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Relações Internacionais (R:I) - O Estado em reconstrução e a sua constituição. A intervenção no Iraque

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Relações Internacionais (R:I)

versão impressa ISSN 1645-9199

Relações Internacionais  n.26 Lisboa jun. 2010

 

O Estado em reconstrução e a sua constituição. A intervenção no Iraque

 

Mateus Kowalski*

Doutorando em Política Internacional e Resolução de Conflitos na Universidade de Coimbra

 

RESUMO

A elaboração de uma Constituição assume-se como um elemento estruturante para o desenvolvimento de um Estado numa situação de pós-conflito, para a coexistência pacífica dos seus cidadãos e, em última análise, para garantir a coesão e reconciliação social, bem como uma paz duradoura. O presente artigo aborda a importância da dimensão político-constitucional como elemento do statebuilding, analisando os dilemas e perversidades inerentes, designadamente os que resultam da intervenção dos actores externos. As lições que se podem retirar do caso extremo do Iraque são relevantes para identificar os limites do auxílio externo na elaboração de uma Constituição num processo de transição política pós-conflito, bem como as áreas em que pode ser optimizado. O artigo argumenta que a intervenção dos actores internacionais é benéfica se for marginal ou mesmo parcial num nível de baixa intensidade.

Palavras-chave: Statebuilding, Constituição, intervenção, Iraque.

 

The State in reconstruction and its Constitution. The intervention in Iraq

ABSTRACT

The making of a Constitution is a fundamental process towards the development of a post-conflict State, the peaceful coexistence of its citizens and, in the end, to guaranty the social cohesion and reconciliation, as well as a lasting and sustainable peace. The present article focuses on the relevance of the politico-constitutional dimension as a statebuilding element, analyzing the inherent dilemmas and perversities that may result from the intervention of external actors. The lessons that may be learned from the case of Iraq are relevant in order to identify the limits from external assistance on the making of a Constitution within a post-conflict political transition process, as well as the areas in which it can be optimized. This article argues that the intervention by external actors can be constructive if marginal or even partial at a low intensity level.

Keywords: Statebuilding, Constitution, intervention, Iraq.

 

A elaboração de uma constituição numa situação de pós-conflito é um processo de extrema importância para garantir a coesão e reconciliação social, bem como uma paz duradoura1. Para tanto, é relevante não apenas o seu conteúdo, como também a forma como é elaborada e adoptada, sendo que não raras vezes o procedimento constituinte e o próprio texto constitucional são impostos externamente ou absorvidos pelas elites locais de acordo com modelos liberais. O caso recente do Iraque é um exemplo paradigmático.

Com a autonomização do statebuildingcomo um subproduto do peacebuilding, a dimensão político-constitucional da reconstrução de um Estado ganhou novo enlevo. Tratando-se do instrumento jurídico fundamental organizador da comunidade estadual, a Constituição tem um papel estrutural relevante na construção política, social e económica de um Estado, bem como na garantia dos direitos fundamentais dos seus cidadãos. Assume-se, assim, como um elemento estruturante para o desenvolvimento de um Estado numa situação de pós-conflito, para a coexistência pacífica dos seus cidadãos e, em última análise, para fazer cessar a violência e evitar o seu ressurgimento, e assim propiciar uma paz duradoura.

Porém, tal como no processo de statebuilding no seu todo, também o processo constituinte nele integrado enferma de diversos dilemas e perversidades. Assim, ao mesmo tempo que deve ser reconhecida a importância do papel da Constituição no statebuilding, importa igualmente integrar a problemática nos dilemas inerentes àquele processo, designadamente os que resultam da intervenção externa na elaboração da uma constituição.

O caso do Iraque, onde decorre um processo de statebuilding, é, de certa forma, único2. De facto, a necessidade de reconstrução do Estado iraquiano advém não de um conflito interno, mas antes de uma intervenção militar externa. Esta especificidade é relevante para o presente estudo uma vez que permite analisar a influência da intervenção externa no processo de elaboração da Constituição de uma forma maximizada. A intervenção armada no Iraque foi feita segundo uma agenda própria dos agressores externos que agiram em função de interesses não totalmente coincidentes com os dos iraquianos. Naturalmente, tentaram usar a Constituição para estruturar um Estado de modo concordante com os propósitos económicos e geopolíticos que presidiram à intervenção, bem como em função dos seus modelos político-ideológicos de referência.

Posto isto, o presente ensaio pretende estudar a importância da dimensão político-constitucional como elemento do statebuilding, bem como analisar os dilemas e perversidades inerentes, designadamente os que resultam da intervenção dos actores externos. A ilustração do caso de transição política no Iraque, de Junho de 2003 a Outubro de 2005, facilitará, crê-se, a compreensão da problemática.

Assim, numa primeira etapa, será abordada a dimensão político-constitucional do statebuilding, onde se procurará caracterizar a Constituição como um elemento de statebuilding e descrever a sua elaboração neste contexto. Depois, numa segunda fase, será estudada a elaboração da Constituição no Iraque pós-intervenção, abordando a relação entre a intervenção, o statebuilding e o procedimento constituinte observado no Iraque.

 

A DIMENSÃO POLÍTICO-CONSTITUCIONAL DO STATEBUILDING

A Constituição como Elemento do Statebuilding

Com o fim da Guerra Fria, as Nações Unidas reciclaram doutrinalmente as operações de paz clássicas até então predominantes, consagrando definitivamente as operações de peacebuilding como as actividades de segurança dominantes da organização3. A Agenda para a Paz do então secretário-geral Boutros-Ghali constituiu um contributo importante para a mudança de paradigma doutrinal ao estabelecer o peacebuilding como uma actividade que tinha como objectivo identificar e apoiar estruturas que permitissem a consolidação da paz e evitar o regresso ao conflito4. Porém, as chamadas missões de peacebuilding de primeira geração definhavam por serem demasiado breves, de âmbito limitado e essencialmente focadas em apressadas reformas político-económicas. Assim, a partir do final dos anos 1990, assistiu-se a uma progressiva evolução para missões de peacebuilding com mandatos de âmbito mais alargado e com objectivos a longo prazo. O peacebuilding é, pois, hoje entendido pelas Nações Unidas como uma actividade complexa, multifacetada e de longa duração que tem como objectivo criar condições para uma paz sustentável actuando ao nível das causas estruturais do conflito, procurando, designadamente, criar as condições para que o Estado possa exercer de forma efectiva e legítima as suas funções essenciais5.

No virar do milénio, o statebuilding começou a emergir como um macro-objectivo do peacebuilding, em que é dada especial ênfase à reconstrução pós-conflito de um Estado em fase de transição, designadamente no que respeita ao reforço da sua capacidade governativa. O statebuilding assenta na ideia de que a segurança e o desenvolvimento em sociedades pós-conflito dependem da existência de instituições governativas legítimas, autónomas e eficazes6. Esta dimensão do peacebuilding só mais recentemente ganhou consistência própria quando em 2004 autores como Francis Fukuyama7, Simon Chesterman8, James Fearon e David Laitin9, Stephen Krasner10, e Roland Paris11, embora com propostas conceptuais diferentes, abordaram o statebuilding enquanto elemento esquecido do peacebuilding. Mesmo se ainda envolto em alguma polémica e até suspeição, o statebuilding passou, desde então, a merecer uma atenção devota por parte quer de académicos quer de pessoas e instituições envolvidos em actividades de peacebuilding. O statebuilding é um processo muito exigente do ponto de vista da sua definição e execução. Em última análise porque pretende transformar uma entidade política enfraquecida num Estado de soberania auto-suficiente e capaz de exercer funções características do Estado moderno, como garantir a sua segurança, a sua representação externa, a aplicação da lei, a cobrança de impostos, a gestão do território ou o fornecimento de bens e serviços básicos. Ora, tal ambição não pode deixar de estar envolta numa enorme complexidade. O sucesso de uma operação deste género, que é multifacetada e que actua a diferentes níveis macro e micro, está sujeita a diversas variáveis difíceis de gerir, tais como o conhecimento preciso da realidade no terreno, a adopção da estratégia casuística adequada, a identificação das áreas mais carenciadas e o acerto da intensidade da intervenção ou a duração da operação. Para mais, deve estar prevista a flexibilidade suficiente que permita uma fácil adaptação das variáveis em função da evolução do processo.

Toda esta complexidade subjacente e o facto de se estar a proceder a uma cirurgia cardiotorácica a um Estado com consequências directas na fisiologia da sua personalidade, não pode deixar de acarretar dilemas que alimentam algum discurso crítico relativamente ao statebuilding. A própria referência ao termo «Estado» que se pretende reconstruir pode ser instintivamente associada à instituição opressiva dominada por elites que hajam alimentado o conflito. Roland Paris e Timothy Sisk identificam cinco categorias genéricas de dilemas12. Primeiro, a que advém do modelo de operação, onde sobressai a dificuldade em encontrar um equilíbrio entre, por um lado, a utilidade de uma intervenção externa forte e pesada e, por outro, o benefício em conferir aos actores locais a liderança na condução do processo de reconstrução. Depois, a questão da duração da operação, sabendo que sendo por natureza uma operação de longa duração, o statebuilding pode gerar animosidade local contra os actores externos intervenientes e alimentar uma passividade contraproducente, para além de consumir muitos recursos, que, é sabido, são limitados. Em terceiro lugar, o dilema que resulta da dominação pelas elites locais que emergem do conflito no processo político, por vezes com prejuízo para a efectiva representação das populações. Um outro dilema é o que resulta da tendência para a intervenção prolongada criar na sociedade local uma dependência indesejável do auxílio internacional. Por fim, haverá igualmente a salientar os dilemas relacionados com as dificuldades em conseguir coerência na actuação entre os vários actores envolvidos, como também a disparidade que por vezes se verifica entre os valores que informam em abstracto o statebuilding e as políticas que, por razões diversas, são efectivamente implementadas no terreno.

Na raiz de vários destes dilemas está o facto de o statebuilding se caracterizar por ser uma intervenção externa no Estado pós-conflito que haverá que reconstruir. Não quer isto dizer que a intervenção, pelo menos em teoria, não possa incluir abordagens quer top-down quer bottom-up. Idealmente, a intervenção externa deveria até limitar-se a fomentar e apoiar uma forte dinâmica interna político-social13 liderada pelos actores locais14.

Ainda assim, o que na prática frequentemente acontece é que a intervenção externa se impõe de forma intrusiva à dinâmica político-social interna. Tal é facilmente verificável quando são os actores estrangeiros que designam os actores locais que participarão no statebuilding, escolhendo as elites que reúnem determinadas características entendidas pelo exterior como sendo as ideais para reanimar o Estado debilitado ou impondo determinados modelos e valores que, apesar de não terem reflexo localmente, são entendidos como a revelação ao ignorante da verdade suprema. Tudo isto, reconheça-se, tanto pode ser oferecido de forma autêntica e altruísta, de forma ingénua e mal planeada, como também de forma armadilhada na tentativa de impor uma agenda em proveito de interesses próprios.

Neste quadro teórico de intrínseca bondade original mas enfermado de dilemas que correm o risco de a corromperem, podem ser identificadas diversas dimensões conceptuais. Uma das dimensões clássicas do peacebuilding é a dimensão político-constitucional15 que, pelo seu teor, informa de maneira característica o statebuilding. A construção de um Estado passa necessariamente pela criação de um quadro político-social que tem a Constituição como vértice proeminente e director.

A Constituição é o estatuto jurídico fundamental organizador da comunidade estadual. Goza de superioridade jurídica normativa e pretende organizar do ponto de vista político, económico e social a comunidade estadual e garantir os direitos fundamentais dos seus cidadãos. Num processo de transição pós-conflito, a adopção de uma constituição é um passo fundamental para estruturar o Estado em reconstrução e garantir a estabilidade e funcionamento democrático das instituições político-sociais, assegurando igualmente a coexistência pacífica em sociedades multiétnicas em que o factor identidade, que por vezes anima a violência16, constituiu uma variável da coexistência nacional inclusiva e pacífica.

O referente da Constituição é, desde o século XIX, o Estado17. Porém, até recentemente, a teoria da Constituição debruçava-se essencialmente sobre o processo constituinte em situações de estabilidade política.

Num contexto de transição pós-conflito, a perspectiva realista encara a Constituição como um reflexo do equilíbrio de poderes num dado momento, não lhe reconhecendo qualquer papel especial de mudança ou transição. Já a abordagem idealista vê a Constituição como um acto fundacional que provoca um corte entre o antigo e o novo regime político. Contudo, numa situação de pós-conflito é possível reconhecer, ainda, um constitucionalismo de transição que almeja enquadrar fenómenos multifacetados de mudança social18 e de reconstrução de instituições democráticas, que sejam funcionais e inclusivas numa lógica de transição e não de reforço de estruturas opressoras. A Constituição afirma-se como um elemento aglutinador de coexistência social e de paz numa comunidade estadual. Não só serve de referente máximo para o funcionamento democrático e estruturado dos órgãos de soberania, como cristaliza os mais fundamentais padrões axiológico-normativos da comunidade, assegurando o seu regular funcionamento do ponto de vista político, social e económico em direcção ao desenvolvimento e ao bem-estar.

Reconheça-se, todavia, que esta estabilidade tão desejada que é conferida pela Constituição tem-se baseado em modelos de democracia liberal que aquele instrumento fundamental acaba por trazer para uma dada comunidade. Esta tendência denota não tanto a aceitação do modelo liberal como um modelo universal, mas mais uma expansão induzida deste modelo19. Sendo adoptado de forma mais ou menos marcada pela maioria dos países desenvolvidos, este modelo acaba por ser a principal exportação dos actores externos do statebuilding. Esclareça-se que não se trata apenas de exportar um conteúdo, mas também um procedimento constituinte. Por outro lado, é todo o ordenamento jurídico e de organização institucional que terá de ser elaborado de novo ou revisto em função da nova Constituição. Na prática, poderá assistir-se a uma tendência para a globalização de um modelo de Estado.

Tal vem suscitar uma série de dilemas a que já se fez referência. Assim, a problemática da intervenção externa no statebuilding tem, como não poderia deixar de ter, reflexo no procedimento constituinte e no seu produto final. Sabendo já da relevância que a Constituição tem na organização da comunidade estadual, este é o apogeu da problemática da intervenção externa no processo de statebuilding.

 

A elaboração da Constituição num processo de statebuilding

Existem determinados elementos que caracterizam uma Constituição. Em primeiro lugar, trata-se de uma lei proeminente que incorpora um núcleo duro de direito imperativo que se impõe aos membros da comunidade, gozando de supremacia no seio do ordenamento jurídico interno. Depois, garante os direitos fundamentais da pessoa humana, enquanto padrão de conduta da comunidade assente num substrato humano. Acresce que a Constituição prevê uma base institucional, com inspiração no princípio da separação de poderes, que serve de garantia da ordem jurídica da comunidade.

O povo, entendido como uma grandeza pluralística, é o titular do poder constituinte20. Como escreve Jorge Miranda, «é cada povo, em cada momento, que faz as opções básicas da sua vida colectiva – políticas, económicas e sociais – através do exercício do poder constituinte»21. Compete, pois, ao povo de cada Estado empreender o procedimento constituinte, processo pelo qual é revelada a Constituição, conferindo-lhe legitimidade e, logo, conferindo fundamento à legitimação do exercício do poder político derivado.

Num contexto de statebuilding, a participação do povo na condução do procedimento constituinte tem, pois, desde logo, uma função legitimadora. Ademais, é possível estabelecer uma relevância directa entre a participação popular e o controlo e redução da violência22. Afigura-se, pois, fundamental que o procedimento seja informado por consultas à população, abertura à manifestação e debate de posições políticas diferentes e que o processo de adopção da Constituição seja representativo. Porém, importa ter presente que a participação popular pode ser muito difícil de organizar e gerir. A intervenção institucional neste processo é essencial, especialmente em zonas onde não exista tradição de participação eleitoral ou onde a legitimidade dos delegados constituintes é posta em causa.

Em processos de statebuilding têm sido observados diferentes abordagens ao procedimento constituinte. Este pode ser decomposto em diversas etapas, nomeadamente, a fase de negociação das regras procedimentais, a de elaboração de documentos interinos e de princípios directores, a preparação de um projecto, a adopção do projecto e, finalmente, a sua promulgação e entrada em vigor. Estas etapas podem ser enquadradas formalmente de modos muito diversos. Num dos modelos mais comuns, uma comissão elabora o texto a pedido do poder executivo que depois submete a proposta à assembleia constituinte para deliberação e aprovação. Um outro processo consiste na elaboração de linhas orientadoras por uma conferência que elege posteriormente um órgão legislativo de entre os seus membros. O órgão legislativo nomeia, então, uma comissão para elaborar o texto, que depois é debatido naquele órgão e sujeito a referendo. Outras abordagens incluem processos dirigidos pelo poder executivo ou textos constitucionais que resultam directamente de negociações de paz.

A escolha do órgão deliberativo é fundamental, havendo estudos que demonstram existir uma correlação entre a maior representatividade do principal órgão deliberativo e a redução da violência23. Por outro lado, o método de selecção do órgão deliberativo principal tem, igualmente, relevância, sendo que também nesta fase a maior representatividade parece estar relacionada com uma redução da violência. Um outro grande desafio é, assim, o de incentivar os actores internos com maior poder e influência a participar, sem abdicar da participação popular no processo, fomentando o diálogo político e garantindo o exercício do poder constituinte pelo povo24. Uma participação pública ampla e consultas populares são importantes para desenvolver o sentimento na população de que a nova Constituição é um instrumento fundamental que lhe pertence e relativamente ao qual deve diligenciar pela sua implementação, e não um diktat distante para ser usado pelas elites em proveito próprio25.

No âmbito do statebuilding é característico o esforço em estabelecer processos eleitorais democráticos como forma de, precisamente, assegurar a representatividade e acomodar as diferenças de identidades, principalmente em estados anteriormente autoritários. Paradoxalmente, os processos eleitorais frequentemente exacerbam as tensões intergrupais e dão origem a novos conflitos. Para mais, sendo que a partir dos anos 1990 a maioria dos conflitos tem natureza intra-estatal, a «identidade» tem sido um elemento relevante na dinâmica do conflito. Daí que o reconhecimento e a gestão da «diferença» se assuma como fundamental no procedimento constituinte26.

A escolha do modelo constitucional de exercício do poder é um outro aspecto que deve merecer atenção cuidada. A edificação constitucional de estruturas institucionais que mantenham um comportamento moderado é um aspecto relevante em ambientes de pós-conflito, sendo determinante para prevenir o regresso ao conflito27. O modelo de maioria simples tende a propiciar conflitos em sociedades altamente divididas. Em alternativa, podem ser adoptados modelos de divisão voluntária do poder entre grupos autónomos mas cooperativos ou modelos de governação integrada que pretende superar as diferenças entre os grupos encorajando-os a agirem em função de objectivos políticos comuns.

As elites têm uma grande influência no procedimento constituinte, que tanto pode ser benéfico como intrusivo e deslegitimador. Mesmo quando o procedimento constituinte é conduzido pelos actores políticos internos, existe por vezes uma tendência para as elites se apropriarem de modelos constitucionais externos, frequentemente das antigas potências colonizadoras. São normalmente modelos liberais que nem sempre espelham a realidade axiológico-cultural local, incorrendo no drama de criar contextos políticos artificiais que podem facilmente desabar e redundar num novo conflito. Por outro lado, as elites podem adoptar modelos que garantam a obtenção ou a conservação de poder para si, marginalizando a vontade, os interesses e as expectativas da restante população. Todavia, as elites podem, e devem, ter igualmente um papel relevante no procedimento constituinte enquanto agirem como representantes de todo o povo, detentor primário do poder constituinte.

Os actores externos trazem consigo grandes quantidades de recursos que são muito atractivos para as populações e para as elites locais. Por outro lado, trazem também modelos próprios que procuram impor, muitas vezes opostos aos das elites locais28. Estas podem reagir de modo diverso, mais ou menos hostil. Naturalmente, as elites tentarão conduzir o processo de statebuilding, podendo acontecer que os actores externos se transformem em agentes das elites e que os recursos internacionais sejam por elas geridos. Contudo, é expectável que os actores externos imponham condições relativamente ao seu papel no statebuilding e quanto à gestão dos recursos que trazem, especialmente quando as elites estiverem ligadas directamente ao conflito que debilitou o Estado. Pode mesmo acontecer que actores externos e elites locais não consigam chegar a um compromisso. Por isso, é importante não só que os actores externos procurem cooperar com as elites e a população em geral envolvendo-os directamente no processo de statebuilding, como também que se consiga concertar um modelo político-constitucional para o Estado decidido pelas elites e população locais com o apoio dos actores externos. Passa, assim, a existir um compromisso público das elites para com a população e os actores externos relativamente ao procedimento constituinte e ao substrato fundamental que dele resultará.

A intervenção externa que limite o exercício do poder constituinte de que o povo é titular retira legitimidade à Constituição e ao processo político derivado. Aqui reside o grande dilema da dimensão político-constitucional do statebuilding: a acção dos actores externos não se pode sobrepor à legitimidade do povo de conduzir o procedimento constituinte. Para além da questão da legitimidade, a intervenção externa deve, igualmente, ser lícita. O statebuilding não pode redundar na violação do direito à autodeterminação ou do princípio geral da proibição da ameaça ou recurso à força. Philipp Dann e Zaid Al-Ali identificam três categorias de intervenção externa no procedimento constituinte, atendendo ao grau de intervenção: total, parcial e marginal29. A intervenção será total quando a Constituição não foi redigida nem adoptada por actores locais, por exemplo, quando resultam de negociações de paz internacionais. A intervenção pode ser marginal quando a influência se resume a aconselhamento por peritos estrangeiros a pedido dos actores locais. O processo constituinte permanece sob tutela dos actores locais. Finalmente, a intervenção pode ser parcial quando o procedimento constituinte é orientado até um certo nível, do ponto de vista processual e substantivo, por actores externos, sendo que o poder último de redacção e adopção da Constituição permanece na esfera dos actores locais.

A indução externa de modelos constitucionais, por contraponto à sua adopção voluntária pelas forças políticas internas, pode gerar uma divisão de poder meramente formal e de compromisso desconfortável para todas as partes. O risco de regresso ao conflito é, pois, muito maior. Além do mais, o procedimento constituinte deve permanecer sob o domínio do povo. Assim, apenas as intervenções externas parciais ou marginais parecem ser de admitir.

 

A ELABORAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO NO IRAQUE PÓS-INTERVENÇÃO

A invasão e a intervenção externa

A 20 de Março de 2003, uma coligação militar liderada pelos Estados Unidos invadiu o Iraque, em violação do direito internacional, com o pretexto de que este Estado possuía armas de destruição maciça o que representaria uma ameaça à paz e à segurança internacionais (para além das mal fundadas acusações de colaboração com grupos terroristas). Concluiu-se depois que as armas de destruição maciça que serviram de justificação à agressão não existiam30. Por outro lado, a rápida e esmagadora vitória militar sobre as forças armadas iraquianas não teve sequência em termos de estabilização do Iraque. Ao contrário do que previa Donald Rumsfeld, as tropas da coligação não foram recebidas em Bagdade com as flores com que se agraciam os «libertadores».

A intervenção da coligação liderada pelos Estados Unidos deixou bem patente uma, pelo menos inicial, falta de planeamento e descoordenação no processo de transição e de reconstrução do Iraque. É significativo que tenha sido principalmente o Pentágono a planear o «novo» Iraque. A estratégia de «desbaatização» que se impôs sobre a de «des-sadamização», esta defendida pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos, é um exemplo da desarticulação no planeamento que marcou de forma negativa os destinos do Iraque. Por outro lado, a doutrina neoconservadora que impregnava o Pentágono teve um claro reflexo na forma como a reconstrução foi conduzida. Assim como tiveram os episódios em que a competência dos nomeados para exercerem funções essenciais era medida em função da fidelidade ao Partido Republicano. Este quadro surrealista tem outros elementos de proporções desequilibradas: o vice-rei Paul Bremer, representante todo-poderoso da potência ocupante; a falta de recursos humanos e materiais adequados à reconstrução; a relutância no envolvimento de iraquianos; a tentativa de imposição de modelos; ou a calendarização da elaboração da Constituição do Iraque em função das eleições americanas são alguns dos exemplos. Perante este cenário surrealista de quem vem libertar e trazer a civilização mas que parece não ter efectivamente planeado o pós-intervenção, fica a pergunta: mas afinal o que foi a «coligação de boa vontade» fazer ao Iraque?

A intervenção da coligação liderada pelos Estados Unidos redundou numa ocupação militar unilateral, com presença prolongada de forças militares da coligação no território iraquiano. Esta situação dá origem a um regime territorial particular. Não havendo transferência de jure de soberania a favor do ocupante, este tem no entanto uma ampla autoridade sobre pessoas e bens situados no território ocupado. Por outro lado, o ocupante tem diversos deveres, designadamente o de tomar todas as medidas para restaurar e assegurar a ordem pública e a segurança, respeitando o direito vigente no território ocupado31.

A coligação liderada pelos Estados Unidos, enquanto potência ocupante, tinha o dever de administrar o território iraquiano durante a fase de transição. O facto é que, tendo a invasão sido ilícita, todo o processo de administração estava inquinado ab initio. Só com a adopção de sucessivas resoluções do Conselho de Segurança foi possível conferir alguma legitimidade internacional ao processo de transição (mas nunca à invasão). O Conselho de Segurança reconheceu a 22 de Maio de 2003 que os Estados Unidos e o Reino Unido eram potências ocupantes32. A Resolução 1483 originou um conjunto de obrigações positivas para as potências ocupantes, designadamente no que respeita à promoção do bem-estar da população iraquiana através da efectiva administração do território, incluindo especialmente o restabelecimento das condições de segurança e estabilidade, e a criação de condições para que o povo iraquiano pudesse determinar o seu futuro político.

Na sequência, foi estabelecida a Autoridade Provisória da Coligação (CPA) que tinha a tarefa de administrar o Iraque de 2003 a 2004, com o especial objectivo de criar as condições para a elaboração e adopção de uma Constituição. A 16 de Outubro de 2003, o Conselho de Segurança reconheceu a autoridade da CPA até que um governo eleito pelo povo do Iraque assumisse funções33. Estava assim lançado o mote para o processo de statebuilding que se seguiria à invasão, o qual, nos termos da Resolução 1483, envolveria as potências ocupantes mas também as Nações Unidas.

 

O Statebuilding no Iraque

O Iraque tornou-se independente do Reino Unido em 1932. Após o período da monarquia haxemita, na sequência do golpe de Estado de 14 de Julho de 1958, foi instaurada a República do Iraque, dominada desde 1968 pelo partido Baas. Em 1979, Saddam Hussein toma o poder e torna-se Presidente do Iraque. Após a intervenção da coligação liderada pelos Estados Unidos, e de ter sido decretada mission accomplished a 1 de Maio de 2003, o Iraque via-se contudo a braços com a necessidade de empreender um pesado esforço de reconstrução de estruturas políticas e sociais, transitando de um período autocrático dominado pelo partido Baas e por Saddam Hussein para uma situação de paz sustentável, no âmbito de um regime democrático.

Normalmente, as operações de statebuilding são implementadas na sequência de um conflito interno, após convite dos actores locais e depois de uma solução negociada para o conflito. Porém, tal como já referido, no caso do Iraque a operação de statebuilding decorre directamente da obrigação e da necessidade criadas pela intervenção e ocupação pela coligação liderada pelos de Estados Unidos e por iniciativa primeira dos actores externos. Esta situação leva a que se torne fácil confundir uma genuína operação pós-conflito de statebuilding com a tentativa pelo invasor de estabilizar o território ocupado, conforme é seu dever e, por vezes, conforme ditam os seus interesses. Estas diferenças são relevantes e levantam diversas interrogações sobre os limites do statebuilding e a sua apropriação em situações que resultam de actos ilícitos internacionais de intervenção externa. Ainda assim, do ponto de vista conceptual, a operação no Iraque pode ser caracterizada como statebuilding34, reunindo uma panóplia variada de actores externos e internos que pretendem a reconstrução do Iraque em transição para um regime democrático que assegure uma paz sustentável.

A conjuntura era extremamente complexa. Primeiro, do ponto de vista interno, a sociedade encontrava-se dividida em diversos grupos étnicos. Desde logo, pelos árabes sunitas que, apesar de constituírem uma minoria da população35, dominaram as estruturas governativas do Iraque desde os anos 1960. Temiam agora o seu afastamento do poder e eventuais retaliações por parte dos outros grupos étnicos. Depois, pelos xiitas, que constituíam a maioria da população iraquiana, mas que durante o regime de Saddam Hussein foram marginalizados do processo político. No Norte, os curdos, nação sem Estado, foram sujeitos no Iraque a graves violações de direitos humanos. Para além das suas pretensões históricas à criação de um Estado curdo independente, no Iraque reclamam uma autonomia alargada e maior fruição dos recursos energéticos que se situam no seu território. Para além destes grupos étnicos, existe ainda no Iraque um conjunto de minorias, como os turcomanos, os caldeus, os yezidi ou os assírios, que temem que a sua identidade e os seus interesses sejam marginalizados no grande jogo de acomodação de tensões entre curdos, sunitas e xiitas. Por outro lado, a comunidade iraquiana no exílio exerce grande influência política junto dos Estados Unidos e do Reino Unido. Um outro aspecto interno a ter em consideração é o factor islâmico. Durante o regime de Saddam Hussein, a actividade político-religiosa era reprimida. Com a deposição do regime, a influência de sectores político-religiosos, nomeadamente dos xiitas, fez-se sentir imediatamente.

Em termos regionais, há que considerar a relação, por vezes hostil, entre o Iraque e o Irão e entre os Estados Unidos e o Irão. O Irão tem, por seu lado, grande influência na comunidade xiita iraquiana ao ponto de poder desestabilizar o processo de transição em curso no Iraque. Por outro lado, também a Síria tem uma relação difícil quer com o Iraque quer com os Estados Unidos, tendo, designadamente, oferecido abrigo a alguns antigos altos funcionários iraquianos do partido Baas. Finalmente, a Norte, a Turquia tem interesse na estabilização do Iraque, na concessão da menor autonomia possível aos curdos e na protecção dos direitos dos turcomanos.

Do ponto de vista internacional mais amplo, os Estados Unidos e outros estados apressaram-se a anunciar um processo de transição democrática no Iraque que iria servir como exemplo para o resto do Médio Oriente, assim contribuindo para a estabilidade e a paz na região. Porém, as expectativas de uma transição rápida foram goradas. Aliás, experiências como as da Bósnia ou de Timor-Leste deveriam ter servido de aviso para a longa duração de uma operação de statebuilding e para os riscos de se pretender contrariar a paciência aqui exigida pelo inultrapassável factor tempo.

A economia do Iraque assentava essencialmente na exportação de petróleo. O Iraque tem desde 2002 as terceiras maiores reservas de crude dos estados pertencentes à Organização dos Países Produtores de Petróleo36. Para além de constituir um estímulo para a intervenção e depois estabilização do Iraque, a rentabilização das reservas de crude foi desde o início encarada como o principal sustento do Estado e da sua reconstrução. As prioridades foram, desde logo, o pagamento de salários e dos custos com a gestão corrente do governo. Igualmente importante, era assegurar a produção de electricidade, a distribuição de água e a rede de esgotos, bem como a extracção e refinação do petróleo. Porém, quando a CPA tentou elaborar um orçamento para o Iraque, descobriu que o seu rendimento nacional, devido à má gestão pelo regime anterior, não era suficiente para fazer face às despesas necessárias com a reconstrução do Estado. A única solução passava, de início, por um novo Plano Marshall com a injecção de capitais americanos, mas muito mais dispendioso.

O plano traçado em 2003 pela CPA envolvia três fases, antes da soberania ser devolvida plenamente aos iraquianos. Os primeiros objectivos seriam eliminar as ameaças bélicas internas e abrir o aeroporto até 31 de Outubro desse ano, para além de atingir a produção da energia necessária aos gastos industriais, das instituições governativas e domésticos. A segunda fase abrangia a dimensão económica, e previa a privatização das empresas estaduais, a conversão de rações em pagamentos em dinheiro, a eliminação de subsídios e tarifas, a aprovação de leis de protecção de investimento e a abertura do mercado financeiro a bancos internacionais. Tratava-se de preparar o Iraque para aderir à Organização Mundial do Comércio. Anunciava Paul Bremer: «Vamos criar a primeira verdadeira economia de mercado livre do mundo árabe.»37. A terceira fase envolvia a reforma político-institucional. Neste domínio, havia que reabilitar as instituições governativas, tendo sido adoptada uma estratégia de afastamento de todos os quadros ligados ao partido Baas ao invés de uma estratégia de mera «des-sadamização». Uma vez que pertencer ao partido Baas significava, correntemente, mais uma estratégia de sobrevivência laboral do que uma genuína convicção ideológica, grande parte dos funcionários governamentais pertenciam ao partido. Esta estratégia levou a que em resultado da purga as estruturas governativas ficassem privadas de altos quadros e funcionários essenciais ao seu funcionamento.

A CPA nomeou um Conselho Governativo multiétnico e multirreligioso, que incluía mulheres e homens, constituído por vinte e cinco membros. Porém, uma vez eleito o presidente do Conselho, muitos membros deixaram de participar nas reuniões e usavam o seu novo estatuto para fins pessoais. Depois, foi nomeada uma comissão preparatória para delinear um plano para a redacção da nova Constituição. Seguir-se-ia a atribuição progressiva de mais poderes ao Conselho Governativo, a redacção da Constituição, a submissão da Constituição a referendo popular, a eleição de um governo e, finalmente, a transição de soberania para o Iraque. Este processo político de transição deveria estar completo em 2004 ou 2005.

 

A elaboração da Constituição

O procedimento constituinte no Iraque desenrolou-se em duas fases. A primeira iniciou-se com a invasão do Iraque pela coligação e terminou com a eleição da Assembleia Nacional Transitória (ANT). Nesta fase, o projecto de Constituição foi elaborado essencialmente pelas autoridades ocupantes, com a colaboração de determinados actores iraquianos. A segunda fase, durante a qual a Constituição foi efectivamente elaborada e adoptada, teve início depois das eleições de Janeiro de 2005 e findou com o referendo que teve lugar a 15 de Outubro desse ano. Na realidade, o processo constituinte foi, pois, regulado por dois regimes diferentes e sucessivos38.

Inicialmente, a CPA pretendia nomear uma conferência nacional para redigir a Constituição, ao invés de o fazer através de eleições democráticas. Quer as Nações Unidas quer alguns sectores religiosos manifestaram-se contra esta hipótese inicialmente avançada pela CPA. O grande ayattolah Ali al-Sistani, um clérigo xiita recatado mas com uma enorme influência em todo o processo de transição, afirmou peremptoriamente que o plano era inaceitável e que não havia garantias de que o «Conselho produza uma Constituição que responda aos superiores interesses do povo iraquiano»39. A CPA acabou por aceitar um processo que incluía eleições directas e a elaboração de uma lei transitória que estabelecesse o enquadramento para a elaboração da Constituição.

A Lei de Administração para o Estado do Iraque durante o Período de Transição (TAL) foi adoptada a 8 de Março de 2004, durante o período de ocupação. Efectivamente, a tal foi elaborada pelo Conselho Governativo do Iraque, nomeado pela CPA. Para além desta interferência, funcionários da CPA intervieram directamente no processo de redacção, primeiro para assegurar que a tal seria redigida num curto espaço de tempo e depois para garantir que determinadas disposições seriam incluídas no documento final.

O preâmbulo da tal confere-lhe uma entoação liberal, apelando ao «povo do Iraque, desejoso de reclamar a sua liberdade que foi usurpada pelo anterior regime tirânico». Depois, no artigo 4.º da tal é estabelecido que o governo iraquiano será republicano, federal, democrático e pluralista. De facto, quase todas as partes envolvidas apoiavam alguma forma de federalismo para o Iraque. Naturalmente, a Turquia avisava, contudo, que uma estrutura federal seria instável e não tinha precedente na região40. O capítulo II da tal consagrava uma carta de direitos fundamentais inspirada no Bill of Rights dos Estados Unidos. O seu artigo 61.º define um calendário para o período transitório. Primeiro, a Assembleia Nacional redigiria o projecto de Constituição até 15 de Agosto de 2005. Depois, o projecto seria submetido ao povo iraquiano através de referendo a realizar até 15 de Outubro do mesmo ano. Se o resultado do referendo fosse positivo, seriam realizadas eleições para um governo permanente até 15 de Dezembro de 2005. Assim, após a eleição da ANT foi constituído o Comité Constitucional composto por 55 membros de forma proporcional à representação dos diversos partidos na ANT. Como os sunitas boicotaram as eleições, a comunidade sunita estava sub-representada naqueles dois órgãos. Ainda assim, foram empreendidos esforços no sentido de integrar sunitas no Comité Constitucional. A verdade é que os 25 sunitas entretanto escolhidos para participar na redacção da Constituição apenas integraram os trabalhos durante três semanas. Pese embora esta situação anómala, pode reconhecer-se ao Comité uma suficiente representatividade.

Em meados de Agosto, o controlo do processo de redacção passou para o Conselho de Liderança na tentativa de que fosse terminado dentro do prazo estabelecido. Com esta mudança, as tentativas de empreender um processo participado a nível nacional foram goradas. Por outro lado, uma vez que as regras de funcionamento do Conselho não eram claras, tal permitiu que funcionários americanos interviessem de forma directa nas negociações. Chegaram mesmo a encorajar o afastamento dos representantes sunitas para facilitar a obtenção de um consenso.

Verificou-se, pois, uma intervenção externa dos Estados Unidos e de outros estados da coligação no processo constituinte41. Em primeiro lugar, sabendo que a tal, elaborada sob influência directa dos Estados Unidos e do Reino Unido, funcionou como base da nova Constituição, observou-se uma transferência por osmose da interferência externa inicial para o texto da Constituição definitiva do Iraque. Depois, foram as potências ocupantes que determinaram o quadro procedimental para a elaboração da Constituição, tendo, igualmente, influenciado o Comité Constitucional. Por outro lado, funcionários da Embaixada dos Estados Unidos em Bagdade intervieram directamente no intuito de salvaguardar os interesses da coligação e, em particular dos Estados Unidos, no contexto das negociações.

Ainda assim, o Comité Constitucional conseguiu incorporar algumas disposições que se assumiam como um reflexo axiológico-normativo da sociedade do Iraque. Por outro lado, a Constituição prevê mecanismos capazes de resolver os focos de potencial violência: reverter a política de arabização no Norte; estabelecer uma estratégia para a questão do petróleo e para a distribuição dos seus rendimentos; e evitar a corrida ao controlo do poder central adoptando uma estrutura altamente descentralizada42. Ao contrário do que acontecia com a tal, a Constituição adopta o islão como religião oficial e fonte de direito43. Por outro lado, incluiu uma carta de direitos fundamentais diferente da prevista na tal, permitindo a limitação de direitos a título excepcional. Tendo adoptado um modelo de Estado federal, a Constituição apressou-se a consagrar o Curdistão como uma região federal, deixando para mais tarde a designação de outras regiões federais, num federalismo assimétrico, e a fazer da capital, Bagdade, uma província autónoma.

A Constituição acabou por ser adoptada a 15 de Outubro de 2005, na sequência do referendo popular. Entraria em vigor após a sua publicação no jornal oficial e a tomada de posse do novo Governo. Todavia, a Constituição e o Estado que os iraquianos pretendiam inicialmente, uma versão mesopotâmica do modelo escandinavo, não era compatível com os propósitos que alimentaram a intervenção da coligação no Iraque. A Constituição e o Estado que enquadrava foram antes moldados segundo um modelo neoliberal44. Comparando a Constituição de 1990, os projectos de 30 de Junho e de 20 de Julho de 2005, e o texto da Constituição adoptada, verifica-se uma evolução nesse sentido. O texto de 1990 estabelecia no seu artigo 12.º que competia ao Estado a responsabilidade de planear e dirigir a economia nacional com o propósito de estabelecer um sistema socialista científico e revolucionário. O projecto de 20 de Junho ainda faz referência à justiça social como sendo a base da construção da sociedade. Já o artigo 25.º da Constituição em vigor alude a um modelo económico neoliberal. Num outro exemplo, o artigo 110.º da Constituição vigente dispõe que será implementada uma estratégia política para desenvolver a indústria petrolífera com base nas mais «modernas técnicas assentes nos princípios de mercado e encorajando o investimento». Nem a Constituição de 1990, nem os projectos de 2005 previam disposições semelhantes. A intervenção externa na elaboração da Constituição do Iraque foi, pois, parcial. Mas parcial no seu grau máximo, sendo que a intervenção resvalou frequentemente para a ingerência indevida. Poder-se-á até defender que foi total no que respeita a alguns procedimentos e disposições essenciais da Constituição com reflexos políticos, sociais e económicos imediatos.

 

CONCLUSÃO

Numa situação de pós-conflito, os actores internacionais não podem pura e simplesmente deixar ao abandono milhões de pessoas num Estado debilitado, sem lei, pobres, doentes, com medo e sem expectativas. Quando o conflito resulta de uma intervenção externa, como aconteceu no caso do Iraque, a obrigação ética, jurídica e humana de empreender (também) um processo de statebuilding é incontornável. Porém, a tentação de intervir de forma parcial ou mesmo total, ao invés de apenas marginal, é muito grande. O que é ainda mais notório no caso extremo de uma invasão, como a do Iraque, em que os interesses que a motivaram arrasaram na sua passagem impiedosa os princípios que informam o statebuilding, incluindo o fundamental procedimento constituinte.

Este desvario arrisca-se a contribuir para a caracterização do statebuilding como uma quimera, ou pior, como um instrumento de expansão «imperialista». Pelo contrário, o statebuilding é um instrumento útil na transição pós-conflito, independentemente da sua origem. Haverá, porém, que saber gerir os dilemas que dele decorrem e criar e cumprir regras que garantam que não é indevidamente apropriado para legitimar transições preconcebidas de forma maquiavélica antes ainda de existir qualquer conflito ou que extravasem as necessidades e os interesses locais e regionais.

Apesar dos ténues esforços de outreach e de participação popular no processo de transição política, o statebuilding no Iraque, designadamente no que respeita à elaboração da Constituição, foi uma transição top-down liderada pelos Estados Unidos e por outros estados da coligação, bem como por algumas elites iraquianas. Este modo de empreender a transição é contrário ao que se deve pretender num processo de statebuilding, que deve assentar essencialmente numa dimensão local caracterizada por ampla participação e representatividade. Este facto levou ao falhanço de conseguir um acordo em 2005 relativamente à partilha do poder político e económico no Iraque45. Realmente, é duvidoso que do processo tenham resultado instituições legítimas, autónomas e eficazes. Actualmente, o Estado iraquiano ainda não consegue garantir o bem-estar das populações, a sua prosperidade e o fim da violência.

Do que transparece das necessidades identificadas no processo de elaboração de uma Constituição numa situação de pós-conflito, os actores internacionais, incluindo as Nações Unidas, não estão devidamente habilitados para conduzir um procedimento constituinte, ou mesmo para o orientar46. As lições que se podem retirar do exemplo extremo do Iraque são fundamentais para identificar as áreas em que o auxílio externo na elaboração de uma Constituição num processo de transição política pós-conflito pode ser optimizado. Em primeiro lugar, relativamente à participação da população, esta deve acontecer de forma permanente, começando antes sequer da adopção de qualquer projecto de Constituição. A população deve ser informada sobre o procedimento constituinte e sobre as propostas em discussão. Deve eleger, igualmente, o órgão que adoptará o projecto de Constituição. Bem assim, a aprovação da Constituição deve ser precedida de referendo popular. Em segundo lugar, todos os grupos políticos da comunidade estadual devem participar no procedimento constituinte de acordo com um critério de representatividade. O projecto de Constituição deve ser elaborado por uma assembleia constituinte eleita pela população, sem estar condicionada a priori por quaisquer directrizes. Finalmente, a intervenção dos actores externos pode ser benéfica se for marginal ou até parcial num nível de baixa intensidade, aconselhando e fornecendo os meios logísticos necessários. A intervenção pode ser oferecida, mas só deve acontecer quando for solicitada. Idealmente, a celeridade da intervenção permitirá maximizar os benefícios que o longo processo de statebuilding pode ter. Contudo, o momento adequado depende da conjuntura que envolve cada situação. Por outro lado, a imposição de condições relativamente ao seu papel no statebuilding e quanto à gestão dos recursos que trazem, se bem que aceitável dentro de certos limites, não pode de modo algum condicionar nem a vontade e o poder constituinte do povo nem o poder de decisão dos seus representantes.

Os actores externos devem, pois, cuidar para que a dinâmica de transição seja, no limite do possível, conduzida pelos actores locais e para que a sua intervenção seja equilibrada. Nestes termos, é inegável que o statebuilding e a elaboração de uma Constituição são fundamentais para os milhões de pessoas em todo o mundo que se viram fatalmente envolvidas num conflito que lhes consome as expectativas e lhes alimenta o desespero.

 

NOTAS

*O autor agradece o apoio que lhe é conferido pela Fundação Calouste Gulbenkian para a realização do programa de doutoramento.

1 BRAHIMI, Lakhdar – State Building in Crisis and Post-Conflict Countries. [Consultado em: 4 de Junho de 2009]. Disponível em: http://unpan1.un.org/intradoc/groups/public/documents/UN/UNpAN026305.pdf.

2 DIAMOND, Larry – «Lessons from Iraq». in Journal of Democracy. Baltimore. vol. 16, n.º 1, 2005, pp. 9-23.

3 PARIS, Roland, e SISK, Timothy – Managing Contradictions: the inherent dilemmas of Postwar statebuilding [Consultado em: 8 de Junho de 2009]. Disponível em: www.ipacademy.org/asset/file/211/iparpps.pdf.

4 UNITED NATIONS – An Agenda for Peace: Preventing diplomacy, Peacemaking and Peace-keeping. Report of the secretary-general A/47/277 – s/24111 of 17 June 1992.

5 DPKO – United Nations Peacekeeping Operations: Principles and guidelines. [consultado em: 4 de Abril de 2009]. Disponível em: http://pbpu.unlb.org/pbps/library/capstone_doctrine_eNg.pdf.

6 PARIS, Roland, e SISK, Timothy – «Understanding the contradictions of postwar statebuilding». In The Dilemmas of statebuilding: Confronting the Contradictions of Postwar Peace Operations. Oxon: Routledge, 2008, pp. 1-20.

7 FUKUYAMA, Francis – State-building: governance and World Order in the 21st Century. Nova York: Cornell University Press, 2004.

8 CHESTERMAN, Simon – You, the People: the United Nations, transitional administration, and state-building. Oxford: Oxford University Press, 2004.

9 FEARON, James, e LAITIN, David – «Neotrusteeship and the problem of weak states». In International Security. Cambridge. vol. 28, N.º 4, 2004, pp. 5-43.

10 KRASNER, Stephen – «sharing sovereignty: new institutions for collapsed and failing states». In International Security. Cambridge. vol. 29, N.º 2, pp. 85-120.

11 PARIS, Roland – At War’s end: building Peace after Civil Conflict. Cambridge: Cambridge University Press, 2004.

12 cf. PARIS, Roland, e SISK, Timothy – Managing Contradictions: the inherent dilemmas of Postwar statebuilding.

13 JEONG, Ho-Won – Peacebuilding in Postconflict societies: strategy and Process. Boulder: Lynne Rienner, 2005.

14 BRAHIMI, Lakhdar – State Building in Crisis and Post-Conflict Countries.

15 RAMSBOTHAM, Oliver – «Reflections on UN post-settlement peacebuilding». in Peacekeeping and Conflict Resolution. Londres: Frank Cass Publishers, 2000, pp. 169-189.

16 HAYSOM , Nicholas – «Conflict resolution, nation-building & constitution-making». In New England Journal of Public Policy. Boston. vol. 19, N.º 2, 2005, pp. 152--170.

17 CANOTILHO, José Joaquim Gomes – Direito Constitucional e teoria da Constituição. Coimbra: Livraria Almedina, 1998.

18 SAMUELS, Kirsti – «Post-conflict peace-building and constitution-making». in Chicago Journal of International Law. Chicago. Vol. 6, n.º 2, 2006, pp. 1-20.

19 RICHMOND, Oliver – «The globalization of responses to conflict and peacebuilding consensus». in Cooperation and Conflict. Tampere. vol. 39, N.º 2, 2004, pp. 129--150.

20 CANOTILHO, José Joaquim Gomes – Direito Constitucional e teoria da Constituição.

21 MIRANDA, Jorge – «Constituição e Integração». In A União Europeia e Portugal: a actualidade e o Futuro. Coimbra: Livraria Almedina, 2005, pp. 173-202, p. 174.

22 WIDNER, Jennifer – Constitution Writing and Conflict Resolution [consultado em: 8 de Junho de 2009]. Disponível em: www.wider.unu.edu/publications/working-papers/research-papers/2005/en_gb/rp2005-51/.

23 ibidem.

24 SAMUELS, Kirsti – «Post-conflict peace-building and constitution-making». in Chicago Journal of International Law. Chicago. vol. 6, N.º 2, 2006, pp. 1-20.

25 USIP – Iraq’s Constitutional Process: shaping a Vision for the Country’s Future. [consultado em: 8 de Junho de 2009]. Disponível em: www.usip.org/files/resources/sr132.pdf.

26 HAYSOM, Nicholas – «Conflict resolution, nation-building & constitution-making».

27 SAMUELS, Kirsti – « Post-conflict peace-building and constitution-making».

28 BARNETT, Michael, e ZÜRCHER, Christoph – «The Peacebuilder’s Contract: how External Statebuilding Reinforces Weak Statehood». in The Dilemmas of Statebuilding: Confronting the Contradictions of Postwar Peace Operations. Oxon: Routledge, 2008, pp. 23-52.

29 DANN, Philipp, e AL-ALI, Zaid – «The Internationalized Pouvoir Constituant: constitution-making under external influence in Iraq, Sudan and East Timor». In Max Planck Yearbook of United Nations law, vol. 10. Leida: Martinus Nijhoff Publishers, 2006, pp. 423-463.

30 De recordar que os inspectores das Nações Unidas que se encontravam no terreno a verificar o respeito pelas resoluções do conselho de segurança relativamente à existência de armas de destruição maciça tiveram de retirar do Iraque pouco tempo antes da invasão sem lhes ter sido dada a possibilidade de chegar a qualquer conclusão.

31 cf. Convenção da Haia IV sobre as Leis e os Costumes de Guerra em Terra, adoptada na Haia, a 18 de Outubro de 1907.

32 Resolução do Conselho De Segurança 1483 (2003), de 22 de Maio de 2003.

33 Resolução do Conselho De Segurança 1511 (2003), de 16 de Outubro de 2003.

34 PARIS, Roland, e SISK, Timothy – Managing Contradictions: the inherent dilemmas of Postwar Statebuilding; BRAHIMI, Lakhdar – State Building in Crisis and Post-Conflict Countries.

35 Actualmente apenas 32 por cento a 37 por cento da população (fonte: CIA – The World Fact book: Iraq. [Consultado em: 4 de Junho de 2009]. Disponível em: www.cia.gov/library/publications/the-world-factbook/geos/iZ.html).

36 Fonte: OPEC: ORGANIZ ATION OF THE PETROLEUM EXPORTING COUNTRIE S – Annual statistic bulletin:2007. [Consultado em: 10 de Junho de 2009]. Disponível em: www.opec.org/library/Annual%20statistical%20bulletin/Asb2007.htm.

37 apud CHANDRASEKARAN, Rajiv – Imperial Life in the Emerald City: Inside Baghdad’s Green Zone. Londres: Bloomsbury, 2008, p. 182.

38 WOLFRUM, Rüdiger – «Iraq – From Belligerent Occupation to Iraqi Exercise of Sovereignty: Foreign Power Versus International Community Interference». In Max Planck Yearbook of United Nations Law, vol. 9. Leida: Martinus Nijhoff Publishers, 2005, pp. 1-45.

39 apud ARATO, Andrew – «Sistani v. Bush: Constitutional Politics in Iraq». In Constellations Journal. Nova York. Vol. 11, N.º 2, 2004, pp. 1-27, p. 1.

40 PILPG – Establishing a stable democratic Constitutional structure in Iraq: some basic considerations. [Consultado em: 20 de Maio de 2009]. Disponível em: www.publicinternationallaw.org/publications/reports/iraqreport.pdf.

41 DANN, Philipp, e AL-AL I, Zaid – «The Internationalized Pouvoir Constituant: Constitution-Making under External Influence in Iraq, Sudan and East Timor».

42 IMAN, Mona – Iraq at a Juncture: Constitution, Referendum and Elections. [Consultado em: 20 de Maio de 2009]. Disponível em: http://usip.forumone.com/resources/iraq-juncture-constitution-referendum-and-elections.

43 cf. Artigo 2.º da Constituição.

44 DOCENA, Herbert – Iraq’s Neoliberal Constitution. [Consultado em: 4 de Junho de 2009]. Disponível em http://www.fpif.org/pdf/papers/0509constitution.pdf. Leia-se neste sentido, a título de exemplo, o muito sugestivo artigo 25.º da constituição do Iraque, que dispõe que «o estado garantirá a reforma da economia iraquiana de acordo com os princípios para assegurar o pleno investimento dos seus recursos, a diversificação das suas fontes, e o encorajamento e desenvolvimento do sector privado».

45 PAPAGIANNI, Katia – «State Building and Transitional Politics in Iraq: the Perils of a Top-down Transition». In International Studies Perspectives. Portland. N.º 8, 2007, pp. 253-271.

46 BRAHIMI, Lakhdar – State Building in Crisis and Post-Conflict Countries.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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