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Impactos ambientais decorrentes da ocupação de áreas reguladoras do aporte de areia: a planície Costeira da Caponga, município de Cascavel, litoral leste cearense.
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Impactos ambientais decorrentes da ocupação de áreas reguladoras do aporte de areia: a planície Costeira da Caponga, município de Cascavel, litoral leste cearense.

Impacts environnementaux liés à l'occupation de secteurs régulateurs de l'apport de sable : la plaine Côtière du Caponga, Cascavel, littoral du Ceará
Antonio Jeovah de Andrade Meireles

Resumos

Para definir os impactos ambientais associados à ocupação humana em áreas caracterizadas pelo aporte de sedimentos (bypass) para a faixa de praia, via campo de dunas e estuário, foram realizados estudos geoambientais na planície costeira da Caponga, abrangendo setores representados por um promontório, faixa litorânea e desembocadura do canal estuarino de mesmo nome. Os resultados foram representados em modelos evolutivos, integrados a partir da definição dos fluxos de matéria e energia que transitam na zona costeira. As conseqüências da expansão urbana sobre o promontório, dunas, praia e canal estuarino foram caracterizadas de modo a definir medias adequadas de planejamento e gestão.

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Texto integral

1A erosão que se processa ao longo do litoral cearense está gradativamente provocando o recuo da linha de costa. Em diversas praias foram evidenciadas influências das ações do homem no desencadeamento acelerado deste processo. Meireles et al. (2006) evidenciaram os principais indicadores morfogenéticos e processos erosivos relacionados com a ocupação de promontórios e margens dos estuários. Verificaram que a dinâmica costeira é completamente dependente do aporte de areia proveniente das dunas e que foi regulado a partir dos eventos trans-regressivos que ocorreram durante o Quaternário.

2O promontório na praia da Caponga, caracterizado como morfologia que atuou como dispersora de sedimentos, alimentadora de material arenoso para o sistema praial e reguladora dos fluxos de energia (eólico e ação das ondas), foi utilizado de forma inadequada. Como conseqüência, foi induzido um novo comportamento evolutivo, orientado para o avanço da erosão (MEIRELES et al., 2001; MORAIS e MEIRELES, 1994; MCLACHLAN e BURNS, 1992)

3As principais causas foram relacionadas com o desenvolvimento de processos energéticos representados pela ação das ondas, marés e velocidade dos ventos, combinadas com a disponibilidade de areia, configuração geomorfológica (formas e contornos do litoral) e principalmente pelo uso e ocupação da planície costeira. Nas praias de Parajuru, Morro Branco, das Fontes, Caponga, Iguape, Litoral Metropolitano de Fortaleza, Dois Coqueiros, Pacheco, Iparana, Icaraí, Pecém, Paracuru, Lagoinha, Mundaú, entre outras, foram evidenciados importantes avanços do mar continente adentro, originados e/ou acelerados pelos impactos ambientais decorrentes das intervenções no processo migratório das dunas móveis.

4Devido à interdependência existente entre os geoelementos que compõem uma planície costeira, intervenções humanas não planejadas irão afetar todo o conjunto de unidades e modificar os fluxos de energia. Desta forma, a definição e delimitação do potencial de suporte, áreas de riscos e vulnerabilidades das unidades ambientais, representa uma importante ferramenta de gestão e planejamento. Estudar o geossistema costeiro submetido a intervenções sistemáticas, interligando as atividades do homem com as reações ambientais, foi fundamental para a compreensão regional das transformações que se processaram no litoral cearense.

5A comunidade de Caponga até os anos de 1970, caracterizava-se, a exemplo de outras comunidades litorâneas no Ceará à época, como comunidade marítima. Dantas (2002) classifica estas comunidades pesqueiras como grupo humano a nutrir-se dos recursos do meio ambiente circundante. Atuava de modo a desenvolver atividades tradicionais, principalmente a pesca e a mariscagem, vinculadas à plataforma continental proximal e ao canal estuarino, respectivamente.  A partir dos anos 1985 inicia-se um processo de instalação de segundas residências, ocupando inicialmente a faixa de praia (instalando-se sobre a berma) com o deslocamento dos pescadores para o campo de dunas à retaguarda e margem direita do canal estuarino. Com a completa ocupação da faixa de praia, os setores de promontório e lagoas costeiras foram utilizados para a  expansão urbana, agora associada a pousadas, vias de acesso e conjuntos residenciais.

6Foram completamente artificializados os sistemas ambientais responsáveis pela dinâmica de aporte de sedimentos para a faixa de praia. Ao ser ocupado o promontório, praia e margens do canal fluviomarinho ­utilizado componentes morfológicos sob o domínio atual dos ventos, ondas e marés, como faixa de aspersão eólica, berma, planície de maré e manguezal - promoveu-se um déficit progressivo de areia ao longo de linha de praia. Para minimizar a erosão costeira foram edificados espigões, muros de enrocamento e gabiões paralelos à linha de costa e nas margens do canal estuarino, bloqueando as trocas laterais entre esses sistemas ambientais, principalmente as vinculadas com aporte de areia para o sistema praial, em uma extensão de 3,5 km.

7Através da precariedade do sistema de saneamento e a coleta de lixo, o canal estuarino e provavelmente o aqüífero, encontram-se associados a elevados índices de poluição, principalmente pelo lançamento de efluentes domiciliares. Com as intervenções definidas ao longo da planície costeira em estudo, evidenciou-se que, alterações na deriva litorânea dos sedimentos e a ocupação das margens do canal estuarino e construções de gabiões canalizando sua desembocadura, ocorreram alterações no fluxo hidrodinâmico, promovendo acúmulo de água estagnada. Com a deposição de areia no canal principal do estuário, assoreando largo trecho nas proximidades da faixa de praia, o volume de água armazenado não foi renovado, gerando déficit de sedimentos, antes sazonalmente aportado na linha de costa, durante os eventos de maior vazão fluviomarinha (primeiro semestre do ano).  

8Com a comparação de fotografias aéreas e imagens de satélite obtidas em diferentes épocas, foi possível evidenciar as interferências do uso e ocupação da planície costeira nos fluxos de matéria e energia e assim definir as conseqüências relacionadas com o incremento da erosão costeira. Os impactos ambientais relacionados com a degradação da paisagem litorânea, extinção do trecho de berma utilizado como porto das jangadas e descaracterização ecodinâmica do canal estuarino, foram algumas das conseqüências evidenciadas pela ocupação inadequada de setores da planície costeira responsáveis pela conservação de um aporte de sedimentos para a deriva litorânea.  

9Para a composição do modelo evolutivo da planície costeira da Caponga, foi também evidenciada a dinâmica sazonal existente entre as precipitações pluviométricas, insolação e velocidade dos ventos. Foi necessária para registrar que a ocupação de setores essenciais para a conservação da paisagem costeira e ecossistemas associados, não levou em conta a dinâmica imposta pelos fluxos de matéria e energia, desencadeando assim a degradação morfológica e diminuição da biodiversidade do ecossistema manguezal.

10O período chuvoso no litoral leste cearense concentra-se entre os meses de fevereiro e maio (com média de 1.331,7mm para a área de estudo). Durante esta época o principal sistema responsável pelas chuvas é a chamada Zona de Convergência Intertropical (ZCIT). Depois deste período a ZCIT se desloca até o hemisfério norte e as chuvas sobre a região cessam, iniciando-se um longo período de estiagem (MORENGO e UVO, 1997). A partir de julho as precipitações diminuem até o mês de novembro. Os meses de outubro e novembro registraram os mais baixos valores acumulados. O primeiro semestre responde por 93% da precipitação anual. Com relação à temperatura media mensal, foram registradas oscilações térmicas com médias que variam em torno de 27ºC, com máximas entre 31 a 32ºC (FUNCEME, 2006).

11Os índices médios mensais que apresentaram os menores valores de insolação foram registrados durante o período de maior precipitação, devido a uma maior nebulosidade. Os maiores valores situaram-se nos meses com menores índices de precipitação (agosto e outubro) e com valores mais altos de velocidade média dos ventos. Esses se apresentam no litoral como um importante componente da dinâmica da paisagem e fundamental para a composição dos modelos evolutivos propostos neste artigo. As direções predominantes no litoral cearense são de SE, ESE, E e NE. As médias de velocidade chegam a superar os 4,5 m/seg. nos meses mais secos. No período de estiagem (segundo semestre) procede-se um predomínio dos ventos de SE (são os ventos mais intensos). No inicio da estação chuvosa, com a chegada da ZCIT, registram-se mudanças na direção dos ventos, passando a predominar os de nordeste.

12A integração destes componentes atmosféricos demonstrou que a migração das dunas móveis ocorre no segundo semestre, associada aos valores mais elevados na velocidade dos ventos e insolação, e índices mais baixos de precipitação pluviométrica. Durante o primeiro semestre o aporte de areia para a faixa de praia diante da área urbana é realizado pela deriva litorânea de sudeste para noroeste, devido à fisionomia da linha de costa e direção preferencial dos ventos de leste e nordeste.

13Desta forma, os estudos foram realizados com o objetivo de definir as alterações morfológicas desencadeadas com a ocupação de áreas essenciais para a manutenção de um aporte de areia para a linha de costa e apresentar uma seqüência de medidas adequadas de utilização da zona costeira. Foi fundamentado na definição das interferências do homem nos fluxos de matéria e energia modeladores dos campos de dunas, faixa de praia e canal estuarino.

LOCALIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO

14A área de estudo está localizada no litoral leste do estado do Ceará (Figura 1) no município de Cascavel, no setor urbano da praia da Caponga e distando 60 km de Fortaleza. É importante salientar que ao longo do litoral foram definidos os setores de aporte de sedimentos para a faixa de praia. Trataram-se dos promontórios e canais fluviomarinhos que atuam como morfologias vinculadas à dinâmica praial, quando, a partir das dunas que bordejam a linha de costa e bancos de areia nos canais estuarinos, atuam como suporte de areia para a continuidade da deriva litorânea.  

15Os trabalhos de campo desenvolveram-se na área de influência direta do sistema fluviomarinho denominado de Caponga (riacho Caponga), dunas móveis e praias adjacentes (Figura 2). Abrangeram as unidades morfológicas associadas à área urbanizada e com o objetivo de diagnosticar as modificações dos fluxos de matéria e energia modeladores da zona costeira, alterados pela expansão do núcleo de pescadores. Este conjunto de unidades definiu uma área de aproximadamente 36,5 km2.

Figura 1 – Localização regional da área de estudo. Evidencia também os setores responsáveis pela manutenção de um volume de areia ao longo da faixa de praia, regulador da disponibilidade de sedimentos para a deriva litorânea (MEIRELES, 2001).

Figura 2 – Unidades geomorfológicas associadas à comunidade da Caponga. O setor urbano está inserido na faixa de praia, campo de dunas e canal fluviomarinho.

METODOLOGIA

16Para a definição dos sistemas ambientais (unidades morfológicas e ecossistemas associados) e os aspectos dinâmicos da planície costeira em estudo foram realizados mapeamentos geológicos e geomorfológicos em escala de detalhe. A dinâmica espaciotemporal foi definida a partir de fotografias aéreas, imagens de satélite e monitoramento do avanço erosivo ao longo da faixa de praia.

17Foram utilizadas imagens de satélite (Landsat TM-7, 2000 e 2003, Quick Bird, 2004) e fotografias aéreas (recobrimentos de 1959, 1968, 1996) para a compartimentação das unidades morfológicas e definição das áreas impactadas distribuídas na faixa de praia, campo de dunas e canal estuarino. Foram também utilizadas para a compartimentação dos setores relacionados com a fonte dos sedimentos para o campo de dunas e áreas onde ocorre o bypass (transferência de sedimentos a partir do sistema local de ação dos ventos, ondas e marés) de areia para a faixa de praia.

18Durante as atividades de campo e com a definição das relações de interdependência das dunas, canal estuarino e faixa de praia, foram caracterizados os fluxos de matéria e energia responsáveis pela morfogênese local. Procedeu-se desta forma para melhor representar os impactos ambientais de uso e ocupação da faixa litorânea e conseqüências associadas à dinâmica costeira. Nesta etapa dos trabalhos foram georreferenciados (GPS Gramin 12 SAD 69) os perfis descritivos dos componentes morfológicos e impactos ambientais. Adotou-se o método de posicionamento estático relativo, com processamento dos dados observados segundo normas do Sistema Geodésico Brasileiro – SGB, com sistema de referência o datum geodésico horizontal SAD69.

19Para a definição das unidades morfológicas levaram-se em conta os eventos eustáticos caracterizados por Meireles (2001), onde o canal estuarino, promontório associado a rochas de praia (beachrocks) dispostas na zona intermaré atual e campo de dunas, gradam lateralmente para terraços marinhos holocênicos (em parte recobertos pelas dunas). Este conjunto morfológico foi caracterizado como indicador de mudanças do nível relativo do mar e flutuações climáticas durante o Quaternário. Para a classificação dos campos de dunas foram utilizados os critérios elaborados por BAGNOLD (1941), CRISTIANSEN et al. (1990), ANGULO e LESSA (1997), MEIRELES e GURGEL, 1994).

20A integração dos processos geoambientais com a expansão da vila de pescadores da Caponga, gerou as bases processuais para a caracterização dos impactos ambientais, riscos, vulnerabilidades e medidas de gestão. Para isso foram definidas as morfologias utilizadas para a edificação de residências e equipamentos hoteleiros e os principais fluxos morfogenéticos associados. No que se refere às intervenções relacionadas com empreendimentos na foz do estuário (Caponga Beach Hotel e casas de segundas residências nas margens esquerda e direita, respectivamente), verificou-se os impactos decorrentes da ocupação das unidades morfológicas antes utilizadas pelas energias fluviomarinha, das ondas e marés e eólica. Para isso utilizaram-se recobrimentos aerofotogramétricos e imagens de satélite, de modo a dimensionar os setores suprimidos e pertencentes a áreas de preservação permanente (APP).

21A vulnerabilidade natural de cada unidade morfológica foi atribuída de modo qualitativo e levou em conta a relação entre a dinâmica morfológica e alterações dos agentes modeladores da planície costeira a partir da construção dos diques de enrocamento na desembocadura do riacho e faixa de praia (VASCONCELOS, 2005 e MEIRELES et al. 2006). Foi classificada a partir da análise integrada do campo de dunas, promontório, lagoas interdunares, sistema fluviomarinho (riacho Caponga) e faixa de praia. Foram associadas avaliações complementares relacionadas com os efeitos da sazonalidade climática (formação de lagoas, alterações no nível hidrostático, movimentação dos corpos dunares), acúmulo de sedimentos e interferências provocadas pelas ocupações de setores do riacho antes caracterizados por um complexo sistema de meandros associados ao manguezal.

22As limitações ambientais foram vinculadas às atividades relacionadas com a utilização de Áreas de Preservação Permanente (segundo as resoluções do CONAMA 303/2002 e 341/2003). As propostas para enfrentar a degradação da planície costeira no setor estudado, foram direcionadas para as iniciativas da gestão municipal e relacionadas com um conjunto de medidas minimizadoras dos impactos derivados da artificialização do canal estuarino, ocupação dos setores de bypass (aporte de areia para a faixa de praia no promontório) e berma.  

23As conseqüências ambientais da ocupação da planície costeira foram identificadas através da erosão progressiva ao longo de linha de costa, degradação dos ecossistemas lagunar e manguezal (poluição, desmatamento e contaminação da água e solo) e descaracterização morfológica do canal estuarino e assim contribuindo para a estagnação da água, antes renovada durante os eventos de maior vazão fluviomarinha.

FLUXOS DE MATÉRIA E ENERGIA.

24Foram caracterizados a partir da definição das principais morfologias originadas através dos processos de transporte, distribuição e deposição dos sedimentos e relações com a sazonalidade climática.  Foram identificados 4 tipos de fluxos de energia e transporte de sedimentos ao longo da planície costeira da Caponga (Figura 3). A integração definiu-se através da origem e evolução das dunas, lagoas costeiras, faixa de praia e sistema fluviomarinho:

  • Fluxo das ondas e marés – associado ao transporte de sedimentos na faixa de praia. Localmente está relacionado com a reflexão e refração das ondas a partir do promontório diante da vila da Caponga. Este promontório foi originado a partir da erosão diferencial relacionada a uma linha de rochas de praia (beachrocks) disposta na zona de estirâncio. Durante o primeiro semestre do ano, o aporte de areia proveniente da deriva litorânea supria de sedimentos a faixa de praia, uma vez que, no período chuvoso, diminui a fonte de areia proveniente do acesso das dunas móveis que migravam sobre o promontório e alcançavam a faixa de praia. A continuidade do transporte de sedimentos diante da vila e sobre a faixa de praia, prolongava-se até a desembocadura do riacho (originado flechas de areia em sua desembocadura). Durante o período de menor vazão fluviomarinha o canal era bloqueado através de flechas de areia na praia, favorecendo ao desenvolvimento de reações ambientais características de um sistema lagunar. Nos eventos de maiores vazões fluviomarinhas (primeiro semestre) as flechas de areia eram rompidas pela força hidráulica do riacho e assim contribuindo com areia para a faixa de praia. O aporte de sedimentos provenientes da deriva litorânea (como principal fonte o campo de dunas à leste da área urbana), proporcionou um largo setor de berma, ocupado com a expansão da vila de pescadores;

  • Hidrodinâmica do canal fluviomarinho (estuário do riacho Caponga) - vinculado ao aporte de água doce proveniente do sistema fluviomarinho e lagunar Lagoa da Velha Ana. Durante os eventos de maiores precipitações pluviométricas e contribuições do fluxo de água subterrâneo (associado ao campo de dunas e ao tabuleiro) estuário inundavam uma faixa da planície costeira atualmente ocupada por residências e vias de acesso. Com a expansão da vila de pescadores, utilizando as dunas, praia, setores antes destinados ao manguezal (impermeabilizando o solo, canalizando seu leito e utilizando a desembocadura para a edificação de residências e do Caponga Beach Hotel), foram acarretados danos ambientais diretamente relacionados com a diminuição da potencialidade de transporte hidrodinâmico e diminuição da biodiversidade. Desta forma, principalmente a partir da canalização da foz (gabiões) e ocupação da faixa de domínio do fluxo fluviomarinho durante os eventos de maior vazão (hotel e casa nas margens esquerda e direita da foz, respectivamente), iniciou-se o assoreamento do canal e estagnação da água acumulada à montante. Evidenciou-se também um déficit de sedimentos na faixa de praia, uma vez que a hidrodinâmica foi alterada, refletindo na deposição de sedimentos ao longo do canal e, principalmente na sua desembocadura, onde foram edificados os gabiões posicionados nas margens;

  • Fluxo eólico – Transporte de areia a partir da ação dos ventos. Com a predominância dos ventos de leste e nordeste, os sedimentos se deslocavam continente adentro e mais adiante alcançavam novamente a faixa de praia (logo após o promontório) e a margem direita do riacho Caponga. A acumulação de sedimentos eólicos no canal do estuário proporcionava a formação de bancos de areia, os quais, regidos a partir de então pela hidrodinâmica estuarina, eram transportados para a faixa de praia. Desta forma, antes da expansão da vila de pescadores, os sistemas morfológicos representados pela faixa de praia e canal estuarino do riacho Caponga, integravam-se com o sistema costeiro através de aportes regulares de sedimentos, evitando processos erosivos progressivos e,

  • Fluxo de água subterrânea – as características topográficas (mergulhando para a costa com altimetria partindo de 45m, associada ao campo de dunas sobre o tabuleiro), climáticas, geológicas (permeabilidade e porosidade da Formação Barreiras, dunas e terraços marinhos holocênicos) e morfológicas, definiram as condições geoambientais para a participação do aqüífero na origem e desenvolvimento das lagoas interdunares e do sistema fluviomarinho. No caso do estuário, o aqüífero alimenta de água doce e de sedimentos finos os canais que partem da zona de contato com o tabuleiro e as dunas. As lagoas costeiras foram associadas ao afloramento do lençol freático associado às dunas e tabuleiro litorâneo. Como aproximadamente 5 lagoas costeiras foram extintas com a expansão da vila de pescadores (comparando as fotografias aéreas de 1968 e 1996) e devido excesso de efluentes domiciliares, é provável alterações na quantidade  e qualidade do fluxo na composição do sistema costeiro local.  

Figura 3 – Fluxos de matéria e energia associados à planície costeira da Caponga. Foram definidos através do aporte de areia para os sistemas praial e fluviomarinho. Faixa de praia com fluxo regular de areia (sentido sudeste-noroeste) transportada através da ação das ondas. As conexões entre as morfologias caracterizadas localmente pelo promontório, campo de dunas, canal fluviomarinho e faixa de praia, através da ação dos ventos, ondas, marés e hidrodinâmica estuarina, definiram uma faixa de praia sem processos erosivos progressivos (fotografia aérea em escala 1:25.000 de 1968).

EVOLUÇÃO DO SISTEMA COSTEIRO ASSOCIADO AO CANAL ESTUARINO DO RIACHO CAPONGA.

25O sistema fluviomarinho atuava como canal de maré em conexão com a laguna Lagoa da Velha Ana. Antes da elevada artificialização do canal fluviomarinho, esse recebia sedimentos eólicos através do campo de dunas que migrava de sudeste para noroeste. Após acumular-se areia em seu leito, a hidrodinâmica transportava os sedimentos para a linha de praia. A figura 4 mostra a evolução da linha de costa a partir de fotografias aéreas de 1968 e 1996. As intervenções trataram também de interromper o transporte de areia associado ao promontório, através da expansão da vila de pescadores sobre as dunas que migravam na direção da margem direita do riacho e faixa de praia.

26Com a construção dos diques (gabiões) nas margens do canal fluviomarinho, foi impossibilitada a dinâmica regida pelos meandros naturalmente originados pela energia hidráulica durante os eventos de maior descarga do canal (período das chuvas no primeiro semestre). Os diques proporcionaram o acúmulo de areia dentro do canal de enrocamento e assim originou-se o barramento e estagnação da água à montante. A figura 5 evidencia o canal logo após sua artificialização e quando foi interrompido pelo fluxo de sedimentos. O canal restringiu-se a um único leito canalizado pelas estruturas em gabiões, o que alterou a potencialidade do transporte de areia pela energia hidrodinâmica na desembocadura.

Figura 4 - Mudanças morfológicas no sistema costeiro (praia, promontório, dunas e canal) a partir do crescimento da vila de pescadores (casas de segundas residências e pousadas). Ocorreu inicialmente o bloqueio do transporte eólico nas proximidades do promontório, seguido da ocupação das margens do canal e da faixa de praia (berma e estirâncio superior).

Figura 5 - Canal artificializado com a construção de dois diques de enrocamento (gabiões). Promoveu a delimitação de um leito fixo para o escoamento do fluxo hidráulico proveniente do sistema lagunar Lagoa da Velha Ana. As fotografias A e A’ obtidas de norte para sul (de jusante para montante) mostram que a obra de engenharia possibilitou o assoreamento do canal. As fotografias B e B’ (obtidas de sul para norte) também evidenciam o soterramento do canal por sedimentos provenientes tanto do transporte das ondas como pela ação dos ventos. Este conjunto de fotografias obtido nos anos 2003 e 2006 possibilitou observar que ocorreram alterações estruturais nos diques associadas a solapamentos e recalques.

27Aliado a este conjunto de intervenções na faixa de domínio do fluxo fluviomarinho, edificações em suas margens também auxiliaram na diminuição de seu potencial de transporte de areia para a faixa de praia e assim integrar-se com o sistema costeiro (como verificado em fotografias aéreas de 1959 e 1968). Em sua margem esquerda verificou-se um muro com aproximadamente 325m de extensão edificado em uma área de preservação permanente (APP) impedindo as trocas laterais com o terraço fluviomarinho adjacente. Esta intervenção também suprimiu uma área do canal associada ao ecossistema manguezal, antes ocupada por vegetação de mangue e fauna característica. A figura 6 mostra parte do muro que pertence ao empreendimento Caponga Beach Hotel (fotografias A e B), construído dentro do canal e assim interferindo na evolução hidrodinâmica e suprimindo uma área antes ocupada pelo manguezal. A fotografia C evidencia outro muro construído na margem direita do riacho.

28Estas intervenções geraram mudanças na configuração do canal estuarino em um trecho de 1,5 km de extensão. Alteraram a distribuição das águas com a retificação e terraplenagem das margens e suprimiram meandros com vegetação de mangue. Favoreceram o assoreamento do sistema fluviomarinho e estagnação da água.

Figura 6 - Muros de alvenaria edificados nas margens do canal fluviomarinho. Foram construídos de modo a ocupar áreas de preservação permanente. Impossibilitam as trocas laterais do canal com os terraços fluviomarinhos e ocuparam setores de expansão da vegetação de mangue. As fotografias A e B evidenciam um muro de aproximadamente 320m de extensão, que impediu a expansão do manguezal e alterou a hidrodinâmica ao longo de sua margem esquerda (possivelmente pertencente aos proprietários do Caponga Beach Hotel).  A fotografia C mostra outro muro localizado na margem direita do riacho.

29A evolução da linha de praia está associada a um déficit progressivo de sedimentos. De acordo com Morais e Meireles (1994) a ocupação dos setores definidos como berma e estirâncio superior em uma faixa litorânea relacionada com um promontório, foram as principais causas do avanço do mar continente adentro. A dinâmica imposta pelo acesso de sedimentos proveniente das dunas que ultrapassavam o promontório foi interrompida pela urbanização, impedindo o acesso de sedimentos à faixa de praia. Aliado à utilização inadequada dessa faixa do litoral da Caponga, as residências, pousadas e vias de acesso foram edificadas em setores de domínio das marés e dinâmica fluviomarinha. Este conjunto de intervenções inviabilizou o aporte de sedimentos pela ação dos ventos e a continuidade no fornecimento de areia para os setores de berma e estirâncio.

30Na faixa de praia associada à desembocadura do canal estuarino, constatou-se edificações posicionadas na área de domínio dos fluxos fluviomarinho e das ondas. De acordo com o levantamento de campo e a partir de fotografias aéreas de diferentes épocas, definiu-se que estas edificações atuaram como elementos indutores da erosão costeira. Foram instaladas em áreas antes ocupadas tanto pelo canal principal como por secundários, originados de acordo com a dinâmica de aporte de areia na desembocadura e vazão durante os eventos de máxima precipitação pluviométrica. As fotografias aéreas (1958, 1968 e 1996) e imagem de satélite (2002 e 2004), constataram que o canal ocupava as áreas que foram utilizadas para a construção da residência na sua margem direita e do Caponga Beach Hotel em sua margem esquerda.

31A figura 7, com os referidos recobrimentos aerofotogramétricos e a imagem de satélite, mostra que o canal estuarino foi canalizado a partir da expansão da vila de pescadores. As fotografias aéreas também evidenciaram que o canal estuarino, nas proximidades da faixa de praia, ocupava uma área que foi utilizada para a construção do Caponga Beach Hotel e casas de segunda residência, ocupando, desta forma, Áreas de Preservação Permanente (APP) e de domínio das ondas e marés (setores caracterizados como berma e estirâncio superior).

32Analisando ainda as fotografias aéreas dispostas na figura 7 observou-se que a expansão da vila de pescadores ocorreu ocupando lagoas interdunares. Com a deficiência do saneamento básico constatou-se que resquícios de lagoas e o lençol freático estão seriamente comprometidos por efluentes domiciliares. Verificou-se também que os locais mais comprometidos foram associados às áreas ocupadas por antigos moradores (deslocados de setores mais próximos da linha de costa) instalados na periferia do núcleo urbano.

Figura 7 - Mostra a evolução do riacho Caponga a partir dos meandros localizados na desembocadura. Evidenciou que os diques de enrocamento artificializaram o canal de modo a restringir seu leito para um único eixo de deságüe no mar. Acarretaram danos ambientais relacionados com a ocupação da Área de Preservação Permanente (APP) e diminuição de seu potencial de transporte (barramento da foz com areia proveniente da faixa de praia e estagnação da água acumulada em sua bacia hidráulica).

33As edificações instaladas na desembocadura do riacho ocupam setores antes destinados à dinâmica morfológica dessa unidade do sistema fluviomarinho. Durante o período chuvoso (primeiro semestre) a área ocupada pela residência logo à direita da desembocadura do canal e sobre a faixa de praia (ocupa a berma e o estirâncio superior), era utilizada como planície de inundação, fazendo parte, desta forma, do sistema fluviomarinho. Da mesma forma, as edificações pertencentes ao Caponga Beach Hotel ocuparam a planície de inundação e parte do canal principal do riacho Caponga.

34As residências localizadas na margem direita do riacho e diante da faixa de praia ocuparam setores antes relacionados com o transporte de sedimentos pela hidrodinâmica do canal estuarino e ondas. A figura 8 mostra que o posicionamento dos muros das casas de segundas residências está na zona de estirâncio, acessados pelas ondas durante a maré alta. Salienta-se que o referido muro da fotografia está associado a uma cerca de arame eletrificada, oferecendo riscos aos banhistas e pescadores que utilizam esta área para lazer e atividades de pesca, respectivamente. O muro da figura 8 B apresenta o aspecto de rolo de arame farpado que representa alto perigo de corte.

Figura 8 - Residência localizada na faixa de praia logo à leste da desembocadura do canal estuarino (margem direita). Verificar que está sobre a faixa de praia e ocupando área antes utilizada pelo fluxo hidrodinâmico do riacho (Fotografias A e B). A fotografia C mostra detalhe da placa de aviso “Perigo – cerca elétrica”, colocando em risco os banhistas e pescadores que frequentemente acessam a faixa de praia por este trecho.

35O Caponga Beach Hotel, localizado sobre terrenos pertencentes aos sistemas ambientais fluviomarinho e de praia, ocupa setores antes destinados ao processo natural de migração do canal fluviomarinho. Como a desembocadura está associada ao transporte de sedimentos por deriva litorânea (ação das ondas e marés), e de acordo com as observações de campo e fotografias aéreas e imagem de satélite, a localização do referido hotel também ocupou terraço fluviomarinho cuja dinâmica morfológica foi relacionada com antigos canais de escoamento natural do fluxo estuarino. A figura 9 mostra a proximidade do hotel com canal artificializado pelos diques de enrocamento. Evidencia também que durante eventos de máxima vazão do canal as edificações foram atingidas, provocando danos aos equipamentos edificados (muros e barracas de praia do hotel).

Figura 9 - Caponga Beach Hotel localizado à oeste dos diques de enrocamento e sobre terreno utilizado pela ação das ondas e marés e, antes acessado pelos meandros do riacho na desembocadura. As fotografias A e B evidenciam a proximidade do hotel com o canal (ocupando APP) e a C mostra a reconstrução do muro do hotel após um período de cheia.

36À montante das edificações localizadas na desembocadura do riacho ocorre uma séria de outras interferências também localizadas em áreas de preservação permanente (APP) à exemplo da representada na figura 10.

37O conjunto de intervenções localizadas nas margens do canal estuarino, principalmente as relacionadas com a canalização de sua desembocadura, alterando o potencial hidrodinâmico de transporte de sedimentos acumulado pela ação dos ventos e das ondas e assim promovendo um barramento do fluxo estuarino, acarretou também impactos associados à estagnação da água acumulada à montante. A figura 11 evidencia a água acumulada devido ao barramento do canal justamente na área de intervenção dos diques de enrocamento posicionados na desembocadura.

Figura 10 - Residência à montante do dique de enrocamento localizada na Área de Preservação Permanente (APP). No lado direito da fotografia o muro ao longo da margem do canal fluviomarinho e pertencente ao Caponga Beach Hotel (também ocupando APP).  Verificar que as intervenções foram realizadas dentro do leito do canal. Em segundo plano vegetação de mangue, evidenciando áreas de expansão do ecossistema manguezal suprimidas pela ocupação de áreas nitidamente pertencentes ao sistema fluviomarinho.

Figura 11 - Água estagnada com lixo acumulado (A) promovendo a contaminação por efluentes domiciliares e edificações nas margens do canal (B e C).

38Atualmente a faixa de praia encontra-se artificializada pela presença de espigões (gabiões) e muros de rocha paralelos à linha de costa. O conjunto de fotografias representado pela figura 12 evidencia a evolução da praia após as obras de engenharia costeira. Mostra que a continuidade dos processos energéticos provenientes das ondas e marés está promovendo a degradação das estruturas de controle erosivo e de equipamentos públicos. Os danos ambientais foram associados diretamente às atividades de pesca tradicional, como por exemplo, a supressão do porto das jangadas e inexistência de área adequada para as atividades de manuseio e conservação das embarcações.

Figura 12 - Evolução da faixa de praia diante da vila da Caponga após a construção dos espigões e muros paralelos à faixa de praia. Verificar que a ação das ondas continuou a danificar os equipamentos urbanos. A evolução do processo erosivo está alcançando a faixa de praia diante da residência e do hotel localizados na desembocadura do riacho Caponga.  

39Ao ser detectada a erosão costeira neste trecho do litoral cearense relacionado com a ocupação do setor de bypass de areia (MEIRELES e MORAIS, 1994), estudos realizados por Pinheiro et al. (2004) demonstraram que a continuidade da erosão foi associada a um déficit progressivo de areia na faixa de praia. A ação das ondas, já em uma faixa de praia com espigões e muros de enrocamento posicionados no estirâncio superior e, o precário estado de conservação, provocou danos de elevada magnitude ao sistema costeiro vinculado ao setor urbano. Os blocos de rocha dispersos sobre o estirâncio e a destruição de equipamentos públicos, já promovem impactos sócio-econômicos diretamente relacionados com os pescadores (supressão do porto das jangadas) e aos pequenos comerciantes (baixa balneabilidade).

40Os impactos cumulativos em uma extensão de 145km de linha de costa, entre os municípios de Cascavel (litoral leste) e São Gonçalo do Amarante (litoral oeste) da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF) provocaram a formação de 5 (cinco) importantes setores de erosão costeira (Figura 13), com uma extensão total de 52,1km (com 36% de litoral em elevado estado erosivo). Como a deriva litorânea comporta-se de sudeste para noroeste, as intervenções a partir de Caponga estão incrementando o déficit de areia na direção das praias do município de Fortaleza. Verificou-se que estão sendo urbanizados sobre o campo de dunas e margens de canais de maré e estuários.

41Como resultado, é provável o incremento da erosão entre as áreas mais intensamente erodidas, visto que o processo de urbanização não está levando em conta a permanência do aporte de areia para a faixa de praia, via campo de dunas e canais estuarinos. Desta forma, a ocupação da zona costeira metropolitana de Fortaleza poderá, a médio e longo prazos, ter uma faixa contínua de praia com déficit de sedimentos e, conseqüentemente, submetida à erosão acelerada, de forma contínua e progressiva.

Figura 13 – Setores de parte da Região Metropolitana de Fortaleza em processo erosivo associados à ocupação das áreas mantenedoras de um aporte regulador de sedimentos para a faixa de praia (promontórios e sistemas fluviomarinhos).

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES FINAIS

42A análise integrada da planície costeira relacionada com o riacho Caponga foi realizada de modo a fundamentar os impactos ambientais desencadeados com a ocupação das Áreas de Preservação Permanente (APP).

43A ocupação da área de transpasse de sedimentos eólicos sobre o promontório direcionado para a faixa de praia, refletiu em um processo erosivo contínuo e progressivo ao longo da linha de costa. Promoveu o recuo do setor de berma ao ponto de atingir as residências, pousadas e hotéis. Como resultado uma faixa de praia com muros paralelos à linha de costa e espigões posicionados na zona de estirâncio, com uma extensão de aproximadamente 3.500 metros.

44As edificações existentes ao longo do leito do riacho, principalmente as relacionadas com muros, diques de enrocamento (gabiões) na desembocadura do canal fluviomarinho, as residências e o hotel na área de domínio do fluxo hidrodinâmico na foz do canal, interferiram diretamente na evolução natural do sistema estuarino. Alteraram a disponibilidade de sedimentos na faixa de praia; modificaram o curso natural das águas estuarinas, com maior intensidade na sua desembocadura; promoveram a impermeabilização do solo e ocuparam unidades ambientais pertencentes à faixa de praia e ao sistema fluviomarinho. O processo de urbanização, a partir de uma vila de pescadores no final dos anos 1970, com a chegada das casas de segundas residências, ocorreu utilizando sistemas ambientais essenciais para a manutenção de um aporte regulador de areia ao longo da linha de costa.

45A Tabela I sintetiza a seqüência de unidades morfológicas analisadas, os impactos ambientais e os principais riscos. Associado à análise dos impactos e a partir das interferências nos fluxos de matéria e energia, foram caracterizadas as vulnerabilidades e as medidas de gestão necessárias para a melhoria da qualidade ambiental deste setor do litoral cearense.

TABELA I – CARACTERIZAÇÃO AMBIENTAL E IMPACTO NAS UNIDADES MORFOLÓGICAS.

Unidades Morfológicas

Impactos ambientais

Riscos

Vulnerabilidade

Medidas de Gestão

Faixa de praia

Ocupação dos setores de berma e estirâncio por residências; obstrução do acesso à praia; tráfego de veículos sobre a faixa de estirâncio. Ocupação do setor associada ao canal fluviomarinho; utilização de Terrenos de Marinha por casas de veraneio.

Incremento da erosão por supressão de áreas de domínio das energias das ondas e marés; interferir no aporte de areia destinado à deriva litorânea;

áreas de lazer devido aos blocos de rocha soltos no estirâncio; a médio prazo  a continuidade da erosão destruindo o calçadão e os espigões.

Elevada vulnerabilidade à ocupação dos setores de berma e estirâncio. Elevada vulnerabilidade à ocupação da faixa de praia associada ao riacho Caponga, principalmente nos setores relacionados com o aporte de areia proveniente da faixa de praia pela ação das ondas e mobilização pelo vento.

Demarcação dos Terrenos de Marinha; manutenção do muro paralelo à faixa de praia e dos espigões; desocupar áreas relacionadas com a dinâmica das ondas e marés; requalificação paisagística da faixa de praia. Retomada da dinâmica natural do riacho nas proximidades da faixa de praia.    

Campo de dunas móveis

Ocupação das dunas sobre o promontório; implantação de vias de acesso; mineração clandestina de areia para a construção civil; acúmulo de lixo; contaminação do lençol freático; urbanização em áreas de dunas promovendo a desconfiguração da paisagem dunar; impermeabilização do solo.  

Incremento contínuo da erosão costeira; contaminação da água armazenada no aqüífero dunar; extinção do campo de dunas; danos à fauna e flora.    

Elevada vulnerabilidade à expansão urbana e ao tráfego de veículos; construção de vias de acesso. Vulnerabilidade elevada do aqüífero quanto ao incremento da exploração do recurso hídrico e problemas de saneamento dos efluentes domiciliares.   

Fiscalização e monitoramento de modo a preservar os resquícios de dunas. Saneamento básico em toda a e assim minimizar a poluição da água armazenada no aqüífero dunar.  A exploração do aqüífero deverá ser monitorada e dimensionada a vazão de segurança. Proibir a exploração mineral das dunas remanescentes e recuperação ambiental dos corpos dunares em áreas mineradas.

Lagoas interdunares

Ocupação das margens por casas de segunda residência e de moradores de baixa renda; terraplenagem e aterros; lançamento de esgotos e desmatamento da mata ciliar.     

Danos á biodiversidade, qualidade da água e zonas de recarga do aqüífero. Fragmentação das lagoas devido à ocupação urbana.   Danos à fauna e flora local.

Elevada vulnerabilidade ao uso e ocupação de suas margens e leitos.

Saneamento básico e recuperação do leito das lagoas com projetos reflorestamento e de requalificação paisagística. Retiradas de edificações nas áreas de preservação permanente (APP). Ações de saúde comunitária para minimizar doenças infectocontagiosas.   

Manguezal

Desmatamento do manguezal; supressão de áreas de expansão do ecossistema através da construção de muros, aterros e terraplenagens. Bloqueio das trocas laterais com as lagoas e terraços fluviomarinhos. Contaminação da água do canal pelo lançamento de esgotos sem tratamento. Alterações na hidrodinâmica estuarina através da construção dos diques de enrocamento na desembocadura do riacho Caponga. Extinção de áreas antes ocupadas pelo manguezal.    

Danos à fauna e flora. Impactos na produtividade primária com a diminuição de áreas antes utilizadas pela cobertura vegetal e fauna. Os diques de enrocamento na desembocadura provocaram alterações no fluxo e na vazão da água salgada. Os aterros também ocuparam áreas antes utilizadas pelo manguezal.

Elevada vulnerabilidade frente às ações de bloqueio das trocas laterais e implantação de estruturas de engenharia que alterem o fluxo e a vazão da dinâmica estuarina. Elevada vulnerabilidade ao uso de áreas de expansão do manguezal, interferindo diretamente na produtividade primária.   

Retomada do fluxo das marés com a retirada do volume de areia na desembocadura, acumulado entre os diques de enrocamento. Ampliação da área de acesso do fluxo das marés, com a retirada dos diques e manejo do aporte de areia proveniente da praia. Retirada dos muros e residências edificados nas margens do canal (APP) para assim promover a regeneração do ecossistema manguezal. Medidas de saneamento básico para melhoria da qualidade da água.   

 Fonte: elaboração própria.

46Devido à alta vulnerabilidade do aqüífero e lagoas costeiras e ao precário tratamento dos efluentes, medidas de gestão deverão ser relacionadas com o saneamento básico. Deverão ser aliadas à requalificação paisagística da faixa de praia, retomada do fluxo natural do sistema estuarino (com renovação da água estagnada à montante e dragagem), refletindo diretamente na retomada da qualidade da água armazenada e, consequentemente, melhoria na qualidade de vida da comunidade.

47Os dados também revelaram aspectos relacionados à necessidade de uma gestão costeira integrada, principalmente com os municípios da Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). As intervenções existentes na praia da Caponga, interceptando o fluxo de sedimentos para a praia (zonas de estirâncio e berma), proporcionaram impactos cumulativos, quando associadas aos demais setores onde os promontórios e margens de rios estão em processo acelerado de ocupação. Com o déficit de areia gerando erosão ao longo do litoral leste da RMF, praias como Porto das Dunas (Aquiraz) e dos municípios de Fortaleza, Caucaia e São Gonçalo do Amarante Parece faltar alguma idéia. Tal como “praias como Porto das Dunas (Aquiraz) e dos municípios de Fortaleza, Caucaia e São Gonçalo do Amarante podem ser seriamente comprometida”.

Bibliografia

48ANGULO, R.J. e LESSA, G.C. The Brasilian sea-level curves: a critical review with emphasis on tre curves fron Paranaguá and Cananeia regions. Marine Geology, 140 (1997) 141-166.

49BAGNOLD, R.A. The physics of  blownsand and desert dune. 1ª ed., London 1941, 265p.

50CRISTIANSEN, C.; DALSGAARD, K.; MOLLER, J.T. & BOWMAN, A.D. –1990– Coastal dune in denwark chronology in relation to sea level. In: Bakker, T.W., Jungerives, P.D. & Klijn, J.A. (ed.), Dunes of European coasts–Geomorphology–Hydrology– Soils.. Journal of the international society of Soil Science, Supplement 18, p.61-70.

51DANTAS, E.W.C. Mar à vista: estudo da maritimidade em Fortaleza. Fortaleza: Museu do Ceará/Secretaria da cultura e Desporto do Ceará, 2002, 75p.

52FUNCEME Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Naturais - Governo do Estado do Ceará. Fortaleza/Ceará, 2006.

53MCLACHLAN,  A  e BURNS, M. Headland bypass dunes on the South African coast: 100 yars of (mis)management. Coastal dunes,  Carter,  Curtis  &  Sheehy-Skeffington (eds).1992 Belkema, Rotterdam, 71-79.

54MEIRELES, A.J.A. Morfologia litoral y sistema evolutivo de la costa de Ceará – Nordeste de Brasil. Tesis Doctoral, Universidad de Barcelona, España, 2001, 353p.

55MEIRELES, A.J.; VICENTE da SILVA, E. e THIERS, P.R.L. Os campos de dunas móveis: fundamentos dinâmicos para um modelo integrado de planejamento e gestão da Zona Costeira. Revista GEOUSP,  vol 20, 2006, 101-119p.

56MEIRELES, A.J.A. e RUBIO ROMERO, P. Geomorfología litoral: una propuesta metodológica sistémica en la llanura costera de Ceará, nordeste de Brasil. Revista de Geografia, Universitat de Barcelona, España; 32/33 (2000): 165-182.

57MEIRELES, A.J.A. e GURGEL Jr., J.B. Dinâmica costeira em áreas com dunas móveis associadas a promontórios, ao longo do litoral cearense. 38o Cong. Bras. de Geologia, Balneário de Camboriú/SC. Anais...v1, 1994, 403-404p.

58MEIRELES, A.J.A. e MORAIS, J.O. Compartimentação geológica, processos dinâmicos e uso e ocupação da Planície Costeira de Parajuru, município de Beberibe, litoral leste do Estado do Ceará. Revista de Geologia 7 (1994): 69-81.

59MEIRELES, A.J.A.; SERRA, J. R e MONTORI, C.B. Evolução paleogeográfica da planície costeira de Jericoacoara, litoral oeste cearense. Revista Paranaense de Geografia, 2001, vol 7: 1-12.

60MORAIS, J. O., MEIRELES, A. J. A. Riscos geológicos associados a dinâmica costeira na praia de Caponga, município de cascavel, estado do Ceará. Revista de Geologia. , p.139 - 144, 1994.

61MORENGO, J.A. e UVO, C.B. Variabilidade e mudança climática no Brasil e América do Sul. Climanálises: boletim de monitoramento e análise climática – edição especial comemorativa de 10 anos; Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos (CPTEC) e Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) [consulta realizada em 10/10/2006]. Disponível em http://www.cptec.inpe.br/​products/​climanalise/​cliesp10a/​mudanca.html.

62PINHEIRO, L. S. ; MORAIS, J. O.; MEDEIROS, C. ; PITOMBEIRA, E. S. . The gabions for the protection of Caponga Beach, Ceará/Brazil: Hazards and Management. Journal of Coastal Research, Itajaí, v. 39, p. 235-245, 2004.

63VASCONCELOS, F. P. . Gestão Integrada da Zona Costeira - Ocupação antrópica desordenada, erosão assoreamento e poluição ambiental do litoral. 1. ed. Fortaleza: Premius, 2005. v. 1. 87p.

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Tabela das ilustrações

Legenda Figura 1 – Localização regional da área de estudo. Evidencia também os setores responsáveis pela manutenção de um volume de areia ao longo da faixa de praia, regulador da disponibilidade de sedimentos para a deriva litorânea (MEIRELES, 2001).
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Legenda Figura 2 – Unidades geomorfológicas associadas à comunidade da Caponga. O setor urbano está inserido na faixa de praia, campo de dunas e canal fluviomarinho.
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Legenda Figura 3 – Fluxos de matéria e energia associados à planície costeira da Caponga. Foram definidos através do aporte de areia para os sistemas praial e fluviomarinho. Faixa de praia com fluxo regular de areia (sentido sudeste-noroeste) transportada através da ação das ondas. As conexões entre as morfologias caracterizadas localmente pelo promontório, campo de dunas, canal fluviomarinho e faixa de praia, através da ação dos ventos, ondas, marés e hidrodinâmica estuarina, definiram uma faixa de praia sem processos erosivos progressivos (fotografia aérea em escala 1:25.000 de 1968).
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Legenda Figura 4 - Mudanças morfológicas no sistema costeiro (praia, promontório, dunas e canal) a partir do crescimento da vila de pescadores (casas de segundas residências e pousadas). Ocorreu inicialmente o bloqueio do transporte eólico nas proximidades do promontório, seguido da ocupação das margens do canal e da faixa de praia (berma e estirâncio superior).
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Legenda Figura 5 - Canal artificializado com a construção de dois diques de enrocamento (gabiões). Promoveu a delimitação de um leito fixo para o escoamento do fluxo hidráulico proveniente do sistema lagunar Lagoa da Velha Ana. As fotografias A e A’ obtidas de norte para sul (de jusante para montante) mostram que a obra de engenharia possibilitou o assoreamento do canal. As fotografias B e B’ (obtidas de sul para norte) também evidenciam o soterramento do canal por sedimentos provenientes tanto do transporte das ondas como pela ação dos ventos. Este conjunto de fotografias obtido nos anos 2003 e 2006 possibilitou observar que ocorreram alterações estruturais nos diques associadas a solapamentos e recalques.
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Legenda Figura 6 - Muros de alvenaria edificados nas margens do canal fluviomarinho. Foram construídos de modo a ocupar áreas de preservação permanente. Impossibilitam as trocas laterais do canal com os terraços fluviomarinhos e ocuparam setores de expansão da vegetação de mangue. As fotografias A e B evidenciam um muro de aproximadamente 320m de extensão, que impediu a expansão do manguezal e alterou a hidrodinâmica ao longo de sua margem esquerda (possivelmente pertencente aos proprietários do Caponga Beach Hotel).  A fotografia C mostra outro muro localizado na margem direita do riacho.
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Legenda Figura 7 - Mostra a evolução do riacho Caponga a partir dos meandros localizados na desembocadura. Evidenciou que os diques de enrocamento artificializaram o canal de modo a restringir seu leito para um único eixo de deságüe no mar. Acarretaram danos ambientais relacionados com a ocupação da Área de Preservação Permanente (APP) e diminuição de seu potencial de transporte (barramento da foz com areia proveniente da faixa de praia e estagnação da água acumulada em sua bacia hidráulica).
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Legenda Figura 8 - Residência localizada na faixa de praia logo à leste da desembocadura do canal estuarino (margem direita). Verificar que está sobre a faixa de praia e ocupando área antes utilizada pelo fluxo hidrodinâmico do riacho (Fotografias A e B). A fotografia C mostra detalhe da placa de aviso “Perigo – cerca elétrica”, colocando em risco os banhistas e pescadores que frequentemente acessam a faixa de praia por este trecho.
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Legenda Figura 9 - Caponga Beach Hotel localizado à oeste dos diques de enrocamento e sobre terreno utilizado pela ação das ondas e marés e, antes acessado pelos meandros do riacho na desembocadura. As fotografias A e B evidenciam a proximidade do hotel com o canal (ocupando APP) e a C mostra a reconstrução do muro do hotel após um período de cheia.
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Legenda Figura 10 - Residência à montante do dique de enrocamento localizada na Área de Preservação Permanente (APP). No lado direito da fotografia o muro ao longo da margem do canal fluviomarinho e pertencente ao Caponga Beach Hotel (também ocupando APP).  Verificar que as intervenções foram realizadas dentro do leito do canal. Em segundo plano vegetação de mangue, evidenciando áreas de expansão do ecossistema manguezal suprimidas pela ocupação de áreas nitidamente pertencentes ao sistema fluviomarinho.
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Legenda Figura 11 - Água estagnada com lixo acumulado (A) promovendo a contaminação por efluentes domiciliares e edificações nas margens do canal (B e C).
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Legenda Figura 12 - Evolução da faixa de praia diante da vila da Caponga após a construção dos espigões e muros paralelos à faixa de praia. Verificar que a ação das ondas continuou a danificar os equipamentos urbanos. A evolução do processo erosivo está alcançando a faixa de praia diante da residência e do hotel localizados na desembocadura do riacho Caponga.  
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Legenda Figura 13 – Setores de parte da Região Metropolitana de Fortaleza em processo erosivo associados à ocupação das áreas mantenedoras de um aporte regulador de sedimentos para a faixa de praia (promontórios e sistemas fluviomarinhos).
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Para citar este artigo

Referência electrónica

Antonio Jeovah de Andrade Meireles, « Impactos ambientais decorrentes da ocupação de áreas reguladoras do aporte de areia: a planície Costeira da Caponga, município de Cascavel, litoral leste cearense. », Confins [Online], 2 | 2008, posto online em 13 Março 2008, Consultado o 27 Fevereiro 2014. URL : http://confins.revues.org/2423 ; DOI : 10.4000/confins.2423

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Autor

Antonio Jeovah de Andrade Meireles

Prof. Dr. do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Ceará (UFC), Pós Graduação em Geografia (UFC), meireles@ufc.br

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