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Food Science and Technology (Campinas) - Evaluation of cv. Isabel to elaborate red table wine

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Food Science and Technology (Campinas)

On-line version ISSN 1678-457X

Ciênc. Tecnol. Aliment. vol.20 n.1 Campinas Apr. 2000

http://dx.doi.org/10.1590/S0101-20612000000100022 

Avaliação da uva cv. Isabel para a elaboração de vinho tinto1

 

Luiz Antenor RIZZON2,*, Alberto MIELE3, Júlio MENEGUZZO4

 

 


RESUMO

A uva Isabel, originária do Sul dos Estados Unidos, é uma das principais cultivares de Vitis labrusca. Atualmente é a cultivar mais difundida na Serra Gaúcha, representando aproximadamente 45% de toda a uva produzida nessa região. Além da elaboração de vinho tinto comum, a Isabel é utilizada para elaboração de vinho rosado e suco e comercializada como uva de mesa. O objetivo do presente trabalho foi determinar as características agronômicas e enológicas da uva Isabel, para elaboração de vinho tinto comum. Para isso, avaliou-se a maturação da uva e realizaram-se estudos para caracterizar o cacho, o mosto e o vinho tinto, nas safras de 1988 a 1994. Os resultados obtidos evidenciaram que a uva Isabel tem cacho pequeno, solto, formado por bagas e sementes grandes. O mosto apresenta cor rosada pouco intensa, tem bom teor de açúcar e baixo nível de ácido málico e acidez total. O vinho tem cor vermelha viva; o aroma é intenso e com acentuada tipicidade varietal; a análise sensorial evidencia que geralmente falta ao vinho equilíbrio e maciez.

Palavras-chave: enologia; uva Isabel; vinho tinto; Vitis labrusca.


SUMMARY

Evaluation of cv. Isabel to elaborate red table wine. Isabella grape, originated from the South of the United States, is one of the most important varieties of Vitis labrusca. Today it is the most diffused variety in the Serra Gaúcha, the southern viticultural region of Brazil, where it represents near 45% of the total production. Isabella grape is used to make red table wine and juice and it is commercialized as table grape too. Due to its importance, this work was carried out from 1988 to 1994 to study grape maturation, cluster characteristic, must composition and chemical and sensory attributes of its red table wine. The results showed that Isabella grapes had small and loose clusters, with large berries and seeds. The must showed a light pink color, good level of sugar, low malic acid and low titratable acidity. The wine has an attractive red color; the aroma is intense and shows a good varietal characteristic; finally, sensory analysis shows the wine needs a better balance and softness.

Keywords: enology; Isabella grape; Vitis labrusca; red wine.


 

 

1 – INTRODUÇÃO

A uva Isabel é uma das principais cultivares de Vitis labrusca, espécie originária do Sul dos Estados Unidos e de onde foi difundida para outras regiões. Na década de 1850 despertou interesse dos viticultores europeus devido à resistência ao oídio, doença que naquela época causava enorme prejuízo à viticultura mundial.

Foi introduzida no Rio Grande do Sul entre 1839 e 1842 por Thomas Maister, através da Ilha dos Marinheiros [24]. Na Serra Gaúcha são cultivados 8.979ha, que representam aproximadamente 45% de toda a uva produzida nessa região [5].

Bento Gonçalves é o município que tem a maior área plantada com essa cultivar, seguido por Flores da Cunha, Caxias do Sul, Garibaldi, Farroupilha, Nova Pádua, Antônio Prado e São Marcos. A quantidade de uva Isabel vinificada na Serra Gaúcha variou de 261.312t na safra de 1985 a 132.328t na de 1991 [14]. Os principais destinos da uva Isabel na Serra Gaúcha são a produção de vinho tinto comum e o suco de uva.

A grande expansão da cv. Isabel na Serra Gaúcha deveu-se à sua adaptação na região. A maior longevidade observada nos vinhedos de Isabel é atribuída à tolerância ao Fusarium oxysporum f. sp. herbemontis, agente causal da fusariose, doença vascular que causa a morte da videira [11, 23], e à filoxera.

Entre as pesquisas efetuadas com a uva Isabel na Serra Gaúcha, destacam-se aquelas referentes ao efeito da desbrota na produtividade e na qualidade da uva [17] e da ação de bioestimulantes na produção da uva e na qualidade do mosto [16, 25].

O efeito da maturação da uva na composição e na qualidade do suco de uva foi estudado por ZANUZ [27] e IDE et al. [13], que avaliaram a influência do tempo de maceração na composição do vinho Isabel. Mesmo que esse vinho seja questionado devido ao aroma e gosto foxados que apresenta, deve-se considerar que foi com ele que muitos consumidores adquiriram o hábito do consumo de vinho e que ainda é o mais consumido no país.

Devido à importância socioeconômica da uva Isabel na Serra Gaúcha, realizou-se o presente trabalho para avaliar suas características agronômicas e enológicas para elaboração de vinho tinto comum.

 

2 – MATERIAL E MÉTODOS

O trabalho foi realizado na Embrapa Uva e Vinho, localizada em Bento Gonçalves, RS, nas safras de 1988 a 1994. Utilizaram-se dez plantas previamente marcadas em um vinhedo da cv. Isabel, formado de pé franco em 1970 e conduzido no sistema de latada, num espaçamento de 2,0m entre plantas e 3,0m entre fileiras. O sistema de poda seca adotado foi o de cordão esporonado. Por ocasião da formação do cacho, foi feita a poda verde que consistiu na retirada de folhas e brotos.

O acompanhamento da maturação da uva, gerando de 10 a 12 amostragens por ano, foi realizado através da coleta de 300 bagas. O trabalho teve início em 22 de dezembro de cada ano e finalizado por ocasião da colheita da uva. A amostra foi levada ao laboratório em sacos plásticos, onde pesaram-se três grupos de 100 bagas para determinar a evolução do peso da baga, esmagando-as manualmente para extrair o mosto, o qual foi centrifugado. Analisaram-se as variáveis ºBrix, acidez total e pH, através de métodos físico-químicos [1].

As características da uva foram determinadas através de medidas efetuadas por ocasião de sua colheita. O peso do cacho, o número de bagas/cacho, o peso da ráquis e a proporção peso da ráquis/peso do cacho foram obtidos através das medidas feitas em 15 cachos de uva colhidos por acaso. O peso da baga foi obtido através da pesagem de três grupos de 100 bagas coletadas por ocasião da colheita da uva. O peso da semente e a relação peso da semente/peso da baga foram determinados retirando as sementes de 100 bagas.

As características analíticas do mosto: densidade, ºBrix, acidez total, relação ºBrix/acidez total, pH, ácido tartárico, ácido málico e relação ácido tartárico/ácido málico foram obtidas do mosto extraído no esmagamento da uva para microvinificação.

O ácido tartárico e o ácido málico foram analisados através da cromatografia líquida de alta eficiência. Utilizou-se um cromatógrafo líquido Varian operando em condição isocrática, um detector espectrofotométrico UV/VIS, modelo UV-50 e um injetor Rheodyne 7125 com volume de 20mL. A separação do ácido tartárico foi realizada em uma coluna Varian MCH-NCAP-5 de 4mm x 15cm. O detector foi fixado em um comprimento de onda de 212nm. Na eluição utilizou-se um solvente constituído de água ultrapura acidificada com ácido fosfórico a pH 2,5 [2].

O vinho foi elaborado em pequena escala sem utilizar a chaptalização, sendo realizadas três microvinificações de 18kg de uva em cada safra. Inicialmente as bagas foram separadas das ráquis e, a seguir, esmagadas com uma desengaçadeira-esmagadeira, momento em que retiraram-se amostras de mosto para análise. O mosto foi, então, colocado em recipientes de 20L, adaptados com uma válvula de Müller, adicionando SO2 na concentração de 50mgL-1 e leveduras secas ativas (Saccharomyces cerevisiae) na proporção de 0,2gL-1. O tempo de maceração foi de cinco dias, com duas remontagens diárias. A fermentação alcoólica ocorreu em uma sala com temperatura controlada de 23°C a 25°C. O vinho foi trasfegado, filtrado, engarrafado e depois analisado.

Inicialmente, foi feita a avaliação sensorial para descrever as principais características do vinho Isabel. As determinações físico-químicas dos vinhos, como densidade, álcool, acidez total, acidez volátil, pH, extrato seco, açúcares redutores, cinzas, alcalinidade das cinzas, nitrogênio total e SO2 total foram feitas, conforme metodologia descrita por RIBÉREAU-GAYON et al. [19]. As antocianinas foram determinadas pelo método de diferença de pH e os taninos através da hidrólise ácida [20, 21]. A densidade ótica foi determinada com comprimento de onda de 420nm e 520nm e os polifenóis totais, através de um espectrofotômetro UV/VIS, com cubetas de 1mm de percurso ótico para os índices de cor e de 10mm para os polifenóis totais.

Os compostos voláteis aldeído acético, acetato de etila, 1-propanol, 2-metil-1-propanol-1, 2-metil-1-butanol + 3-metil-1-butanol foram determinados por cromatografia gasosa. Utilizou-se um aparelho equipado com um detector de ionização de chama e coluna de aço inoxidável, Carbowax 600 a 5%, mais Hallcomid M-18OL a 1% como fase estacionária e Chromosorb W de 60-80mesh como suporte, de 3,2m de comprimento e de 1,8" de diâmetro interno. A amostra de vinho (3mL) foi injetada diretamente no aparelho após ter recebido 10% de seu volume de uma solução de 4-metil-2-pentanol a 1gL-1 como padrão interno [4]. O teor de P foi determinado por colorimetria usando molibdato de amônio. O Ca, Mg, Mn, Fe, Cu e Zn foram analisados por absorção atômica, enquanto que o K, Na e Li por emissão de chama [18].

 

3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 – Maturação da uva

Detectou-se aumento do peso da baga no decorrer do período de maturação da uva Isabel (Figura 1). Certas reduções de peso da baga observadas em algumas semanas foram conseqüência de períodos mais secos. Nesse sentido, as safras de 1988 e 1991, que ocorreram com tempo mais seco, apresentaram peso da baga menor em relação à safra de 1992, que teve maior umidade relativa do ar. O peso da baga é uma característica varietal, também influenciada por fatores naturais, especialmente umidade, fertilidade do solo, nível de produção e tratos culturais [6]. A uva Isabel se caracteriza por ter baga maior que as cultivares de Vitis vinifera utilizadas para vinificação. Geralmente, uvas com bagas grandes apresentam maior rendimento em mosto e liberam, por ocasião da maceração, proporcionalmente menos cátions, fato que determina menor salificação dos ácidos em relação às uvas com bagas pequenas [22].

 

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A evolução do ºBrix no período de maturação da uva está indicada na Figura 2. Nas três primeiras semanas, que corresponde ao período I de crescimento do fruto, a uva se caracteriza por ser ainda verde, por um aumento do tamanho da baga como conseqüência da divisão celular, por um teor de açúcar do mosto baixo e acidez elevada [26]. A partir da análise do mosto da uva colhida em 12/1 detectou-se incremento maior no ºBrix, o qual prolongou-se até duas semanas antes da colheita.

 

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O início da fase de maturação da uva, considerado quando 50% das bagas começam a mudar de cor, foi observado entre 12/1 e 19/1; no entanto, em 1988, safra mais tardia, ela ocorreu entre 19/1 e 26/1. ZANUZ [27], estudando a evolução da uva Isabel em 1989, no município de Bento Gonçalves, identificou o início da maturação em 26/1, quando o mosto apresentava 10,5ºBrix.

A data de colheita da uva Isabel variou de 23/2 a 9/3. A determinação do momento da colheita é definido, principalmente, pelo teor de açúcar do mosto. Em março a temperatura média do ar diminui consideravelmente, fator que não é favorável à fotossíntese e conseqüentemente ao acúmulo de açúcar na baga. Por isso, nem sempre as safras mais tardias originam mostos com maior teor de açúcar.

Quanto à acidez total, observou-se redução no teor com a evolução da maturação da uva (Figura 3). Entre os fatores que determinam a redução da acidez total durante sua maturação destacam-se a diluição dos ácidos orgânicos devido ao aumento do tamanho da baga, a migração de bases e conseqüente salificação dos ácidos orgânicos e a respiração celular. Nas condições de cultivo da videira na Serra Gaúcha, não há estudos indicativos da participação individual desses fatores na redução da acidez total do mosto no período de maturação.

 

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No período de 12/1 a 9/2 detectou-se redução mais acentuada da acidez total no mosto da cv. Isabel. Possivelmente, a temperatura média mais elevada desse período tenha favorecido a redução da acidez total do mosto, pela combustão do ácido málico, através da respiração celular.

Quando a época de colheita da uva ocorreu no final de fevereiro a acidez total variou de 64meqL-1 a 86meqL-1 e no início de março a acidez total média foi de 59meqL-1. Isso significa que a cv. Isabel tem na Serra Gaúcha níveis relativamente baixos de acidez total no mosto. No entanto, por ocasião do processamento da uva observa-se liberação importante de ácidos da película para o mosto, aumentando a acidez.

A evolução da acidez do mosto foi acompanhada também através da medida do pH (Figura 4). Constatou-se aumento do pH do mosto com a maturação da uva, pois de um valor médio de 2,59 no início da avaliação passou para 3,41 nas determinações efetuadas em 9/3. Entre os fatores que contribuem para elevar o pH do mosto durante a maturação da uva, destaca-se a salificação dos ácidos orgânicos. Em regiões de clima quente, o pH elevado dos mostos é conseqüência dos baixos teores de ácido tartárico, ácido málico e da elevada alcalinidade das cinzas. A cv. Isabel se caracterizou por apresentar mostos com pH baixos, exceção à safra de 1990 que atingiu pH de 3,61 na última época estudada. Entre os prováveis fatores determinantes de valores de pH baixos para os mostos de Isabel, salienta-se o baixo teor de K do mosto, em conseqüência do tamanho da baga que determina menor proporção de película em relação ao volume da polpa.

 

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3.2 – Características da uva

As características físicas da uva Isabel são indicadas na Tabela 1. O peso médio do cacho foi de 156,7g, variando de 114,0g em 1988 a 210,1g em 1992, e o número médio de bagas/cacho foi de 52,1. A uva Isabel possui ráquis pequena (peso médio de 3,2g) que participa com somente 2,0% no peso do cacho, inferior ao valor médio indicado na literatura que é de 3% a 7% para as uvas de vinho [19].

 

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A baga é grande, pesando em média 3,0g (variação de 2,55g em 1991 a 3,48g em 1992). É de formato ligeiramente oval – comprimento de 1,67cm, largura de 1,57cm e relação comprimento/largura de 1,07 – e, quando madura, se desprende da ráquis com certa facilidade. A baga apresenta de uma a duas sementes com peso médio de 64,8mg, e que participam com 3,1% do peso.

Segundo BÁN [3] e GALET [10], a uva Isabel apresenta cachos de 14 a 19cm de comprimento. Os cachos são soltos, de pedúnculo curto, e com ráquis verde que permite a colheita sem o auxílio de equipamento de corte [10, 24]. A ráquis apresenta quantidade elevada de elementos minerais e de compostos fenólicos e teores baixos de açúcar [9, 12]. A película é espessa mas mesmo assim se rompe facilmente por ocasião da colheita e transporte. É coberta por uma pruína abundante, de coloração azul escura. A polpa é macia, suculenta e deliqüescente [24]. O aroma da uva Isabel é percebido facilmente por ocasião da maturação, caracterizando-se principalmente pelo aroma floral agradável do antranilato de metila.

3.3 – Características do mosto

As principais características analíticas do mosto da uva Isabel são indicadas na Tabela 2. Detectou-se uma variação da densidade do mosto de 1,092gmL-1 em 1991 a 1,071gmL-1 em 1993 (média de 1,077gmL-1). O açúcar é entre os constituintes do mosto o que tem maior participação na densidade. Por isso a densidade e o ºBrix tiveram uma flutuação similar, exceto para a safra de 1988 que teve o menor valor de ºBrix e que não correspondeu à menor densidade.

 

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O teor médio de 18,2ºBrix é considerado elevado para uma cultivar de Vitis labrusca, visto que, geralmente, esta espécie apresenta potencial de produção de açúcar inferior às cultivares de Vitis vinifera.

Quanto à acidez total, detectou-se um teor médio de 57meqL-1, valor considerado baixo para mosto destinado à vinificação. O teor mais baixo – 40meqL-1 – foi na safra de 1989 e o mais elevado – 70meqL-1 –, na de 1993. No entanto, ficou evidenciada uma liberação marcante de ácidos da película para o mosto por ocasião do processamento da uva.

A relação ºBrix/acidez total teve um valor médio de 44,0. A utilização dos valores dessa relação como índice de maturação da uva deve ser feita com cuidado, pois um aumento do açúcar nem sempre corresponde à igual redução da acidez total [22]. Essa relação também não é indicada para comparar mostos de diferentes cultivares.

Quanto ao pH, o valor mais elevado (3,54) foi detectado em 1990 e o mais baixo, (3,26) em 1989 e 1994. O valor médio do mosto de Isabel (3,35) foi superior ao estabelecido como ideal para mostos de cultivares tintas de Vitis vinifera. No entanto, as características da uva Isabel – tamanho da baga, relação película/polpa e teor de potássio do mosto - , não favorecem o aumento de pH na vinificação, como geralmente ocorre em outras cultivares tintas de Vitis vinifera.

O teor médio de ácido tartárico – 4,3gL-1 – é similar ao encontrado em outras cultivares de uvas tintas.

Quanto ao ácido málico, constataram-se teores baixos no mosto de Isabel – média de 1,5gL-1. Em princípio, o baixo teor desse ácido é indicativo de que a uva atinge um bom estágio de maturação.

A relação ácido tartárico/ácido málico evidenciou uma predominância do ácido tartárico sobre o ácido málico, pois o valor médio foi de 3,3. Provavelmente esse seja um dos fatores determinantes do pH do mosto e do vinho de Isabel ser relativamente baixo.

3.4 – Características analíticas do vinho

As análises básicas do vinho Isabel são indicadas na Tabela 3. A densidade do vinho é conseqüência da graduação alcoólica e da quantidade de açúcar residual. Os valores detectados correspondem àqueles normalmente encontrados nesse tipo de vinho. O grau alcoólico mostra uma variabilidade em função das safras. O teor mais alto em 1991 deveu-se à maturação especial da uva devido às condições climáticas favoráveis verificadas naquele ano. Em mais de 40% das safras foi possível elaborar vinhos tintos de Isabel com teor alcoólico superior a 10% v/v, o que permitiria a produção de vinhos sem chaptalização, uma vez que a cultivar apresenta potencial para a produção de açúcar.

 

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Os resultados confirmam aumento no teor de acidez total dos vinhos em relação aos mostos, possivelmente em decorrência da liberação dos ácidos orgânicos da película durante a maceração. Isto porque a cv. Isabel se caracteriza por apresentar uma maior concentração de ácidos orgânicos na película em relação às cultivares Vitis vinifera.

A acidez volátil é baixa, fato que confirma a sanidade da uva e a ocorrência da fermentação alcoólica sem contaminação bacteriana.

Com relação ao pH, observaram-se, em algumas safras, valores mais elevados no vinho que no mosto, possivelmente em conseqüência da precipitação do ácido tartárico na forma de bitartarato de potássio. O aumento mais importante ocorreu em 1988, quando o pH do mosto foi de 3,32 e o do vinho de 3,54. O aumento do pH no vinho não foi mais expressivo, provavelmente, devido ao teor moderado de K do mosto.

O extrato seco e o extrato seco reduzido indicam que o vinho apresenta boa estrutura e corpo. Os teores de açúcares redutores evidenciam que houve transformação normal dos açúcares do mosto em álcool pelas leveduras. Todos os vinhos apresentaram menos de 3,0gL-1, sendo, por isso, classificados como secos. A legislação brasileira não estabelece um mínimo de extrato seco reduzido, mas um máximo da relação álcool em peso/extrato seco reduzido, fixado em 4,8 para os vinhos tintos comuns. Nenhum vinho mostrou valor dessa relação superior ao máximo estabelecido por essa legislação.

As cinzas correspondem aos elementos minerais presentes no vinho e geralmente representam aproximadamente 10% do valor do extrato seco reduzido. No caso do vinho tinto de mesa, o valor mínimo estabelecido pela legislação brasileira é de 1,5gL-1. Todos os vinhos analisados apresentaram teor de cinzas superior ao mínimo exigido. A alcalinidade das cinzas informa sobre a salificação dos ácidos do vinho. Teores baixos indicam maior proporção de ácidos livres e teores altos maior salificação. Os valores da alcalinidade das cinzas dos vinhos de Isabel foram baixos.

O nitrogênio total aparece nos vinhos tintos de Isabel em doses variáveis em função das safras. Os teores são baixos também devido à presença de taninos, compostos responsáveis pela formação do complexo proteína-tanino que precipita.

Com relação aos polifenóis totais e os taninos, os vinhos apresentaram teores baixos, o que mostra o reduzido teor desses componentes na uva. Os níveis detectados são característicos de vinhos leves. As antocianinas são pigmentos vermelhos responsáveis pela coloração dos vinhos tintos. No caso das uvas do grupo das americanas, como é o caso da cv. Isabel, a antocianina se encontra ligada geralmente a duas moléculas de glicose, na forma de diglicosídeo. Os vinhos de 1989, 1991 e 1994 originaram maiores concentrações de antocianinas e, conseqüentemente, maior intensidade de cor. Nas demais safras, eles apresentaram fraca intensidade de cor, chegando mesmo em alguns casos a ser considerados rosados.

Os principais elementos minerais do vinho Isabel são indicados na Tabela 4. A composição mineral do vinho se origina, essencialmente, da parte sólida da uva, embora as operações tecnológicas de vinificação podem provocar modificações acentuadas. O K é o cátion predominante nos mostos e nos vinhos, mas os teores detectados nos vinhos de Isabel são baixos e representam de 30% a 40% das cinzas. O Na também aparece em concentrações reduzidas, menos de 5,0mgL-1, pois não foram utilizados produtos enológicos na vinificação. O teor de Ca está relacionado com a precipitação do tartarato de cálcio, que ocorre geralmente após o engarrafamento. Um dos fatores que concorrem para aumentar o teor de Ca do vinho é a utilização de calda bordalesa e a sua conservação em recipientes de concreto. Nesse caso, a diferença nos teores de Ca dos vinhos Isabel das diferentes safras pode ter sido devida às aplicações de calda bordalesa antes da colheita da uva.

 

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O teor de Mg foi superior ao de Ca, o que se justifica, pois os seus sais são mais solúveis que os de Ca, embora a aplicação de produtos fitossanitários na videira também possa interferir. Os teores de Ca e Mg detectados foram menores em relação àquele indicado para vinhos brasileiros [7].

Os demais elementos minerais analisados, exceto o P, foram detectados em pequenas concentrações. O Fe e o Cu apresentam uma importância acentuada no vinho, uma vez que participam das reações de oxidorredução e podem ser responsáveis por turvações. Também podem atuar como catalisadores no processo de envelhecimento. Foram detectados teores mais elevados de Cu e mais baixos de Mn no mosto da cv. Isabel, da Serra Gaúcha, em relação ao teor do vinho [15].

A variação observada no teor de P nas diferentes safras pode ser conseqüência do grau de prensagem da uva por ocasião da vinificação.

Com relação aos compostos voláteis (Tabela 5), o vinho Isabel se caracterizou por apresentar teores baixos de etanal, possivelmente em decorrência da dose de SO2 utilizada. Os teores de acetato de etila sempre foram inferiores ao seu nível de percepção, que é de aproximadamente 180mgL-1 para vinho tinto. Os baixos teores de acetato de etila são devidos ao bom nível sanitário da uva. Quanto ao metanol, os vinhos de Isabel mostraram tendência a formar teores que podem ser considerados elevados devido à quantidade de pectina da uva. O teor médio de metanol detectado no vinho Isabel corresponde àquele indicado para esse tipo de vinho [8, 13]. A legislação brasileira estabelece em 350mgL-1 o teor máximo de metanol nos vinhos.

 

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Quanto aos álcoois superiores, as concentrações foram superiores a 250mgL-1, exceção à safra de 1993. Além do aspecto varietal, a concentração de álcoois superiores está relacionada com as condições fermentativas, tais como temperatura, oxigenação, teor de nitrogênio e SO2 .

3.5 – Características sensoriais do vinho

O vinho Isabel se caracterizou por apresentar cor vermelha viva, de intensidade variável em função das safras. Assim, em 1991 teve intensidade de cor acentuada, enquanto que em 1992, ao contrário, chegou a ser classificado como vinho rosado.

O vinho Isabel apresentou aroma foxado intenso característico dos vinhos dessa cultivar, muitas vezes identificado como aroma de uva ou de framboesa. Com relação ao sabor, o vinho Isabel em algumas safras foi relativamente ácido e áspero, faltando-lhe suavidade e equilíbrio. Por outro lado, teve estrutura e tipicidade. Trata-se de um vinho de fácil distingüibilidade. Devido às suas características deve ser consumido jovem, pois não melhora com o envelhecimento.

 

4 – CONCLUSÕES

A uva Isabel apresenta cacho pequeno, solto, formado por um número reduzido de bagas de tamanho grande. Possui bom potencial de produção de açúcar, podendo através de práticas culturais e de um controle adequado de produção, originar vinhos sem necessidade de correção do mosto com sacarose.

O mosto tem baixa acidez e aroma foxado acentuado.

As deficiências de intensidade de cor do vinho Isabel podem ser melhoradas através da definição de um sistema de produção para vinho tinto. É um vinho típico e de boa distingüibilidade, apreciado por muitos consumidores, mas questionado por outros quanto às suas características sensoriais.

Devido à importância dessa cultivar para a vitivinicultura da Serra Gaúcha, os vinhedos devem ser orientados para a produção de vinho, suco ou uva de mesa buscando obter produtos genuínos e característicos.

 

5 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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1 Recebido para publicação em 06/12/99. Aceito para publicação em 06/04/00.

2 Eng. Agr., Dr., Embrapa Uva e Vinho, C.P. 130, CEP 95700-000 Bento Gonçalves-RS. E-mail: rizzon@cnpuv.embrapa.br

3 Eng. Agr., Dr., Embrapa Uva e Vinho. Bolsista PQ do CNPq. E-mail: miele@cnpuv.embrapa.br

4 Eng. Agr., M.Sc., Embrapa Uva e Vinho. E-mail: meneguzzo@cnpuv.embrapa.br

* A quem a correspondência deve ser enviada.