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Psicologia: Reflexão e Crítica - Metapsychology of the modern subject

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Psicologia: Reflexão e Crítica

Print version ISSN 0102-7972

Psicol. Reflex. Crit. vol.12 n.3 Porto Alegre  1999

http://dx.doi.org/10.1590/S0102-79721999000300014 

Metapsicologia do sujeito moderno

Mario Fleig 1, 2
Universidade do Vale do Rio dos Sinos
Associação Psicanalítica de Porto Alegre\

 

 


Resumo:
Partindo do procedimento de comparação e oposição entre modelos culturais, método de investigação da antropologia cultural, examinamos os princípios organizadores da pré-modernidade e modernidade e seus efeitos no laço social na modernidade. Dos impasses daí resultantes, podemos situar tanto os sintomas sociais quanto as dificuldades subjetivas. A partir dessa psicopatologia podemos delimitar a clínica psicanalítica, criada por Freud, que pressupõe o sujeito moderno inaugurado por Descartes e que coexiste com clínicas diversas. Tal delimitação implica definir os limites extremos do sujeito moderno, seus ideais e imperativos próprios. É isso que caracteriza a metapsicologia do sujeito moderno, submetido ao imperativo de sair de casa (abandonar a tradição que o funda), referir-se dentro de um tempo e espaço sem centro fixo e submetido ao comando dos objetos. O aparelho psíquico se estrutura a partir do material que a cultura coloca à disposição do sujeito, de tal modo que o inconscientizado singular não se articula fora do social.

Palavras-chave: Metapsicologia; sujeito moderno; inconsciente.

Metapsychology of the Modern Subject

Abstract
The author sets himself to examine the organizing principles of Pre-Modernity and Modernity starting from procedures of comparison and opposition among cultural models, a method of investigation of Cultural Anthropology . The effects of these principles on the social relations are also studied. The resulting impasse allows us to locate both the social symptoms and the subjective difficulties. From this psychopathology, we can delimit the psychoanalytic clinical practice, created by Freud. This clinical practice presupposes the modern subject - introduced by Descartes -, and which coexists with diverse clinical practices. A delimitation of this sort implies a definition of the extreme boundaries of the modern subject, his ideals and his imperatives. The metapsychology of the modern subject is characterized by the subject’s submission to the imperative to leave home (thus abandoning the tradition which is his own foundation), to refer itself within time and space with no fixed center, and the submission of the subject to the command of the objects. The psychic apparatus is structured from the material the culture provides the subject with. Hence, the singular "unconscioused" cannot articulate itself outside the social means.

Keywords: Metapsychology; modern subject; unconscious.


 

 

Um processo psíquico, como formação do inconsciente, se expressa em ideais, soluções sintomáticas e formas de gozo, ou seja, em soluções singulares e/ou sociais que tecem o mito que funda a cultura.

Partindo da concepção de Freud (1930[1929]/1976), seguimos a tese que o aparelho psíquico estrutura-se a partir do material que a cultura coloca à disposição do sujeito, de tal modo que o inconscientizado singular não se articula fora do social. Considerando que a metapsicologia freudiana trata dos limites extremos da alma, esses podem ser localizados nos pontos de impasses sociais que recobrem os impasses subjetivos. Esses emergem tanto do lado do sujeito, denunciando-se através da dor psíquica, quanto do lado do objeto de interesse, na forma de sua construção e utilização. A metapsicologia convoca a um estudo das relações no seio da cultura, onde os ideais e imperativos aí veiculados, em suas múltiplas representações, resultam tanto nas formações sócio-culturais, quanto nas formações psicopatólgicas.

O projeto freudiano de elaborar uma metapsicologia como descrição do processo psíquico - "Proponho que uma apresentação seja denominada metapsicológica quando conseguirmos descrever um processo psíquico segundo suas relações dinâmicas, tópicas e econômicas." (Freud, 1915/1976 p. 208) - resultou para ele mesmo num fracasso, pois interrompeu seu plano e dos doze trabalhos previstos, apenas cinco foram publicados. Contudo, esse fracasso foi apenas circunstancial, pois o desafio da metapsicologia não deixou de aparecer ao longo da obra e o conjunto de seus escritos pode ser tomado como a tentativa, no âmbito do saber fragmentário, de nomear os limites da alma humana. Retomar o projeto da metapsicologia freudiana parece se impor a partir da prática psicanalítica, para o analista que tenha pretensão mínima de dar conta do que é sua práxis. Nesta direção, cabe indagar sobre os contornos de uma possível metapsicologia em nossa cultura e tal delimitação implica em examinar aquilo que constitui um sujeito, seus ideais e imperativos, ou seja, em que consiste a especificidade da modernidade e do sujeito moderno.

Uma vez que nas falhas é que se mostra a estrutura metapsicológica e isso pode ser apreendido no sintoma como aquilo que se repete e ao mesmo tempo reitera um gozo tanto singular quanto social, propomos perseguir a descrição do processo psíquico a partir do sintoma social (cf. Fleig, 1997b; 1998a e 1998b).3

O sintoma, sendo um efeito de estrutura, poderia levar a supor formas e possibilidades quase invariantes para o sujeito. Entretanto, hoje sabemos que esse não pode ser considerado sem as torções e alterações que ocorrem em cada cultura. A tese lacaniana de que o inconsciente é transubjetivo e social, ou seja, que o inconsciente se estrutura como uma linguagem, possibilita que todo sintoma seja tomado também como social, isto é, uma solução substitutiva que enlaça recalcamento e gozo nos conflitos próprios de cada cultura e de cada sujeito constituído na mesma.

Durante um certo tempo houve um pressuposto de que a psicanálise seria igual em qualquer lugar, supondo que o ser humano era o mesmo. Essa é uma posição teórica que não há mais como ser sustentada, pois a investigação acerca do sintoma social vem descobrindo especificidades e alterações das formas psicopatológicas em consonância com as modificações da cultura.

A investigação daquilo que produz mal-estar aparece com Freud, pois ao mesmo tempo em que desenvolvia a sua clínica se mostrava preocupado com as grandes questões da cultura: o que é uma civilização? o que a organiza?, possivelmente provocadas pela escuta dos indivíduos, um a um.

É sobre o sintoma social que versa um dos textos mais importantes de Freud, O Mal-estar na Civilização (1930 [1929]/1976), no final do qual, duas observações são indicadas: "Creio que a linha de pensamento que procura descobrir nos fenômenos de desenvolvimento cultural o papel desempenhado por um supereu promete ainda outras descobertas." (p.169) A segunda observação: "No entanto, e a despeito de todas essas dificuldades, podemos esperar que, um dia, alguém se aventure a se empenhar na elaboração de uma patologia das comunidades culturais." (p.169)

Na primeira observação, quais seriam então essas outras descobertas, esclarecimentos ou revelações (Aufschlüsse) possíveis a partir da instância superegoica, regulativa e imperativa da vida e da cultura moderna?

E na segunda observação, a referida "patologia das comunidades culturais" (Pathologie der kulturellen Gemeinschaften) não corresponde então ao sintoma social? Freud legou-nos uma enorme tarefa pela frente, e em acréscimo, forneceu os instrumentos essenciais. Alertou também para o problema epistemológico, que implica o trânsito do âmbito do caso individual para o social, ou seja, a partir do que é observado num caso individual, ser dito algo que tenha pertinência para toda a cultura ou para um dado momento dessa. Como é possível fazer essa passagem sem utilizar procedimentos comuns da ciência da generalização, dado que na clínica psicanalítica é inviável usar os procedimentos de quantificação e de tratamento estatístico? Eis como Freud, no mesmo texto, coloca a dificuldade: "Eu não diria que uma tentativa desse tipo, de transportar a psicanálise para a comunidade cultural, seja absurda ou que esteja fadada a ser infrutífera. Mas teríamos de ser muito cautelosos e não esquecer que, em suma, estamos lidando apenas com analogias e que é perigoso, não somente para os homens mas também para os conceitos, arrancá-los da esfera em que se originaram e se desenvolveram." (p. 169).

Essa passagem somente estará justificada na medida em que for desenvolvida uma conceituação da relação entre o social e a singularidade. Essa encontra uma explicitação sólida nas formulações de Lacan, especialmente na noção de discurso e no discurso como constituindo o laço social, cujo núcleo se encontra na tese de que não há singularidade possível fora do laço ou tecido social. Portanto, aquilo que emerge num sujeito não está absolutamente descolado de algo que se passa no tecido cultural. O mesmo pode ser proposto em sentido inverso: aquilo que é observado numa dada cultura é pertinente a cada um como singularidade constituída nesse contexto. É essa formulação que justifica o trânsito entre o singular e o transindividual ou transubjetivo, tomando sempre todas as precauções que preservem as especificidades da singularidade e da estrutura discursiva que enlaça e constitui as mesmas singularidades (cf. Calligaris 1993).

Partindo do pressuposto que o tipo de cultura em estudo - a modernidade - se diferencia do que é chamado de culturas não-modernas ou, genericamente, de culturas tradicionais, cabe a interrogação acerca das transformações culturais que determinaram a formação da modernidade e quais os traços que compõem este sintoma que denominamos precisamente de "modernidade". É uma tarefa impossível de ser esgotada, tanto pelo acúmulo de traços, quanto pela sua riqueza, permitindo serem abordados pelos mais diversos desenvolvimentos culturais. Somando-se a isso o fato de, por sua contemporaneidade, ser uma estrutura que se encontra em movimento. Contudo, isto não impede de precisar alguns traços que denunciam as soluções de compromisso nas quais algo fica recalcado. Isto remete ao conceito freudiano de sintoma, como a solução de um impasse pela produção de um substitutivo que atenda a desejos opostos. É uma saída paradoxal, pois ao mesmo tempo que apresenta uma resolução, produz um sofrimento gozoso na forma de algo insuportável e inconciliável para esse sujeito.

Para precisar o conceito freudiano de sintoma, implica examinar a noção de substitutivo (Ersatz), isto é, um elemento representado por outro. Nesse sentido, o sintoma não é uma resolução exitosa, pois o impasse, tanto para o sujeito quanto para a cultura, vem significar a reapresentação do conflito recalcado, ou seja, seu retorno.

Quais são, então, os impasses que marcam a cultura contemporânea, os mais determinantes, em torno dos quais os demais se organizam?

Para poder situar do modo mais pertinente os impasses da modernidade é necessário delimitar o próprio conceito de modernidade 4. Para tal, propomos o modelo antropológico de Dumont (1983), que opera pela oposição entre sociedade moderna e pré-moderna ou tradicional, a partir de três princípios: a) hierarquia/igualdade; b) tradição/autonomia; c) holismo/individualismo.

a) O primeiro princípio, que rege a distribuição da sociedade entre hierárquicas e igualitárias, se enunciado numa terminologia grega, significa que por natureza os seres humanos são desiguais. Nascer desiguais e continuar assim faz parte da natureza de cada um, não havendo nenhuma aspiração a ser diferente, cabendo apenas realizar o que já está dado. Essa concepção de homem, sociedade e universo está calcada na tradição. Para Aristóteles, ilustrando no pensamento grego o predomínio da concepção da desigualdade, por exemplo, cada ente tem a sua natureza, de tal modo que a da mulher é diferente e hierarquicamente menor que a do homem. Não há lugar na pólis para aquele que nega a sua natureza.

A desigualdade, como princípio organizador da cultura, resulta numa forma de laço social altamente viável, pois, através do ordenamento de todas as entidades de forma hierárquica, determina um intensa estabilização da cada sujeito num dado lugar social.

b) O segundo princípio, aliado ao primeiro, se constitui na oposição entre tradição e autonomia, de modo que o poder, a autoridade e a verdade coincidem sempre com a tradição. O campo dos ideais, como instância de onde se articula a normatividade, é constituído prevalentemente pela força da tradição. Desse modo, o ideal de vida de alguém situado numa sociedade pré-moderna é ser no amanhã como os seus antepassados foram ontem. Esse princípio é altamente viabilizador da transmissão cultural, como ocorre em certas culturas em que não há a figura do professores ou instrutores, pois os problemas que aparecem são resolvidos pela consulta à tradição, conhecida por todos e preservada na memória histórica, carregada de pai para filho, numa transmissão eficiente. A estabilidade social é um dos efeitos mais marcantes, pois se o ideal é que amanhã se repita o que foi ontem, e isso como critério do verdadeiro, então, manter-se fiel e repetir os ancestrais será sempre tomado como compondo essencialmente o campo dos ideais partilhados. A partir dessa formulação, numa cultura tradicional, os ideais partilhados de modo generalizado tem como efeito uma normatividade altamente vinculante. Algo diferente ocorre na modernidade, na qual os ideais não são partilhados de forma homogênea, resultando numa normatividade carente de força vinculante.

c) O terceiro princípio que organiza uma sociedade tradicional reside no holismo, no qual o valor se encontra sempre no todo. O todo, como valor prevalente, nas suas mais diversas formas, se representa como povo, tribo, clã, família, etc. Então, se há alguma coisa a ser defendida em primeiro lugar, é sempre o valor prevalente, o todo. A vida de cada um só faz sentido na medida em que contribui para preservar o valor máximo, o grupo ao qual pertence, e reeditar aquilo que já foi realizado pelos antigos. Quanto mais um indivíduo sustentar os ideais grupais, estando mais próximo dos antepassados, maior reconhecimento receberá. O velho é especial, por se encontrar mais próximo da fonte de autoridade, a tradição, e poder testemunhar do quanto já pôde e pode dar para a sobrevivência do valor prevalente. O lugar do velho na modernidade, na qual o valor de um indivíduo não é medido pelo seu potencial altruísta e nem por ser depositário da tradição, torna-se um impasse típico, pois a tentativa de assegurar um valor subjetivo mínimo vem pelo acúmulo de bens e pela herança os ideais conflui na irrupção das revoluções sociais. São três grandes revoluções sociais, precedidas pela Revolução Gloriosa de 1688: a Revolução Americana, a Revolução Francesa e a Revolução Russa de 1917, provocando efeitos que alteram o mais corriqueiro cotidiano até a organização do Estado.

Cada uma dessas revoluções tem a sua especificidade, mas o lema central da Revolução Francesa, liberdade, igualdade e fraternidade, significa que, do ponto de vista formal, todos são iguais 5. A igualdade é posta como um ideal, não ainda efetivado, mas resguardado como direito de todo cidadão. Se de fato existe a desigualdade, isso é uma contingência histórica e depende das condições materiais dadas. Mas, na modernidade, não há nada que possa justificar a desigualdade do ponto de vista dos direitos. É a afirmação da igualdade formal de todos os seres humanos.

E o que significa a liberdade? No mínimo que cada um possa dirigir a sua existência e inventar até o limite que lhe permita a condição de cidadania, enquanto que na sociedade tradicional o que dirige a existência é a autoridade da tradição. Isto é, a pessoa age segundo aquilo que seu clã e sua tradição determinam, de acordo com algo que está escrito desde sempre. É o caso do índio brasileiro que vive na selva; não é um sujeito de uma liberdade fantástica? Certamente que sim, entretanto sua ação está absolutamente sob a norma que cai sobre ele. Não lhe é possível inventar nada de diferente, nem mesmo ele quer inventar algo diferente, ou mesmo isso lhe ocorre.

O conceito de liberdade6 é um dos grandes avanços que a modernidade produziu, abrindo o espaço da inventividade de novas formas de existência, tanto individual quanto culturalmente. Rompe-se com a concepção de destino como algo que já está pronto e abre-se para o sujeito a possibilidade de inventar como modo de autodeterminação.

O ideal de fraternidade tem suas origens no preceito cristão do amor ao próximo e no pressuposto da filiação divina, passíveis de generalização para todo gênero humano. É reeditado no projeto da modernidade como ideal de fraternidade universal, resultando na transformação da figura do estrangeiro 7, na modificação nas relações de parentesco, na posição do pátrio poder e no próprio erotismo.

Esses princípios implicam numa quebra do conceito de desigualdade e autoridade. A alteração do princípio, que define a sociedade tradicional como holista, se constitui numa das transformações mais surpreendentes no projeto da modernidade, ou seja, o deslocamento do valor do grupo para o valor em cada um, isto é, o advento do individualismo, ou o deslocamento do todo como valor prevalente. Sob este aspecto, na modernidade se dá a aplicação generalizada da figura do renunciante à tradição, isto é, produz essa nova figura humana chamada indivíduo, que se compreende como sendo único, por si mesmo, marcado pelos ideais da igualdade, liberdade e fraternidade.

O modo de subjetivação pré-moderno, regulado pela tradição que determina lugares relativamente fixos de assujeitamento, expresso na noção medieval de pessoa, é progressivamente substituído pelo advento de meros indivíduos. Ora, a condição de meros indivíduos, assim como a homogeneização do espaço e do tempo na ciência moderna, produz uma nova problemática relativa ao modo de diferenciação e singularização de um grupo e de um indivíduo 8.

Enquanto na sociedade ré-moderna a subjetivação se fazia pela personalização, como pertença a uma coletividade que oferecia um nome, um título e um lugar social preestabelecidos e regulados pelos ideais de reproduzir a tradição, na modernidade se realiza o ideal de independência pelo surgimento de uma massa anônima. O individualismo, como expressão dos ideais revolucionários, só pode se firmar enquanto opera o recalcamento da tradição fundante.

Contudo, como é possível sustentar a tese freudiana do determinismo psíquico? A contribuição mais surpreendente na tematização do ideal de autonomia na modernidade é aquela de que cada um é responsável pelo que se passa consigo, mesmo pelas conseqüências cujas determinações lhe escapam. A partir da formulação freudiana sobre o narcisismo (Freud, 1914/1976), a constituição do sujeito é determinada pelos ideais dos pais, que se apresentam como um imperativo. Em termos culturais, os ideais da modernidade se expressam no imperativo que cai sobre o sujeito: "seja livre". Esse é um absoluto impasse, pois realizá-lo é reconhecer-se não livre, e ser livre é não segui-lo, o que resulta em negar a própria liberdade. Resta para o sujeito apenas a saída pelo recalcamento da tradição que o funda, buscando um caminho de auto-fundação subjetiva 9. Dado que a condição de meros indivíduos é insustentável e insuportável, na modernidade vamos encontrar diferentes estratégias para tentar resolver tal impasse.

A mais abrangente estratégia moderna de subjetivação se faz pela auto-fundação do sujeito epistêmico, formulada por Descartes através do cogito. É o paradigma da representação, onde um ente somente é fundado como objeto de uma representação, e assim podendo ser submetido ao cálculo e produzido tecnicamente por um sujeito que ocupa o lugar de fundamento epistemológico, ético e ontológico.

Esse modo de fundamentação próprio da modernidade foi apontado e dissecado por Heidegger (1927/1967; 1946/1976), que mostra que a entificação do ser se dá pela afirmação da subjetividade como sendo o fundamento último, como sujeito pleno, reflexivo, auto-centrado, unificado e autônomo. Com o advento da supremacia do sujeito epistêmico, as crenças e verdades devem ser fundadas na certeza subjetiva alcançada pelo exercício da razão e não mais a partir da autoridade e da tradição. Como sujeito ético, as regras de ação passam a se originar no próprio âmbito das escolhas do sujeito, por intermédio da discussão e argumentação da comunidade dos iguais, descartando-se os padrões tradicionais. O estatuto ontológico da realidade se constitui então a partir da representação que o sujeito faz das coisas, mediante idéias claras e distintas.

O fundamento último de tudo passa a ser o sujeito epistêmico, não apenas como empírico, mas como razão que se realiza na história. Autoconsciência e autodeterminação são os traços específicos do sujeito moderno como razão que se submete ao próprio tribunal da razão. A razão é guia de si mesma. Em outras palavras, é o ideal de construir uma sociedade melhor do que as anteriores a partir da ciência como saber que pretende alcançar a plenitude.

Podemos ver que na Filosofia Moderna se perseguem formulações adequadas desse fundamento último como sujeito da ciência: desde o cogito cartesiano, passando pelo princípio da razão suficiente de Leibniz, pelo sujeito transcendental que acompanha todas as representações em Kant, pelo eu puro de Fichte, pelo saber absoluto onde se encontram a certeza e a verdade em Hegel, até alcançar o para-si sartreano como liberdade que nadifica o que se lhe opõe. Contudo, mesmo que a busca de sustentação do sujeito moderno pela expansão da esfera privada10, através do fomento da interioridade como lugar de fortalecimento subjetivo, tenha contribuído para a identificação do sujeito, a via da autoconsciência e autodeterminação se mostrou insuficiente. A solução apresentada pela construção do sujeito epistêmico não dá conta da problemática em jogo.

A grande crítica ao projeto da sustentação subjetiva por intermédio do sujeito epistêmico11 aparece no seio do movimento literário que é o romantismo, especialmente o tardio, que é muito desesperado. Neste se realiza uma radical crítica do ideal da razão como fundamento e fonte de soluções, denunciando que o projeto da modernidade, calcado na razão soberana, resulta num fracasso. É uma violenta crítica à razão moderna e ao mesmo tempo outra proposta para a sustentação subjetiva. Ela é buscada no abissal, nesse abismo de desespero, ali onde o sujeito possa em algum lugar se agarrar e então produzir algo 12.

Isso se formula no final do Século XlX, quando o chamado mal do século exprime todo o desespero diante das promessas da ciência. Para o romantismo, que conserva a tese central da modernidade da autofundação subjetiva, os sujeitos são fundantes de um mundo não pela razão calculadora e representacional, mas como expressivos de uma natureza interior profunda.

O traço que importa ressaltar na tradição do romantismo é a implicação do próprio sujeito em sua questão, diferentemente do sujeito epistêmico, que se põe numa distância imposta pela disciplina científica. É no seio do romantismo que nasce a psicanálise, ligada às produções do romantismo tardio. Então, ao lado da sustentação subjetiva através do sujeito epistêmico, emerge isso que Lacan denomina, com todas as diferenças que se interpõem, o sujeito do desejo.

O sujeito epistêmico encontra sua sustentação na construção de um saber, que advém do processo de tomada de consciência sobre si mesmo, reflexividade autocentrada. Esse é o tema central na dialética hegeliana da consciência de si que pode alcançar a síntese do eu e do nós no espírito como cultura, no qual o eu é o nós e o nós contém o eu elevado à universalidade da cultura, o espírito de uma época.

Em contrapartida, o sujeito da psicanálise (desejante) se estrutura a partir do que lhe falta e da falta que se situa excêntrica a si mesmo. E sobre o que lhe falta não há saber que dê conta, de modo que o desejo aponta sempre para a insuficiência do saber. Contudo, a recusa desse saber, mesmo que insuficiente, recai no irracionalismo e no obscurantismo, situados no romantismo tardio.

A descoberta de Freud gira em torno de uma coisa aparentemente tão banal, mas tão única, pois ali onde a sustentação subjetiva fraqueja, resulta numa implicação. O sujeito desejante é a interrogação sobre o que lhe falta, e nisso é um intervalo, uma brecha na existência. Dessa forma, ele pode ser apontado como algo que pode acontecer no todo de uma cultura ou numa biografia, e em cada caso sempre como algo singular (cf. Fleig, 1996; 1997a). Somente ao não reduzir o sujeito nem à pessoa, nem ao sujeito epistêmico, nem a mero indivíduo, é possível suportar que na existência ocorra um rompimento como emergência de sujeito, como um acontecimento ao qual se possa ser fiel (cf. as formulações de Badiou, 1988; 1992; 1994). Ao tropeçar brutalmente numa palavra, como num ato falho, o desconcerto demonstra que aí aconteceu sujeito.

O impasse do sujeito na modernidade fica mais claro a partir do texto da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, no qual os ideais da revolução aparecem na figura do direito do cidadão, como uma nova posição a respeito do usufruto.

Segundo a Declaração dos direitos do homem e do cidadão (citado por Vecchio, 1968), votada pela Convenção Nacional em 23 de junho de 1793, as únicas causas das desgraças do mundo são o esquecimento e o desprezo dos direitos naturais do homem. Com isso fica demarcado que a pretensão da declaração dos direitos do homem e do cidadão tem como finalidade pôr fim à infelicidade humana. O primeiro passo de tal empreendimento é, segundo o "Art. 1o. - A meta da sociedade é a felicidade comum. O governo é instituído para garantir ao homem o gozo de seus direitos naturais e imprescritíveis." Esta garantia fundamental para a consecução do gozo dos direitos de cada um é complementada no "Art. 23 - A garantia social consiste na ação de todos para assegurar a cada um o gozo e a conservação de seus direitos: esta garantia repousa sobre a soberania nacional." (p. 236).

Na afirmação dos ideais revolucionários da consecução da "felicidade comum" através do acesso ao "gozo de seus direitos naturais e imprescritíveis", garantidos pelo governo, encontra-se a perspectiva implícita do irrestrito direito ao gozo que diz respeito a cada um. Esta suposição passa a reordenar os ideais da cultura moderna, situando o sujeito na posição de reivindicante. Tomado na suposição de um direito ao gozo prometido pelo gozo do direito, passa a exigir-se e exigir do social o gozo que lhe cabe na vida, e ainda por acréscimo, um gozo suposto e almejado sem falhas. O ideal máximo então é: realizar neste mundo aquilo que anteriormente era apenas um promessa para a vida eterna.

A afirmação generalizada do direito ao gozo determina conseqüências subjetivas e culturais de amplo alcance. Essas conseqüências podem ser vistas no modo como podem ser respondidas perguntas referenciais. Numa cultura, com predomínio de traços tradicionais, encontram-se as clássicas perguntas e respostas, por exemplo, no catecismo cristão: "Quem somos nós? Somos filhos de Deus. Para que existimos? Para amar e servir a Deus sobre todas as coisas e amar o próximo como a si mesmo", etc. Essa singela formulação permitia situar o sujeito num lugar social e definir o tipo de gozo que lhe dizia respeito, delimitando-lhe que o gozo pleno apenas poderia ser suposto na divindade e, para o próprio sujeito, na outra vida. Portanto, de acordo com essa formulação, se algum gozo existe, esse é o da divindade. "Para que nós existimos? Para fazer o senhor gozar, para a glória de Deus. O que é a glória de Deus? Glória de Deus é o seu próprio gozo. Nós existimos para fazer Deus gozar." Ora, esse é o ideal da posição de escravo.

Numa sociedade hierárquica, ser escravo é um sonho partilhado, pois quanto mais esse trabalha, mais faz o gozo do senhor e mais feliz pode ficar. Ora, quando essa dialética é alterada, modifica-se também o conceito de felicidade e dos ideais da vida. O que está em questão é o gozo, o tipo de gozo e a quem compete.

No modelo antigo, o gozo pleno era de Deus, enquanto que a Revolução Francesa propõe o gozo a partir de cada um e no presente. Desse modo, o projeto da modernidade é fazer o reino dos céus aqui e agora, na suposição de que cada um tem o direito de ter o gozo que lhe diz respeito. Um sujeito que supõe não ter alcançado o gozo pleno, pode dizer: "Minha vida é insuportável! Não pode ser assim!" Entretanto, se nas mesmas circunstâncias aí se encontra tomado no modelo antigo, sua fala se dirige à resignação e à espera da recompensa após a morte: "Eu estou sofrendo, mas isso faz sentido, porque assim irei alcançar a vida eterna."

Contudo, os ideais da modernidade e suas realizações não impedem que novas formas de escravidão apareçam. O escravo antigo estava submetido ao senhor, enquanto que o moderno é escravo do delírio de liberdade e autonomia. Pode ser observado na supremacia do individualismo, como desligamento das tradições e dos compromissos, que encobre o comando do senhor absoluto, que é o objeto a ser consumido, na forma da suposição do gozo prometido e sem falha. O crescente submetimento ao objeto e a prevalência desse como valor determinante do social e da economia subjetiva é patente na atualidade.

É possível considerar então que um dos impasses nodais da modernidade seja a busca da sanção simbólica que legitimaria ao sujeito ocupar o lugar de gozo que lhe diga respeito. Contudo, diferentemente de uma cultura tradicional, essa garantia oferecida pela sanção simbólica se encontra esfacelada, na multiplicação dos sistemas de crenças e representações, coexistindo até mesmo dentro de um grupo familiar. Em decorrência dessa elasticidade do simbólico, como registro da pertença, a definição do lugar de gozo a ser ocupado por cada um no tecido cultural fica jogada num impasse. O sujeito pode se colar às imagens veiculadas pelos ideais de gozo suposto e sem falha, na forma do consumo do objeto circulante, ou se eternizar na indefinição do lugar de gozo.

Isto caracteriza precisamente o impasse subjetivo denominado adolescência. Como ocupar um lugar de gozo? O que sanciona o exercício efetivo do sujeito?

A ambigüidade da sanção simbólica resulta na formação da culpa por seu ato ou na tentativa de se fazer reconhecer pela punição do Outro. A modernidade apresenta uma solução substitutiva para o insuportável da falta constituinte através do sintoma social da adolescência. A não garantia do lado do Outro, como lugar da operação da sanção simbólica, é o grande problema da instauração do lugar subjetivo habitável. Logo, as soluções próprias dessa cultura se estruturam como sintomáticas.

O advento da modernidade, em decorrência de três grandes revoluções - revolução científica (teoria do campo unificado), a revolução industrial (razão aplicada aos processos de produção em série) e as revoluções sociais (promessa de um gozo sem falhas no interior de uma nova sociedade) - se funda na busca de soluções para a problemática oriunda da passagem do modelo de sociedade tradicional.

Isso implica no deslocamento da primazia do relacional, próprio do laço social nas sociedades tradicionais, para a prevalência do objeto. Na organização de novas formas de laço social, não mais calcado na tradição (hierarquia, holismo, prevalência do laço de parentesco), mas no amor (receber a imagem do semelhante), no controle impessoal e anônimo e na instrumentalização do semelhante.

Segundo Arendt (1969), o declínio do poder permite o avanço da violência, e a violência, como se mostra no cotidiano, é uma das faces do sintoma social de nossa cultura. Esse fenômeno se oferece como mostração da coisa em putrefação, da coisa não ligada, não simbolizada. E no cotidiano, é a tentativa fracassada de constituir um ato, isto é, inscrever a coisa através de seu assassinato como duplo corte, que de um lado fica o resto da perda (objeto causa do desejo) e de outro lado o intervalo entre as marcas desta operação, o sujeito desejante (Jerusalinsky, 1993).

A burocratização, como incremento da "constante paranóica" (Melman, 1994) no laço social - dado que nesse a mola central é sempre o dispositivo do controle do semelhante - não se dá sem a crescente instrumentalização do sujeito, tomado prevalentemente no laço social não como alguém capaz de responder pelo seu ato e por sua palavra, mas como um objeto a ser ofertado para o gozo do Outro.

Arendt (1969) também faz tal aproximação, é inversamente proporcional. Quanto maior a diminuição do exercício da força legítima, portanto, do poder, maior a probabilidade de irrupção do exercício da força não legítima, isto é, da violência.

O decréscimo do poder pela carência da capacidade de agir em conjunto é um convite à violência. A violência multiplica, com os instrumentos que a tecnologia fornece de maneira cada vez mais sofisticada e eficaz, o vigor individual. Assim, a forma extrema da violência é a violência de um contra todos. O que surge do cano de uma arma não é poder, mas a sua negação.

Para Arendt (1969), a glorificação contemporânea da violência não é mais do que a expressão da atitude técnica em relação à política, nascida com Platão e renovada na era moderna pela certeza de que só podemos conhecer aquilo que nós mesmos fizemos, assentada na compreensão do homem como homo faber, cerne do contratualismo moderno 13.

Recorrendo à distinção introduzida por Lacan (1986) entre a primeira morte - aquela que atinge o suporte biológico - e a segunda morte, como apagamento do próprio sujeito, pode-se ver que o que está em jogo de forma decisiva na violência em nossa cultura é a destruição que possa alcançar o sujeito para além da putrefação. Ora, essa violência se faz presente de forma crescente ali onde o sujeito moderno se vê tomado num laço social instrumentalizado, caracterizando a perversão como uma patologia social 14.

O deslocamento do ideal de gozo que se apresenta na modernidade pode, por outro lado, ser considerado a partir da antropologia dos valores, segundo Dumont (1983). Nessa perspectiva, uma sociedade não pode ser caracterizada e descrita sem que se definam os valores que ali são priorizados. Sua tese central sobre a cultura ocidental é que o valor prevalente nessa é o individualismo. Seguindo o método comparativo, Dumont (1966 e 1983) opõe a cultura ocidental, centrada na primazia do indivíduo como valor social, às demais culturas, ditas tradicionais, que caracterizam o grupo como valor social.

O valor prevalente é aquilo que tem a dimensão do sagrado, e numa sociedade tradicional este valor é o grupo. Contudo, isto varia de acordo com cada formação cultural, assim como em cada uma organizam-se estratégias para preservá-los.

Por exemplo, as estratégias na modernidade diante da morte e o advento da criança como dotada de valor, são dois temas tratados exemplarmente por Ariès (1960), que nos mostra a invenção da infância na modernidade e as mudanças diante da morte.

Partindo do problema da manutenção do valor prevalente na cultura e sendo o indivíduo o próprio valor social prevalente, quais as estratégias que se organizam para preservá-lo?

Ao considerar que o desaparecimento de cada indivíduo coincide com o desaparecimento do valor prevalente, as estratégias buscam preservar que algo de cada indivíduo perdure para além da morte. Sobreviver à morte através dos filhos, das obras, da autoria na invenção, da imortalização do nome próprio, são alguns dos expedientes.

A morte implica no risco extremo do desaparecimento do valor prevalente, enquanto que numa sociedade tradicional a morte não põe necessariamente em risco o valor prevalente. Pelo contrário, pode acontecer que a morte do indivíduo seja o que vai propiciar que o valor prevalente fique preservado, no caso em que essa permita a sobrevivência do grupo.

Como a modernidade é uma invenção sem par, ela se apresenta como uma aventura, no sentido de que não tem termos de comparação e assim não há uma referência que diga algo sobre o seu destino. Não é possível saber se a modernidade é uma invenção cultural que dará as condições de viabilidade social e subjetiva adequadas ou conduzirá à catástrofe.

Sendo assim, morrer passa a ser algo que causa extremo horror para o sujeito moderno e sobreviver a qualquer custo se torna a preocupação prevalente. Preservar a imagem de si mesmo até alcançar a imortalidade é uma meta generalizada. Essas formas fazem parte, dentro de um âmbito mais geral, das estratégias para preservar o valor dos bens, que vai da vida ao objeto de consumo.

Conseqüentemente, um traço que distingue a atual cultura de todas as outras é o de ser dominada pela prevalência dos objetos. A suposição que aí aparece é que através do objeto o valor será preservado e será alcançado o gozo que a relação com o semelhante não fornece.

Além disso, podem ser consideradas duas incidências da prevalência do objeto: de um lado, a raiz subjetiva do advento da economia de mercado e do acúmulo de capital. O capital é a busca de uma garantia subjetiva de se fazer reconhecer como dotado de valor e preservação desse. Entretanto, a constatação cotidiana é que isso não diminui a angústia, dado que os bens acumulados, consumidos e/ou destruídos não alcançam produzir a garantia suficiente de que o valor prevalente esteja a salvo. Por outro lado, a insuficiência da sustentação subjetiva que tenta se resolver pelo acúmulo de bens, necessita se ancorar no sujeito epistêmico. É perfeitamente compreensível que para alguém poder juntar dinheiro, tenha que ter muita esperteza ou muita inteligência. É uma espécie de efeito do sujeito epistêmico e de outro lado da prevalência do objeto, como um artefato para oferecer um gozo sem falhas. A forma de gozo na interação com o semelhante se apresenta sempre como muito precária. Frente a essa decepção é que são produzidos os artefatos ligados diretamente ao afã de acúmulo de bens. Desse modo, a sociedade de consumo é a expressão ou efeito oriundo de dentro do próprio capitalismo.

O projeto da modernidade é possível graças às diferentes revoluções que o fazem acontecer: sociais, científicas, tecnológicas e industriais.

A revolução industrial, possibilitada pelas revoluções científicas/tecnológicas subjacentes, que ocorreram no Século XIX, está centrada na descoberta dos meios de produção de objetos em série, determinando o progressivo desaparecimento da produção de bens de forma artesanal. Nesta perspectiva, a cultura toda se organiza para produzir objetos em abundância, especialmente pela descoberta do domínio da força, inicialmente através da máquina a vapor e, posteriormente por outras modalidades de utilização de fontes de energia que não o braço humano ou a força animal.

Atualmente, estamos na segunda ou terceira revolução, dependendo de como se a considera e que se centra em três pontos: a revolução da energia atômica, da informática e da biologia.

A energia atômica implica a produção de fontes de energia quase ilimitadas. A revolução na informática potencializa as possibilidades de produção, acúmulo e circulação de informações através dos circuitos integrados. Possibilita o advento da era do instantâneo, encurtando o intervalo entre o ato e o objeto e assim criando a suposição da produçã de um mundo virtual capaz de preencher o que marca a existência humana 15. A revolução biológica ocorre no âmbito da microbiologia, tendo sua expressão maior no projeto do mapeamento completo do genoma humano. Através dos avanços possíveis neste campo, descortina-se a interligação entre a informática e o código genético. Isto implica o advento crescente de possibilidades de intervenção e controle no suporte biológico dos seres humanos.

A partir do desenvolvido até aqui, é possível determinar com mais clareza as conseqüências do deslocamento do valor prevalente na cultura, especialmente o surgimento de outras formas de gozo determinadas a partir da veiculação de uma promessa de gozo sem falhas.

Aquilo que era prometido para depois, a modernidade exige que se dê o mais rápido possível. Na observação da crescente produção do objeto, sempre mais próximo e mais adequado ao gozo sem falhas, aí se encontra uma promessa e a crença na existência daquilo que possa preencher perfeitamente a falta que constitui o desejo. É a cultura do instantâneo, seja através da imagem, da comunicação, ou do café instantâneo. Esses são os efeitos, no cotidiano, da terceira revolução científico-tecnológica.

Neste contexto se delineiam os contornos do sintoma social próprio da modernidade. O sintoma social (Melman, 1992) se inscreve no discurso dominante de uma sociedade e numa época determinada, como solução veiculada para os impasses desta sociedade. A busca de um objeto que supostamente venha realizar a promessa de um gozo sem falhas caracteriza o núcleo do sintoma social da cultura ocidental moderna. Deste modo, a prevalência do objeto, a alocação do valor no indivíduo e a promessa de um gozo sem falhas a ser efetivado sempre imediatamente, constituem este núcleo organizador das várias manifestações do sintoma social na modernidade.

A indústria moderna se aprimora na produção do objeto, a cada vez prometido como sendo o mais apto a produzir o gozo almejado, substituindo os antecedentes deixados então na obsolência precoce e programada. A gama de objetos prontos para serem consumidos é vasta. Não se trata de fazer uma classificação dos mesmos, mas apenas observar seus efeitos na determinação da posição do sujeito, que fica situado no lugar de um reivindicante do direito ao gozo prometido sem falhas. Ali onde emerge a insatisfação, pela veiculação da falta de algo, desencadeia-se a busca desse algo que venha preencher e acalmar o insuportável vazio. Esse insuportável corresponde ao que Freud (1930[1929]/1976) já apontou como sendo a verdade da civilização: o mal-estar. Todas as tentativas vão na direção de remediar tal mal-estar, sendo que a forma dominante se dá através da busca de um objeto que produza a felicidade almejada. Nesta perspectiva, pode-se dizer que a toxicomania é um sintoma social, na medida em que determina uma posição subjetiva prevalente em nossa cultura, da qual ninguém que participa da mesma pode se dizer isento. O que sofre variações, que não são sem valor, são os tipos e formas de consumo do objeto.

Descrevendo os tipos e formas de consumo do objeto, Melman (1992) delimita três modalidades do sintoma social moderno: a toxicomania propriamente dita, o alcoolismo e a delinqüência. As substâncias tóxicas "pesadas" produzem um estado de gozo indescritível e induzem o sujeito a abandonar o gozo fálico e a rumar para os domínios do gozo Outro (cf. Lacan, 1975), fora da linguagem e implicando cada vez mais o Real do corpo, ofertado para fazer este Outro ilimitado gozar. As substâncias mais "leves" e socialmente permitidas como o álcool, produzem um gozo limitado, mas que ao mesmo tempo anestesiam a infelicidade cotidiana. E o objeto a ser capturado na forma do rapto, ou ainda na forma da destruição e depredação (cf. Jerusalinsky, 1998), determina o gozo delinqüente.

O sujeito que faz a experiência de gozo através de uma substância tóxica, entrando no que Lacan (1975) conceituou como gozo Outro e foi transposto por Melman (1992) para a elucidação da estrutura do sintoma social de nossa cultura, sofre um alteração subjetiva marcante. O gozo Outro, que se situa além do gozo sexual (sempre marcado pela sua interrupção no exato momento de sua plenitude e por isso mesmo sendo sempre um gozo insuficiente, faltoso, precário, fálico), e igualmente fora da linguagem (ou do Simbólico, marcado pela castração, pela falta constituinte, pelos limite da lei e da proibição), implicando a oferta do corpo (enquanto que o gozo fálico se dá sempre deixando fora o Real do corpo), possibilita ao sujeito realizar algo que escapa ao dizível. Podemos abordar isto metaforicamente: é como se o sujeito realizasse o ideal mais alto - por exemplo, experimentar o gozo eterno no céu, e depois voltar para este "vale de lágrimas". Um dos efeitos mais surpreendentes é a derrocada moral, na qual a normatividade social quase que desaparece para o sujeito. Ora, uma norma tem caráter vinculante para alguém na medida em que esse se encontra referido por ideais como dotados de alto valor. Ora, se alguém já alcançou tais ideais, eles deixam de ter força vinculante e as normas sociais perdem toda sua força. É o que se observa na posição corrente do toxicômano submetido ao comando do objeto na forma de uma substância que lhe produz um estado de plenitude sem comparação. Para poder reiterar este estado de gozo, até alcançar o gozo Outro sem retorno - é a overdose - o sujeito tende a romper a normatividade relativa ao laço social vigente. Esse rompimento, como dissolução do caráter vinculante da lei, põe em risco a viabilidade do tecido social e nisto a própria viabilidade subjetiva de cada um. O sintoma social de nossa cultura se propõe como solução para os impasses do gozo e do mal-estar da civilização pela promessa do preenchimento da falta, através do encontro do objeto adequado ao gozo. Mas tal solução substitutiva produz um impasse específico: a realização do gozo buscado tende a coincidir com a efetivação da morte. A lei e o campo do objeto proibido, mesmo produzindo o mal-estar oriundo da suspensão do objeto adequado, protege a cada um do encontro direto com a morte, fazendo o seu contorno no campo limitado da linguagem. Este é o efeito da castração, operação da falta simbólica que permite a estruturação de um laço social viável.

Contudo, cada sujeito constituído na modernidade é suscetível a ser tomado na busca de consumir o objeto e aí alcançar um gozo que imagina sem falhas. Lacan (1938/1984) percebeu muito cedo, através de Freud, que o problema do homem na nossa cultura estava ligado ao que ele denominou de "declínio da imago paterna". O "declínio da imago paterna" significa o declínio da autoridade como instância que opera a regra e a lei 16. De certa forma, a aposta que Freud faz, e Lacan o segue nisso, é a aposta na operação dessa regra como função simbólica. Freud a denominou de castração. A castração ocorre pela operação da falta simbólica, constituindo sujeito desejante, ou seja, efeito de inscrição da falta. Contudo, a nossa cultura veicula uma promessa de que seria possível passar por cima dessa falta. Nessa perspectiva, a psicanálise aponta para algo central na sociedade tradicional: apostar no valor da regra. Por isso, se alguém diz que a psicanálise está ultrapassada, desse ponto de vista, está perfeitamente correto. Na sua prática, ela não adere perfeitamente a essa promessa de gozo, não por ser contra esse, mas por afirmar que a sustentação humana se dá através da apropriação ou subjetivação da interrogação acerca do desejo e não pela melhoria ou fomento de uma promessa de gozo.

Para concluir esta análise preliminar, observamos que os impasses sociais de nossa cultura, que recobrem impasses subjetivos, nos indicam os limites extremos da alma. A descrição desses confins do sujeito moderno, como bordas que fazem limites com aquilo que não se deixa inscrever e nem por isso cessa de nos acossar, articulam a metapsicologia do sujeito moderno.

 

 

1 Texto apresentado no Grupo de Trabalho "Pesquisa em Psicanálise". VII Simpósio de Pesquisa e Intercâmbio Científico da ANPEPP, Gramado, maio de 1998.

2 Endereço para correspondência: Rua Duque de Caxias, 1304/602 - 90010-281 - Porto Alegre, RS. Fone/Fax (51) 226.1661. E-mail: mfleig@bage.unisinos.br

3 A relação da clínica psicanalítica e sua correspondente teorização como metapsicologia e as determinações histórico-culturais da subjetividade não podem ser tomadas numa única direção. Souza (1998) alerta para os limites e perigos de uma redução da metapsicologia às condições contemporâneas de subjetivação, dissolvendo-se a psicanálise num engajamento ético por ideais sublimatórios.

4 Não podemos ignorar que o conceito de modernidade está envolto por densa ambigüidade, não havendo univocidade na sua delimitação. É um conceito que surge no Século XII, e a partir daí ganha delimitação sempre relativa à problemática de cada época. Assim, o que se entende por moderno e modernidade num século não coincide com o que se entende em outro. Aqui, nos restringimos a uma conceituação de modernidade que não pretende dar conta da polissemia do termo, ainda que possamos situar sua raiz na palavra modus, de onde vem moda, modalidade. A modernidade carrega consigo esse traço que implica a passagem da concepção ontológica, que busca o ser eterno e duradouro dos entes e o como algo se dá, isto é, o ser é o modo ou a modalidade de algo.

5 Claro que os revolucionários ainda têm muitas incongruências do ponto de vista da formulação como podemos ver, por exemplo, na famosa declaração dos direitos universais, cujo título é Declaração dos Direitos Universais do Homem e do Cidadão. Neste título já aparece declarada a ambigüidade, pois quando fala do homem está falando do ser natural e quando fala do cidadão, fala do sujeito social. Quando fala do homem como sujeito natural está aí reintroduzindo todo o jus naturale como se tivesse um direito natural, alguma coisa dada desde sempre. O que a sociedade tradicional sempre fez foi dizer que é assim porque é um direito natural. Eles introduzem, novamente, aquilo que eles estavam criticando, mas são pequenos detalhes que não tiram a importância do grande movimento que é derrubar um princípio substituindo-o por outro. Veja as análise das formulações dos direitos na Revolução Francesa em Vecchio (1968).

6 Acerca da noção de invenção da liberdade e seus efeitos na modernidade tivemos longas discussões com a psicanalista Conceição Beltrão, que nos apresentou o maravilhoso texto de Starobinski (1964), e nos permitiu avançar na compreensão da transformação e importância dos objetos, tanto na forma do luxo e do consumo quanto na obra de arte, e assim articular a posição do trabalho em relação à liberdade.

7 Souza (1994) aborda as duas modalidades de lidar com o estrangeiro - o exotismo e o racismo - e suas repercussões nas identificações que marcam o problema da identidade nacional brasileira.

8 Remetemos para a obra de Giddens (1990), que elabora a questão da homogeneização do espaço e do tempo na modernidade.

9 Posição desenvolvida por Calligaris (1986; 1992; 1993; 1996), que apresenta os elementos básicos para se compreender o que seja o império da imagem em nossa cultura, onde a busca de sustentação subjetiva se faz em grande medida pelo recurso a estereótipos narcísicos. Devemos igualmente a Calligaris a sugestão de elaboração de uma metapsicologia do sujeito moderno, submetido ao imperativo de sair de casa (abandonar a tradição que o funda), referido num tempo e espaço sem centro fixo e submetido ao comando dos objetos.

10 Veja a magnífica história da vida privada de Ariès e Duby (1985-1987)

11 Veja a pertinente e translúcida análise realizada por Figueiredo (1995), discutindo os impasses produzidos pela condição de meros indivíduos, resultado da expansão da modernidade e do progressivo abandono do recurso do lugar de ‘pessoa’. As duas grandes tentativas aparecem na fundação subjetiva através do sujeito epistêmico e através do sujeito desejante, onde se situa o aparecimento da psicanálise.

12 A busca do profundo, do último reduto da alma, onde estaria o grão do singular e do inefável, aquele algo absolutamente verdadeiro e fonte da criação imaginativa, abrirá uma via de aproximação do sujeito moderno desesperado com as múltiplas formas de esoterismo e obscurantismo. Podemos situar neste quadro o pano de fundo de uma das insuperáveis diferenças entre Freud e Jung: Jung nunca abandonou sua fascinação pelo profundo, como traço essencial do romantismo tardio, ou seja, sempre foi um partidário do inconsciente romântico. Freud, por sua vez, introduz um conceito de inconsciente que não se reduz a uma não-consciência como vontade obscura e primordial, mas como da ordem do não-realizado, como uma funda, uma ruptura, um umbigo. Não se trata, para Freud, do não-conceito/não-consciência, mas do conceito da falta.

13 A análise da técnica como um destino possível que engaja o homem na ocultação do âmbito da verdade, pondo em perigo não apenas o ser do homem mas também as possibilidades de desvelamento da verdade é feita por Heidegger (1946/1976). Vemos que Arendt é tributária desta posição de Heidegger. Para uma discussão acerca da defesa de uma ética contratualista, veja Tugendhat (1993).

14 Considerar a perversão como uma patologia do laço social e não como uma patologia sexual, como classicamente era conceituada, é a tese fundamental defendida por Calligaris (1986).

15 Tema desenvolvido por Jerusalinsky (1993), tratando das relações entre a lógica operatória dominante em nossa cultura e o sintoma social, especialmente em sua expressão através da corrupção.

16 Freud nos mostra a importância do lugar paterno como fundador da cultura. Quais os destinos de um pai? É a grande interrogação que nos deixa Lacan. Sobre essa questão, veja Fleig (1998a).

 

 

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Recebido em 30.04.99
Revisado em 30.05.99
Aceito em 15.06.99

 

 

Sobre o autor:

Mario Fleig é psicanalista, analista membro da Associação Psicanalítica de Porto Alegre, membro da Association Freudienne International, doutor em Filosofia pela PUCRS, professor na UNISINOS, organizador de "Psicanálise e sintoma social" e "Psicanálise e sintoma social - livro 2"; colaborador nos livros "Filosofia e Psicanálise" e "Psicanálise e Colonização".