It is the cache of ${baseHref}. It is a snapshot of the page. The current page could have changed in the meantime.
Tip: To quickly find your search term on this page, press Ctrl+F or ⌘-F (Mac) and use the find bar.

Revista Brasileira de Educação Especial - Resource classroom in the process of inclusion of students with intellectual disability from teachers' standpont

SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.18 issue3Sexuality in intellectual disabilities: an analysis of the perceptions of mothers of special adolescentsDevelopment of blind children and sighted children author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Revista Brasileira de Educação Especial

Print version ISSN 1413-6538

Rev. bras. educ. espec. vol.18 no.3 Marília July/Sept. 2012

http://dx.doi.org/10.1590/S1413-65382012000300009 

RELATO DE PESQUISA

 

Sala de recursos no processo de inclusão do aluno com deficiência intelectual na percepção dos professores

 

Resource classroom in the process of inclusion of students with intellectual disability from teachers' standpont

 

 

Esther LopesI;Maria Cristina MarquezineII

I Mestre em Educação - Universidade Estadual de Londrina - UEL. estherlopes2505@hotmail.com
II Doutora em Educação - Docente do Departamento de Educação - Universidade Estadual de Londrina - UEL. crisedes@uel.br; mcrismarquezine@gmail.com

 

 


RESUMO

Este trabalho é recorte de uma pesquisa desenvolvida em uma escola de Ensino Fundamental - anos iniciais. O objetivo da pesquisa foi analisar a percepção dos professores sobre a importância da sala de recursos multifuncional Tipo I - Atendimento Educacional Especializado - AEE, no processo de inclusão do aluno com deficiência intelectual no ensino regular. A pesquisa contou com a participação de quatro profissionais da educação, os quais exercem diferentes funções na escola. No estudo foram seguidos os pressupostos da pesquisa qualitativa, com ênfase nas práticas da pesquisa-ação, utilizando entrevistas com roteiros semiestruturados, para coleta de dados. O referencial teórico contempla breve histórico da Educação Especial, apontando a deficiência intelectual como um dos maiores desafios nesse processo. Apresenta a sala de recursos como apoio no processo inclusivo e a importância da presença do professor especializado, para esse atendimento. Os resultados ressaltam a importância da sala de recursos no processo inclusivo. Contudo, revela que o trabalho nela desenvolvido não deve e não pode ser confundido com reforço escolar ou repetição de conteúdos curriculares da classe regular. Ela deve ser um espaço de desafio no qual o aluno, com deficiência, encontra condições necessárias para o desenvolvimento do processo de aprendizagem, com vistas à superação de seu próprio limite, em busca da verdadeira inclusão.

Palavras-chave: Inclusão. Educação Especial. Deficiência Intelectual. Sala de Recursos. Atendimento em Sala de Recursos.


ABSTRACT

This paper is part of a study carried out at an elementary school - beginning years. The study's aim was to analyze teachers - perceptions of the importance of a multifunctional resource classroom type I - Specialized Educational Service - SES in the inclusion process of students with intellectual disabilities in regular education. Four education professionals, who have different functions in the school, participated in the study. Qualitative research guidelines were followed, with emphasis on action-research practices, using a semi-structured interview guide for data collection. The theoretical framework covers a brief history of special education, indicating that intellectual disability is one of the biggest challenges in this process. The paper presents the resource classroom as a major support in the inclusive process, and highlights the importance of specialized teachers in this service. The results emphasize the importance of the resource classroom in the inclusive process. However, the study defends that the work carried out in that venue should not be confused with school tutoring or repetition of regular class curriculum content. It should provide challenging conditions in which students with disabilities encounter what they need in order to develop their learning process, so as to overcome their own limits, on the way to real inclusion.

Keywords: Inclusion. Special Education, Intellectual Disabilities. Resource Classroom. Specialized Educational Service.


 

 

1 Introdução

A inclusão do aluno com deficiência intelectual no ensino regular tem sido um tema mundial e amplamente discutido no meio educacional, nas últimas décadas. No Brasil, a discussão do assunto foi iniciada com o advento da Declaração de Salamanca (1994) - documento considerado marco do movimento mundial pela inclusão (BUENO, 2008).

Esse tema tem sido objeto de estudos e pesquisas de muitos estudiosos, que estavam ou estão ligados à Educação Especial, e tem provocado calorosas discussões. Além disso, pode-se perceber que a produção científica na área vem crescendo nos últimos anos, mas novas contribuições são bem-vindas. A razão disso é que há muito a ser explorado, considerando-se a necessidade de aprofundar os conhecimentos para o atendimento à diversidade encontrada nas salas de aula, em todos os níveis e modalidades do sistema educacional brasileiro.

A legislação brasileira aborda, permite e orienta a implantação da educação inclusiva nas escolas, e as políticas públicas, nela baseadas, incentivam a luta pela igualdade e pelo direito à educação para todos, como foi explicitado por Aranha (2004, p.13) ao afirmar "[...] O Brasil tem definido políticas públicas e criado instrumentos legais que garantem tais direitos". A autora, que foi assessora do Ministério de Educação (MEC), acrescenta "A transformação dos sistemas educacionais tem se efetivado para garantir o acesso universal à escolaridade básica e a satisfação das necessidades de aprendizagem para todos os cidadãos".

A realidade demonstra que a maioria das instituições de ensino parece não estar preparada nem estruturada para incluir os alunos com deficiência e dar atendimento adequado a essa nova demanda. Parecem faltar, nos órgãos responsáveis pela educação, ações que transformem em realidade o caráter inclusivo da educação, presente nos textos oficiais. Contudo, é sabido que muitas escolas têm tentado adequar suas ações, buscando atender a demanda do alunado nelas matriculado. O trabalho tem sido extenuante, dada a falta de estruturas básicas e de recursos humanos com formação adequada que lhes permitam atender a diversidade presente nas salas de aula. 

Miranda (2010, p.62),  ao abordar a questão dos saberes necessários para atuar na escola inclusiva, afirma ser "a incorporação de alunos com deficiência no ensino comum" o maior desafio para o sistema educacional.

Sobre o assunto, Mazzaro (2007, p.103) registra "[...] Os professores tentam adequar suas práticas pedagógicas às propostas de inclusão, porém, faltam-lhes as condições básicas para atender à diversidade, que requer estrutura que a escola não possui". O autor questiona posturas assumidas por autoridades nacionais, pois "as políticas provenientes de países que já superaram, há décadas, problemas básicos, estão longe da realidade brasileira".

Isso porquê, além de estruturas adequadas, dentro das condições básicas para atender a diversidade, encontra-se, também, a necessidade de entender as concepções de deficiência e de inclusão.

 

Deficiência Intelectual

A deficiência intelectual, durante muito tempo, foi concebida e tratada como doença mental, tanto que os termos utilizados para nomeá-la foram enormemente influenciados pelos conhecimentos e terminologia da medicina.

Recorrendo-se à literatura podem-se encontrar: idiotia - século XIX; debilidade mental e infradotação - início do século XX; imbecilidade e retardo mental (com seus níveis: leve, moderado, severo e profundo) e deficit intelectual/cognitivo - final do século XX e deficiência mental - final do século XX e início do século XXI. (PLETSCH, 2009).

Nos últimos anos, a expressão deficiência mental vem sendo substituída por deficiência intelectual. Em outubro de 2004, em evento realizado pela Organização Pan-Americana da Saúde (OPS) e pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em Montreal, Canadá, a expressão deficiência intelectual foi mundialmente difundida, por meio do documento intitulado Declaração de Montreal sobre Deficiência Intelectual. (OPS/OMS, 2004).

A  tendência mundial de substituir a expressão deficiência mental por deficiência intelectual é justificável,  posto que o termo intelectual se refere ao funcionamento do intelecto, especificamente, e não ao funcionamento da pessoa como um todo.

Ao propor-se estudo sobre as possibilidades que as escolas oferecem, quando tratam da educação do deficiente intelectual, sentiu-se a necessidade de fazer pequena retomada histórica.

Mazzotta (2003) registra que foi no século XIX, quando "o médico Jean Marc Itard (1774-1838) mostrou a educabilidade de um ‘idiota', o denominado ‘selvagem de Aveyron'", que teve início o atendimento educacional aos ‘débeis' ou ‘deficientes mentais', numa iniciativa que ficou conhecida como abordagem médico-pedagógica, por apoiar-se na crença da educabilidade das pessoas com deficiência intelectual.

A despeito da experiência de Itard, a educação do deficiente mental tem sua trajetória marcada pela institucionalização.

Na vigência do paradigma da institucionalização, o atendimento ao deficiente intelectual não se diferenciava do tratamento dado aos doentes mentais, levando-se em conta a criação de instituições para atendimento de casos mais graves, enquanto os mais leves eram ainda indiferenciados; prevalecia o descaso pela Educação Especial (MENDES, 2001).

Salaberry (2007, p.26) mostra que, no Brasil: "[...] a influência da medicina, na educação da Pessoa com Deficiência Mental perdurou até aproximadamente 1930, interagindo gradualmente com a psicologia e a pedagogia, [...]". Pode-se dizer que nessa época começa a despontar um trabalho mais educacional do que médico com as pessoas com deficiência.

Na década de 1950, surge nos Estados Unidos um movimento de pais de crianças com deficiência mental que se organizaram em defesa dos interesses e necessidades de seus filhos, criando a National Association For Retarded Children (NARC) - a qual exerceu grande influência em vários países. (MATOS, 2003; SALABERRY, 2007). No Brasil, esse movimento foi o inspirador do movimento que deu origem à Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE), iniciado em 1954, na cidade do Rio de Janeiro, por incentivo de um casal norte-americano, membros da NARC (SALABERRY, 2007). No decorrer dos anos as APAEs se tornaram as maiores prestadoras de serviço educacional e de habilitação da pessoa com deficiência intelectual em todo o país

Desses movimentos resultou a criação de instituições especializadas no atendimento à pessoa com deficiência intelectual, via de regra, autônomas e de caráter filantrópico. Meletti (2010b, p.215) vem mostrar, por meio de pesquisas e análise das políticas públicas nacionais, que, "no Brasil, a educação da pessoa com deficiência mental é historicamente marcada por sua implementação em instituições especiais privadas de caráter filantrópico e pelo entendimento de que o espaço educacional segregado é o mais adequado para educá-la". Defende a tese de que a instituição ou escola especial "[...] foi se constituindo como instância legítima da deficiência mental, seja por assumi-la em função da inexistência de práticas a ela destinadas, seja por ser responsabilizada pela sociedade civil e pelo Estado como lócus social do indivíduo com deficiência mental [...]".

O papel das escolas especiais como espaço da educação de deficientes intelectuais continua ativo nesse início de século, já que a escola regular não se havia  estruturado adequadamente para receber todos os alunos. Como se pode perceber, as instituições ou escolas especiais continuavam a comandar a educação de alunos com deficiência intelectual, por ausência do Estado brasileiro. Os próprios documentos oficiais ressaltam a sua ausência afirmando: "o aluno com essa deficiência tem uma maneira própria de lidar com o saber, que não corresponde ao que a escola preconiza" (BRASIL, 2007, p.22). O Estado continua a demonstrar a sua ausência publicando documentos oficiais com esse tipo de afirmativa: "Na verdade, não corresponder ao esperado pela escola pode acontecer com todo e qualquer aluno, mas os alunos com deficiência mental denunciam a impossibilidade de a escola atingir esse objetivo, de forma tácita." (BRASIL, 2007, p.16).

A denúncia da impossibilidade de a escola atingir, com esses alunos, o seu objetivo de ensinar faz com que a educação escolar, de grande parte do alunado com deficiência intelectual, continue nas escolas especiais ou em classes especiais, nas instituições públicas, sob a responsabilidade de professores formados ou especializados na área. Isso porque a educação do aluno com deficiência intelectual constitui, sem dúvida, um enorme desafio para a escola regular.

Iacono e  Mori (2004, p.2) abordaram o assunto, afirmando que nas áreas em que vigora a prática pedagógica da educação especial, "a educação de alunos com deficiência mental tem sido um desafio constante não só para os profissionais que trabalham nesta área, como para os pais destes alunos". Desafio, porque as escolas regulares e seus professores sentiam-se despreparados, e até mesmo incapazes, para trabalhar com esses alunos, no entanto não podiam negar a matrícula, pois,  se o fizessem, estariam violando o direito do cidadão.

Cumprir o direito, apenas no aspecto burocrático, não denota inclusão. Para Denari (2008, p.35), o êxito da inclusão escolar "requer esforços que necessariamente demandam olhares diversos, questionamento a certos paradigmas relacionados à maneira de conceber a deficiência e entender os processos de ensino e aprendizagem". Entender o processo de ensino e aprendizagem demanda conhecimento das teorias que tratam sobre o assunto e experiência com os sujeitos do processo.

No trabalho educacional de pessoas com deficiência intelectual, tornam-se importantes e necessários, além dos conhecimentos sobre o processo de ensino e aprendizagem, o conhecimento das concepções da deficiência e a crença nas possibilidades de aprendizagem do aluno, que é o princípio da ação pedagógica e da definição das estratégias pedagógicas a serem empregadas no processo.

Na décima edição do Manual publicado pela Associação Americana de Retardo Mental - AAMR, em 2002, cuja concepção é adotada pelos órgãos oficiais e por estudiosos brasileiros desde 1970, a deficiência intelectual passou a ser definida nos seguintes termos: "Retardo mental é uma incapacidade caracterizada por importantes limitações, tanto no funcionamento intelectual quanto no comportamento adaptativo, está expresso nas habilidades adaptativas conceituais, sociais e práticas". (AAMR, 2006, p.20).

Esta definição não traz consigo os graus de retardo mental, mas acrescenta cinco hipóteses que são essenciais para a sua adoção, quando se trata de diagnosticar, classificar e estabelecer sistemas de apoio à deficiência intelectual, considerada dentro do contexto ambiental, etário e cultural do indivíduo. Afirma que a avaliação válida deveria considerar a diversidade cultural e linguística, as diferenças nas comunicações, os fatores sensoriais, motores e comportamentais.

Na descrição das hipóteses, os autores do documento apresentam aspectos que devem ser considerados no diagnóstico e avaliação e na definição dos apoios que serão propostos para o atendimento educacional das pessoas com deficiência intelectual. Dentre esses aspectos destacam-se: a) os padrões, em relação aos quais o indivíduo deve ser avaliado, são os ambientes típicos da comunidade (lar, vizinhança, escola e outros) e não ambientes isolados ou segregados; b) a cultura e a etnia, incluindo-se a língua falada em casa e os costumes, podem influenciar e devem ser levados em conta; c) os indivíduos com deficiência mental apresentam habilidades e potencialidades em algumas áreas, independente de suas limitações; d)  tão importante  quanto o diagnóstico e a classificação é a descrição dos apoios que o indivíduo precisa para melhorar o funcionamento; e) apoios apropriados resultarão em funcionamento melhorado, exceto em casos raros.

Nas palavras de Pan (2008, p.59): "O sistema atual, o de 2002, consolida a definição de retardo mental com ênfase em uma perspectiva funcional e dinâmica, que permite entender essa categoria de deficiência mais pelo aspecto do desempenho do que pelos traços clínicos".  Ressalta a autora que, para caracterização da deficiência intelectual, são propostas cinco dimensões: habilidades intelectuais, comportamento adaptativo, interações e papéis sociais, saúde e contexto. Isso pode ser interpretado como uma transformação no entendimento do conceito.

Pletsch (2009, p.93) enfatiza que o sistema "multidimensional" busca alterar a ideia de que a deficiência mental é uma condição estática e permanente.  A autora mostra que a alteração almejada trata "da concepção na qual a deficiência varia conforme os apoios e/ou suportes recebidos pelo indivíduo".

Nos meios educacionais, essa afirmação traz preocupações para os gestores e professores, porque o aluno chega à escola em momentos diversos, e a escola não pode pedir que esse aluno ou sua família esperem até que as medidas necessárias e cabíveis, para o oferecimento de apoios e suportes, sejam tomadas.

Corroborando a premissa segundo a qual inclusão não é a simples colocação dos alunos em sala de aula (BRASIL, 1998; GLAT; FONTES; PLETSCH, 2006), mas inclui a tentativa de mudança no sentido de aceitação das diferenças e respeito à diversidade nela presente. Daí a urgência de dar condições de diferenciação no agir pedagógico, adequando-o a esse novo momento, que exige uma visão mais clara, das peculiaridades específicas e especiais de cada aluno e a capacidade de atendê-las.

O aluno com deficiência intelectual necessita de uma ação pedagógica adequada as suas necessidades educacionais, para que o sucesso da inclusão se estabeleça em seu favor permitindo-lhe ultrapassar as barreiras impostas pela deficiência.

1.2 A Sala de Recursos como Apoio à Inclusão

Ao se fazer opção pela construção de um sistema educacional inclusivo, em consonância com os postulados da Declaração de Salamanca (1994), é iniciada, no Brasil, uma reconfiguração das modalidades de atendimento e serviço aos alunos com deficiência, entre as quais figura a sala de recursos.

No texto das Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica (BRASIL, 2001) encontra-se o conceito desse serviço de apoio à inclusão, pelo qual deve ser desenvolvido o atendimento educacional especializado (AEE) na escola, envolvendo-se professores com diferentes funções:

Salas de Recursos: serviço de natureza pedagógica, conduzido por professor especializado, que suplementa (no caso dos superdotados) e complementa (para os demais alunos) o atendimento educacional realizado em classes comuns [...]. Esse serviço realiza-se em escolas, em local dotado de equipamentos e recursos pedagógicos adequados às necessidades educacionais especiais dos alunos, podendo estender-se a alunos de escolas próximas, nas quais ainda não exista esse atendimento. Pode ser realizado individualmente ou em pequenos grupos, para alunos que apresentem necessidades educacionais especiais semelhantes, em horário diferente daquele em que freqüentam a classe comum. [...]. (BRASIL, 2001, p.50).

Os estados da Federação passaram a considerar a oferta da sala de recursos, no espaço escolar do ensino regular, como um dos atendimentos da Educação Especial, que visa contribuir para a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais matriculados em classes comuns. Para demonstrar a aceitação da posição da Secretaria de Educação Especial do Ministério da Educação passaram, também, a legislar sobre esse serviço.

O Estado do Paraná, considerando os preceitos legais que regem a Educação Especial como: a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional Nº 9394/96 (BRASIL, 1996); as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, Resolução CNE n° 02/01 (BRASIL, 2001), a Deliberação Nº 02/03 - CEE (PARANÁ, 2003), inicialmente regulamentou a oferta da sala de recursos com a Instrução 04/04 (PARANÁ, 2004) e, em seguida, com a Instrução nº 015/08 (PARANÁ, 2008), ambas da SEED/DEE - PR. Todavia, em 2011 é emitida a Instrução 016/11 (PARANÁ, 2011) que amplia a terminologia desse serviço de apoio para sala de recursos multifuncional - tipo I, adequando-se às orientações do MEC, contidas no Decreto Federal nº 7611, de 17 de novembro de 2011, assim definindo-a:

Sala de Recursos Multifuncional - Tipo I, na Educação Básica é um atendimento educacional especializado, de natureza pedagógica que complementa a escolarização de alunos que apresentam deficiência Intelectual, deficiência física neuromotora, transtornos globais do desenvolvimento e transtornos funcionais específicos, matriculados na Rede Pública de Ensino. (PARANÁ, 2011).

Moretti e Corrêa (2009, p.487) valorizaram esse serviço, afirmando que na perspectiva inclusiva a sala de recursos tornou-se muito importante, "pois visa oferecer o apoio educacional complementar necessário para que o aluno se desempenhe e permaneça na classe comum, com sucesso escolar".

Além das oportunidades de sucesso acadêmico que são oferecidas no contexto da classe regular, pelas adequações curriculares possíveis e recomendadas pela legislação, ao aluno está sendo garantido o direito ao apoio especializado, a fim de complementar seu aprendizado em período diverso daquele em que frequenta a classe regular.

Sobre a função e a importância da sala de recursos, Arnal e  Mori (2007, p.3) alertam para o fato de que a sala de recursos só pode ser considerada instrumento de inclusão "[...] desde que consiga atender à diversidade, assegurando ao aluno a inclusão em situações de aprendizagem no ensino regular".

No objetivo da inclusão, o direito à aprendizagem e o acesso a níveis mais elevados de educação fazem parte do que está posto como igualdade de direitos e de oportunidades educacionais para todos. 

O alunado com direito a frequentar a sala de recursos multifuncional tipo I, no Paraná, encontra-se especificado no Item 2, da Instrução 016/2011 que trata do objetivo desse serviço, estabelecendo que o aluno deve estar na Educação Básica, na Rede Pública de Ensino.

Destaca-se que nesse serviço de apoio à inclusão serão atendidos, além dos alunos com deficiência intelectual, que são objeto de reflexão deste artigo, alunos com deficiência física-neuromotora, transtornos globais do desenvolvimento e transtornos funcionais específicos.

Nesse ponto, importa registrar outra legislação emanada do Ministério da Educação trata-se da Resolução Nº 4, de 2 de outubro de 2009 (BRASIL, 2009), que instituiu as Diretrizes Operacionais para o Atendimento Educacional Especializado na Educação Básica, modalidade educação especial.

O artigo 4º, dessa Resolução, especifica o público alvo descrito em um amplo grupo de alunos como objeto do atendimento educacional especializado -AEE. Nessas diretrizes são considerados como público-alvo do AEE:

  1. Alunos com deficiência;
  2. Alunos com transtornos globais do desenvolvimento;
  3. Alunos com altas habilidades/superdotação (BRASIL, 2009).

Observa-se, no teor do documento, a ampla função da sala de recursos, tendo-se em vista a população à qual ela se destina e o seu caráter multifuncional e, ainda, a diferença da Instrução Nº 016/11 (PARANÁ, 2011) que apresenta como público alvo os alunos com transtornos funcionais específicos - TFE, omitindo os alunos com altas habilidades/superdotação.

Conhecendo-se os documentos e tendo-se ciência de quais alunos poderão ser recebidos para o AEE, embora com divergências, depara-se com uma série de dúvidas e questionamentos, tais como: a multifuncionalidade da sala, o suporte pedagógico para as diferentes áreas abrangidas; a condição de atendimento eficiente e eficaz e outras que, certamente, já são ou serão objeto de pesquisas. Destaca-se, também, o enunciado do Item 4 da Instrução paranaense que estabelece os critérios para a organização funcional da SRM - TI a qual  diz que o serviço deverá "obrigatoriamente estar contemplado no Projeto Político Pedagógico e Regimento da Escola, funcionará com características próprias em consonância com as necessidades específicas do aluno nela matriculado". Essa exigência traz preocupações, não pelo fato da institucionalização do AEE, que é algo extremamente positivo no processo inclusivo, e sim pela forma como o assunto será ou está sendo inserido no PPP. Não se trata, apenas, de transcrever o texto do dispositivo legal, mas de dar características próprias da escola para o atendimento. Considera-se, aqui, que para isso tem de haver, nos espaços de discussão, profissionais com formação específica e ou professores especializados e empenhados em contribuir para a construção desse documento, garantindo sintonia com os pressupostos da educação inclusiva.

Por se tratar de um serviço de apoio à Educação Básica, que engloba o Ensino Fundamental - anos iniciais, Ensino Fundamental - anos finais e Ensino Médio, a Instrução traz orientações referentes aos requisitos de ingresso para o atendimento ao alunado de cada um dos níveis, a saber:

Sala de Recursos Multifuncional - tipo I, anos iniciais:

  • Alunos que nunca frequentaram serviços da Educação Especial [...];
  • Alunos egressos de Classe Especial ou Escola de Educação Especial [...];

b) Sala de Recursos Multifuncional - tipo I, anos finais:

  • Alunos que nunca frequentaram serviços da Educação Especial [...];
  • Alunos egressos de Sala de Recursos Multifuncional (Tipo I) anos iniciais, Classe Especial ou Escola de Educação Especial [...];

c) Sala de Recursos Multifuncional - tipo I, ensino médio:

  • Alunos egressos de Sala de Recursos Multifuncional - Tipo I, anos finais do ensino fundamental. (PARANÁ, 2011).

Propõe, ainda, que a matrícula no serviço de apoio deve ser efetivada mediante o Relatório de Avaliação psicoeducacional realizada no contexto escolar, a qual possibilita o reconhecimento das necessidades educacionais especiais dos alunos, público-alvo desse atendimento educacional especializado.

O relatório de avaliação no contexto escolar, é o documento que orienta o professor na elaboração do plano de atendimento educacional especializado,  consoante uma proposta pedagógica a ser desenvolvida de acordo com a especificidade de cada aluno, portanto sua elaboração deve ser individual.

Com referência à ação pedagógica, o documento estabelece que:

O trabalho pedagógico a ser desenvolvido na Sala de Recursos Multifuncional - Tipo I, na Educação Básica deverá partir dos interesses, necessidades e dificuldades de aprendizagem específicas de cada aluno, oferecendo subsídios pedagógicos, contribuindo para a aprendizagem dos conteúdos na classe comum e, utilizando-se ainda, de metodologias e estratégias diferenciadas, objetivando o desenvolvimento da autonomia, independência e valorização do aluno. (PARANÁ, 2011).

Estabelece, outrossim, que o trabalho pedagógico será realizado em três eixos:

Eixo 1 - Atendimento individual:

  • Nas escolas que ofertam o Ensino Fundamental - anos iniciais: o professor da SRM deve trabalhar o desenvolvimento de processos educativos que favoreçam a atividade cognitiva (áreas do desenvolvimento);
  • Nas escolas onde se ministra o Ensino Fundamental - anos finais: deve-se trabalhar o desenvolvimento de processos educativos que favoreçam a atividade cognitiva (áreas do desenvolvimento) e os conteúdos defasados dos anos iniciais, principalmente de leitura, escrita e conceitos matemáticos;
  • Com os alunos do Ensino Médio, atendidos em SRM: desenvolvam-se processos educativos, que favoreçam a atividade cognitiva e os conteúdos defasados, principalmente de leitura, escrita e conceitos matemáticos.

Eixo 2 - Trabalho colaborativo com professores da classe comum:

  • Objetiva-se desenvolver ações para possibilitar o acesso curricular, a adaptação curricular, a avaliação diferenciada e a organização de estratégias pedagógicas de forma a atender as necessidades educacionais especiais dos alunos.
  • Eixo 3 - Trabalho colaborativo com a família:
  • Visa-se possibilitar o envolvimento e participação desta no processo educacional do aluno.

O item que trata sobre critérios para a solicitação de autorização de funcionamento da SRM - TI, no subitem 8.1, da referida instrução, estabelece  que o professor, para atuar na sala de recursos, deverá ser "especializado em cursos de pós-graduação em Educação ou licenciatura plena com habilitação em Educação Especial ou habilitação em nível médio, na extinta modalidade de estudos adicionais e atualmente na modalidade normal" (PARANÁ, 2011).

Observa-se uma mudança bastante significativa no texto da Instrução em vigor, em relação às Instrução nº 04/04 e Instrução 015/08, da SEED/DEE (PARANÁ, 2004, 2008), que foram substituídas, nos quesitos exigidos do professor para atuação na sala de recursos, uma vez que a Instrução 04/04, no item 5.3, recomendava que, para atuar em sala de recursos, o professor deveria ter experiência profissional de, no mínimo, dois anos, nas séries iniciais do Ensino Fundamental. Tal recomendação tinha, certamente, o objetivo de garantir e valorizar os conhecimentos e experiências adquiridos pelo professor no ensino regular os quais poderiam dar sustentação pedagógica a sua atuação no atendimento educacional especializado. Infelizmente, essa recomendação não mais figura entre os quesitos necessários para atuar no programa de apoio à inclusão.

As escolas paranaenses vêm-se adequando para a oferta do atendimento educacional especializado proposto e recomendado pela legislação, buscando garantir os direitos dos alunos e propiciando-lhes acesso ao conhecimento.

1.3 Objetivo da pesquisa

A  pesquisa foi delineada com o objetivo de analisar a percepção dos professores sobre a importância da sala de recursos multifuncional Tipo I - Atendimento Educacional Especializado (AEE), no processo de inclusão do aluno com deficiência intelectual no ensino regular. Neste artigo, buscou-se identificar os aspectos da realidade da escola estudada, no que concerne ao processo de inclusão dos alunos na classe regular e seu atendimento na sala de recursos.

 

2 Método

Para a pesquisa foram seguidos os pressupostos da pesquisa colaborativa, com ênfase nas práticas da pesquisa-ação (MENDES, 2010). A opção por esse tipo de pesquisa se deu pelo significado contido no seu conceito: fazer pesquisa "com" os professores e não "sobre" eles (LIEBERMAN, 1986).

2.1 Participantes

Na pesquisa contou-se com participação de quatro participantes profissionais da educação de uma escola regular da rede municipal de uma cidade localizada no norte do Paraná. As características dos participantes encontram-se detalhadas na Tabela a seguir.

Para caracterização dos participantes foi definido o código PE, seguido dos algarismos de 1 a 4, com vistas à garantia do anonimato e à proteção dos sujeitos.

A presente pesquisa foi aprovada pelo Parecer CEP nº 057/09, emitido pelo Comitê de Ética em Pesquisa Envolvendo Seres Humanos da Universidade Estadual de Londrina - UEL.

2.2 Instrumentos

Para a coleta de dados foram utilizados roteiros de entrevistas semiestruturados.

De acordo com a posição de Manzini (2004), fez-se a opção pela entrevista semiestruturada, considerando-se a característica do roteiro, no qual, após focalizado um assunto, elaboram-se as perguntas principais, que podem ser complementadas por outras questões inerentes às circunstâncias momentâneas da entrevista.

Levando-se em conta o número de participantes, a função que exercem na escola e o papel de cada um no processo de ensino e aprendizagem, foram elaborados 05 (cinco) roteiros. Os roteiros foram organizados com direcionamento investigativo a respeito dos saberes estruturados pelos profissionais, com base em suas experiências com a prática inclusiva junto aos alunos com deficiência intelectual incluídos, a saber: Roteiro I: diretora da escola, com 13 questões; Roteiro II - supervisora pedagógica, com 15 questões; Roteiro III - professora da classe regular, com 17 questões e Roteiro IV - professora da sala de recursos, com 17 questões.  O Roteiro V foi elaborado para ser aplicado com as participantes PE3 e PE4, ao final da pesquisa.

Os roteiros elaborados foram testados em estudo piloto realizado em outra escola, com características semelhantes à selecionada como lócus da pesquisa.

Após a aplicação, os roteiros e as entrevistas foram transcritos, editados e submetidos à avaliação de juízes de transcrição, os quais declararam a fidedignidade das mesmas.

 

2.3 Procedimento

No decorrer dos contatos mantidos com a escola para a realização da pesquisa foi desenvolvido um grupo de estudos, entre as participantes, que consistiu em oito encontros de leituras, discussões e trocas de experiências, num total de 24 horas. Os resultados desta ação encontram-se publicados no Capítulo n° 5 do livro organizado por Shimazaki e Pacheco (2012).

No final dos encontros foi elaborado um plano de intervenção, com adequações curriculares necessárias e possíveis para ser trabalhado com os alunos com deficiência intelectual incluídos no 5º Ano do Ensino Fundamental da escola.

Todos os participantes foram entrevistados antes do grupo de estudos (investigação inicial). A PE3 e  a PE4 foram entrevistadas, também, após a realização do grupo de estudos e elaboração do plano de intervenção (investigação final), com o Roteiro V.

 2.4 Tratamento dos Dados

Os dados da entrevista foram trabalhados por meio de análise de conteúdo sob a perspectiva de Bardin (1977) e Marquezine (2006) e agrupados em temas e subtemas.

Nesse recorte, para a elaboração do artigo, foram apresentados apenas alguns temas, por restrição de espaço.

2.5 Fidedignidade

Após a divisão dos dados de entrevista, observou-se a necessidade de aumentar o rigor metodológico da pesquisa no tratamento dos dados coletados, pensando-se que a divisão das falas da entrevista não deveria ser arbitrária. Como alternativa metodológica  lançou-se  mão da posição de Carvalho (1996) a qual  mostra  que, em pesquisa qualitativa, a categorização das falas deve ser avaliada por juízes.

Neste trabalho recorreu-se a dois juízes para avaliar a criação de classes e subclasses, baseadas nas falas das entrevistadas e sua respectiva distribuição nas mesmas tal qual foi feito em Marquezine (2006). Fazendo-se a média da avaliação dos dois juízes, conseguiu-se como resultado o índice de 92 % de concordância sobre a distribuição realizada pelos pesquisadores.

 

3 Resultados e discussão

A escola, lócus da pesquisa, demonstrou que a sala de recursos e a classe regular atendiam as necessidades educacionais especiais dos alunos com deficiência intelectual, possibilitando-lhes  participar tanto de atividades especializadas desenvolvidas no AEE, no contexto do ensino regular e conduzidas por professor especializado, como de atividades desenvolvidas em classe regular.

No decorrer das entrevistas, os participantes foram interrogados sobre a concepção que tinham de inclusão. Excertos das respostas emitidas pelos profissionais entrevistados revelam duas maneiras de entender o processo de inclusão:

a) A escola/classe se adapta ao aluno

A gente já tinha uma noção de como era a inclusão. [...], o professor é que vai se adaptar ao aluno, porque o aluno está lá na sala, não é o aluno que vai se adaptar ao professor ou à classe. (PE1).

Percebe-se que, apesar da publicidade desse assunto, o entendimento revelado pelo participante sobre o significado da inclusão foi, inicialmente, vago. O PE1 revelou ter sobre o assunto uma concepção correspondente às  encontrada na posição de autores como Mazzota (2003), Denari (2008) e outros,  quando afirmam que a escola deve amoldar-se ou adaptar-se para a inclusão, para atender às dificuldades apresentadas por todos os alunos, também  por aqueles que apresentam necessidades educacionais especiais. Diferentemente do que ocorria quando se trabalhava com a visão integracionista, segundo a qual o aluno precisava ser capacitado, habilitado ou reabilitado para ser encaminhado ao ensino regular, na visão inclusiva, a escola se coloca à disposição do aluno para atender suas necessidades e garantir-lhe aprendizagem.

a) A inclusão seria de alunos com deficiências físicas e sensoriais, não com deficiência intelectual:

[...] para nós era mais a inclusão de pessoas com deficiência física, motora, uma coisa [...], não pesada. [...] diferente desse incluir, que nós sentimos a necessidade de fazer um trabalho diferente, dentro da sala [...] regular. Bem diferente daquela inclusão que a gente tinha uma visão de adaptação de espaço físico, [...] uma inclusão para deficiente visual. Era essa que a gente estava esperando, não uma inclusão de crianças com déficit de atenção, com uma dificuldade de linguagem, todas aquelas inclusões que acontecem e a gente não tinha percebido que era uma inclusão. (PE4).

Não obstante conhecer-se a legislação educacional (BRASIL, 1996) que preconiza a igualdade de direitos e oportunidades educacionais para todos, preferencialmente no ensino regular, o direito à inclusão do deficiente intelectual, ainda, não é, reconhecido por muitos educadores. O PE4 demonstrou esse entendimento, reconhecendo que o desafio representado pela aceitação do deficiente intelectual continua sendo muito grande para a maioria das escolas e dos professores. (IACONO; MORI, 2004; BEYER, 2006).

Outro aspecto abordado foi a disponibilidade da escola em receber os alunos avaliados e diagnosticados como deficientes intelectuais,  e encaminhados para a classe regular, com apoio especializado em sala de recursos multifuncional.

A resposta apresentada é considerada interessante pela pesquisadora, pois expressa as dificuldades que se têm com crianças, no ensino regular. 

[...] Nós vimos isso, assim, como naturalmente, porque nós já tínhamos as crianças, só não sabíamos como lidar adequadamente com elas. (PE1)

[...] A gente tinha algumas dificuldades com algumas crianças. Recebíamos as crianças e não tínhamos aonde abrigá-las [...], uma sala adequada para elas. (PE1).

[...] A maior dificuldade da inclusão que a gente sente, é quando, no momento em que o aluno está presente na sala regular, nas atividades que ele tem que realizar e ele não domina todas os pré requisitos que ele deveria ter para desenvolver uma ou outra atividade no conteúdo de português, de matemática, e ai esse professor do regular tem que atender essa criança  mais as necessidades dele (normais, da sala de aula), e ai o professor, [...] precisa de uma dinâmica que ele não domina. (PE2).

Ao receber informações sobre o processo inclusivo e serviços de apoio à inclusão, os profissionais da escola passaram a relacioná-las às situações vivenciadas no cotidiano escolar e vislumbrar as possibilidades de atender, de maneira diferente, os alunos, que apresentavam dificuldades de aprendizagem, visto que os alunos incluídos são oriundos de classes comuns da própria escola ou de outras escolas, raramente da escola especial.

Infelizmente, a realidade descrita retratou o que vem ocorrendo com a inclusão, em muitas escolas, nas quais os alunos considerados como incluídos provieram do próprio ensino regular. Meletti (2009, p.10), com suas pesquisas, veio mostrar essa peculiaridade da inclusão escolar brasileira, já que "[...] a inclusão mais evita a saída/retirada de alunos da escola do que favorece a entrada/colocação daqueles que não têm acesso ao sistema regular de ensino".

Esses alunos passam a aumentar os números dos censos educacionais, pela dupla matrícula, quando na verdade eles já estavam no sistema (BRASIL, 2008).

3.1 Sala de Recursos Multifuncional - Tipo I, no cotidiano da escola

No decorrer das entrevistas, quando perguntados sobre o início do processo de inclusão na escola, os participantes apresentaram respostas como:

Nós começamos com uma sala de recursos, [...]. Então, hoje, a Escola tem a sala de recursos e a classe especial. (PE1).

A princípio, quando nossos alunos precisavam de apoio especializado, eles eram avaliados e acabavam indo para outras escolas porque na nossa não tinha sala de recursos. Então, eles acabavam sendo transferidos para o regular e para sala de recursos de outras escolas. (PE2).

Para essa escola, foi  a abertura da sala de recursos multifuncional que desencadeou  processo inclusivo, com o envolvimento de professores, da diretora e da equipe pedagógica na preparação do ambiente e de recursos pedagógicos para a implantação desse serviço da rede de apoio.

Nós começamos com uma sala de recursos [...] (PE1).

Quando a sala foi aberta foi até uma festa. Eu falo que foi uma festa porque, supervisora, orientadora, diretora, todas confeccionando materiais para que essa sala acontecesse. [...]. (PE4).

[...] essa sala de recursos atende a criança nessas áreas que ela está defasada, o pedagógico lá na sala regular tende a melhorar. (PE2).

O trabalho pedagógico especializado, na sala de recursos, deve constituir um conjunto de procedimentos específicos, de forma a desenvolver os processos: cognitivo, motor, socioafetivo emocional, necessários para apropriação e produção de conhecimentos (PARANÁ, 2008).

De acordo com a Instrução 016/11 (PARANÁ, 2011), uma sala de recursos multifuncional - Tipo I autorizada para funcionar 20h semanais pode oferecer atendimento especializado para, no máximo, vinte alunos, e realizado de acordo com o cronograma elaborado pela professora especializada, juntamente com a equipe pedagógica.

Os relatos do PE4, descritos a seguir, assinalam alguns aspectos que merecem ser considerados:

Na sala de recursos eu tenho seis alunos esse ano [...].

[...] nós temos alunos em processo. Esses alunos que já estão há um ano e pouco em processo de avaliação frequentam o apoio pedagógico, que no caso eu vou observar um pouco mais, [...].

[...] Ela (a criança) pode frequentar a sala de recursos enquanto o processo está sendo montado. (PE4).

O PE4 tinha apenas seis alunos regularmente matriculados para o AEE, no momento da pesquisa, conquanto houvesse outros alunos em processo de avaliação que recebiam apoio pedagógico na sala de recursos e seriam matriculados nessa sala se, ao final do processo avaliativo, fossem confirmadas as necessidades de AEE.

A Instrução determina que o aluno deve ser atendido de acordo com as suas necessidades, podendo ser o atendimento duas a quatro vezes por semana, não ultrapassando  duas horas diárias e ser prestado individualmente ou em pequenos grupos. O tempo de trabalho coletivo não deve exceder o tempo do trabalho individual. A Instrução recomenda, ainda, que os atendimentos em grupos sejam organizados por faixa etária e/ou conforme as necessidades pedagógicas dos alunos.

[...] Vamos supor: se tem uma criança precisando ser trabalhada na área cognitiva e a outra também. Então, vamos colocar essas duas crianças no mesmo horário. (PE4).

Diante do exposto, registram-se aqui alguns questionamentos: Como ficaria a participação desse aluno se estivesse numa sala de recursos frequentada pelos vinte alunos previstos na Instrução? Qual o valor pedagógico do AEE se a carga horária semanal do aluno vai se tornando cada vez menor à medida que o número de alunos aumenta, até chegar ao limite estabelecido? Como o professor especializado poderia organizar seu plano de atendimento especializado para atender as necessidades individuais desses alunos? As salas de recursos não correriam o risco de se tornarem classes especiais?

A articulação pedagógica entre os professores, que atuam no AEE e os professores das classes do ensino regular, para promover as condições de participação e aprendizagem dos alunos, é de extrema importância para o êxito da educação inclusiva. (BRASIL, 2010).

A consciência de que o trabalho pedagógico é coletivo contribui para não se alimentar a ideia de que o AEE continua sendo um serviço da educação especial paralelo do ensino regular.

Não é porque ele (o aluno) veio para sala de recursos que a professora também não vai trabalhar. Tem que ser um trabalho em conjunto. (PE4).

Pletsch (2009, p.96) também valoriza esse aspecto na afirmação: "A colaboração entre ensino regular e Educação Especial, por meio de sala de recursos [...], constitui condição importante para que ocorra aprendizagem significativa do aluno com deficiência mental".

 

4 Considerações finais

O trabalho pedagógico na sala de recursos só tem sentido se o professor do ano que o aluno se encontra der continuidade na sala regular.

De certa forma, a sala de recursos da escola onde a pesquisa foi desenvolvida está tentando cumprir o seu papel no processo inclusivo, considerando que a natureza pedagógica a ela atribuída é a de complementar o atendimento educacional realizado em classes regulares.

Vale lembrar que o trabalho desenvolvido na sala de recursos não deve e não pode ser confundido com reforço escolar ou repetição de conteúdos programáticos da classe regular.

Oliveira (2009, p.74) orienta: "Cabe à escola criar condições necessárias para o desenvolvimento do aluno e para a superação de seu próprio limite". A escola lócus da pesquisa tem buscado criar tais condições.

Esta é uma meta que toda escola de Educação Básica desejosa de ser inclusiva deverá procurar atingir, uma vez que, o aluno vai ganhando autonomia e adquirindo capacidade para frequentar a escola regular, sem os apoios especializados à  medida que a aprendizagem e o desenvolvimento ocorrem. No momento em que a escola atingir esse patamar, poder-se-á afirmar que a inclusão está implantada e é real nas escolas brasileiras.

 

Referências

ASSOCIAÇÃO Americana de Retardo Mental (AAMR). Retardo mental - definição, classificação e sistemas de apoio. 10. Ed. Porto Alegre: Artmed. 2006.         [ Links ]

ARANHA, M.S.F. (Org.). Educação inclusiva: a fundamentação filosófica/coordenação geral. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Especial. 2004. v.1.         [ Links ]

ARNAL, L. S. P.; MORI, N. N. R. Educação escolar inclusiva: a prática pedagógica nas salas de recursos. 2007. Disponível em: http://www.alb.com.br/anais16/sem09pdf/sm09ss02_06.pdf. Acesso em: 15 out.2010.         [ Links ]

BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70. 1977.         [ Links ]

BEYER, H.O. Da Integração escolar à educação inclusiva: implicações pedagógicas. In: BAPTISTA, C.R. (Org.). Inclusão e escolarização: múltiplas perspectivas. Porto Alegre: Mediação, 2006. p.73-81.         [ Links ]

BRASIL. Lei 9394 de 23 de dezembro de 1996. Lei de diretrizes e bases da educação nacional. Brasília: Ministério da Educação e do Desporto. 1996.         [ Links ]

BRASIL. Diretrizes curriculares nacionais para a Educação Especial. Brasília: Ministério da Educação. 1998.         [ Links ]

BRASIL. Diretrizes nacionais para a educação especial na educação básica. Resolução 02/2001. Brasília: Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação, 2001.         [ Links ]

BRASIL. Formação continuada a distância de professores para o atendimento educacional especializado - deficiência mental. Brasília: Ministério da Educação, 2007.         [ Links ]

BRASIL. DECRETO 6.571, de 17 de setembro de 2008. Dispõe sobre o atendimento educacional especializado, Brasília, 2008.         [ Links ]

BRASIL. Resolução CNE/CEB 04 de 02 de outubro de 2009. Diretrizes operacionais para o atendimento educacional especializado na educação básica, modalidade educação especial. Brasília: Ministério da Educação, 2009.         [ Links ]

BRASIL. DECRETO 7611, de 17 de novembro de 2011. Dispõe sobre o atendimento educacional especializado, Brasília, 2011.         [ Links ]

BUENO, J.G.S. As políticas de inclusão escolar, uma prerrogativa da educação especial. In: BUENO J.G.S; MENDES, G.M.L; SANTOS, R.A. (Org.). Deficiência e escolarização: novas perspectivas de análise. Araraquara: Junqueira & Marin. Brasília: CAPES, 2008. p.43-63.         [ Links ]

CARVALHO, A. M. P.  O uso do vídeo na tomada de dados: pesquisando o desenvolvimento do ensino em sala de aula. Pro-posições, Campinas, v. 7, n. 19, p. 5-13, 1996.         [ Links ]

DECLARAÇÃO DE SALAMANCA e linha de ação sobre necessidades educativas especiais. Salamanca, Espanha, 1994.         [ Links ]

DENARI, F.E Educação especial e inclusão escolar: das dimensões teóricas às ações práticas. Revista@mbienteeducação. São Paulo, v.1, n.2, p.31-39, 2008.         [ Links ]

GLAT, R.; FONTES, R.S.; PLETSCH, M.D. Uma breve reflexão sobre o papel da Educação Especial frente ao processo de inclusão de pessoas com necessidades educacionais especiais em rede regular de ensino. Cadernos de Educação, Rio de Janeiro,  n.6, p.13-30. 2006.         [ Links ]

IACONO, J.P.; MORI, N.N.R. Deficiência mental e terminalidade específica: novas possibilidades de inclusão ou exclusão velada? In: ANPED SUL, SEMINÁRIO DE PESQUISA EM EDUCAÇÃO DA REGIÃO SUL, 5., Curitiba, 2004. Anais… Curitiba: Editora Universitária Champagnat, v.1. p.1-16. 2004.         [ Links ]

LIEBERMAN, A. Collaborative research: Working with, not working on. Educational Leadership, v.43, n.5, p.29-32, 1986.         [ Links ]

MANZINI, E.J. Entrevista semi-estruturada: análise de objetivos e de roteiros. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL SOBRE PESQUISA E ESTUDOS QUALITATIVOS. A pesquisa qualitativa em debate, 2.,  Bauru, 2004. Anais... Bauru: USC, 2004. (1 CDROM).         [ Links ]

MARQUEZINE, M.C. Formação de profissionais/professores de educação especial - deficiência mental e Curso de Pós-Graduação Lato Sensu: um estudo de caso. 2006. Tese (Doutorado em Educação) -  Faculdade de Filosofia e Ciências, Programa de Pós-graduação em Educação, Marília, 2006.         [ Links ]

MATOS, S.R. Educação, cidadania e exclusão à luz da educação especial - retrato da teoria e da vivência. Revista Benjamim Constant. Rio de Janeiro, 2003.         [ Links ]

MAZZARO, J. L. Baixa visão na escola: conhecimentos e opiniões de professores e pais de alunos deficientes visuais, em Brasília, DF. 2007. Tese (Doutorado em Educação) - Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2007.         [ Links ]

MAZZOTTA, M.J.S. Trabalho docente e formação de professores de educação especial. São Paulo: EPU, 2003.         [ Links ]

MELETTI, S. M. F. A inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais no sistema regular de ensino no Município de Londrina. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 32., Caxambu. 2009. Anais.... Caxambu, 2009. Disponível em: <http://www.anped.org.br/reunioes/32ra/trabalho_gt_15.html>. Acesso em: 04 ago. 2010.         [ Links ]

MELETTI, S. M. F. A constituição dos modos de lidar e de significar a condição do deficiente mental. In: OLIVEIRA, F.N.; ALLIPRANDIN, P.M.; MELETTI, S.M.F. (Org.). Educação e reflexão: contribuição teórica, atuação docente e pesquisa. Londrina: EDUEL, 2010. p.215-231.         [ Links ]

MENDES, E.G. Perspectivas atuais da educação inclusiva no Brasil. In: ENCONTRO DE EDUCAÇÃO ESPECIAL DA UEM, 3., Maringá, 2004. Anais… v. 3, n.1, p. 15-35, 2001.         [ Links ]

MENDES, E.G. Observatório Nacional de Educação Especial. Estudo em Rede Nacional sobre as salas de recursos multifuncionais nas escolas comuns. (Projeto de Pesquisa). UFSCar. São Carlos/SP, 2010.         [ Links ]

MIRANDA, C.R.S. A Educação inclusiva e a escola: saberes construídos. 2012. 113f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2010.         [ Links ]

MORETTI, I.G.; CORRÊA, N.M. A Sala de recursos como atendimento educacional  especializado para a ‘inclusão' de alunos com deficiência mental em classes comuns. In: v CONGRESSO MULTIDISCIPLINAR DE EDUCAÇÃO ESPECIAL, 5., Londrina, 2009. Anais...  Londrina: Universidade Estadual de Londrina., 2009. p.485-492 (1 CDROM).         [ Links ]

OPS/OMS. Declaração de Montreal sobre a deficiência intelectual. Montreal, 2004.         [ Links ]

OLIVEIRA, A. A. S. Estratégias para o ensino inclusivo na área da deficiência intelectual: alguns apontamentos. In: MARQUEZINE, M.C.; MANZINI, E.J.; BUSTO, R.M.; TANAKA, E.D.O.; FUJISAWA, D.S. (Org.). Políticas públicas de formação de recursos humanos em educação especial. Londrina: ABPEE, p.69-82, 2009.         [ Links ]

PAN, M.A.G.S. O direito à diferença: uma reflexão sobre deficiência intelectual e educação inclusiva. Curitiba: IBPEX. 2008.         [ Links ]

PARANÁ. Conselho Estadual de Educação. Deliberação 02/2003. Curitiba, 2003.         [ Links ]

PARANÁ. SEED/SUED. Instrução 04/2004. Critérios para Sala de Recursos, séries iniciais do Ensino Fundamental. Curitiba, 2004.         [ Links ]

PARANÁ. SEED/SUED. Instrução 15/2008. Critérios para Sala De Recursos, séries iniciais do Ensino Fundamental. Curitiba, 2008.         [ Links ]

PARANÁ. SEED/SUED. Instrução 16/2011. Critérios para o atendimento educacional especializado em Sala de Recursos Multifuncional - Tipo I, na Educação Básica. Curitiba, 2011.         [ Links ]

PLETSCH, M.D. Repensando a inclusão escolar de pessoas com deficiência mental: diretrizes políticas, currículo e práticas pedagógicas. 2009. Tese (Doutorado em Educação) -  Programa de Pós-graduação em Educação, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. 2009.         [ Links ]

SALABERRY, N.T.M. A APAE educadora: na prática de uma unidade da APAE de Porto Alegre. Dissertação (Mestrado) - Programa de Pós-graduação em Educação, Pontifícia Universidade Católica de Porto Alegre, Porto Alegre, 2007.         [ Links ]

SHIMAZAKI, E.M.; PACHECO, E.R. (Org.). Deficiência e inclusão escolar. Maringá: EDUEM, 2012.         [ Links ]

 

 

Recebido em: 31/10/2011
Reformulado em: 13/06/2012
Aprovado em: 15/08/2012