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Revista Eletrônica de Enfermagem
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Artigo Original

 

Salicio DMBS, Gaiva MAM. O significado de humanização da assistência para enfermeiros que atuam em UTI. Rev. Eletr. Enf. [Internet]. 2006;8(3):370-6. Available from: http://www.fen.ufg.br/revista/revista8_3/v8n3a08.htm

 

O significado de humanização da assistência para enfermeiros que atuam em UTI1

 

The meaning of humanization assistance for nursing working in the intensive care UNITS

 

El significado del humanización del cuidado de las enfermerías que actúan em la Unidad de Terapia Intensiva

 

 

Dalva Magali Benine SalicioI, Maria Aparecida Munhoz GaivaII

IEnfermeira da Secretaria Estadual de Saúde – Hemocentro, Cuiabá/MT. E-mail: dalvabenine@brturbo.com.br

IIEnfermeira, Profª Drª da Faculdade de Enfermagem da UFMT, Cuiabá/MT

 

 


RESUMO

Trata-se de um estudo descritivo numa perspectiva qualitativa, com o objetivo compreender o significado da humanização da assistência para um grupo de oito (8) enfermeiros que atuam em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) na cidade de Cuiabá-MT. Os dados foram coletados por meio de entrevistas semi-estruturadas, no período de julho a agosto de 2005, orientadas pelas seguintes questões: Como você vê a questão da humanização? Como esta a humanização em sua UTI? A análise pautou-se na técnica de análise temática e foi realizada a partir da identificação de três núcleos temáticos: o trabalho da enfermagem em UTI; o significado da humanização e a realidade da humanização nas UTIs estudadas. Apesar dos enfermeiros reconhecerem a importância de se prestar uma assistência integral, ainda convivem em seu cotidiano de trabalho com inúmeras dificuldades para efetivar uma assistência humanizada.

Palavras chave: Humanização da assistência; Cuidados intensivos; Qualidade da assistência à saúde; Prestação de cuidados de saúde.


ABSTRACT

This is a descriptive study in a qualitative perspective, with the objective to understand the meaning of humanization assistance for a group of eight (8) nurses working in the Intensive Care Units in Cuiabá-MT. The data had been collected through semi structured interviews, from july to august 2005, oriented by the following questions: How do you see the question of the humanization? How is this humanization in your UTI? The analysis was based on thematic analysis technique and was accomplished through three thematic points: the work of the nursing in UTI; the meaning of the humanization and the reality of the humanization in the UTIs studied. Despite the nurses recognized the importance of giving an integral assistance, they still have daily work with innumerable difficulties to accomplish a humanized assistance.

Key words: Assistance humanization; Intensive care; Health care quality; Health care.


RESUMEN

Este es un estudio descritivo en uma perspectiva cualitativa, con el objetivo de comprender el significado del humanización del cuidado para un grupo de ocho (8) enfermeros que actúan en la unidad de Terapia Intensiva (UTI) de Cuiabá-MT. Los datos fueran recogidos con entrevistas semi-estruturadas, en el período de julio a agosto de 2005, con base en las seguintes questiones: Cómo usted ve la cuestión del humanización? Cómo esto el humanización en su UTI? La analisis fue hecha a traves de la tecnica de analisis temática y a partir de la identificación de tres núcleos tematicos: el trabajo del oficio de enfermera en UTI; el significado del humanización y la realidad del humanización en el UTIs estudiaron. A pesar de las enfermeras que reconocen la importancia de si dan una ayuda integral, alambique coexisten en su diaria de dificultades innumerables del trabajo para lograr una ayuda del humanizado.

Palabras clave: Humanización de la asistencia; Cuidados intensivos; Cualidad de la asistencia a salud; Prestación de cuidados de salud.


 

 

INTRODUÇÃO

A hospitalização em Unidade de Terapia Intensiva (UTI), uma unidade preparada para atender pacientes graves ou potencialmente graves, apesar de contar com assistência médica e de enfermagem especializadas e contínuas e dispor de equipamentos diferenciados, expõe o paciente a um ambiente hostil, com exposição intensa a estímulos dolorosos, onde a luz contínua, bem como procedimentos clínicos invasivos são constante em sua rotina de cuidados.

Partindo do pressuposto que a Unidade de Terapia Intensiva é um ambiente que concentra pacientes graves, mais recuperáveis, cuidados por profissionais que se empenham para maximizar suas chances de viver mais e, principalmente melhor e com uma assistência de qualidade e humanizada, temos assistido nos últimos anos um considerável crescimento e aprimoramento de ações concretas destinadas a promover a humanização da assistência hospitalar no âmbito das UTIs.

O Programa Nacional de Humanização Hospitalar - PNHAH, foi instituído pelo Ministério da Saúde, através da portaria nº 881, de 19 /06/ 2001, no âmbito do Sistema Único de Saúde (BRASIL, 2002). O PNHAH faz parte de um processo de discussão e implementação de projetos de humanização do atendimento a saúde e de melhoria da qualidade do vinculo estabelecido entre trabalhador da saúde, pacientes e familiares.

Para FERREIRA (1988, p 346) humanização é “tornar-se humano, humanar-se. Tornar benévolo, afável, tratável, humano. Fazer adquirir hábitos sociais polidos; civilizar”.

Humanizar de acordo com os valores éticos consiste fundamentalmente, em tornar uma prática bela, por mais que ela lide com o que tem de mais degradante, doloroso e triste na natureza humana, o sofrimento, a deterioração e a morte. Refere-se, portanto, a possibilidade de assumir uma posição ética de respeito ao outro e de reconhecimento dos limites. O ponto chave do trabalho de humanização está no fortalecimento desta posição ética de articulação do cuidado técnico cientifico, já construído, conhecido e dominado, ao cuidado que incorpora a necessidade, a exploração e o acolhimento do imprevisível, do incontrolável, ao indiferente e singular (MORAES et al, 2004).

A humanização dos serviços deve ser vista não enquanto um modismo, mas como uma questão que vai além dos componentes técnicos, instrumentais, que envolve as dimensões político – filosóficas que lhe dão sentido (CASATE & CORRÊA, 2005).

O respeito aos direitos dos pacientes na prática cotidiana em terapia intensiva, passa pelo questionamento dos próprios pacientes e familiares e pela abertura de espaços para diálogo com os próprios profissionais de saúde, tornando essa prática mais humanizada.

Mais uma vez é importante lembrarmos que a construção de uma assistência humanizada em UTI é um processo com metas no curto, médio e em longo prazo, impulsionada por medidas de avaliação e da capacidade de aprender com a própria experiência e a dos outros.

Entendemos que enquanto todos nós, profissionais enfermeiros, não nos empenharmos em prestar uma assistência mais “humana”, colocando-nos sempre na situação do “outro”, fragilizado, dependente, carente, a procura de um tratamento de respeito, não conseguiremos prestar uma assistência humanizada.

Este estudo tem como objetivo compreender o significado da humanização da assistência, atribuído por enfermeiros que atuam em Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), de Cuiabá –MT.

 

METODOLOGIA

Devido às particularidades e subjetividades presentes no estudo o princípio metodológico de escolha foi baseado na perspectiva da pesquisa de abordagem qualitativa, pois esta trabalha com o universo dos significados (motivos, aspirações, valores e atitudes), fatores estes, essenciais para tentar compreender e explicar a dinâmica das relações humanas (MINAYO, 2000).

A pesquisa foi realizada na cidade de Cuiabá – MT, que conta atualmente com oitenta (80) leitos de cuidados intensivos adulto, distribuídos em sete (07) UTIs, sendo duas públicas e cinco privadas. Fizeram parte deste estudo oito (08) enfermeiros que atuavam nestas UTIs. Considerando a natureza do estudo, a definição do número de entrevistados considerou a variabilidade observada nas respostas e a saturação teórica.

Na execução da pesquisa os aspectos éticos definidos na resolução 196/96, sobre a pesquisa com seres humanos (BRASIL, 1996). Dessa forma, o projeto foi encaminhado e aprovado por um Comitê de Ética em Pesquisa. Os enfermeiros que concordaram em participar do estudo receberam informações detalhadas sobre sua finalidade e objetivos e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Os dados foram colhidos no período de julho a agosto de 2005, utilizando para tal a entrevista semi-estruturada, por proporcionar uma maior possibilidade de integração com os sujeitos de estudo, valorizando a vivência individual dos participantes e compreensão das particularidades cultural de cada grupo (MINAYO, 1999). As entrevistas foram realizadas no local de trabalho dos enfermeiros, mediante um roteiro pré-elaborado com as seguintes questões norteadoras: Como você vê a questão humanização? Você considera a humanização importante? Como está a humanização em sua unidade?

Os depoimentos foram gravados após a autorização dos entrevistados, mediante a garantia do sigilo e do anonimato, e posteriormente foram transcritos pela pesquisadora. Para preservar o anonimato dos participantes, cada entrevistado foi identificado por um número. A análise dos dados foi realizada segundo as diretrizes do método qualitativo, ordenação, classificação em categorias empíricas, síntese e interpretação dos dados (MINAYO, 2000).

 

DESCRIÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS

Os participantes do estudo foram oito (8) enfermeiros que atuavam em UTIs adulto públicas e privadas, sendo quatro (4) do sexo feminino, e quatro (4) do sexo masculino. A idade variou de 27 a 39 anos e a média do tempo de formação foi de três (03) meses a nove (9) anos. A maioria dos enfermeiros atuava a mais de três (3) anos em UTI.

A partir da organização e análise dos dados foram identificadas três categorias que deram sentido ao significado de humanização da assistência: O trabalho da enfermagem em UTI, Significado de humanização e a Realidade da humanização nas UTIs estudadas, as quais serão descritas e analisadas a seguir.

O trabalho da enfermagem em UTI

Ao falarmos em cuidado de enfermagem ao ser humano, seja voltado para a assistência direta ou para as relações de trabalho, implica essencialmente falar de cuidado humanizado. Contudo é importante ressaltar que muitas vezes devido à sobrecarga imposta pelo cotidiano do trabalho, a enfermagem presta uma assistência mecanizada e tecnicista, não reflexiva, esquecendo de humanizar o cuidado (COLLET & ROZENDO, 2003).

Os enfermeiros ao falarem em humanização retratam o cotidiano do trabalho em UTI, que para eles é um trabalho estressante, cansativo e desgastante, não só pela sobrecarga de trabalho, mas também pelo grau de cuidados que os pacientes requerem.

“A UTI é um trabalho difícil e estressante, mais assim ao mesmo tempo, é uma coisa que quando você está mergulhado no trabalho você não vê tudo isso...”(Enfermeiro 1).

“...o trabalho é cansativo, porque você tem, você se doa mais para o paciente, tem que estar mais de olho nele, os cuidados são maiores e tem mais o que fazer por eles né”. ( Enfermeiro 2).

“É um trabalho de muito envolvimento, meu trabalho não é gerenciamento é de muita assistência” (Enfermeiro 8).

Para LOPES & LAUFERT (2001) o ambiente da UTI é caracterizado por um trabalho que envolve uma forte carga emocional, na qual vida e morte se misturam, compondo um cenário desgastante e, muitas vezes, frustrante.

Ainda nesse sentido, COUTRIN et al (2003) afirmam que os fatores estressantes no trabalho da enfermagem são: o lidar com o sofrimento do paciente e da família, o fazer específico da profissão (que requer agilidade, atenção e renovação de conhecimentos técnicos), a necessidade de improvisação, as questões de ordem burocrática, o inter-relacionamento com a equipe e o barulho constante dos aparelhos.

Dentre os fatores que produzem estresse no trabalho os enfermeiros referem também a organização e as condições do trabalho na UTI. Os depoimentos a seguir exemplificam essas situações:

“Boa parte do tempo tem de fazer a sistematização... porém não consigo fazer, por conta do número insuficiente de funcionários” (Enfermeiro 3).

“É um pouco estressante do ponto de vista que você, às vezes faltam as condições necessárias para você atender seu cliente... vai desgastando né, todos os dias a mesma coisa, acaba que vai estressando né, vai ficando difícil você trabalhar”. (Enfermeiro 8).

“...estressante quando se tem poucos funcionários para muitos pacientes, ai ele é estressante porque dobra seu esforço, então a UTI exige muito de nós”. (Enfermeiro 2).

Para VILA & ROSSI (2002) a equipe de enfermagem que atua em UTI está exposta a um nível maior de estresse, porque presta assistência direta aos pacientes e familiares e também tem que lidar com suas próprias emoções e conflitos.

Por outro lado, os sujeitos do estudo identificam situações prazerosas no trabalho na UTI, principalmente aquelas ligadas à recuperação do paciente e seu retorno para o convívio familiar.

“O trabalho é corrido, é bem trabalhoso, mas é recompensado, recompensa quando a gente tem êxito, quando o paciente melhora e vai embora isto para a gente é muito gratificante” (Enfermeiro 7).

Para que os profissionais de saúde/enfermagem possam prestar uma assistência de qualidade e humanizada, se faz necessário ter sua dignidade e condição humana respeitada, recebendo uma remuneração justa, condições adequadas de trabalho e ter seu trabalho reconhecido e valorizado (BACKES et al, 2006).

O Significado de Humanização

A humanização representa um conjunto de iniciativas que visa a produção de cuidados em saúde, capaz de conciliar a melhor tecnologia disponível com promoção de acolhimento, respeito ético e cultural ao paciente, espaços de trabalho favoráveis ao bom exercício técnico e a satisfação dos profissionais de saúde e usuários. (DELANDES, 2004).

Os enfermeiros ao se referirem ao conceito de humanização, focalizam o cuidado ao sentimento de respeito e dignidade do paciente. Assumem também que cuidar humanamente significa tratar o paciente como gostaria de ser tratado.

“...eu vejo a humanização como uma forma de estar cuidando dele, além dos medicamentos, você está também cuidando do conforto dele, cuidando dele como se estivesse cuidando de você...” (Enfermeiro1)

“Humanização é tratar o paciente como pessoa, é respeitar as suas individualidades, suas vontades, suas crenças...” (Enfermeiro 7).

“...cuidar da pessoa como um todo, não cuidar só do corpo” (Enfermeiro 2).

As falas dos enfermeiros denotam a necessidade de se pensar o cuidado em UTIs, dando a ele um sentido multidimensional, não apenas “assistir” no sentido confinado ao ato de olhar, de ver, mas tornando-o uma atividade provida de sentimentos, responsabilidade, sensibilidade, ou seja, o cuidado pressupõe uma relação a pessoa e não a individualidade.

A Portaria n.º 3432/98 do Ministério da Saúde (BRASIL, 1998), estabelece padrões para caracterização da humanização das UTIs e considera como aspectos importantes o ambiente físico, a assistência prestada ao paciente e familiares e o relacionamento destes com a equipe de saúde.

Para os enfermeiros entrevistados, a humanização pressupõe oferecer um cuidado integral ao paciente, englobando o contexto familiar e social, o ambiente do trabalho e a equipe de saúde.

“...humanização é planejar o cuidado para o bem estar do cliente então... existe na minha opinião várias vertentes de humanização: por parte do funcionário... oferecer um ambiente melhor para se trabalhar” (Enfermeiro 3).

“...humanização é o atender bem né, é você respeitar o próximo, respeitar o doente, o familiar, o colega...é tentar manter-se o respeito no ambiente de trabalho” (Enfermeiro 6)

“...a humanização, ela tem que englobar tudo, o paciente, o familiar, os integrantes da equipe multiprofissional, e muitas vezes a gente vê que isso não acontece...” (Enfermeiro 8).

Os enfermeiros relacionam o cuidado humanizado a um ambiente agradável e mais próximo da realidade do paciente, pois ele tem influência direta no bem-estar do cliente, família e da equipe de saúde. Como pode ser observado no exemplo a seguir:

“...o ambiente acolhedor, calmo, tranqüilo, ambiente que favorece a recuperação ... diminuição de ruídos, apagar luzes” (Enfermeiro 2).

Humanizar aparece, ainda, relacionada ao diálogo com o paciente, informar e orientar, identificá-lo pelo nome, com o intuito de personalizar e individualizar o cuidado.

“Se comunicar com o paciente, tocar, cumprimentar...” (Enfermeiro 2).

“Conversar, explicar mesmo que ele esteja inconsciente” (Enfermeiro 3).

A família também é considerada como um dos elementos fundamentais para humanização do cuidado, no sentido de oferecer informações.

Assim humanizar passa a ser responsabilidade de todos, individual e coletivamente. Jamais estará dada, sendo preciso reconstruí-la em todos atos de saúde, quer aqueles burocráticos - administrativos, quer aqueles relacionais. Humanização no setor saúde é ir além da competência técnocientifica - política dos profissionais, compreende o desenvolvimento da competência das relações inter-pessoais que precisam estar pautadas no respeito ao ser humano, no respeito à vida, na solidariedade, na sensibilidade de percepção das necessidades singulares dos sujeitos envolvidos (CASATE & CORRÊA, 2005).

PINHO et al, (2006) reforçam esse aspecto ao afirmarem que o cuidado de enfermagem é um cuidado ético e para tal pressupõe o uso de habilidades técnicas, conhecimentos e relação com o outro.

Dessa forma, a assistência humanizada se estende para além dos cuidados centrados no paciente, inclui a avaliação das necessidades dos familiares e de toda a equipe de saúde, o grau de satisfação destes sobre os cuidados realizados e a prevenção da integridade do paciente como ser humano.

A realidade da Humanização nas UTIs

A humanização em UTI onde se presta cuidados a pacientes críticos, os profissionais de saúde, especialmente os enfermeiros, necessitam utilizar a tecnologia aliada a empatia, a experiência e a compreensão do cuidado prestado fundamentado no relacionamento interpessoal terapêutico, a fim de promover um cuidado seguro, responsável e ético em uma realidade vulnerável e frágil. Cuidar em Unidades Criticas é ato de amor, o qual está vinculado: a motivação, comprometimento, postura ética e moral, características pessoais, familiares e sociais (SILVA, 2000).

Para os enfermeiros entrevistados a efetivação de um cuidado humanizado nas UTIs depende, principalmente, da vontade política dos dirigentes das instituições, assim como o comprometimento da equipe multiprofissional, voltada para um mesmo objetivo - humanizar o assistir.

“... depende realmente de ter alguém disposto para implantar” (Enfermeiro1).

“Temos um ambiente agradável né... mas ainda falta muito para ter um ambiente humanizado, por não termos cadeiras, não termos material de trabalho adequado... outras coisas que precisa ter não tem...” (Enfermeiro 6).

“Então eu acho que tinha que ter um projeto que envolvesse a superintendência do hospital...” (Enfermeiro 1).

Os desafios do processo de humanização da assistência e das relações de trabalho a serem enfrentados pela profissão implicam em superação da relevância dada à competência técnocientifica em detrimento da humanização; a superação dos padrões rotineiros, arraigados, cristalizados de produzir atos em saúde; a superação dos modelos convencionais de gestão; a superação do corporativismo das diferentes categorias profissionais em prol da interdependência e complementaridade nas ações em saúde; a construção da utopia da humanização como um processo coletivo possível de ser alcançado e implementado (COLLET & ROZENDO, 2003). A fala que segue aponta para esse desafio.

“... se viesse uma proposta da instituição acho que ficaria assim muito mais fácil para estar implantando um cuidado humanizado... aqui dentro as coisas se amarram, demoram muito para acontecer... precisa daquilo... ai não fez por questões burocráticas... e isso é uma desumanização...” (Enfermeiro 5).

Embora a humanização da atenção à saúde, nas ultimas décadas, pareça ser consenso, ao mesmo tempo tem se constituído em um desafio para os profissionais.

“...aumentar um pouco o número de funcionários para que não sobrecarregue... a estrutura às vezes deixa um pouco a desejar é... em termos de equipamentos.. funcionários o número é insatisfatório...” (Enfermeiro 8).

“... falta conscientização de toda equipe... que todo mundo falasse uma mesma linguagem...” (Enfermeiro 7).

Os enfermeiros ao descreverem suas práticas demonstram uma enorme contradição entre o que acreditam e o que é vivido em seu cotidiano.

“... não é feito nenhum trabalho com a família, não tem ninguém que chega aqui que aborde, que converse ou qualquer outra pessoa preparada pra conversar com a família, falar como é o ambiente, o que ele vai ver, deixar os familiares preparados... não tratado como coisa, objeto que tem que aceitar tudo...” (Enfermeiro 7).

“...as famosas rotinas... o paciente tem um hábito de vida de não tomar banho às 4 horas da manhã... quem acorda às 4 da manhã para tomar banho? e frio ainda às vezes...tipo de coisas que eu não concordo...” (Enfermeiro 7).

“... eu particularmente procuro estar conversando com os familiares na visita passando os informes do paciente, o médico fala da parte clínica. Se eu vejo que alguma coisa mais complexa eu chamo ajuda da psicóloga...” (Enfermeiro 5).

“A família precisa ser atendida... precisa ficar ao lado da família do doente, eles precisam ser bem recebidos” (Enfermeiro 2).

Estar hospitalizado e com afecção grave é uma experiência estressante para o paciente e família. Nesse sentido, a assistência ao paciente e familiares é considerada outro aspecto fundamental no processo de humanização, pois quando um membro da família é hospitalizado, o equilíbrio e os papéis ocupados são afetados. A doença grave causa o desequilíbrio na dinâmica familiar (KNOBEL et al, 1999).

A presença do enfermeiro junto aos familiares deve possibilitar a troca de informações da evolução do paciente, por meio de uma comunicação efetiva, contribuindo para a identificação de dificuldades dos familiares e oferecendo o apoio necessário.

“Não, o trabalho quanto aos familiares é só atender ele na visita, dar algumas orientações, solicitar o que a gente precisa dele, orientar o que a gente quer que ele faça, e fica assim, a gente não envolve eles no desenvolvimento do trabalho” (Enfermeiro 6).

“...o horário da visita é o horário de pico de serviço, medicação, preparar banho... ás vezes a família fica um pouco distante da gente” (Enfermeiro 8).

Como podemos observar, a maioria das falas revela a dicotomia vivida pelos enfermeiros entre a teoria e a prática. Apesar de assumirem que a humanização da assistência consiste em prestar um cuidado com respeito, atenção, diálogo com o paciente e família, os informantes ao falarem de seu cotidiano relatam um trabalho, rotinizado, mecânico e desumano com o paciente e sua família. Apesar dos enfermeiros terem consciência da necessidade da assistência humanizada, o que ainda predomina na UTI é o cuidado técnico.

Essa contradição entre o falado e o vivido foi observada por VILA & ROSSI (2002) ao estudarem o significado cultural do cuidado humanizado em UTI em um hospital universitário.

Para a humanização acontecer seria necessário o compromisso de todos, um pacto entre os diferentes níveis de gestão do SUS (Federal, Estadual e Municipal), entre as diferentes instâncias de efetivação das políticas públicas de saúde, assim como gestores, trabalhadores e usuários da rede de saúde. Os enfermeiros entrevistados tem essa visão crítica.

“... falta conscientização de toda a equipe... que todo mundo falasse uma mesma língua e tratasse o paciente de forma igual” (Enfermeiro 7).

Para OLIVEIRA et al, (2006), a efetivação da humanização nos serviços de saúde exige a união e colaboração de todos os envolvidos, gestores, técnicos, funcionários e a participação ativa dos usuários.

Um outro ponto crucial que merece ser re-pensado ao propor um cuidado mais humano diz respeito à formação profissional na área da saúde, que apesar de toda crise da ciência racionalista e das propostas de mudanças do modelo de atenção da saúde, que pregam a integralidade e a humanização da assistência, ainda hoje está centrada, predominantemente, no aprendizado técnico, racional e individualizado, muitas vezes sem o exercício da crítica, criatividade e sensibilidade (MINAYO, 2004).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

No Brasil ainda é pequena a discussão de políticas de intervenção considerando os aspectos de humanização, assim como ainda não está no rol das prioridades da maioria dos gestores. A dimensão subjetiva da qualidade da atenção, como o conforto, o acolhimento e a satisfação dos usuários é algo que parece ainda um discurso ideal e distante do real.

No discurso dos entrevistados aparece claro o que é humanização, e por outro lado, a realidade do cotidiano das UTIs está longe de oferecer uma assistência humanizada, tendo entre os principais elementos dificultadores a ausência de um filosofia assistencial nas instituições e falta de comprometimento da equipe de saúde.

Apesar das discussões e posições teóricas sobre a humanização em UTI, ainda hoje é impressionante a flagrante violação dos direitos e da dignidade dos usuários desses serviços. Ninguém questiona a importância da existência da tecnologia porque ela em si mesma não é benéfica nem maléfica, tudo depende do uso que fazemos dela.

Mesmo diante de recursos tecnológicos cada vez mais avançados, os profissionais não devem esquecer que jamais a máquina substituirá o ser humano.

Diante de fatos concretos e importantes vimos a necessidade da equipe multiprofissional que atua em UTI, principalmente, a enfermagem que está assistindo nas 24 horas o paciente, a responsabilidade por prestar um cuidado que valorize a intersubjetividade dos sujeitos, os direitos e a cidadania. Finalmente, que busque melhores condições de trabalho, valorizando assim sua categoria e ocupando seu espaço no contexto dos serviços de saúde.

 

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Artigo recebido em 19.05.2006

Aprovado para publicação em 29.12.2006

 

 

1 Trabalho de Conclusão do Curso de Especialização em Enfermagem Intensiva - UNIC

 

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