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Revista Brasileira de Psiquiatria - Tourette's Syndrome - bibliographic review and case reports

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Revista Brasileira de Psiquiatria

Print version ISSN 1516-4446

Rev. Bras. Psiquiatr. vol.21 n.1 São Paulo Jan./Mar. 1999

http://dx.doi.org/10.1590/S1516-44461999000100011 

artigos de revisão


Síndrome de Tourette - revisão bibliográfica e relato de casos

Tourette's Syndrome - bibliographic review and case reports

 

Ana Hounie1, Kátia Petribú2


 

 

RESUMO
A Síndrome de Tourette (ST), outrora considerada rara - apenas uma curiosidade médica - tem sido alvo de crescente relevância na literatura e prática neuropsiquiátricas. Atualmente, estudos epidemiológicos têm demonstrado que sua freqüência é bem maior do que se supunha. Associando-se ao Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC), integra-se ao "Espectro Obsessivo-Compulsivo", despertando o interesse de centros de pesquisa.
Este trabalho busca revisar a literatura sobre o tema. Aborda o transtorno em sua perspectiva histórica. Comenta as teorias etiopatogênicas, o diagnóstico, o quadro clínico, e os tratamentos disponíveis. Serão relatados e discutidos três casos atendidos pela autora no Ambulatório de TOC e Transtornos Relacionados do HC-UFPE: um caso clássico, peculiaridades da ST em um portador de retardo mental e um caso de Tourettismo.

DESCRITORES
Síndrome de Tourette (ST); Gilles de la Tourette; tiques; "tourettismo"

 

ABSTRACT
Tourette's Syndrome- a bibliographic review and a three case report.
The Tourette's Syndrome (TS), considered in the past as a rare condition - a medical curiosity- has been object of growing concern both in the literature and neuropsychiatric practice. Recent epidemiological studies show that the pathology is much more frequent than it was thought before. Association with Obsessive-Compulsive Disorder is well established integrating this syndrome to the "Obsessive-Compulsive Disorder Spectrum", world-wide neuroscientific field of research.
This paper reviews the literature about the TS and discusses historical aspects, etiologic theories, diagnostics clinical features and treatment. Three case studies are reported and discussed, including a case of "tourettism" and peculiarities of TS in a mentally retarded boy.

KEYWORDS
Tourette Syndrome; Gilles de la Tourette; tics; "tourettism"

 

 

Perspectiva histórica

A patologia que atualmente conhecemos como Síndrome de Gilles de la Tourette (ST) foi inicialmente descrita pelo médico francês Jean Marie Itard, em 1825. Relatou o caso de uma nobre francesa, a Marquesa de Dampièrre, desde os seus sete anos portadora de tiques corporais persistentes. Emitia sons semelhantes a latidos, além de proferir obscenidades que a forçaram a viver reclusa pela maior parte de sua vida.1

Posteriormente, em 1873, Trousseau descreveu tiques motores, vocalizações bizarras e palilalia como sintomas integrantes da doença, então denominada "maladie des tics"1. George Beard, em 1881, relatou os casos dos "Franceses saltitantes de Maine", doentes portadores de ecolalia e reações de sobressalto exageradas.2

Foi em 1884 que George Gilles de la Tourette, interno de Charcot no Hospital de la Salpêtrière, descreveu mais oito casos de tiques múltiplos, coprolalia e ecolalia. Retomou os casos descritos anteriormente por Itard e Beard, considerando-os integrantes da mesma síndrome. Charcot, premiando a brilhante contribuição, conferiu o epônimo de Gilles de la Tourette à doença dos tiques.1

Entre outubro de 1885 e março de 1886, Freud freqüentou a enfermaria de Charcot naquele hospital. Relatou que "as coréias e as diversas formas de tiques (por exemplo, a doença de Gilles de la Tourette) estavam recebendo atenção especial durante a época em que freqüentei aquele serviço".3 Acrescentou ainda que "Charcot considerava existirem dois tipos de tiques: o verdadeiro ou neurológico e o histérico. A diferença entre eles é que os verdadeiros são permanentes, enquanto os histéricos desaparecem mais cedo ou mais tarde".4

Ao final do século XIX e início do XX, com o advento da psicanálise, foram elaboradas hipóteses psicogênicas para a ST. Estas permaneceram em voga até que os avanços da psicofarmacologia, na década de 50, permitiram a elaboração de hipóteses biológicas.2

Recentemente tem havido crescente interesse pela doença e vários estudos vêm sendo desenvolvidos, alguns de natureza histórica - tentativa de identificar personalidades famosas como portadores da Síndrome (Mozart, um irmão de Tolstoy, e até mesmo Ana Freud) -, outros de natureza neurológica e/ou psiquiátrica.2,5 Esse interesse deve-se ao fato de que a ST tem se mostrado muito freqüente. Depois, desperta curiosidade pela alta comorbidade com o Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) e com o Transtorno de Hiperatividade com Déficit de Atenção, levando a um questionamento sobre uma possível base neurobiológica comum. Além do mais, trata-se de uma doença grave, muitas vezes com grande comprometimento psicossocial, causando intenso sofrimento aos portadores e seus familiares.

Durante muito tempo a ST foi considerada não como um distúrbio, mas como "um jeito meio nervoso de ser". Assim, o objetivo deste trabalho é divulgar a existência desse transtorno, tão pouco conhecido pelos profissionais de saúde, subdiagnosticado, alertando para as possibilidades de tratamento.

 

Conceitos

Para Jaspers6, os movimentos são atos compreensíveis. Ele os classificou como neurológicos, resultantes de distúrbios do aparelho motor, e psicológicos, decorrentes de uma anormalidade mental em um aparelho motor normal. Os outros fenômenos motores seriam os psicóticos, os quais ele não compreende nem de um ou outro modo. Os fenômenos neurológicos são denominados distúrbios da motilidade; os psicóticos, da motricidade, e os psicológicos, não como fenômenos motores e sim como atos e expressões.

Grandes psicopatologistas como Jaspers, Bleuler e Nobre de Melo pouco se detiveram sobre o estudo dos tiques. O primeiro assim descreveu certos estados hipercinéticos: "Há muitos movimentos que lembram, pela aparência externa, movimentos atetóticos, coréicos, e compulsivos...Os pacientes fazem movimentos estranhos com o corpo, rodopiam, esticam-se,... sacodem os braços e as pernas. Outros dão a impressão de serem reações a sensações corpóreas. Assim é que os doentes giram e se torcem, comprimem os órgãos genitais com as mãos, pegam no nariz, escancaram a boca e metem a mão dentro, apertam os olhos,... . Enfim, há um grupo de movimentos que se assinala pela complicação especial e pela semelhança com atos intencionais: um doente pula e tira o chapéu; outro faz exercícios militares; um terceiro põe-se de súbito a dizer palavrões; casos em todos os quais dizemos tratar-se de atos impulsivos".6

Para Bleuler7, "um tique é um movimento curto que se repete a intervalos irregulares (por exemplo, sob a forma de caretas, ranger dos dentes, respiração ofegante). Ocorre de forma não-voluntária, mas pode ser transitoriamente interrompido. Muitas vezes podemos adivinhar que seja a expressão de um impulso emocional específico, como por exemplo, negação intensa (sacudir a cabeça), não saber o que fazer (dar de ombros), evitar uma bofetada imaginária, afastar-se de algo nojento. Os tiques podem ser acompanhados de grunhidos, latidos e da enunciação de palavras obscenas (a doença de Gilles de la Tourette). Muitas vezes os tiques são sintomas de uma doença cerebral. Em outros casos são provavelmente expressão de uma tensão emocional que tem causas psíquicas. Não obstante, a essência de muitos tiques ainda é enigmática".

Muito tempo se passou até que a psiquiatria pudesse elaborar melhores conceitos sobre o tema.

De acordo com o DSM-IV8, tiques são movimentos involuntários, súbitos, rápidos, recorrentes, não rítmicos e estereotipados. Aparecem também na forma de vocalizações. Ocorrem de forma contínua ou em acessos. Às vezes são precedidos por uma sensação desconfortável, chamada de sensação premonitória e freqüentemente seguidos por uma sensação de alívio. Geralmente desaparecem durante o sono e diminuem quando da ingestão de álcool e durante atividades que exijam concentração. Ao contrário, são exacerbados pelo estresse, fadiga, ansiedade e excitação. Podem ser suprimidos pela vontade, mas ao custo de elevada tensão emocional.

Os tiques complexos podem organizar-se e serem ritualizados, o que os torna, às vezes, difíceis de diferenciar das compulsões, que seriam precedidas de fenômenos cognitivos e acompanhados de sinais autonômicos (ansiedade), enquanto os tiques são geralmente precedidos de fenômenos sensoriais (sensações premonitórias) seguidos de alívio.9

Leckman et al.10 introduziram recentemente o conceito de "just right phenomena", que consiste na realização de tiques ou compulsões até a "perfeição", como traduziram Miguel et al.11 ou, como prefere a autora, até a satisfação ou sensação de suficiência.

 

Classificação dos tiques

A primeira grande classificação dos tiques, de acordo com critérios descritivos, deve ser a de tiques motores e vocais, que por sua vez se subdividem em simples e complexos. Os primeiros envolvem contrações de grupos musculares funcionalmente relacionados, são abruptos, rápidos, repetidos e sem propósito, geralmente percebidos como involuntários.

Os tiques complexos, entretanto, são mais lentos, envolvem grupos musculares não relacionados funcionalmente, podem parecer propositados, percebidos como voluntários (The Tourette Syndrome Classification Study Group - TTSCSG12). De acordo com esse grupo, uma sucessão de tiques simples situa-se no limite entre o que se entende por tique simples e complexo.

Dentre os tiques complexos estão incluídos a ecocinese ou ecopraxia (imitação de gestos realizados por outrem), e a copropraxia ( realização de gestos obscenos). Coprolalia e ecolalia são seus equivalentes na linguagem e palilalia, a repetição de sons, sílabas ou palavras.

Os tiques podem ser, ainda, tônicos ou clônicos. Os tônicos ou distônicos são sustidos, mais lentos, enquanto os outros são breves, súbitos.

Os tiques vocais são sons produzidos pela passagem de ar através do nariz ou boca. Tiques vocais simples são meros sons, enquanto os complexos apresentam significado e incluem coprolalia, palilalia e ecolalia.

A classificação de tiques freqüentemente encontrados é apresentada na tabela 1:

 

 

Nosografia

Desde as primeiras descrições dos tiques até os dias de hoje, o diagnóstico da ST vem sofrendo numerosas reformulações e aperfeiçoamentos. No DSM-IV8, a ST é incluída nos transtornos de tiques. Estes, por sua vez, são incluídos no capítulo destinado aos transtornos diagnosticados pela primeira vez na infância ou adolescência. Entre os outros transtornos de tiques estão os de tique motor ou vocal crônico, de tique transitório e os de tiques sem outra especificação.

Por sua vez, a CID 1013 inclui o estudo dos tiques no capítulo referente aos transtornos emocionais e de comportamento com início usualmente ocorrendo na infância e adolescência. São eles: os de tique transitório, de tique motor ou vocal, de tiques vocais e motores múltiplos combinados (Síndrome de Gilles de la Tourette), outros transtornos de tiques e tiques não especificados.

Já a Tourette Sindrome Association (TSA), uma entidade norte-americana dedicada ao desenvolvimento de pesquisas e divulgação científica sobre a ST, considera as classificações anteriormente citadas insuficientes. Elaboraram uma versão própria na qual os tiques são considerados como "definidos" ou "históricos", dependendo de terem ou não sido testemunhados por um observador confiável.12 A tradução livre dos critérios diagnósticos da TSA referentes à ST é apresentada a seguir:

I. Diagnóstico definido:

· Presença de tiques motores múltiplos e um ou mais vocais durante a doença, não necessariamente concomitantes.

· Ocorrência de tiques muitas vezes ao dia, quase todos os dias, ou intermitentemente, ao longo de mais de um ano.

· Variação ao longo do tempo da localização anatômica, do número, freqüência, complexidade, tipo e gravidade dos tiques.

· Início antes dos 21 anos de idade.

· Ausência de outras condições médicas que expliquem os movimentos involuntários e as vocalizações.

· Testemunho ou registro (examinador confiável ou fita de vídeo) de tiques motores e/ou vocais.

II. Diagnóstico histórico:

· Presença de tiques motores múltiplos e um ou mais vocais durante a doença, não necessariamente concomitantes.

· Ocorrência de tiques muitas vezes ao dia, quase todos os dias, ou intermitentemente, ao longo de mais de um ano.

· Variação ao longo do tempo da localização anatômica, do número, freqüência, complexidade, tipo e gravidade dos tiques.

· Início antes dos 21 anos de idade.

· Ausência de outras condições médicas que expliquem os movimentos involuntários e as vocalizações

· O testemunho de um observador confiável, um membro da família ou amigo íntimo é aceito pelo examinador.

III. Diagnóstico provável:

· Tipo 1: Preenche todos os critérios para o diagnóstico definido, exceto o terceiro e o quarto.

· Tipo 2: Preenche todos os critérios do diagnóstico definido, exceto o primeiro. Este tipo pode ser tanto um tique motor simples com tiques vocais, ou múltiplos tiques motores com provável(eis) tique(s) vocal(is).

Os critérios para os outros transtornos de tiques da TSA não serão relacionados por fugirem ao objetivo deste trabalho.

Vale ressaltar que os critérios diagnósticos do DSM-IV e da CID-10 são semelhantes. Entretanto, os critérios do DSM -IV são mais detalhados, desde que idealizados para a pesquisa clínica. Por este motivo, foram escolhidos como referência para o nosso estudo e passam a ser transcritos a seguir:

 

Transtorno de Tourette

A - Presença de múltiplos tiques motores e um ou mais tiques vocais em algum momento durante a doença, embora não necessariamente ao mesmo tempo (um tique é um movimento ou vocalização súbita, rápida, recorrente, não rítmica e estereotipada).

B - Ocorrência de tiques muitas vezes ao dia (geralmente em ataques), quase todos os dias ou intermitentemente durante um período de mais de um ano, sendo que durante este período jamais houve uma fase livre de tiques superior a três meses consecutivos.

C - Acentuado sofrimento ou prejuízo significativo no funcionamento social, ocupacional ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo, ocasionados pelo transtorno.

D - O início dá-se antes dos 18 anos de idade.

E - O transtorno não se deve aos efeitos fisiológicos diretos de uma substância (por exemplo, estimulantes) ou a uma condição médica geral (por ex., doença de Huntington ou encefalite pós-viral).

O tique motor ou vocal crônico é semelhante à ST, com a diferença de que os sintomas apresentados são motores ou vocais e nunca ambos estão presentes, ainda que não concomitantes.

No transtorno de tique transitório a patologia ocorre por um mínimo de quatro semanas e nunca ultrapassa 12 meses consecutivos. Ou seja, a única diferença entre este e a ST é o critério temporal. Existem critérios especificadores quanto ao seu caráter único ou recorrente.

Para aqueles tiques não enquadrados nos critérios anteriores, existe a categoria Transtorno de Tique Sem Outra Especificação. Como exemplo, citaríamos sintomas com início após os 18 anos de idade ou aqueles com duração inferior a quatro meses e, ainda, os casos de tourettismo, que serão abordados posteriormente.

 

Epidemiologia

A prevalência exata da ST é desconhecida. Certamente é mais freqüente do que se supunha. De modo geral, estima-se que a prevalência seja cerca de 0,5/1000 pessoas.14 Esta cifra deve, entretanto, ser considerada subestimada, uma vez que depende, em parte, dos critérios e métodos utilizados e do tipo de estudo epidemiológico. 15, 16 A ST acomete cerca de três a quatro vezes mais o sexo masculino do que o feminino.17 Quando são considerados tiques isoladamente, a freqüência aproximada varia de 1% a 13% nos meninos e 1% a 11% nas meninas.18 De acordo com Burd et al. (apud Leckman18), os dados disponíveis apontam para uma freqüência de 9 homens para 1 mulher e de 3 para 1, quando são consideradas crianças e adultos. Parece não haver diferenças transculturais na prevalência de ST. Assim, estudos epidemiológicos realizados em Israel, Inglaterra, França e Estados Unidos têm encontrado resultados bastante semelhantes.16 É encontrada independentemente de classe social. Alguns estudos revelam que aproximadamente 60% dos pacientes tenham caído de posição social quando comparados com a de seus pais.19

 

Etiologia

A etiologia da ST permanece desconhecida. Existem diversas linhas de pesquisa sobre o tema. A seguir, abordaremos os principais achados e teorias etiopatogênicas relacionadas à ST.

 

Fatores genéticos

Os estudos com gêmeos e famílias têm fornecido evidências de que há uma transmissão genética vertical da vulnerabilidade à ST.20 A análise de segregação de famílias indica que a ST é herdada de acordo com o padrão autossômico dominante com penetrância variável dependendo do sexo.20, 21 A taxa de concordância para a ST entre gêmeos monozigóticos (MZ) é maior que 50%, enquanto para os dizigóticos, é de cerca de 10%. Quando são incluídos os casos de tiques simples a concordância aumenta para 77% nos MZ. Estes dados falam a favor de que os fatores genéticos têm papel importante na etiologia da ST. Por outro lado, apontam para a influência dos fatores não genéticos.18 Foi sugerido que o Transtorno Obsessivo-Compulsivo e a ST estariam relacionados geneticamente, e que o TOC representaria um fenótipo alternativo do hipotético gene da ST, ainda não localizado.17, 21

 

Fatores perinatais

Os resultados dos estudos que tentam estabelecer uma relação entre eventos perinatais adversos e a ST são conflitantes. Dois estudos não conseguiram verificar essa associação22, enquanto outros encontraram 1,5 vezes mais complicações durante a gestação de mães de crianças com tiques quando comparadas a controles normais.23 Leckman et al. observaram uma relação entre a gravidade dos estressores durante a gestação, além de náusea e vômitos no primeiro trimestre e o desenvolvimento de distúrbios de tiques.18

 

Fatores psicológicos

Estes transtornos são conhecidos pela sua relação com o estresse: exacerbação dos sintomas diante de eventos estressantes, não necessariamente desagradáveis.22 Embora a maioria das formulações psicodinâmicas elaboradas para explicar a ST tenham sido desacreditadas, há associação entre o conteúdo dos tiques, seu início e os eventos marcantes na vida das crianças portadoras de ST. Assim, torna-se difícil negligenciá-los no curso do transtorno.18

Freud, no início de sua obra, ainda no final do século XIX, dedicou algumas linhas sobre o assunto. Relatou que Charcot os dividia em "verdadeiros" e "histéricos ". Os tiques verdadeiros seriam os de origem neurológica e os histéricos, de origem psicológica, passíveis de análise e providos de simbolismo.

Em 1889, no relato do caso da Sra. Emma von N., Freud 24 descreveu um quadro histérico em que se superpunham tiques motores simples, como contração de músculos do rosto e do pescoço, aliados aos vocais, descritos como "um curioso estalido com a boca, um som impossível de imitar", que interrompiam com freqüência suas observações. Apresentava também uma alteração da fala: "ficava de tempos em tempos sujeita a interrupções espásticas, a ponto de gaguejar". E ainda : "o que a paciente dizia era perfeitamente consciente e revelava um grau inusitado de instrução e inteligência. Isso fazia com que parecesse ainda mais estranho que, a cada dois ou três minutos, ela de súbito se calasse... e exclamasse numa voz alterada, carregada de angústia:— "Fique quieto! - não diga nada! - não me toque!"...Essas interrupções chegavam ao fim tão de súbito quanto como começavam e...provavelmente, sem que ela própria as notasse". Nessa época, Freud, através da hipnose (psicoterapia hipnótica) pôde relacionar o conteúdo dos tiques a traumas psíquicos. Interpretou a frase interpolada como uma fórmula protetora contra conteúdos "perigosos" emergentes à consciência. À luz de hoje, talvez fossem considerados tiques vocais. Ele tentava explicar o surgimento dos tiques de natureza psicológica ou histérica através da teoria da contra-vontade: uma ação voluntariamente controlada, uma idéia ou ação antitética mais forte irrompendo na consciência em forma de "tic convulsive" ou tique. Anteriormente, Charcot e Guisson já haviam relatado casos de tiques, coprolalia, ecolalia e idéias obsessivas4, enquanto Freud relatava nunca ter visto um caso de coprolalia. Como, na época, a Síndrome de Tourette era composta pela tríade clássica de coprolalia, tiques motores e ecolalia, não aventou tal diagnóstico para sua paciente.

 

Fatores neurobiológocos

a. Neuroimagem

A tomografia cerebral computadorizada (TCC) geralmente apresenta-se sem anormalidades em crianças com ST.15 Robertson et al.19 encontraram 71 TCC normais dentre 73 pacientes. Os dois casos de alterações referiam-se a dois pacientes que golpeavam a cabeça (head banged). Singer et al. (1993) observaram uma assimetria no tamanho do putâmen dos pacientes. Enquanto normalmente o putâmen esquerdo costuma ser maior que o direito, na ST encontra-se uma predominância direita.25 Peterson (1993), em estudos com ressonância magnética, encontrou diferenças estruturais nos gânglios da base e no corpo caloso de portadores da ST.25 Estudos com tomografias de emissão (PET e SPECT) revelam, em geral, hipometabolismo e hipoperfusão em regiões do córtex frontal e temporal, no cíngulo, estriado e tálamo.26 Tais achados sugerem alterações no circuito córtico-estriado-talâmico. Em 1990, Alexander et al.27 propuseram um modelo explicativo para a ST, baseando-se na existência de vários circuitos anatômicos e funcionalmente diferentes que conectariam as diversas áreas corticais com as estruturas subcorticais, retornando a uma área definida no córtex frontal. Para esses autores, na ST haveria uma alteração do circuito que conecta o córtex órbito-frontal, estriado e o tálamo.25 Brito2 propõe um novo modelo neurobiológico para explicar a ST e sua resposta terapêutica às diversas substâncias utilizadas atualmente. O modelo proposto incorpora os achados neuroquímicos, neuro-hormonais, etc., às teorias neuro-anátomo-funcionais que envolvem a macro e micro organização da gânglia basal, criando um modelo mais refinado e abrangente do que os propostos até então.28

b. Neuroquímica

Os estudos sobre um possível substrato neuroquímico na ST são também conflitantes. Diversos trabalhos encontraram alterações quantitativas nos neurotransmissores e seus metabólitos.29, 10 Os mesmos achados não foram confirmados em estudos posteriores. Como bem salienta Brito2, as pesquisas quantitativas dos metabólitos são insuficientes para determinar as causas dos desequilíbrios bioquímicos, já que esses podem ser causados tanto na síntese, quanto no seu catabolismo. A principal hipótese estudada envolve uma hiperatividade dopaminérgica, visto que os neurolépticos, antagonistas da dopamina, geralmente promovem uma grande redução dos tiques. Na mesma linha de raciocínio, os estimulantes como o metilfenidato, a cocaína, a pemolina e a L-dopa causam exacerbação dos tiques.30 O envolvimento do sistema noradrenérgico foi hipotetizado com base na resposta terapêutica à clonidina, um agonista alfa-2. O sistema serotonérgico também tem sido responsabilizado pela fisiopatologia da ST; entretanto, há poucas evidências que sustentem essa hipótese.18

Outros mecanismos de neurotransmissão vêm sendo estudados, tais como a acetilcolina, o gaba, o sistema opióide endógeno, entre outros.17 Todos necessitam de maiores elucidações.

c. Neuroendocrinologia

A elevada incidência de ST e tiques no sexo masculino levanta a hipótese de que estejam relacionados à exposição do sistema nervoso central a altos níveis de testosterona e/ou outros hormônios gênero-específicos.18 Há relatos de casos que envolvem esteróides androgênicos na exacerbação de sintomas da ST entre fisiculturistas que abusam dessas substâncias.31 Há um relato de flutuações dos tiques na ST relacionadas ao ciclo menstrual, com exacerbação na fase estrogênica pré-menstrual.32

d. Neurofisiologia

Brito2 ressalta que a presença de anormalidades no eletroencefalograma (EEG) de pacientes com ST é controvertida. Os achados são insignificantes, não se justificando o uso do EEG na investigação rotineira da ST. As anormalidades encontradas são inespecíficas e não há evidências de atividade paroxística diretamente relacionada aos tiques.33 O mesmo autor relata que os achados sugerem que os tiques não se originariam de mecanismos corticais utilizados em movimentos voluntários.

e. Neuroimunologia

Swedo et al.34 sugerem a possibilidade de que tiques, alguns transtornos do movimento, sintomas obsessivo-compulsivos e hiperatividade possam estar relacionados à presença de anticorpos antineurais decorrentes de infecções estreptocócicas. Assim, Swedo et al.35 designaram esse subgrupo de pacientes pelo acrônimo PANDAS - Distúrbios Pediátricos Neuropsiquiátricos Autoimunes Associados a Infecções Estreptocócicas. Relatam ter encontrado maior freqüência do D8/17, um marcador genético da susceptibilidade à Febre Reumática (FR), em pacientes com PANDAS (85%), quando comparado a controles normais (17%). Da mesma forma, Kiessling et al.36 descreveram uma relação temporal entre infecção estreptocócica e o início abrupto de tiques em três crianças com transtornos de déficit de atenção e hiperativadade. Hollander et al.37, em publicação recente, alertam para o fato de que o marcador D8/17 poderia estar relacionado ao sexo (o grupo estudado por Swedo era composto em 70,4% por pacientes do sexo masculino, contra 29,2% no grupo controle), e não ao PANDAS. Ressaltam ainda que a positividade para o D8/17 pode não ser específica para PANDAS, Coréia de Sydenham e Febre Reumática, questionando se não seria positivo também em outras patologias neuropsiquiátricas. Eliminadas essas possibilidades, o D8/17 poderá estar relacionado com um subtipo de TOC, definindo o papel dor fatores autoimunes pós-estreptocócicos no TOC e na ST.38 Caso esses achados sejam observados em estudos posteriores, teremos o primeiro marcador genético para um transtorno psiquiátrico.36 No Hospital das Clínicas da USP, Mercadante vem desenvolvendo um estudo semelhante, dosando anticorpos antineurais em pacientes portadores de tiques e sintomas obsessivo-compulsivos, sem história de FR. Recentemente, Renó Jr. et al.39 descreveram o caso de uma criança portadora de FR e ST, que desenvolveu um quadro de TOC durante uma reagudização do quadro de FR, sem apresentar coréia de Sydenham. Acreditam tratar-se do primeiro caso relatado na literatura psiquiátrica.

f. Neuropsicologia

De acordo com Brito2, as pesquisas relacionadas à neuropsicologia da ST demonstraram que o funcionamento cognitivo se encontra dentro dos limites da normalidade. Há, entretanto, uma ligeira diferença entre o QI verbal e o de performance. Os portadores de ST apresentam dificuldades no rendimento escolar, principalmente quando há comorbidade com TOC ou THDA. Foram encontradas dificuldades de aprendizado em 36% de 200 crianças com ST.40 Parece haver, também, déficit na atenção, principalmente nas tarefas mais complexas, como adição seriada, teste com seqüência de blocos, trilhamento, entre outros.41 Para esses mesmos autores, como os pacientes praticamente não diferiam no QI, esses achados representariam déficits seletivos.

 

Quadro clínico

Os tiques geralmente aparecem por volta dos sete anos, havendo uma faixa de início que varia dos 2 aos 15 anos.17 Em geral, apresentam-se na forma de tiques motores simples, mais comumente piscadelas dos olhos. Alguns pesquisadores, inclusive a autora deste trabalho, observam uma progressão rostro-caudal, mas o curso é imprevisível.18 O início das vocalizações ocorre posteriormente ao dos tiques motores, na idade média de 11 anos, freqüentemente na forma de pigarro, fungadelas, tosse, exclamações coloquiais, entre outras.15 Em alguns casos, de 12% a 37 %, os tiques vocais são o primeiro sintoma a surgir.42 A coprolalia é encontrada em menos de um terço dos casos.43 Sugere-se que haja alguma determinação cultural, visto que é encontrada seis vezes mais na Dinamarca do que no Japão.17 A copropraxia é encontrada entre 1% e 21% dos casos. A ecolalia e ecopraxia, e a palilalia são encontradas aproximadamente em 11% a 44% e 6% a 15% dos casos, respectivamente.15 Alguns sintomas como coprografia, palilalia e coprolalia limitados ao pensamento, apenas são descobertos quando inquiridos diretamente.43 Estima-se que um terço dos pacientes apresente remissão completa ao final da adolescência, outro apresente melhora dos tiques e o restante continue sintomático durante a vida adulta.43 Remissões espontâneas foram relatadas em 3% a 5% dos casos.44, 45 Aparentemente, os tiques da face, dos olhos e da cabeça são os mais resistentes à intervenção farmacológica.46 A intensidade dos tiques é variável, desde quase imperceptíveis, como um leve levantar de ombros, até tiques aparatosos como saltos ou fortes latidos.18 Às vezes são "camuflados" em atitudes corriqueiras como por exemplo, afastar o cabelo do rosto, ajeitar a roupa, reconhecidos pelo seu caráter repetitivo. Após a instalação do quadro, os sintomas passam a apresentar flutuação na intensidade, principalmente na adolescência. Uma série de comportamentos se associam à ST, como o hiperativo, o automutilatório, distúrbios de conduta e de aprendizado, além dos sintomas obsessivo-compulsivos (SOC).17 Alguns autores, como Apter et al.,47 observaram que mais de 40% dos pacientes com a ST apresentavam TOC. Estima-se que aproximadamente 90% dos portadores da ST tenham SOC.

 

Diagnóstico diferencial

Deve-se diferenciar os tiques das outras discinesias ou hipercinesias já reconhecidas e classificadas - alterações da motilidade que descreveremos de maneira sucinta:

Acatisia: Sensação de inquietação que ocorre, geralmente, como efeito colateral dos neurolépticos.

Balismo: Movimentos amplos, intermitentes, que se projetam para fora e para a frente, com tendência à flexão e enrolamento sobre seu próprio eixo. Geralmente são unilaterais. Decorrem de lesões subtalâmicas contralaterais ou de múltiplos microinfartos no estriado contralateral.

Coréias: Movimentos coréicos que se assemelham a uma dança, súbitos, não repetitivos, anárquicos, decorrentes de um processo infeccioso (Coréia de Sydenham), ou de processos degenerativos.

Distonias: Movimentos de torção, sustidos, geralmente repetitivos, que progridem para posturas anormais. Aqui estão incluídas as distonias de torção, como o torcicolo espasmódico, que pode estar associado à espasticidade da fala.1, 17

Outra forma de distonia focal é o blefaroespasmo idiopático, que consiste em piscadelas repetitivas. É diferenciada da ST pela ausência de outros tiques e presença desses movimentos em outras partes do corpo.12

Os tiques distônicos confundem-se com as distonias. A presença de tiques clônicos em outras regiões anatômicas levanta a possibilidade da ST.12

Mioclonias: Contrações musculares súbitas, breves, restritas a grupos musculares ou porções destes, provocando ou não deslocamento de um segmento.

A Síndrome das Pernas Doloridas e de Movimento dos Artelhos é uma síndrome em que os dedos ou o pé estão em constante movimento de flexão e extensão, acompanhados de dor profunda na perna do mesmo lado.1

Movimentos semelhantes a tiques são vistos, também, na Síndrome das Pernas Inquietas.12

Estereotipias: Comportamentos voluntários, repetitivos e sem objetivo aparente. Encontradas em pacientes retardados, psicóticos ou hiperativos.

Compulsões: Atos ou rituais mentais realizados geralmente em resposta a uma obsessão, para prevenir algum dano. Às vezes, torna-se difícil distinguir compulsões de tiques, principalmente se estamos diante de ambas as condições (TOC e ST).

Outras doenças mais raras como a Doença de Wilson, a Coréia de Huntington, a Síndrome de Lesch-Nyhan, entre outras, apresentam-se com movimentos anormais que podem assemelhar-se a tiques. Uma história clínica cuidadosa e exames laboratoriais confirmam o diagnóstico.1

Particular atenção deve ser dada ao "Tourettismo", casos que se apresentam como a ST, embora decorram de uma lesão ou disfunção orgânica identificável. Este termo é atribuído a Oliver Sacks, eminente neurologista que descreveu o quadro em pacientes que "despertaram" da encefalite letárgica, fato divulgado ao público leigo através do filme "Awakenings" (Tempo de Despertar). O tourettismo tem sido descrito em quadros pós-encefalíticos, após a administração de L-dopa48, em acidentes vasculares cerebrais49, no traumatismo crânio-encefálico50, em intoxicações com cocaína e anfetaminas1, monóxido de carbono51 e após inalação de gasolina.52 Aqui são enquadrados também os casos de discinesia tardia com sintomas "Tourette-like", como foi relatado por Stahl53 e Seeman et al.54 De acordo com Goldman55, existia uma certa relutância em identificar casos de Tourette em portadores de retardo mental. Preferia-se considerá-los como casos de Tourettismo, já que há, necessariamente, dano cerebral. Entretanto, se a ST é uma condição genética, ela pode ocorrer na população deficitária.55 Goldman relatou sete casos de ST em crianças portadoras de retardo mental. Na revisão bibliográfica realizada pelo Medline, a autora encontrou apenas 27 casos de ST em pacientes portadores de déficit intelectual. Destes, apenas 7 foram classificados como moderados ou graves.55, 56

 

Comorbidade

A relação entre sintomas obsessivo-compulsivos (SOC) e a ST foi salientada por Gilles de la Tourette, na sua descrição do transtorno.1 A maioria dos estudos encontraram SOC em aproximadamente metade dos pacientes com ST. Sua relação com o TOC vem sendo estudada, segundo Leckman18, desde 1977. Hanna1, em um estudo de crianças e adolescentes portadores de TOC, observou que 26% apresentaram transtornos de tiques, e 13% tinham a ST. Segundo Petribú57, alguns autores demonstram incidências (30% a 40%) maiores de TOC nos pacientes com ST, quando comparadas à incidência de TOC na população geral. De acordo com Robertson & Yakeley17, comportamentos obsessivo-compulsivos estão intimamente relacionados à ST, tanto do ponto de vista fenomenológico, quanto genético, e são parte integrante da síndrome.

A análise fenomenológica dos SOC revela diferenças entre os portadores de TOC e ST. Enquanto os pacientes com TOC apresentam mais rituais de lavagem e "checagem", os outros revelam mais compulsões de tocar, piscar, contar, o que as "aproxima" mais dos tiques complexos (tic-like compulsions) .58, 59

A relação entre ST e o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) tem sido extensamente estudada, embora seja menos clara. Estudos que tentaram correlacioná-los do ponto de vista genético foram questionados ou refutados por outros autores.17 O TDAH ocorre em portadores de ST na freqüência de 21% a 90%.60 Estima-se que 10% das crianças com TDAH apresentem tiques e que aproximadamente 50% das crianças e adolescentes com ST tenham TDAH associado.61

Pesquisas sobre comorbidade com distúrbios do sono, transtornos de ansiedade e depressão são abundantes na literatura.17 Discute-se se seriam comorbidades ou parte integrante da síndrome.

Recentemente, Robertson et al.62 publicaram um artigo no qual avaliaram a psicopatologia e a comorbidade com transtornos de personalidade (TP) em 39 adultos portadores de ST. Destes, 64 % apresentavam um ou mais TP, de acordo com o SCID-II (entrevista clínica estruturada para o eixo II do DSM III-R). O TP mais encontrado foi o Borderline, seguido pelos TP Depressivo, Obsessivo-Compulsivo, Paranóide e Passivo-agressivo. Por se tratar do primeiro estudo controlado sobre este tema, os autores limitaram-se a levantar hipóteses que justificassem seus achados aguardando que estes possam ser confirmados futuramente.

 

Tratamento

O tratamento da ST consiste em duas abordagens associadas: o tratamento psicossocial e o farmacológico. Antes de iniciá-lo, deve-se fazer uma avaliação dos tiques quanto à localização, freqüência, intensidade, complexidade, e interferência na vida diária. O ambiente escolar, familiar, os relacionamentos, os fenômenos associados devem ser investigados e analisados. Faz-se necessário um julgamento criterioso quanto à necessidade de medicação. Até o presente momento, não há tratamento curativo, sendo o medicamento útil no alívio dos sintomas. A filosofia do tratamento é conservadora para evitar a medicação desnecessária, utilizando-a sempre nas menores doses possíveis.2 Segundo Singer e Walkup63 apenas 60% dos portadores requerem medicação supressiva de tiques.2

O tratamento psicológico inclui orientação aos pais e familiares e àqueles que convivem com a criança como seus educadores. É importante fornecer informações a respeito da doença, suas características e o modo de lidar com o doente. Deve-se cuidar para que ocorra o mínimo de estigmatização. Evitar atitudes superprotetoras que favoreçam a manipulação da doença por parte da criança.

Quando necessário, deve-se indicar psicoterapia. Há relatos de casos tratados com psicoterapia comportamental64, embora, em geral, tenha valor limitado.65 A psicoterapia dirigida ao insight tem sua importância na medida em que estabelece conexões entre os sintomas e os conflitos psíquicos subjacentes, facilitando o seu entendimento.

O tratamento medicamentoso de escolha para a ST são os antagonistas da dopamina, ou seja, os neurolépticos. Existem outras drogas úteis, entretanto, não tão eficazes.

O haloperidol foi usado pela primeira vez na ST em 1961, por Seignot (apud Brito2). Desde então, vêm sendo utilizados outros neurolépticos com sucesso, como o pimozide, o sulpiride e, mais recentemente, a risperidona. O haloperidol é utilizado inicialmente em pequenas doses (0,25 - 0,5mg/dia) com aumentos de 0,5 mg/semana até o máximo de 2-3mg/dia. A dose deve ser individualizada para cada paciente, havendo relatos entre 0,5 a 40mg/dia. É o medicamento de primeira escolha. Apresenta, entretanto, uma série de sintomas adversos: extrapiramidais, sedação, disforia, hiperfagia com ganho de peso, e, o mais grave, discinesia tardia (DT). O pimozide vem sendo utilizado largamente para o tratamento da ST em doses que variam de 1 a 20mg/dia com eficácia comparável à do haloperidol. Um relato recente que compara a eficácia de haloperidol e pimozide em crianças e adolescentes com ST concluiu que o pimozide seria superior ao haloperidol em doses equivalentes.66 A principal vantagem do pimozide em relação ao haloperidol parece ser a menor incidência de efeitos colaterais, sendo o de maior gravidade os cardiovasculares. Existem relatos de morte súbita relacionados ao seu uso. Assim, alguns autores defendem a realização prévia, e ao longo do tratamento, de ECG de controle. Outros efeitos colaterais incluem sedação, disfunção cognitiva e sinais extrapiramidais. O sulpiride causa menos extrapiramidalismo, sedação e disfunção cognitiva, quando comparado ao haloperidol e pimozide. Existe um relato de DT após o uso de sulpiride em um portador de ST.67 Foram relatados casos de ginecomastia, galactorréia, irregularidades menstruais e depressão.67, 68 Tem sido utilizado nas doses de 200 a 400 mg/dia. A risperidona, um neuroléptico atípico recente, tem sido utilizada com sucesso em casos de ST e TOC resistentes a múltiplos tratamentos. Segundo relatou Glakas (1995) seus pacientes responderam rapidamente a 6mg/dia de risperidona.69 Em 1995, Lombroso et al.70 conduziram o primeiro ensaio com esta droga em crianças e adolescentes portadoras de tiques crônicos, incluindo a ST. Obtiveram melhora do quadro clínico em todos os casos, utilizando 2,5 mg/dia. O principal efeito colateral observado foi ganho de peso. Os neurolépticos são, dentre as opções terapêuticas disponíveis, os mais eficazes. Entretanto, devido ao risco de DT, outras opções terapêuticas, embora não tão eficazes, tornam-se interessantes.

A clonidina, um agente alfa-adrenérgico, tem sido usada com sucesso. Em alguns pacientes mostrou-se tão efetiva quanto o haloperidol nas doses de 0,1 a 0,6mg/dia.71 Parece ser mais eficaz em pacientes com TDAH e tiques.1 Os efeitos colaterais incluem sedação, cefaléia e dor de estômago. Por se tratar de agente hipotensor, deve ser administrado com monitorização da pressão arterial. Em 1996, Fras71 relatou um caso de ST e TDAH tratado com guanfacina, um agente alfa-adrenérgico mais seletivo, com melhora de ambas as condições.

Outras drogas têm sido utilizadas com graus variados de sucesso como a flufenazina, o penfluridol, o lorazepan, a buspirona, a metadona, a clomipramina, a nifedipina e o verapamil.17,69

Os antidepressivos tricíclicos são utilizados no tratamento dos portadores de transtornos de tiques e TDAH associado, o que contraindica o uso de psicoestimulantes.72 Destes, o mais pesquisado é a desipramina. Spencer et al.73 encontraram 80% de melhora dos sintomas da ST e do TDAH em 33 casos de crianças e adolescentes portadores desses transtornos tratados com desipramina. Em outra revisão, os mesmos autores encontraram um percentual de resposta semelhante, pesquisando o uso da nortriptilina.72 Embora essas drogas sejam bem toleradas, é necessária a monitorização cardíaca, devido à cardiotoxicidade e risco de morte súbita.74

 

Relato de casos

Caso 1

A., 13 anos, sexo feminino, estudante.

Aos sete anos de idade a paciente passou um período em que, ao andar, ora girava ao redor do seu tronco, ora se agachava. Ao ser acompanhada por uma prima na brincadeira foi repreendida e, aparentemente, abandonou o ato. Posteriormente, passou a realizar gestos obscenos, sendo castigada. Ao que parece, permaneceu assintomática até aproximadamente um ano atrás, quando a genitora percebeu que sua filha repetia palavras que ouvia dos outros (ecolalia) e as próprias palavras (palilalia). Repetia, por exemplo, "trans, trans, trans", " morte, morte, morte".

Depois de um período aproximado de quatro meses, começou a proferir palavras obscenas involuntariamente e fora de qualquer contexto (coprolalia). Posteriormente, passou a apresentar tiques motores simples que foram mudando de localização ao longo do tempo. Apresentou inicialmente movimentos de nariz (torcer o nariz), caretas faciais e levantar dos ombros. Depois, passou a apresentar um tique motor complexo caracterizado por fungar, movimentar os ombros e balançar o tronco em uma seqüência estereotipada e repetitiva a cada dois segundos. Tem ainda história de tiques vocais, como pigarrear e comportamento compulsivo de ordenação. O quadro descrito passou a interferir na sua vida familiar e escolar. Foi repreendida devido à coprolalia e discriminada na escola, tendo recebido o apelido de "tic-tic". Seu rendimento escolar foi comprometido. Tornou-se irritada e desobediente.

A paciente chegou ao nosso ambulatório após ter sido examinada por vários profissionais da área médica e sem receber diagnóstico e tratamento adequados.

A paciente é a primogênita de uma prole de dois. Nascida de parto normal, sem intercorrências. Apresentou desenvolvimento neuropsicomotor sem anormalidades. Aos 11 anos, sofreu uma concussão com perda da consciência e vômitos (atropelamento). Não tem história de febre reumática ou sarampo.

A mãe é portadora de distimia, tendo apresentado um episódio de depressão maior na época da recrudescência dos sintomas da filha. O pai apresenta sintomas obsessivos, os quais ainda não foram caracterizados como componentes de TOC ou de personalidade obsessivo-compulsiva. Na família materna há 12 pessoas portadoras de febre reumática, inclusive a genitora. Dois tios maternos foram a óbito em decorrência de cardite reumática. Há casos na família paterna de portadores de tiques, incluindo um caso de Tourette em um primo legítimo. A avó paterna é descrita como obsessiva pelos familiares (meticulosa, organizada em excesso, "cheia de manias"). A mãe é dona de casa. O pai é funcionário público (perito criminal). Escolaridade e funcionamento social dentro dos padrões normais. A família pertence à classe média, é de religião protestante, praticante. A educação é rígida, não sendo permitido o uso de palavras de baixo calão. As manifestações de irritabilidade e insatisfação não são bem aceitas no ambiente familiar.

Foi iniciado pimozide em doses crescentes de até 3 mg/dia, com resposta parcial da sintomatologia. Em virtude dos efeitos colaterais de sonolência, ganho de peso e disforia, foi necessária a suspensão do medicamento com introdução do haloperidol na dose de 3 mg/dia, tendo ocorrido supressão completa dos tiques vocais e parcial dos motores. Durante o tratamento, A. apresentou quadro depressivo, tendo sido instituída a sertralina na dose de 25 mg/dia. Ao se aumentar a dose para 50 mg/dia, a paciente apresentou acatisia. Vem utilizando 3 mg/dia de haloperidol e sertralina 25 mg/dia, com boa resposta. Retornou às atividades escolares. Aliado ao tratamento farmacológico, vem sendo acompanhada em psicoterapia individual, associada à orientação de pais e professores.

Trata-se de um caso clássico de ST com tiques motores e vocais crônicos, incluindo ecolalia, palilalia e coprolalia, que são vistos em apenas um terço dos casos.17 Apesar das queixas terem surgido há um ano, acreditamos que os primeiros sintomas tenham surgido na infância, por volta dos sete anos. É difícil afirmar com certeza, já que grande parte das crianças normais apresenta comportamentos obsessivos e rituais durante o período de crescimento, principalmente na faixa etária dos 2 aos 4 anos.75 Durante o tratamento, a paciente teve a sua menarca e pudemos observar uma leve piora dos sintomas no período pré-menstrual, o que condiz com um caso da literatura.32 A compulsão à ordenação persiste, mas não se trata de um sintoma que interfira no seu cotidiano. Acreditamos que seja apenas um sintoma associado, não constituindo um quadro de TOC. É importante salientar que, sendo o genitor uma pessoa "obsessiva", este seja um traço característico da identificação com a figura paterna.

Outro dado interessante a ser notado é a alta freqüência de febre reumática na família da mãe. Podemos pensar que haja uma suceptibilidade familiar à febre reumática que tenha se manifestado na forma de PANDAS na nossa paciente.36 Por outro lado, não conseguimos demonstrar qualquer evidência de infecção estreptocócica na história de A. Aliado à presença de prováveis casos de TOC na família paterna, temos um possível caso de ST em um primo da paciente.

Não existem dúvidas quanto à influência genética na patologia desta paciente. Entretanto, é curioso que o aparecimento dos sintomas tenha se dado justamente no período em que o pai teve que se ausentar por alguns meses, a trabalho. Esta ausência pode ter reagudizado os sintomas depressivos maternos. É interessante observar que, enquanto apenas 10% dos casos têm coprolalia, nossa paciente, justamente em um período difícil de seu desenvolvimento, a adolescência, passe a falar palavrões, em um ambiente castrador e severo. Se, por um lado, temos o determinismo genético, de outro lado temos uma jovem portadora de um terreno (emocional) fértil, propício para que esta síndrome genética nele se desenvolva. Uma pessoa, filha de mãe deprimida, ausente, e de um pai castrador, intolerante. Filha de uma família em que foi necessário adoecer para obter a atenção parental.

Conjecturas? Talvez. Acredito, entretanto, que os aspectos psicodinâmicos são tão importantes quanto os biológicos. Dentro desta abordagem, a paciente evolui praticamente assintomática no que tange aos tiques, podendo falar seus "palavrões" dentro de um setting terapêutico, sem que, necessariamente, tenham de ser considerados coprolalia.

Caso 2

B., 38 anos, casado, motorista de táxi.

Há seis meses, ao ser atendido no ambulatório de TOC do HC-UFPE, o paciente queixava-se do surgimento de tiques. O sintoma apresentado era caracterizado por fechamento do olho esquerdo, com contração da musculatura geniana e elevação da comissura labial ipsilateral. Referia que esse tique vinha prejudicando sua concentração no trânsito, deixando-o ansioso. Apresentava também insônia. Vinha fazendo uso de bromazepam havia seis meses, com melhora parcial da insônia, porém sem melhora dos tiques. Relatava ainda episódios de tensão abdominal e de torção do nariz, além de alteração da linguagem do tipo bloqueio da fala.

Referia ter apresentado comportamento hiperativo na infância. Esta informação foi obtida da sua genitora. Há sete anos, em um acidente automobilístico, sofreu traumatismo crânio-encefálico, com afundamento do crânio e exposição do seio frontal, sem lesão meníngea. Esteve em coma durante 10 dias, obtendo completa recuperação, com retorno às atividades laborativas. Não apresentava seqüelas neurológicas.

Informava ter um filho hiperativo de cinco anos. Não relatava patologias psiquiátricas em outros membros da família.

O paciente é autônomo, taxista, responsável pelo sustento da esposa e do filho. B tem o segundo grau completo. A esposa não concluiu o ginásio. Sempre foi pai e marido dedicado, até o momento em que, em decorrência dos tiques, passou a "perder o prazer em tudo, até em brincar com o filho".

Exame físico e neurológico sem anormalidades, exceto pela presença dos tiques e do afundamento craniano. EEG, ECG e parecer cardiológico sem alterações.

Foi iniciado pimozide em doses crescentes de até 2 mg/dia, com resposta parcial. Devido ao efeito colateral de sonolência, que o prejudicava na atividade profissional, a medicação teve de ser suspensa. Seguiu-se o haloperidol na dose de 1 mg/dia, com disforia subseqüente e posterior instalação de um quadro depressivo. Demos prioridade ao tratamento da depressão, e instituímos nefazodona na dose de 300 mg/dia. O neuroléptico foi suspenso. A partir da remissão da sintomatologia depressiva, adicionamos 1 mg/dia de trifluoperazina. Atualmente vem fazendo uso desta medicação na dose de 2,0 mg/dia, associada ao antidepressivo, com remissão quase que completa da sintomatologia.

Visto tratar-se de um caso de ST em um paciente com mais de 18 anos e com história sugestiva de causa orgânica definida (TCE), levantamos a possibilidade do diagnóstico de Tourettismo, embora haja um hiato de sete anos entre o acidente e o início da sintomatologia. No relato de Fahn50, em 1982, o caso de Tourettismo pós-traumático teve início passados dois meses do acidente. Não obstante, não existe na literatura uma definição do tempo necessário entre a causa e o efeito. É óbvio que, quanto menor este intervalo, maior a probabilidade da relação causal. É interessante assinalar o passado de hiperatividade, haja visto a sua associação com a ST em até 50 % dos casos.73 Poderíamos pensar, talvez, que estivéssemos diante de uma verdadeira ST de início tardio.

Caso 3

C., 18 anos, sexo masculino.

O paciente vinha apresentando tiques motores e vocais de progressão rostro-caudal havia três anos. Há cerca de dois meses vem sendo acompanhado no ambulatório de TOC e transtornos associados do HC-UFPE. É portador de retardo mental de moderado a grave, segundo avaliação clínica. Sua mãe foi exposta a Raio X durante sua gestação. O acompanhamento pré-natal, entretanto, transcorreu sem anormalidades. O parto foi a fórceps, a genitora desenvolveu pré-eclâmpsia e o paciente, anóxia, com parada cardiorrespiratória. Há relato de crises convulsivas febris nas primeiras 24 horas de vida que o levaram a ser medicado com fenobarbital até a idade de quatro anos. Até os 12 meses apresentava desenvolvimento neuropsicomotor aparentemente dentro dos padrões de normalidade, quando sofreu um acidente (queda do berço). A genitora não sabe informar a ocorrência de perda da consciência na ocasião. A partir de então perdeu as habilidades adquiridas, como articular palavras curtas: papai, mamãe, bola, água. Tornou-se uma criança inquieta, o que motivou a administração de neurolépticos (haloperidol, pimozide) por alguns anos, tendo obtido melhora. A partir dos cinco anos de idade, voltou a pronunciar algumas palavras. Atualmente, a linguagem é composta de poucos vocábulos simples, ditos com dificuldade. O paciente é totalmente dependente dos cuidados maternos, necessitando de ajuda para a realização das atividades básicas de higiene e alimentação. É sociável e compreende a conversação simples. Freqüenta uma escola para excepcionais. Há aproximadamente três anos, quando tinha quatorze anos de idade, passou a apresentar tiques motores e vocais com localização alternante ao longo do tempo. No início, piscava os olhos, pigarreava, mordia os lábios, fazia caretas e esticava a língua, além de elevar o ombro direito. Foi inicialmente tratado pela clínica neurológica, quando foi suspensa a medicação neuroléptica (haloperidol) e instituído propranolol em doses crescentes de 40 a 80 mg/dia com resposta parcial. Permaneceu sem medicamentos até chegar ao nosso ambulatório. Na ocasião, observamos piscamento dos olhos, seguido de movimento de lateralização do pescoço para a direita e levantava o ombro direito, constituindo um tique motor complexo orquestrado. Apresentava também vocalizações repetitivas e estereotipadas, como proferição de ssá-ssá ou nomes próprios, como Ana, que é uma "namorada" da escola. Optamos, entretanto, por não considerá-los como tiques vocais. Trata-se de um paciente incapaz de subjetivar suas queixas e expressar o caráter involuntário dos tiques. Além disso, respostas telegráficas constituem a maior parte da sua forma rudimentar de comunicação. C. tinha ainda comportamento automutilatório de morder as mãos, com hiperqueratose secundária.

A genitora referia, além do pré-natal citado anteriormente, história de amigdalites repetidas na infância, embora não tenha sido acometido por febre reumática. Exame neurológico sem alterações, exceto pela presença de tiques e estrabismo divergente. É diabético, compensado apenas com dieta específica. Não foi evidenciada patologia cardíaca. Apresenta exames complementares sem anormalidades (EEG, ECG, tomografia craniana computadorizada).

Não há patologia psiquiátrica nem história de tiques na família. A irmã mais nova faz uso de fenobarbital ("foco no cérebro").

É o primeiro de uma prole de dois. É de família humilde, vive em uma casa simples, com saneamento básico, dividindo o ambiente familiar com seus pais e uma irmã. Todos se relacionam com C. de modo carinhoso, principalmente o pai, ao qual é muito próximo afetivamente.

Vem sendo medicado com pimozide 1mg/dia com supressão total dos tiques. Ainda repete palavras. Com a evolução do tratamento, poderemos definir se as vocalizações são ou não tiques vocais.

Este caso revela como principal dificuldade a caracterização das suas vocalizações como sendo tiques vocais complexos ou estereotipias de linguagem próprias de um portador de retardo mental grave.

O diagnóstico de ST é compatível com os critérios do DSM-IV. Entretanto, a história de múltiplas injúrias sobre seu sistema nervoso central levanta a possibilidade de pensarmos em Tourettismo. Afinal, durante a vida intra-uterina sofreu exposição à radiação X, anóxia perinatal, parada cardiorrespiratória etc.30

Outro fator que deve ser levado em consideração é a exposição crônica a neurolépticos. Tal fato nos faz levantar a possibilidade da existência de um quadro de discinesia tardia com sintomas Tourette-like, como nos casos relatados por Stahl53 e Seeman et al.54 Nesse caso, no entanto, a sintomatologia deveria ter diminuído, o que ocorre após a piora inicial característica que se segue à suspensão dos neurolépticos nos casos de DT. Ao chegar ao nosso ambulatório, após um período de um ano sem fazer uso de neurolépticos, os sintomas haviam piorado consideravelmente. Isto não elimina a hipótese anterior, mas nos inclina a priorizar aquela de Síndrome de Tourette como aventada inicialmente.

 

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Correspondência
Ana Hounie
R. Oscar Freire, 1702, apto.55
CEP: 95409-011
São Paulo - SP - Brasil
Tel.: + 55 11 883-2845
Fax: + 55 11 280-0842

 

 

1. Professora de Psiquiatria da Faculdade de Filosofia do Recife - FAFIRE.
2. Professora Assistente de Psiquiatria / FESP-UPE.