It is the cache of ${baseHref}. It is a snapshot of the page. The current page could have changed in the meantime.
Tip: To quickly find your search term on this page, press Ctrl+F or ⌘-F (Mac) and use the find bar.

Food Science and Technology (Campinas) - Composition, physiological and nutritive properties of an insoluble high fiber flour obtained from cassava fibrous waste

SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.19 issue2Honey adulteration analysis by commercial sugars additions using the stable carbon isotope compositionEffect of bleaching, osmotic process, heat treatment and storage on ascorbic acid stability of cashew apple processed by combined methods author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Services on Demand

Article

Indicators

Related links

Share


Food Science and Technology (Campinas)

On-line version ISSN 1678-457X

Ciênc. Tecnol. Aliment. vol.19 n.2 Campinas May/Aug. 1999

http://dx.doi.org/10.1590/S0101-20611999000200009 

Composição e propriedades fisiológico – nutritivas de uma farinha rica em fibra insolúvel obtida do resíduo fibroso de fecularia de mandioca1

 

D.S. RAUPP2, S.S. MOREIRA2; D.A. BANZATTO3, V.C. SGARBIERI4,*

 

 


RESUMO

As indústrias brasileiras de processamento de fécula produzem, como descarte, grandes quantidades de bagaço ou farelo de mandioca que é jogado fora, poluindo o meio ambiente, ou é utilizado na alimentação de animais. A proposta desta pesquisa consiste na utilização do bagaço, descarte da fecularia, como produto para consumo na alimentação humana. Foi preparado, a partir do bagaço coletado na fecularia um produto farináceo identificado como "farinha de mandioca teste", a qual apresentou, em comparação com as farinhas comerciais, alta quantidade (43,1%) de fibra alimentar e baixa quantidade (47,1%) de amido. Os teores de proteína, lipídeo e cinzas foram semelhantes ao das farinhas comerciais. A "farinha teste" foi usada no preparo de dietas semi-sintéticas para ratos em crescimento nas concentrações de 11,6 , 34,8 e 58,0%; farinhas adquiridas no comércio foram usadas como referência. A freqüência de defecações, o peso das fezes úmidas e secas e o volume das fezes secas foram maiores para os grupos supridos com dietas contendo a "farinha teste", em comparação com os grupos que receberam a farinha do comércio, mas, com relação aos valores dos quocientes de eficiência alimentar (QEA) e protéica (PERop) não houve diferença significativa entre as duas farinhas. Uma redução no ganho de peso corpóreo dos animais, resultante de diminuição da ingestão de alimento, foi observado para os tratamentos contendo a farinha teste. Tais resultados permitiram concluir que a "farinha de mandioca teste" apresentou propriedades fisiológicas, em nível intestinal, características da fibra alimentar insolúvel e, em vista disso, constitui-se numa fonte potencial de fibra para a alimentação humana. O bagaço de mandioca produzido como descarte nas fecularias poderá ser aproveitado como matéria-prima para a produção de uma farinha de mandioca rica em fibra alimentar insolúvel, característica distinta das farinhas de mandioca existentes no comércio.

Palavras-chave: resíduo fibroso, fecularia, mandioca, nutrição, fibra alimentar, composição.


SUMMARY

Composition, physiological and nutritive properties of an insoluble high fiber flour obtained from cassava fibrous waste. At the brazilian starch industries the production process of sour or fermented cassava starch generates a high quantity of a by-product denominated residual cassava fibrous waste or bagasse. Normally such material is discarded with deleterious effects to the environment or it is utilized, in low quantity, as a component of animal feed. It was prepared in laboratory, from the bagasse, a cassava flour which presented higher insoluble dietary fiber (43.1%) and lower starch (47.1%), compared to cassava flours obtained from the market place. The proportions of protein, lipid and ash of the high-fiber flour were similar to commercial flours. In addition, defecation frequency, wet (fresh) and dry fecal weight and fecal bulking in rats fed high-fiber flour increased, but It did not interfere in the food efficiency ratio and on the protein efficiency ratio (PER op) values. A reduction of the body weight gain, as a result of a decrease in food ingestion, was observed for the treatments containing the high fiber cassava flour. Such results indicate that the high-fiber cassava flour presents nutritional and gastrointestinal properties which allows it to be used as an adequate source of dietary fiber for human nutrition. The cassava fibrous waste may be used as high-fiber cassava flour containing high proportion of insoluble fiber, a distinct feature from the regular commercial flour.

Keywords: high-fiber flour, cassava, nutrition, dietary fiber, composition.


 

 

1 – INTRODUÇÃO

As unidades industriais que processam a mandioca para a produção de polvilho azedo e doce continuam produzindo altas quantidades de descartes considerados agressivos ao ambiente, sendo os principais identificados como casca, manipueira e bagaço ou polpa residual de mandioca. O bagaço é o principal descarte sólido produzido nas fecularias e, em geral, é jogado nos cursos d’água ou deixado em valas que extravasam e carregam grande carga orgânica para os mesmos [5,8,12,15].

As fecularias são abundantes nos Estados de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Mato Grosso do Sul, processam cerca de 230.000 toneladas de mandioca e produzem aproximadamente 96.761 toneladas/ano em peso úmido de fécula ou polvilho e 14.835 toneladas/ano de bagaço ou polpa residual, que é jogado fora ou aproveitado para a alimentação de animais. O rendimento industrial na obtenção de fécula ou polvilho, em peso úmido, utilizando-se o processo de trituração e lavagem com água corrente é cerca de 25,5% [12].

O bagaço de mandioca é produzido ainda embebido em água e contém cerca de 47,0% e 43,0%, b. s., respectivamente, de amido e fibra alimentar [15]. O amido remanescente, uma quantidade considerável, não está disponível para ser removido pelo processo de lavagem com água em peneiras que é aplicado, em geral, nas micro-indústrias, e constitui, juntamente com a fibra, quase a totalidade da produção de bagaço [5, 8, 12, 15].

FIORETO [8] determinou a composição química do farinhão (outra denominação atribuída ao bagaço de mandioca) e encontrou 9,4% de umidade; 0,6% de lipídios; 1,5% de proteínas; 0,8% de cinzas; 69,8% de amido; e 11,1% de fibra. Este produto é aproveitado, em algumas regiões e em pequena escala, como alimento destinado à alimentação animal [9, 13].

A constatação de que os componentes da fibra alimentar, longe de serem substâncias inertes dos alimentos, como se pensava no passado, desempenham papel fisiológico muito importante na regulação do funcionamento do trato gastrointestinal, assim como no controle e/ou prevenção de certas doenças crônicas e degenerativas, tem despertado na comunidade científica mundial o interesse pelas pesquisas relacionadas às fibras dos alimentos. Acredita-se que as fibras exercem suas funções gastrointestinais através de sua ação física, capacidade de hidratação e de aumentar o volume e a velocidade de trânsito do bolo alimentar e fecal. As fibras possuem também capacidade de complexar-se com outros constituintes da dieta através de vários mecanismos, podendo arrastá-los em maior quantidade na excreção fecal. Dessa forma, tanto nutrientes essenciais, proteínas, minerais e vitaminas, como substâncias tóxicas, poderão ser excretadas em maior ou menor quantidade, dependendo da qualidade e da quantidade da fibra presente na dieta. As fibras solúveis, parcialmente fermentáveis no intestino grosso, são efetivas em promover alterações benéficas na microflora intestinal [6, 7, 17, 18, 20-28].

No presente trabalho propôs-se (a) preparar, a nível de laboratório, um tipo diferenciado de farinha de mandioca rica em fibra insolúvel, a partir do bagaço, produzido como descarte pela fecularia; e (b) determinar a composição química e algumas propriedades físicas desse produto, bem como o seu efeito nas fezes, nas defecações, no consumo de alimentos, no ganho de peso corpóreo, no quociente de eficiência alimentar e no quociente de eficiência protéica operacional, em ratos.

 

2 – MATERIAL E MÉTODOS

Amostra de bagaço residual de mandioca foi coletada na fecularia Santa Rosa, Tibagi, PR para o preparo em laboratório de uma farinha de mandioca especial, identificada nesse trabalho como "farinha teste". Foram determinadas a composição química e algumas propriedades físicas nessa farinha teste especificadas como umidade, cinzas, proteína, lipídios, fibra alimentar, carboidratos digeríveis, grau de hidratação e granulometria, segundo procedimentos analíticos da literatura [3, 16, 22].

A farinha teste foi usada no preparo de dietas semi-sintéticas destinadas à alimentação de ratos em crescimento e uma farinha de mandioca adquirida no comércio (farinha b, Tabela 1) foi usada para comparação. O ensaio consistiu de sete tratamentos de dez ratos/tratamento e os ratos foram distribuídos entre os tratamentos segundo o modelo inteiramente casualizado.

 

a09t1.gif (4473 bytes)

 

Para o preparo das dietas utilizou-se ingredientes de diversas procedências: caseína 60 mesh fornecida pela Kauffmann & Co, contendo 90,39% (%N x 6,40) de proteína, em base seca; óleo refinado de soja; amido de mandioca, preparado em laboratório, grau de pureza em carboidratos igual a 99,4%, em base seca; mistura vitamínica e mistura de sais minerais, preparadas em laboratório segundo a formulação da AIN-93G (19). A dieta básica foi preparada segundo a formulação da AIN-93G (19) para conter: caseína 20%; óleo de soja 7%; mistura mineral 3,5%; mistura vitamínica 1%; L-cistina 0,3%; bitartarato de colina 0,25%. O amido de mandioca foi a única fonte de carboidrato e entrou na dieta básica em q.s.p. 100%. A farinha de mandioca teste ou a farinha de mandioca comercial (identificada na Tabela 1 como farinha b) entraram na formulação das dietas nas porcentagens de 11,6%, 34,8% e 58,0% para fornecerem, respectivamente, 5%, 15%, 25% e 2,3%, 7,0%, 11,6% de fibra alimentar, e em substituição à igual porcentagem de amido de mandioca. A formulação da AIN-93G [19] considera 5% o teor de fibra para a dieta básica.

Os animais utilizados foram ratos albinos da linhagem Wistar, SPF (Livres de Patógenos Específicos), de 21 dias e fornecidos pelo Centro de Animais de Laboratório (CEMIB) da UNICAMP. Durante o ensaio, a temperatura do laboratório foi mantida a 21 ± 2° C, com alternância automática de claro-escuro em períodos de 12 horas. Os animais receberam dieta e água ad libitum.

O ensaio teve duração de 31 dias durante os quais foram feitas, para cada rato, as determinações de peso de alimento ingerido, peso de fezes úmida e seca, volume de fezes seca, número de defecações, ganho de peso corpóreo, bem como, foram calculados o quociente de eficiência alimentar (QEA) e o quociente de eficiência protéica operacional (PERop).

Os dados foram analisados estatisticamente utilizando-se o programa ESTAT desenvolvido no Polo Computacional da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, UNESP, Jaboticabal. Foram realizadas análises de variância dos tratamentos de acordo com o modelo inteiramente casualizado. Visando comparações específicas entre grupos de tratamentos realizou-se ainda a análise de variância com desdobramento por contrastes, cujo modelo aparece especificado junto aos resultados da análise. Os dados foram também avaliados por análise de regressão polinomial para ajuste de uma função estatística que relacione as características (variáveis) em função dos níveis de farinha utilizados na dieta.

 

3 – RESULTADOS E DISCUSSÃO

O produto elaborado a partir do bagaço de mandioca produzido pela polvilheira e identificado como "farinha de mandioca teste" está sendo proposto, neste trabalho, para ser consumido na alimentação humana.

O alto (43,10%) e o baixo (47,10%) conteúdo, respectivamente, de fibra alimentar e de amido (Tabela 1) determinados na farinha de mandioca teste, comparados com os valores determinados para as farinhas de mandioca comerciais, torna esse produto atraente para uso na alimentação humana. Os valores porcentuais encontrados para a fibra alimentar e para o amido ficaram bem acima e bem abaixo, respectivamente, daqueles citados nos trabalhos de CEREDA [5] e de FIORETO [8]. A divergência nos resultados é atribuída ao uso de diferentes métodos analíticos. RAUPP & SGARBIERI [17] concluíram, depois de uma revisão da literatura específica, que vários métodos analíticos aplicados para determinar a fibra dos alimentos estimam seus componentes em valores diferenciados. O método de fibra bruta [3], que consiste no tratamento ácido e alcalino da amostra alimentícia, bem como os métodos de detergentes ácidos ou neutros quantificam quase a totalidade de celulose, algumas hemiceluloses e a lignina mas não quantificam substâncias pécticas, gomas, mucilagens e, portanto, subestimam a fibra alimentar total. O método enzimático, aplicado no presente trabalho, utiliza enzimas para a hidrólise dos polissacarídeos, das proteínas e dos lipídios constituintes dos alimentos, e quantifica a totalidade dos componentes de natureza fibrosa, contudo, o método pode superestimar a fibra de alguns alimentos em razão do amido não estar disponível para a ação das enzimas amilolíticas.

Segundo MOREIRA & RAUPP [15], a fibra alimentar estimada em 43,1% na farinha de mandioca teste apresentou alta proporção (75,0%) de fração insolúvel contra 25,0% de fibra solúvel. Foram estimadas para qualquer das farinhas (Tabela 1), teste ou comerciais, proporções baixas para proteína, lipídios e cinzas. Com relação à granulometria a farinha teste apresentou cerca de 43,0% de partículas maiores que 1 mm enquanto que na farinha comercial foi estimada uma proporção de aproximadamente 13,0% com este tamanho de partícula. O grau de hidratação foi semelhante para os dois tipos de farinha.

O efeito da farinha teste nas fezes produzidas pelos animais e no número de defecações, parâmetros considerados de importância no estudo de um produto fibroso, foram avaliados e os resultados estão apresentados nas Tabelas 2 e 3.

 

a09t2.gif (3855 bytes)

 

 

a09t3.gif (6086 bytes)

 

Os dados da Tabela 2 indicam que, de um modo geral, os resultados do ensaio biológico obtidos com a dieta referência (sem farinha) diferiram dos obtidos com as dietas contendo diferentes concentrações de farinha, tanto a farinha teste como a comercial. Faz exceção a essa regra geral, o peso de fezes úmida (10,3g) que não diferiu estatisticamente de 11,6% de farinha teste (15,9g); o peso de fezes seca (7,6g) que não diferiu de 11,6% de farinha comercial (8,7g); o volume de fezes seca (4,0g) que não diferiu de 11,6% (6,7g) e de 34,8% (12,2g), respectivamente, da farinha comercial; o número de defecações (212,2) que não diferiu significativamente (258,3) da dieta com 11,6% de farinha comercial; todos ao nível de 5% de probabilidade (p<0,05).

Quando se aplicou a análise de variância com desdobramento por contraste (Tabela 3), a maioria dos contrastes deram resultados estatisticamente significativos ao nível de probabilidade de 1% (p<0,01), exceto para peso de fezes úmida, volume de fezes seca e número de defecações, cuja diferença estatística foi ao nível de 5% (p<0,05).

Outros resultados do ensaio biológico com ratos são mostrados e analisados nas Tabelas 4 e 5. Na Tabela 4 aparecem os dados obtidos no tocante à ingestão de dietas, ganho de peso corpóreo dos ratos, quociente de eficiência alimentar (QEA) e quociente de eficiência protéica operacional (PERop). A análise de variância conjunta de todos os tratamentos não mostrou diferença estatística entre os tratamentos para nenhuma das variáveis estudadas.

 

a09t4.gif (3483 bytes)

 

 

a09t5.gif (6347 bytes)

 

Entretanto, a análise de variância com desdobramentos por contraste (Tabela 5) mostrou diferença estatística nos seguintes casos: para a variável alimento ingerido, a dieta referência (sem farinha) diferiu das demais dietas nos três níveis de farinhas incorporadas, ao nível de probabilidade de 5% (p<0,05). Para a mesma variável, a dieta com 58,0% de farinha teste diferiu da dieta com 58,0% de farinha comercial, ao nível de probabilidade de 1% (p<0,01). Não houve diferença estatística entre os vários contrastes estabelecidos em relação à variável ganho de peso corpóreo. O tratamento com 11,6% de farinha teste diferiu de 11,6% de farinha comercial a 5% de probabilidade estatística para o QEA e PERop. Todos os demais contrastes para essas duas variáveis não revelaram diferença estatística.

Os dados obtidos no ensaio biológico com ratos foram também avaliados através de análise de regressão polinomial para ajuste de uma função estatística que relacione as diversas variáveis em função dos níveis na dieta de farinha teste ou de farinha comercial. Os resultados desta análise estatística são mostrados na Tabela 6.

 

a09t6.gif (6043 bytes)

 

Ao se examinar os dados da Tabela 6 verifica-se um elevado grau de ajuste para as variáveis dependentes de peso de fezes úmida, peso de fezes seca, volume de fezes seca e número de defecações. Próximo de 100% dos dados experimentais podem ser explicados pelas equações de regressão estabelecidas. Apenas o peso de fezes úmida para as dietas com farinha comercial produziram um coeficiente de determinação mais baixo, 91,75%; para os demais casos, esse coeficiente esteve acima de 98,0%.

Para as variáveis alimento ingerido e ganho de peso corporal, não foi encontrada correlação para a farinha teste, tendo sido demonstradas correlações bem mais fracas nas dietas com farinha comercial, a saber, 86,71% para alimento ingerido e 53,9% para ganho de peso.

Vários pesquisadores [7, 17, 18, 20-23, 25-28], ao avaliar as propriedades físicas, químicas, nutricionais e fisiológicas atribuídas às fibras dos alimentos constataram que alguns componentes da fibra alimentar influem distintamente no processo da digestão e absorção de alimentos e de seus nutrientes. A celulose (fibra insolúvel) e a pectina (fibra solúvel) auxiliam no trânsito gastrointestinal dos bolos alimentar e fecal e ajudam na prevenção de doenças como a constipação, diverticulites, diabetes, câncer de cólon, enquanto que outras como as solúveis de alta viscosidade [18] retardam o trânsito intestinal e até podem favorecer o estabelecimento da constipação. Efeitos fisiológicos importantes como a redução dos teores sangüíneos e hepáticos de colesterol e triacilgliceróis e, em alguns casos, redução da hiperglicemia também são atribuídos a ação das fibras alimentares.

Dos componentes da dieta, somente a fibra alimentar é capaz de influenciar no peso das fezes [7]. Essa influência é dependente das características físico-químicas do material fibroso, sendo que as mais importantes são a capacidade de retenção de água da fibra e a maior resistência à fermentação. Diversos autores têm relatado aumento de peso das fezes em ratos e em humanos alimentados com fibras de diversas fontes [17, 18, 23, 25, 27].

Segundo RAUPP & SGARBIERI [17, 18] a celulose, fibra insolúvel, de alta pureza e a fração insolúvel da fibra alimentar do feijão carioca 80 SH estimularam uma maior ingestão de alimentos, mas não afetaram significativamente o crescimento de ratos, quando o material fibroso foi acrescentado em substituição ao amido, a dietas isoprotéicas em concentrações de 3%, 6% e 9%. Porém, a fibra solúvel obtida por dois processos diferentes, digestão enzimática in vitro e extração com TCA (10%) atuou no sentido de diminuir a ingestão da dieta e afetou negativamente o crescimento dos ratos.

Aumento da saciedade e redução da ingestão alimentar foram observados também em outras pesquisas em função da presença na dieta de fibras solúveis de diversas fontes [1, 4, 24]. Redução de peso corporal em humanos foi observada por MIKKELSEN et al. [14], por KROTKIEWSKI [10] e por KROTKIEWSKI & SMITH [11] em indivíduos alimentados, respectivamente, com celulose, goma guar e farelo de trigo, e, também, por DAVIES et al. [6] o qual forneceu aos ratos dietas contendo fibras purificadas, pectina e celulose. Redução da ingestão de alimentos e diminuição do ganho de peso corporal foram observadas por ARÊAS [2] em ratos em dieta contendo polpa de laranja, a qual continha 71,1% de fibra detergente neutro constituída de 25,7%, 2,1%, 4,4%, 38,9%, respectivamente, de celulose, hemicelulose, lignina e substâncias pécticas.

Os resultados desta pesquisa mostram que a farinha de mandioca teste preparada a partir do bagaço de mandioca resultante do processamento da fecularia, apresenta propriedades nutricionais e fisiológicas apropriadas para consumo, na alimentação humana, como fonte de fibra alimentar insolúvel. Sugere-se, por conseguinte, que esse produto, por suas características químicas, físicas e nutricionais, seja comercializado como uma farinha de mandioca de elevado teor de fibra alimentar insolúvel, diferenciada, portanto, das farinhas de mandioca disponíveis no mercado.

A industrialização desse produto deverá ser viável, também, sob o ponto de vista tecnológico e econômico, mas é recomendável, sobretudo com relação ao aspecto ambiental. Essa inovação, além de resolver o problema da poluição ambiental, poderia incrementar o rendimento já estabelecido nas fecularias e colocaria à disposição do mercado consumidor de alimentos um produto alimentício de grande importância, em particular, para determinados grupos de indivíduos, propensos a terem problemas relacionados com o funcionamento do aparelho digestivo.

 

4 – CONCLUSÕES

O bagaço de mandioca produzido como descarte nas fecularias pode ser utilizado na elaboração de farinhas com elevado teor de fibra alimentar insolúvel, característica distinta das farinhas de mandioca atualmente existentes no mercado de alimentos.

A farinha de mandioca teste com alto teor de fibra apresentou propriedades características de fibra alimentar insolúvel e, em vista disso, constitui-se em boa fonte potencial de fibra para a alimentação humana.

A freqüência de defecações, o peso das fezes úmidas e secas, o volume das fezes secas foram mais elevadas para os ratos em dietas contendo a farinha de mandioca rica em fibra do que para os ratos que receberam a farinha comercial.

 

5 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

[1]  ANDERSON, J. W. & BRYANT, C. A. Dietary fiber: diabets and obesity. Am. J. Gastroenterol., v. 81, p. 898-906, 1986.        [ Links ]

[2]  AREAS, M. A. Estudo dos efeitos da polpa de laranja sobre parâmetros fisiológicos, nutricionais, bioquímicos e morfológicos em ratos normais e diabéticos. Tese de Doutorado. 1994, 158p. Faculdade de Engenharia de Alimentos, Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP).        [ Links ]

[3]  ASSOCIATION OF OFFICIAL ANALYTICAL CHEMISTS (AOAC) Official methods of analysis. 14 ed., Washington, D.C., 1984.        [ Links ]

[4]  BOLTON, P. R.; HEATON, K. W. & BURROUGHS, L. F. The role of dietary fiber in satiety, glucose, and insulin: studies with fruit and fruit juice. J. Clin. Nutr., v. 34, p. 211-217, 1981.        [ Links ]

[5]  CEREDA, M. P. Caracterização dos resíduos da industrialização da mandioca. In: Resíduos da industrialização da mandioca no Brasil. São Paulo: Paulicéia, 1994, p.11-50.        [ Links ]

[6]  DAVIES, J. R.; BROWN J. C. & LIVESEY, G. Energy values and energy balance in rats fed on suplements of guar gum or cellulose. Br. J. Nutr., v. 65, p. 415-433, 1991.        [ Links ]

[7]  EASTWOOD, M. A.; BRYDON, W. G.; BAIARD, J. D.; ELTON. R. A; HELLIWELL, S.; SMITH, J. H. & PRITCHARD, J. L. Faecal weight and composition, serum lipids, and diet among subjects age 18 to years not seeking health care. Am. J. Clin. Nutr., v. 40, p. 628-634, 1984.        [ Links ]

[8]  FIORETO, A. M. C. Viabilidade de cultivo de Trichosporon sp. em manipueira. Botucatu, 1987, 96p. (Dissertação de Mestrado). Faculdade de Ciências Agronômicas de Botucatu. Universidade Estadual "Júlio de Mesquita Filho" (UNESP).         [ Links ]

[9]  KOK, E. A. O farelo de raspas de mandioca na alimentação dos animais. Bol. Ind. Alim., São Paulo, v. 5, n. 4, p. 195-205, 1942.        [ Links ]

[10]  KROTKIEWSKI, M. Effect of guar-gum on body weight, hunger ratings and metabolism in obese subjects. Br. J. Nutr., v. 52, p. 97-105, 1984.        [ Links ]

[11]  KROTKIEWSKI, M. & SMITH, U. Dietary fiber in obesity. In: LEEDS. A. R., AVENEL, A.. Dietary of fibre perspectives – rewiews and bibliography, London: John Libbey, 19p.61-67.        [ Links ]

[12]  LEONEL, M. Uso de enzimas complementares no processo de produção de etanol a partir de farelo de mandioca. Botucatu, 1998, 114p. Tese (Doutorado em Agronomia/Energia na Agricultura) - Faculdade de Ciências Agronômicas, Universidade Estadual Paulista.        [ Links ]

[13]  LORENZONI, W. R. & MELLA, S. C. Avaliação do resíduo sólido obtido da lavagem da raiz da mandioca como alimento energético para bovinos. In: Resíduos da industrialização da mandioca no Brasil. São Paulo: Paulicéia, 1994, p. 91-100.        [ Links ]

[14]  MIKKELSEN, O.; MAKDANI, D. D.; COTTON, R. H.; TITCOMB, S. T.; COLMEY, J. C. & GATTY, R. Effects of a high fiber bread diet on weightloss in college-age males. Am. J. Clinn. Nutr., v. 32, p. 1703-1709, 1979.        [ Links ]

[15]  MOREIRA, S. S.; RAUPP, D. S. (1997) Caracterização do sistema de produção de polvilho azedo na região sul do país: Caracterização do bagaço de mandioca obtido no processamento do polvilho azedo. VI Encontro Anual de Iniciação Científica, 29/06 a 01/07/97, Ponta Grossa, PR.        [ Links ]

[16]  PROSKY, L.; ASP, N. G.; FURDA, I.; DeVRIES, J. W.; SCHWEIZER, T. F. & HARLAND, B. F. Determination of total dietary fiber in food products: collaborative study. J. Assoc. Off. Anal. Chem., Washington, D. C., v. 68, p. 677-679, 1985.        [ Links ]

[17]  RAUPP, D. S. & SGARBIERI, V. C. Efeitos de frações fibrosas extraídas de feijão (Phaseolus vulgaris, L.) na utilização de macro e micronutrientes da dieta pelo rato. Ciênc. Tecnol. Aliment. Campinas, v. 16, n. 2, p. 100-107, 1996.        [ Links ]

[18]  RAUPP, D. S. & SGARBIERI, V. C. Efeito da fibra solúvel de alta viscosidade na ingestão de alimentos, na excreção fecal e no peso corpóreo, em ratos. Arq. Biol. Tecnol., Curitiba, (no prelo).        [ Links ]

[19]  REEVES, P. G.; NIELSEN, F. H.; FAHEY JR., G. C. AIN-93 Purified diets for laboratory rodents: Final report of the American Institute of Nutrition Ad Hoc Writing Committee on the Reformulation of the Ain-76A Rodent Diet. J. Nutr. American Institute of Nutrition, University of Illinois, Urbana, IL, v. 123, p. 1939-1951, 1993.        [ Links ]

[20]  ROEHRIG, K. The physiological effects of dietary fiber. Food Hydrocolloids, Oxford, v. 2, p. 1-18, 1988.        [ Links ]

[21]  SCHNEEMAN, B. O. Soluble vs insoluble fiber: different physiological responses. Food Technol., Chicago, v. 2, p. 81-82, 1987.        [ Links ]

[22]  SCHWEIZER, T. F. & EDWARDS, C. A. (Eds.)Dietary Fibre - A Component of Food, Nutritional function in health and disease. London: Edited by. Springer-Verlag, 1992, 354p.        [ Links ]

[23]  EVA-PEREIRA. A.; MORAES, G. R.; OLIVEIRA, S.P. & REYES, F. G. R. Uso de biscoito rico em fibras no tratamento da constipação intestinal crônica. Ver. Paul. Med., v. 109, p. 265-268, 1991.        [ Links ]

[24]  SHEARER, R. S. The effects of bulk-producing tablets on hunger intensity in dieting patients. Curr. Ther. Res., v. 19, p. 433-441, 1976.        [ Links ]

[25]  SMITH, A. N.; DRUMMOND. E. & EASTWOOD, M. A. The effects of coarse and fine Canadian Red Spring Wheat and French Soft Wheat bran on colonic motility in patients with diverticular disease. Am. J. Clin. Nutr., v. 34, p. 2460-2463, 1981.        [ Links ]

[26]  TOMA, R. B. & CURTIS, D. J. Dietary fiber: effect on mineral bioavailability. Food Technol. Chicago, v. 2, p. 111-116, 1986.        [ Links ]

[27]  WALKER. A. R. P. Effect of high crude fiber intake on transit time and the absorption of nutrients in South African Negro schoolchildren, Am. J. Clin. Ntr., v. 28, p. 1161-1169, 1975.        [ Links ]

[28]  WISKER, E. & FELDHEIM, W. Faecal bulking and energy value of dietary fiber. In: SCHWEIZER, T. F. & EDWARDS, C. A. Dietary Fibre - A Component of Food. Nutritional function in health and disease. London: Edited by Springer-Verlag, 1992, p. 233-246.        [ Links ]

 

 

6 – AGRADECIMENTOS

O primeiro autor agradece ao Dr. Gilvan Wosiack por permitir que as análises físicas e químicas pudessem ter sido realizadas no Laboratório de Tecnologia de Alimentos da UEPG, de sua responsabilidade; ao CNPq/PIBIC/UEPG pela concessão de uma bolsa de iniciação científica para o período agosto/96 a julho/97.

 

 

1 Recebido para publicação em 27/08/98. Aceito para publicação em 20/05/99.

2 Universidade Estadual de Ponta Grossa, Departamento de Zootecnia e Tecnologia de Alimentos, Campus Uvaranas, Bloco F, Ponta Grossa, PR, CEP 84010-330 - Fone 042 220-3082 /3083.

3 Universidade Estadual de Ponta Grossa, Departamento de Ciência do Solo e Engenharia Agrícola.

4 Instituto de Tecnologia de Alimentos, Avenida Brasil, 2880 - CEP. 13.073-001 - Campinas, SP.

* A quem a correspondência deve ser enviada. quem a correspondência deve ser enviada.