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Acta Ortopédica Brasileira - Laboratorial analysis of the myelomeningocele gait of lower lumbar level and unilateral hip instability

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Acta Ortopédica Brasileira

Print version ISSN 1413-7852

Acta ortop. bras. vol.12 no.2 São Paulo Apr./June 2004

http://dx.doi.org/10.1590/S1413-78522004000200004 

ARTIGO ORIGINAL

 

Análise laboratorial de marcha na mielomeningocele de nível lombar baixo e instabilidade unilateral do quadril

 

 

 

Ana Paula T. GabrieliI; Steve VankoskiII; Luciano S. DiasIII; Carlo MilaniIV; Alexandre LourençoV; José Laredo FilhoVI

IMestre, Dept. Clínica Cirúrgica, Universidade de Caxias do Sul
IIBioengenheiro, Laboratório de Análise de Marcha, Children's Memorial Hospital, Chicago, IL, USA
IIIProfessor, Depto. de Ortopedia, Laboratório de Análise de Marcha, Children's Memorial Hospital, Chicago, IL, USA
IVLivre Docente, Professor Associado do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da UNIFESP/EPM
VDoutor,  Professor Afiliado do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da UNIFESP/EPM
VIProfessor Titular do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da UNIFESP/EPM

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este estudo examina a influência da instabilidade unilateral do quadril sobre a marcha de pacientes portadores de mielomeningocele, nível lombar baixo e instabilidade unilateral do quadril.
Foram estudados através da análise laboratorial de marcha, 20 pacientes deambuladores comunitários utilizando goteiras e muletas, com luxação ou subluxação unilateral do quadril. ,
Os pacientes foram sub divididos em dois grupos. Grupo 1 (10 pacientes) , que não apresentavam contraturas do quadril (flexão e/ou adução) ou as apresentavam de forma simétrica entre os lados; e Grupo 2 (10 pacientes), que apresentavam contraturas assimétricas de quadril A cinemática do quadril e da pelve foi analisada no sentido de se avaliar a simetria entre o lado envolvido e o oposto. Sete pacientes do Grupo 1 e 2 do Grupo 2 apresentaram marcha simétrica. Marcha assimétrica foi encontrada em 3 pacientes do Grupo 1 e 7 pacientes do Grupo 2. A assimetria na marcha relacionou-se principalmente com a presença de contraturas de quadril unilaterais ou bilaterais mas assimétricas.
Demonstrou-se que a assimetria da marcha não pode ser atribuída somente à instabilidade do quadril, mas parece estar mais relacionada com presença de contraturas unilaterais ou assimétricas e cujo tratamento deveria ser o objetivo em detrimento de reduções cirúrgicas do quadril.

Descritores: Mielomeningocele; Luxação do quadril; Marcha


 

 

INTRODUÇÃO

A mielomeningocele é um dos defeitos de fechamento do tubo neural que resulta em déficit neurológico distal à lesão. Os pacientes podem ser classificados de acordo com o nível neurológico em torácico, lombar alto, lombar baixo e sacral(8). Pacientes de nível lombar baixo tipicamente mostram força muscular grau 3 ou maior em quadríceps e isquiotibiais mediais, mas não apresentam função da musculatura glútea.

Os avanços no manejo neurocirúrgico e urológico destes pacientes têm aumentado sua expectativa de vida e o desenvolvimento e manutenção da marcha durante a vida tornou-se um objetivo realista. O nível neurológico parece ser o fator mais importante para determinar-se o potencial deambulatório. Oitenta por cento das crianças de nível lombar baixo deverão permanecer como deambuladores comunitários durante a vida. Outros fatores que influenciam a capacidade deambulatória são as deformidades de membros inferiores e coluna vertebral(1).

Cerca da metade dos pacientes com mielomeningocele apresentarão algum grau de instabilidade do quadril durante os dez primeiros anos de vida. Isto ocorre devido ao desequilíbrio entre as forças flexoras e extensoras e adutoras/abdutoras que atuam na articulação e é característico dos pacientes de nível lombar baixo. A correlação entre luxação ou subluxação do quadril e a diminuição ou perda da habilidade para andar em pacientes com mielomeningocele tem sido discutida na literatura. Alguns estudos não mostram correlação entre o estado do quadril e a capacidade para marcha. Outros autores, entretanto, demonstram que pacientes com quadris reduzidos teriam a qualidade da marcha beneficiada pela redução, principalmente em casos de instabilidade unilateral, por causa do possível desenvolvimento de discrepância do comprimento dos membros inferiores, obliqüidade pélvica e escoliose(13) Alguns estudos defendem a idéia de que a redução cirúrgica está indicada apenas em pacientes com instabilidade unilateral. Deve ser enfatizado que somente um destes trabalhos baseou suas conclusões em critérios objetivos da análise laboratorial da marcha e que a indicação cirúrgica é ainda controversa e discutível. Existe uma alta incidência de complicações cirúrgicas nestes procedimentos, como rigidez, fraturas patológicas e recidiva da instabilidade, que poderiam, por si só, levar à diminuição da capacidade deambulatória(3, 4, 10, 12)).

A análise laboratorial da marcha permite o entendimento das características da marcha normal e patológica, sendo que as doenças neuromusculares têm sido muito estudadas, principalmente a paralisia cerebral(7). Na mielomeningocele, estudos descreveram as características peculiares à marcha de pacientes de nível sacral e lombar baixo, tendo sido raramente abordado o efeito da instabilidade unilateral do quadril sobre a marcha (3, 5, 14, 15). Considerando de um lado a importância de desenvolver e manter a marcha nestas crianças e de outro lado, os problemas vinculados aos tratamentos cirúrgicos, é importante estabelecer de forma exata quais os fatores que influenciam a capacidade deambulatória, a fim de evitarem cirurgias e tratamentos desnecessários. Neste sentido, este estudo visa analisar a marcha de pacientes com mielomeningocele de nível lombar baixo e instabilidade unilateral do quadril , deambuladores comunitários utilizando goteiras de polipropileno e muletas, comparando pacientes com contraturas unilaterais ou assimétricas em flexão e/ou adução dos quadris com aqueles que não as apresentam, ou as apresentam de forma simétrica. Nosso objetivo é estudar a influência destas contraturas sobre a marcha destes pacientes.

 

MÉTODOS

Foram analisados 20 pacientes portadores de mielomeningocele de nível lombar baixo, conforme a definição de Hoffer (força muscular grau 3, no mínimo, em adutores e flexores do quadril, flexores do joelho e dorsiflexores do pé). Treze pacientes eram do sexo feminino e 7, do sexo masculino, com idade média de 10,2 anos (variando de 5 a 18 anos). Todos pacientes eram deambuladores comunitários (pela descrição de Hoffer) e deambulavam com goteiras de polipropileno e muletas(8). Todos os pacientes apresentavam luxação ou subluxação (definidas pelo índice de Reimers (11) como percentagem de migração igual ou maior que 33%) unilateral do quadril.

Nenhum paciente apresentava escoliose maior que 20 graus ou complicações neurológicas relacionadas à mielomeningocele na época da análise da marcha. Nenhum paciente havia realizado cirurgias ósseas do quadril anteriormente aos estudos.

Os pacientes foram sub divididos em dois grupos, de acordo com a presença de contraturas de quadris – flexão e/ou adução. As contraturas em flexão foram medidas através do teste de Thomas e foram chamadas graves quando maiores de 30 graus, moderadas, quando entre 20 e 30 graus e leves se menores de 20 graus. As contraturas em adução do quadril foram medidas com os quadris fletidos e foram classificadas como graves quando menos de 10 graus de abdução era obtida, moderadas, se a abdução era entre 10 e 30 graus e leves se mais do que 30 graus de abdução do quadril era possível. O Grupo 1 compreendeu dez pacientes que não apresentavam contraturas (flexão e/ou adução) de quadril ou as apresentavam de forma simétrica (Tabela 1) A idade média no Grupo 1 era de 9,8 anos (variando entre 5 e 15 anos), havia 8 pacientes do sexo feminino e 2 do sexo masculino. Nove pacientes apresentavam instabilidade do quadril direito e um, do quadril esquerdo.

No Grupo 2 havia 10 pacientes com contraturas em adução e/ou flexão unilateral ou assimétricas do quadril, que foram medidas conforme previamente mencionado. A média de idade neste grupo foi de 10,5 anos (variando entre e 18 anos). Eram 5 pacientes do sexo masculino e 5 do sexo feminino. Oito pacientes apresentavam instabilidade do quadril direito e, 2 do quadril esquerdo (Tabela 2).

Dois pacientes apresentavam discrepância do comprimento dos membros inferiores de mais de 3 centímetros, sendo que nestes a análise de marcha foi realizada com o uso de compensação no calçado.

A análise tridimensional da marcha foi realizada utilizando o sistema Vicon (Oxford Metrics Inc. USA). O paciente era submetido ao exame físico e ao teste muscular manual antes da análise, a fim de avaliar o grau de mobilidade articular e estabelecer a presença e grau de contraturas nos quadris. Para a realização da análise da marcha foram utilizados eletrodos musculares de superfície e o paciente era instruído a deambular em uma velocidade auto-determinada. Pelo menos três tomadas eram coletadas e a mais representativa era selecionada para ser analisada. Dados de cinemática, cinética e eletromiográficos foram coletados. Neste estudo foram utilizados somente os dados da cinemática em relação à obliqüidade pélvica, rotação, abdução/adução e flexão/extensão do quadril, além dos parâmetros lineares da marcha (velocidade, cadência e comprimento do passo). Os dados da cinemática do quadril foram analisados e classificados em diferente ou similar, dependendo se havia ou não diferença na apresentação entre os lados direito e esquerdo, além disso foi avaliado o grau de alteração em relação à marcha normal. A marcha foi então classificada em simétrica (se os lados direito e esquerdo apresentavam similaridade na cinemática da pelve e quadril) (Fig. 1) ou assimétrica (quando a cinemática era diferente entre os lados) (Fig. 2).

 

 

 

 

Por tratar-se de um estudo retrospectivo, baseado na análise de prontuários e exames de imagem dos pacientes, não foram obtidos consentimentos informados. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de ética em Pesquisa da UNIFESP/EPM.

 

RESULTADOS

Os dados dos pacientes e parâmetros de marcha e da cinemática do quadril e pelve nos Grupos 1 e 2 estão demonstrados nas Tabelas 1 e 2, respectivamente.

Não houve diferença estatística entre os Grupos em relação à idade, discrepância do comprimento dos membros inferiores, velocidade, cadência e comprimento do passo. Os parâmetros de marcha, entretanto, eram discretamente maiores no Grupo 1 (Tabela 3).

 

 

Sete pacientes no Grupo 1 foram considerados simétricos porque não havia diferença entre os lados afetado e não afetado, no que diz respeito à cinemática da pelve e do quadril. Quatro deles não tinham contraturas de adução e/ou flexão dos quadris. Três pacientes mostravam diferenças na cinemática de pelve e quadril entre os lados e foram classificados como assimétricos; todos apresentavam contraturas em adução e/ou flexão dos quadris (Tabela 1).

Dois estudos no Grupo 2 mostraram marcha simétrica no que diz respeito à cinemática de pelve e quadril. Ambos apresentavam contraturas moderadas em adução do lado afetado. Oito pacientes mostraram marcha assimétrica, sendo que os movimentos de abdução/adução do quadril na análise foi o mais alterado entre os lados. A maioria deles apresentava contraturas em adução moderadas do lado afetado (Tabela 2).

Houve diferença estatística significante na comparação do número de pacientes com marcha simétrica e assimétrica nos dois Grupos, sendo a simetria da marcha mais relacionada com à ausência de contraturas do quadril ou com à presença de contraturas de igual magnitude, bilateralmente (Grupo 1) (Tabela 4).

 

 

Comparando as médias de idade, porcentagem de migração da cabeça femoral, discrepância no comprimento dos membros inferiores, velocidade, cadência e comprimento do passo entre os casos com marcha simétrica e assimétrica, não houve diferença estatística em qualquer dos grupos (Tabelas 5 e 6).

 

 

 

 

DISCUSSÃO

Cerca de 80% dos pacientes com mielomeningocele de nível lombar baixo são capazes de deambular independentemente durante a vida adulta (14). A correlação entre a subluxação ou luxação dos quadris e a capacidade deambulatória, entretanto, carecia de demonstração objetiva na literatura. De acordo com nosso conhecimento existe apenas um estudo que avaliou a instabilidade unilateral do quadril utilizando a análise laboratorial da marcha em pacientes com mielomeningocele, o qual demonstrou que contraturas de flexão e/ou adução, mesmo leves podem levar a um padrão assimétrico da marcha(3).

A fim de obter e manter uma marcha eficiente, é necessário alcançar estabilidade na fase de apoio, apresentar bons meios de progressão e preservar energia(7). Nas doenças neuromusculares é comum haver excessivo desvio vertical do centro de gravidade, normalmente localizado anteriormente à segunda vértebra sacral. A assimetria da marcha corresponde a um desvio do centro de gravidade, o que pode causar aumento do gasto energético(14). Ela pode estar relacionada a diferenças de força muscular ou do movimento articular entre os lados. Por conseqüência, objetivar o desenvolvimento de simetria na marcha em pacientes com mielomeningocele é um fator que provavelmente possa influenciar a manutenção da capacidade deambulatória durante a vida. Padrões simétricos de marcha foram mais encontrados em pacientes do Grupo 1, que não mostravam contraturas de quadril ou as mostravam em igual magnitude entre os lados, e este achado obteve significância estatística em nossos dados. Padrões assimétricos da cinemática de abdução/adução e rotação e obliqüidade pélvicas estiveram relacionados à presença de contraturas unilaterais do quadril, particularmente de adução, o que pode levar à conclusão de que a correção destas contraturas deva ser o objetivo no tratamento destes pacientes, idéia que também já foi defendida por outros autores(10).

1. Simetria da marcha

No Grupo 1, 7 pacientes mostraram padrão simétrico da marcha e três, assimétrico.Quatro dos sete não apresentavam contraturas do quadril e os outros 3 as apresentavam de forma leve ou moderada. Os 3 pacientes com marcha assimétrica mostraram diferenças na obliqüidade pélvica ou na abdução/adução dos quadris e apresentavam contraturas em flexão e/ou adução dos quadris.

No Grupo 2, os 8 pacientes mostravam diferenças na cinemática do quadril entre os lados, principalmente na abdução/adução do quadril, a maioria apresentava graves contraturas em adução do lado afetado. A assimetria da marcha pode ser explicada pela necessidade de, na mielomeningocele, ser necessário abduzir o quadril na fase de balanço durante a marcha com muletas, a fim de facilitar a liberação do pé. Assim como já demonstrado por outros autores, deformidades que limitam a abdução (como contraturas em adução) interferem negativamente na marcha, levando a uma obliqüidade pélvica desigual e conseqüente assimetria da marcha(15). Os dois casos que mostravam marcha simétrica no Grupo 2 apresentavam contraturas moderadas em adução do quadril do lado afetado. Estes casos tiveram velocidade, cadência e comprimento do passo maiores que a média do grupo, sugerindo que, mesmo com a presença de contraturas de quadril desiguais entre os lados, se o padrão de marcha é simétrico, os parâmetros da marcha não são prejudicados. A literatura mostra uma relação direta entre velocidade e gasto energético em pacientes com mielomeningocele(6). Nosso estudo revelou que a velocidade foi maior em pacientes do Grupo 1, mas esta demonstração não obteve significância estatística, provavelmente por causa do pequeno número de pacientes analisados. Nos dois pacientes do Grupo 2, que mostravam marcha simétrica, os parâmetros lineares de marcha estavam acima da média do grupo. Serão necessários outros estudos, com maior casuística para confirmar estes dados.

2. Parâmetros lineares da marcha, discrepância de comprimento e porcentagem de migração

Em nossos grupos, divididos pela presença de contraturas assimétricas do quadril, não pudemos demonstrar diferenças estatisticamente significativas no que diz respeito à discrepância do comprimento dos membros, porcentagem de migração da cabeça femoral, velocidade, cadência e comprimento do passo, embora estes parâmetros fossem discretamente superiores no Grupo 1, mostrando que a ausência de contraturas no quadril ou a sua presença bilateralmente na mesma magnitude, não influencia negativamente a marcha (Tabela 3). Talvez a falta de significância estatística possa ser atribuída ao pequeno número de casos analisados.

3. Obliqüidade pélvica

No Grupo 1, 8 pacientes mostraram o mesmo padrão de obliqüidade pélvica bilateralmente e dois, diferentes graus entre os lados (ambos apresentavam padrão assimétrico de marcha e contraturas em flexão e/ou adução). No Grupo 2, 8 pacientes mostravam o mesmo grau de obliqüidade pélvica bilateralmente, e dois, diferentes graus entre os lados (ambos mostrando padrão assimétrico de marcha).

A maioria dos pacientes deste estudo mostrou aumento da obliqüidade pélvica, não sendo este achado provavelmente relacionado à instabilidade do quadril. A obliqüidade pélvica excessiva na mielomeningocele também já foi demonstrada em outros estudos e deve-se basicamente à marcha em Trendelenburg, característica desta população, por causa da fraqueza do músculo glúteo médio. Além disso, o desvio lateral do tronco é o responsável pelo despregamento do pé na fase de apoio terminal, quando existe paralisia da musculatura dorsiflexora do pé, o que gera maior obliqüidade pélvica5, 15).

Conforme demonstrado na literatura, a manutenção do alinhamento pélvico é muito importante para a manutenção da capacidade deambulatória(9). Na mielomeningocele duas são as causas principais para a perda deste alinhamento : a presença de escoliose e a fraqueza do músculo glúteo médio, não se incluindo - a presença de instabilidade unilateral do quadril. Nenhum de nossos pacientes apresentava escoliose significativa, porém todos pertenciam ao nível lombar baixo, onde a força do músculo glúteo médio é muito diminuída ou inexiste.

4. Inclinação pélvica anterior

Somente um paciente do Grupo 2 e nenhum do Grupo 1 mostrou diferentes graus de inclinação pélvica anterior entre os lados. Esta distribuição homogênea de alterações neste parâmetro da cinemática da pelve entre os grupos pode ser provavelmente explicada pelas características próprias destes pacientes, como paralisia da musculatura extensora dos quadris, uso de muletas e pela presença de contraturas em flexão do quadril (que no nosso estudo, na maioria dos casos, eram leves ou moderadas). Além disso, as goteiras de polipropileno costumam exacerbar a inclinação pélvica anterior, porque diminuem o avanço tibial anterior que ocorre quando existe paralisia dos dorsiflexores do tornozelo. Desta forma, a fim de manter o centro de gravidade dentro da base de apoio, o paciente tende a inclinar a pelve anteriormente(5, 15). É possível que na presença de contraturas em flexão graves haja maior alteração da inclinação pélvica anterior entre os lados.

5. Rotação pélvica

Somente 3 pacientes apresentavam marcha assimétrica com diferentes padrões de rotação pélvica entre os lados, todos do Grupo 2 . Todos apresentavam contraturas em flexão do quadril afetado. O aumento da rotação pélvica é um fator que torna mais fácil a progressão do corpo quando existe fraqueza ou paralisia da musculatura extensora dos quadris e dorsiflexora dos tornozelos, sendo portanto característico na mielomeningocele. Rotação pélvica excessiva também foi notada após transferências do músculo iliopsoas, que no passado era realizada para o tratamento das instabilidades do quadril(5). Em nossa casuística, em que nenhum paciente havia sido submetido a esta cirurgia, este fato poderia ser explicado pela presença de contraturas unilaterais em flexão dos quadris em quase todos os casos.

6. Abdução / adução

No Grupo 1 houve somente 2 pacientes que apresentavam diferenças no comportamento cinemático em relação à abdução / adução dos quadris, gerando assimetria da marcha, provavelmente porque, se contraturas de adução estavam presentes, elas eram de igual magnitude bilateralmente. No Grupo 2, 7 casos mostravam desigualdade nos padrões cinemáticos de abdução/adução entre os quadris. Cinco deles apresentavam contraturas unilaterais em adução do lado afetado. Estes achados explicam o caráter assimétrico da marcha, mais encontrado no Grupo 2.

Outros autores encontraram anormalidades na cinemática de abdução/adução dos quadris na mielomeningocele, embora a presença de contraturas do quadril não fosse mencionada(5, 15). Eles demonstraram que em pacientes sem contraturas ou instabilidade do quadril, geralmente existe um aumento da abdução do quadril na fase de balanço, devido à excessiva rotação pélvica. De acordo com nossos dados, as anormalidades na cinemática de abdução/adução foram mais freqüentes no Grupo 2, possivelmente devido à presença de contraturas unilaterais do quadril, especialmente em adução, o que colaborou na geração do caráter assimétrico da marcha.

7. Flexão /extensão

Diferentes padrões entre os lados no que diz respeito à cinemática de flexão/extensão dos quadris foram encontrados em 4 pacientes do Grupo 2 (três apresentavam contraturas em flexão somente do lado afetado). Nenhum paciente do Grupo 1 apresentou esta diferença entre os lados, novamente demonstrando que a assimetria da marcha devido à alteração da cinemática do quadril em flexão/extensão esteve relacionada à presença de contraturas unilaterais.

 

CONCLUSÃO

Pacientes com luxação ou subluxação unilateral do quadril podem apresentar uma marcha simétrica e portanto, eficaz no sentido de preservar energia. Conforme está demonstrado na literatura, mas pouco confirmado pela análise laboratorial de marcha, o fato do quadril estar reduzido ou não, por si só, não é o responsável pela assimetria da marcha encontrada nestes pacientes, a qual é muito mais relacionada com à presença de contraturas em adução e/ou flexão unilaterais ou assimétricas do quadril. Por causa disto, a redução cirúrgica dos quadris, defendida por alguns autores, parece não ter indicação(13, 10). Uma vez que parece haver um grande desequilíbrio entre as forças musculares do quadril, mesmo realizando a redução aberta e osteotomias femorais e pélvicas, a incidência de reluxação e outras complicações, como rigidez, é muito alta. Nosso estudo mostra que todos os esforços devem ser direcionados a fim de evitar e corrigir as contraturas unilaterais de partes moles dos quadris, especialmente as de adução e flexão, o que também já foi demonstrado em outros estudos(2, 12, 13). Procedimentos como miotomia dos adutores, ou se necessário, osteotomia femoral proximal em valgo; e alongamento do músculo psoas , cirurgias mais simples que a redução cirúrgica do quadril, podem ser necessários. Em pacientes com mielomeningocele e luxação ou subluxação unilateral do quadril, o objetivo ortopédico deve ser a obtenção de marcha simétrica, prevenindo ou corrigindo contraturas do quadril e ignorando a luxação. Com isso, muito menos complicações ocorrerão a fim de manter estes pacientes deambulando na vida adulta(9).

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Endereço para correspondência
Rua Gal. Arcy da Rocha Nóbrega, 401/703
Caxias do Sul – RS - CEP 95040-290
fone fax (54) 219 3943
email: gabrieli@terra.com.br

Trabalho recebido em 06/08/03
Aprovado em 09/04/04

 

 

Estudo realizado no Laboratório de Análise de Marcha do Children's Memorial Hospital, Northwestern University Medical School, Chicago, IL, USA; Escola Paulista de Medicina/ UNIFESP e Universidade de Caxias do Sul.