurindo Guasselli e ao graduando Társio Onófrio (UFRGS, Porto Alegre),  pela cartografia;  a Nicolas Le Brazidec (Paris) pela revisão da Língua Francesa.

2  Segundo Fernandéz (2004), esta caracteriza uma sólida presença institucional (firmas, associações empresariais, instituições financeiras, ONGs, agências de desenvolvimento, escolas, centros de serviço, institutos tecnológicos e universidades, etc); bem como o desenvolvimento de formas de cooperação que gerem uma consciência de pertença a uma dinâmica territorial e ao padrão de coalizão representativo dos interesses locais.

3  No território Estrada de Ferro (GO) não foi possível identificar atores na escala regional, em razão da generalização das informações fornecidas pelos entrevistados.

4  Boisier denomina o conjunto de atores presentes como “mapa institucional”. Aqui considera-se, na ausência de cartografia na proposta do autor, a figura como um “organograma institucional”.

5  A idéia-guia foi apontada pelos próprios entrevistados e diz respeito à principal ação ou projeto realizado nos territórios.

6  O PAA foi criado, em 2003, pelo Governo Federal (Governo Lula) com o objetivo de incentivar a agricultura familiar, compreendendo ações vinculadas à distribuição de produtos agropecuários para pessoas em situação de insegurança alimentar e à formação de estoques estratégicos. O PAA é proposto pelo Governo Federal, através da Secretaria da Agricultura familiar (SAF) do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA).

7  Os percentuais foram calculados em relação ao número total de atores envolvidos em cada um dos projetos analisados. Este total pode ser visualizado nos organogramas institucionais.

8  Dentre eles, Francisco Beltrão, Pato Branco e Itapejara do Oeste.

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Para citar este artigo

Referência electrónica

Aldomar A. Rückert e Anelise G. Rambo, « Metodologia das escalas geográficas de poder e gestão aplicada à análise de desenvolvimento em quatro territórios rurais no Brasil », Confins [Online], 8 | 2010, posto online em 15 Março 2010, Consultado o 27 Fevereiro 2014. URL : http://confins.revues.org/6370 ; DOI : 10.4000/confins.6370

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Autores

Aldomar A. Rückert

Docente e pesquisador no Programa de Pós-Graduação em Geografia e em Desenvolvimento Rural – Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, RS- Brasil

Artigos do mesmo autor

Anelise G. Rambo

Doutoranda no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Rural (Pgdr) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, RS- Brasil.

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