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Lua Nova: Revista de Cultura e Política - Political order and subject of right in the debate about human rights

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Lua Nova: Revista de Cultura e Política

Print version ISSN 0102-6445

Lua Nova  no.57 São Paulo  2002

http://dx.doi.org/10.1590/S0102-64452002000200005 

Ordem política e sujeito de direito no debate sobre direitos humanos*

 

Political order and subject of right in the debate about human rights

 

 

Andrei Koerner

Pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP e coordenador do IEDIS

 

 


RESUMO

O debate teórico sobre os direitos humanos durante os anos noventa é analisado a partir de dois eixos: a ordem política que garante esses direitos e a relação do sujeito à regra de direito. Estes eixos têm como pontos extremos: o primeiro, a ordem estatal e a ordem global e o segundo, uma concepção institucional e uma concepção sociológica da relação do sujeito à regra de direito. Isso permite identificar quatro posições polares, juntamente com os problemas teóricos e práticos que enfrentam.

Palavras-chave: Direitos humanos; ordem jurídica; ordem política.


ABSTRACT

The theoretical debate about human rights during the nineties is analyzed according to two axis: the political order that grants those rights and the relation between the subject and the rule of law. The ultimate questions those axis point out are: first, the state order and the global order and, second, an institutional conception and a sociological conception about how the subject is related to the rule of law. Four polar positions are, then, identified, along with the theoretical and practical problems they face.

Keywords: Human rights; juridical order; political order.


 

 

Neste artigo apresentamos uma análise do debate sobre os direitos humanos dos anos noventa, em que se combinaram mudanças políticas na sociedade internacional e importantes transformações conceituais nos direitos humanos.

Tomamos como ponto de partida a bibliografia sobre os direitos humanos, voltamos nossa atenção para os eixos em que se condensaram os debates do período, a fim de apresentarmos uma formulação simplificada de diferentes posições políticas e intelectuais a respeito das principais polêmicas. Organizamos a exposição segundo as diferentes posições adotadas pelos autores em torno de dois eixos: as relações entre as ordens políticas interestatal e estatal e as relações entre os sujeitos e as normas.

A apresentação tem os seguintes momentos: (1) o duplo processo de transformações conceituais da política internacional e dos direitos humanos; (2) os dois eixos de análise; (3) a caracterização das quatro posições polares; e (4) a apresentação das conseqüências desse debate e algumas questões para pesquisa posterior: democracia global, direitos humanos e diálogo intercultural.

 

TRANSFORMAÇÕES POLÍTICAS E CONCEITUAIS

Em contraste com a agenda política dos Estados nacionais, em que o ajuste estrutural e o equilíbrio macro-econômico marcaram o debate político e acadêmico, o tratamento de temas sociais marcou a agenda dos direitos humanos das Nações Unidas na década de noventa. Neste processo ocorrem importantes rearticulações entre as ordens políticas, interna e interestatal, bem como debates sobre a redefinição do conceito de direitos humanos.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, fora formulada dentro de um sistema internacional cujos sujeitos eram os Estados nacionais. A eles caberia a implementação dos direitos humanos em seus territórios, bem como a responsabilidade internacional pelas violações. Os Estados viam com muitas restrições iniciativas internacionais na área dos direitos humanos. Essa concepção comandou a elaboração dos Pactos Internacionais de Direitos Civis e Políticos e dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, assinados em 1966 e prevaleceu durante todo o período da Guerra Fria. Mas houve algumas ampliações no campo do monitoramento internacional dos direitos humanos no período.

Nas Conferências das Nações Unidas dos anos noventa importantes transformações dos direitos humanos modificam este quadro. Assim, a Conferência de Viena de 1993 reafirmou a universalidade, indivisibilidade, inter-relação e interdependência dos direitos humanos, o direito ao desenvolvimento, assim como a relação necessária entre direitos humanos, democracia e desenvolvimento, do qual a pessoa humana é o sujeito central. Reconheceu a legitimidade da preocupação internacional com a proteção e promoção dos direitos humanos, limitando o princípio da soberania estatal nesse ponto. Previu a criação de programas de assistência técnica, promovidos pelas Nações Unidas, para incrementar a capacidade dos Estados de proteger e promover os direitos humanos e recomendou a criação do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos1. As outras Conferências das Nações Unidas da década foram no mesmo sentido, pois nelas foram formulados planos de implementação, programas de cooperação, procedimentos de monitoramento internacional e de responsabilidade pelas violações. No plano institucional, criaram-se – ou foram instalados – órgãos supra-nacionais de fiscalização e responsabilização por violações de direitos humanos bem como novas interações entre eles, estados e organizações da sociedade.

Na primeira metade dos anos noventa ocorre um movimento de "maré montante", em que os foros das instituições multilaterais são abertos às demandas de promoção de direitos humanos de grupos discriminados ou em situação de risco, postas por Estados, agências de cooperação e, especialmente, as ONGs. Mas, a partir da Conferência de Istambul, em 1996, vê-se uma regressão nesses espaços, por um lado porque as Nações Unidas passam a enfrentar problemas crescentes, uma vez que suas agências sofrem restrições orçamentárias e críticas a concepções ‘socialistas’ nelas predominantes; por outro lado, devido à ocupação dos espaços de decisão consensual por grupos que buscam visibilidade e respostas para seus problemas ou que procuram revisar as formulações adotadas por consenso nas Conferências anteriores.

Do ponto de vista do processo político, prospectos otimistas de internacionalização e consensualismo das decisões políticas foram duramente contrastados por eventos que ocasionaram em graves violações dos direitos humanos. Os atentados de setembro de 2001 constituem evidente inflexão nessa situação. Embora seja cedo para avaliar os efeitos da nova situação para os direitos humanos, parece certo que ela representa uma clara mudança em relação ao período anterior.

Assim, no campo dos direitos humanos, ocorre um duplo processo durante a "longa década de noventa (de 1989 a 2001)": por um lado, no plano da enunciação dos direitos, dá-se a maior permeabilidade entre as ordens políticas estatal e interestatal, bem como o deslocamento da efetivação dos direitos humanos do plano da titularidade formal de sujeitos individuais para a dimensão das práticas sociais e da realização de concepções individuais e coletivas de vida boa. Nesse sentido, coloca-se a questão da democracia e da participação, a das formas de interação entre Estado, organizações da sociedade civil e indivíduos. Porém, por outro lado, a situação política internacional mostra como essas relações estão ainda indefinidas, dada a proteção internacional seletiva dos direitos humana, submetida aos interesses geopolíticos das principais potências, assim como as reações de suas lideranças e de grupos políticos fundamentalistas, nacionalistas e defensores de outros particularismos, que contestam mudanças mais profundas no campo dos direitos humanos.

 

OS DOIS EIXOS DE ANÁLISE

O levantamento bibliográfico preliminar mostrou ser imensa a produção bibliográfica sobre os direitos humanos. O tema foi abordado pelas mais variadas correntes políticas, perspectivas disciplinares e orientações intelectuais2. Procuramos fazer uma exposição estilizada de posições opostas no campo dos direitos humanos, a partir de eixos em que se condensam tensões políticas e divergências intelectuais relevantes. Mas o trabalho não pretende ser exaustivo e nem mesmo representativo da bibliografia e a análise que segue não é mais que uma primeira abordagem do tema.

Apresentamos posições alternativas que se situam no interior do próprio campo dos direitos humanos, que os aceitam, em alguma medida. Algumas formulações incorporam críticas e argumentos que estão nos limites do campo e, possivelmente, foram "importadas" de pontos de vista externos3. As posições são definidas a partir do cruzamento de dois eixos: as relações entre ordem política estatal e ordem global; as relações entre o sujeito e a norma jurídica.

Ordem política: refere-se à autoridade política à qual é atribuído o papel de reconhecer/proteger/promover os direitos humanos, mas que, inversamente, pode praticar graves violações. Nesse eixo, as tensões se agrupam em torno da soberania, postas por mudanças que tendem à formação de uma ordem global num sistema de Estados.

Neste eixo, apresentamos dois pólos: um, que atribui papel predominante à ordem política global e o outro, que atribui papel predominante à ordem política estatal. Desses pólos, o segundo é mais comum na bibliografia de direitos humanos, pois difícil encontrar algum autor que defenda o predomínio exclusivo da ordem política internacional, no sentido de um governo mundial e que levaria ao fim o sistema de Estados nacionais. Assim, o segundo pólo é mais nítido nos textos trabalhados, enquanto o primeiro aparece sempre em algum tipo de combinação.

Sujeito e norma: refere-se à maneira pela qual se concebe a relação entre a norma jurídica e a determinação dos cursos de ação dos sujeitos. Neste eixo, as tensões se agrupam em torno do relativismo cultural, em que a efetivação dos direitos humanos é concebida como a determinação da vontade dos sujeitos por enunciados mandatórios emitidos pelas instituições, ou como a incorporação de normas e valores culturais.

Neste eixo, os dois pólos são: um, que identifica o direito como um sistema autônomo de normas, o qual tem uma relação mandatória com os sujeitos; e outro, que concebe o direito como um aspecto da normatividade social, a qual tem outras modalidades de relações com os sujeitos.

Dentre esses pólos, em teorias dos direitos humanos o primeiro parece ser mais comum enquanto que, no segundo pólo, é difícil encontrar alguma formulação que não reconheça algum caráter mandatório às normas postas pela autoridade pública, pois isso significaria a sua supressão enquanto ordem pública e governo central seja ele estatal ou internacional. Assim, o primeiro pólo é mais nítido nos textos trabalhados, enquanto o segundo aparece sempre em algum tipo de combinação.

Temos, pois, o seguinte quadro para a análise:

 

 

A combinação simples desses elementos em pares resulta nas seguintes posições:

• Globalismo (I;1): deve predominar a ordem política global, cujo sistema de normas é mandatório sobre os dos Estados e as normatividades sociais.

• Estatalismo (II;1): deve predominar a ordem política estatal, cujo sistema de normas é mandatório, tanto em relação ao da ordem política internacional como as sociais e comunitárias. O direito internacional dos direitos humanos só deve ter efetividade jurídica se for incorporado à legislação nacional. Por sua vez, as normatividades sociais só são reconhecidas se compatíveis com as normas estatais.

• Contextualismo (II;2): deve predominar a ordem política estatal, a qual deve reconhecer e combinar as diferentes normatividades produzidas pelos grupos sociais.

• Trans-localismo (II;1): deve predominar a ordem internacional, cuja normatividade resulta da combinação das diversas normatividades do globo, a qual não se põe como ordem mandatória, mas como resultado de um processo de diálogo intercultural, que promove o reconhecimento das diferenças e, pois, consensos.

O sujeito de direitos humanos é concebido a partir das capacidades ou práticas sociais. Para ser justa, a ordem normativa global deve levar em conta, além das necessidades básicas e capacidades dos indivíduos (o que pode ser alcançado com uma ordem internacional igualitária), as diferentes concepções comunitárias da vida boa..

Desenvolvemos a seguir essas quatro combinações, procurando apontar as suas "afinidades eletivas" com relação a alguns temas, bem como os problemas cruciais que enfrentam.

 

AS QUATRO POSIÇÕES

1. Globalismo4

Para essa posição, as transformações pelas quais a política internacional tem passado desde o final da Segunda Guerra apontam para a formação de uma verdadeira ordem global. Apesar das variações das formulações e no alcance das reformas que propõem, têm em comum a proposta de reforçar a ordem global, e, para isso, supõem que é possível transformar o sistema interestatal atual, hierárquico, fragmentário, onde parecem prevalecer relações de caráter estratégico entre agentes estatais auto-interessados, numa ordem mais estável e integrada, democratizada e promotora da cooperação, a partir de normas e valores consensuais. Devem ser adotadas reformas políticas que constituam as instituições de um verdadeiro governo global (ou, mais frequentemente, de uma governança global), através do fortalecimento e democratização das instituições multilaterais, as Nações Unidas, suas agências especializadas e as organizações regionais. Assim, propõem a ampliação do Conselho de Segurança da ONU, eliminando o poder de veto dos membros permanentes; a transformação da Assembléia Geral numa espécie de Senado, onde são representados os Estados, a qual deve ser acompanhada por uma Assembléia dos Indivíduos ou dos Povos.

No campo dos direitos humanos, há variações nas formulações, desde a proposta de que as instituições multilaterais protejam de forma mais efetiva um core de direitos básicos até a que propugna a ampliação do papel daquelas instituições, tornando-as verdadeiramente globais, e que assim sejam capazes de se sobrepor aos Estados e conduzir uma ampla gama de ações para a implementação dos direitos humanos.

O direito internacional teria adquirido a condição de direito constitucional global, no qual os direitos humanos seriam a carta dos direitos fundamentais, para os direitos estatais, os quais estariam sujeitos à norma de reconhecimento daqueles.

Para a proteção dos direitos humanos contra graves violações, as mudanças institucionais fortaleceriam os mecanismos internacionais e permitiriam a punição de culpados, a responsabilização dos Estados por violações, a adoção de medidas preventivas, o monitoramento de situações de risco e o controle da implementação de medidas propostas pelas instâncias da governança global.

Assim, o reforço do caráter mandatório do direito internacional dos direitos humanos seria essencial para a proteção contra as violações. Isto é, seriam reforçados os instrumentos políticos que aumentariam a previsibilidade da responsabilização dos violadores, o que significa o fortalecimento dos limites contra possíveis violações e a maior efetividade das respostas públicas aos claims que indivíduos e grupos, enquanto titulares dos direitos, possam apresentar.

As instituições multilaterais fortalecidas teriam como vantagens principais a punição dos responsáveis pelas graves violações, maiores incentivos para que os Estados respeitem e promovam os direitos humanos, a criação de um terceiro imparcial para julgar os conflitos entre Estados e indivíduos, o reconhecimento internacional dos direitos das minorias e grupos de risco e a cooperação técnica para a promoção dos direitos humanos.

Os principais temas presentes nessas formulações são graves violações ocorridas em virtude de ditadura, guerra civil ou externa, de que resultam genocídios, perseguição a opositores, e fomes coletivas. A necessidade de agir nessas situações serve como suporte para um fundamento comum entre os defensores dessa posição. Afirmam que os direitos humanos são a expressão jurídica de um sentimento compartilhado de sympathy, de solidariedade ou de compaixão face ao sofrimento de outros seres humanos. Os direitos humanos seriam, pois, a manifestação de um consenso da sociedade internacional, que reputa ilegítimos atos que infligem sérios sofrimentos a outros seres humanos.

Outra justificação é a de que os direitos humanos são universais e absolutos, pois são determinados pela razão, a partir de princípios como a liberdade e a dignidade de todo ser humano. A ênfase dessa universalidade estaria na formulação dos direitos humanos e no seu caráter moral, mais do que na sua implementação; no entanto, nos últimos 50 anos, a sociedade internacional teria promovido a sua enunciação em instrumentos jurídicos, o Direito Internacional dos Direitos Humanos, de caráter progressivamente obrigatório.

O globalismo adota uma perspectiva otimista em relação à história. Os relatos das mudanças são muitas vezes lineares, apresentando um processo cumulativo e incremental de mudanças. Esse processo, aliado à globalização econômica e cultural, tornaria predominante no mundo o estilo de vida capitalista, moderno, urbano; então, as questões relevantes aos direitos humanos estariam nesse campo; enquanto que aquelas colocadas pelas diferenças interculturais seriam crescentemente marginais. Assim, apesar de não haver instituições adequadas à efetiva proteção internacional dos direitos humanos, já estaria preparado o caminho para isso, propugnando-se a intensificação do seu uso para evitar casos graves de violações, bem como o seu aprofundamento e a ampliação do seu escopo.

Quanto ao escopo dos direitos humanos, o globalismo privilegia a proteção dos direitos civis e políticos. Outra formulação é a de que, dentre os direitos enunciados pelos instrumentos internacionais, há um cerne de direitos humanos básicos, cuja proteção as instituições multilaterais devem tornar efetiva; esses direitos humanos básicos seriam certos mínimos vitais para a sobrevivência humana e, pois, compreenderiam também os direitos sociais e econômicos.

Os sujeitos dos direitos humanos assim concebidos seriam os "seres humanos enquanto humanos", ou seja, todos os indivíduos da face da terra, portadores de nossa humanidade comum. Os indivíduos seriam os únicos sujeitos de direitos humanos, embora devam ser protegidos também dos efeitos sócio-econômicos e culturais que violem a sua condição humana básica. Alguns incluem os direitos de grupos com características específicas, o que foi acentuado na década de noventa, quando foram reconhecidos novos direitos a esses grupos.

O globalismo adota uma postura ampla no sentido da promoção dos direitos humanos, a qual deve ser alcançada por programas de cooperação internacional. Neste sentido, as formulações das Conferências das Nações Unidas dos anos noventa teriam caráter programático, pois foram formuladas em processos deliberativos, com ampla participação e seu enunciado foi adotado consensualmente. Porém, mais importante, foram acompanhadas de Planos de Ação e mecanismos de monitoramento.

O globalismo faz um paralelo entre os direitos humanos e os direitos fundamentais das Constituições dos Estados, em que os direitos humanos seriam os direitos fundamentais do direito constitucional internacional. Seus enunciados seriam os princípios de organização política, das relações entre Estados e seus cidadãos, e dos objetivos a serem buscados pela sociedade internacional e pelos Estados. Os princípios serviriam também para a interpretação das normas divergentes dos diferentes sistemas culturais, cuja compatibilização deve ser feita por processos similares à interpretação constitucional: identificar as divergências, determinar o seu alcance, circunscrever os seus efeitos, procurar resolver os conflitos mais importantes e compatibilizar lateralmente outras divergências. Deste modo, o globalismo acredita que pode ser alcançada a combinação entre princípios universais dos direitos humanos, o seu enforcement pelas instituições multilaterais em caso de graves violações e a diversidade cultural no plano da sua prática pelos Estados e sistemas culturais particulares.

Quanto aos problemas que o globalismo enfrenta, acentuamos críticas à seletividade e efeitos não esperados da intervenção humanitária e o relativismo.

A ordem política internacional é extremamente desigual em termos de recursos militares, econômicos e políticos, o que se manifesta nas instituições multilaterais. A pressão da opinião pública internacional contra graves violações de direitos humanos passa por esse jogo político desigual, que determina as respostas dadas por aquelas instituições. A seletividade acaba por minar a legitimidade de sua ação, mesmo em casos em que sua ação possa ser considerada bem sucedida. Enfim, essa situação torna pouco provável que, em curto prazo, as instituições multilaterais possam exercer um papel amplo e efetivo na prevenção de graves violações.

Associado a esse problema está o dos efeitos não esperados: sanções econômicas acentuam os sofrimentos da população dos países punidos, a intervenção militar pode resultar no envolvimento permanente num conflito, com desdobramentos para o equilíbrio regional etc. A inclusão de temas morais provoca a saturação da agenda política interestatal e em riscos adicionais, pelo pois os ressentimentos políticos e culturais gerados por intervenções militares produzem conseqüências dificilmente controláveis.

O relativismo cultural questiona a possibilidade de que as diferenças possam ser reduzidas a um mínimo denominador comum cultural. Com essa objeção, rejeita-se a possibilidade de uma técnica como a da "interpretação constitucional" no campo dos direitos humanos. Pois o problema relevante é que os sistemas culturais se articulam de maneiras diferentes, são conjuntos diferentes, que compreendem diferentes elementos e relações entre eles.

As mudanças conceituais dos direitos humanos nos anos noventa colocam em xeque definições que delimitam um core de direitos básicos. Aqui o problema é o da definição de prioridades em instituições multilaterais – ou, eventualmente, globais. Por que a ação internacional deveria remediar graves violações ao invés de priorizar ações preventivas? Como desenvolver ações preventivas de promoção dos direitos humanos, implementá-los através de ações internacionais, sem levar em conta as concepções dos destinatários?

A diversidade cultural e a indivisibilidade dos direitos humanos desdobram-se em problemas formidáveis para a formulação de políticas de direitos humanos. Para isso, mostra-se muito insuficiente uma concepção institucional dos direitos humanos. São esses problemas que põem importantes obstáculos às propostas dos globalistas de fortalecimento das instituições multilaterais. O debate sobre a reforma institucional das Nações Unidas mostra demandas pela ordem e pela sua democratização, completadas pelo ceticismo quanto à sua viabilidade.

2. Estatalismo5

Muitos autores são céticos, ou abertamente contrários, às mudanças propostas pelos globalistas, embora não sejam necessariamente contrários aos direitos humanos enquanto tais. Consideram justificadas as pretensões de universalidade – ou de universalização – dos direitos humanos formuladas por muitos globalistas e pensam que se trata de enunciados válidos, desde que tomados como parâmetros morais para a convivência dos agentes nas relações internacionais. Do ponto de vista interno, os direitos humanos seriam traduzidos nos direitos fundamentais da Constituição e na estrutura institucional do Estado de Direito.

O estatalismo interpreta de forma mais restrita as mudanças no cenário internacional ao longo dos anos noventa, as quais não teriam sido tão acentuadas quanto consideram os globalistas. Apesar essas mudanças, os estados seriam ainda os atores determinantes nas relações internacionais. Para compreendê-las, o esquema adequado de interpretação seria a interação estratégica de agentes estatais guiados pelo interesse nacional, definido em função de elementos como poder militar, interesses econômicos, posição relativa e prestígio.

O direito internacional dos direitos humanos teria o mesmo caráter que o direito internacional em geral, ou seja, de common law, direito costumeiro, cuja observância pode ser habitual entre os parceiros, mas que não teria caráter mandatório. Os tratados e outros pactos internacionais de caráter mandatório, só criariam obrigações imediatas, ou seja, prestações e contra-prestações de curto prazo e escopo limitado, dada a impossibilidade de seu enforcement efetivo pelas instituições multilaterais. Em suma, não haveria propriamente direito internacional, dada a ausência de um ente político global com capacidade militar suficiente para obrigar o cumprimento das normas internacionais pelos recalcitrantes e desobedientes e, pois, dissuadir violações (Krasner, 1993).

Outras formulações não negam a existência de esquemas de cooperação, os chamados regimes internacionais, que resultam da ação auto-interessada dos Estados. Os regimes internacionais seriam esquemas de aliança impostos pelas principais potências. Os demais Estados receberiam diversos incentivos para participar dos regimes e procurariam defender seus interesses através da exploração dos espaços abertos por eles. Os regimes tenderiam a serem progressivamente estáveis, dados os ganhos que proporcionam para os Estados, como a redução da incerteza e dos custos de informação. A estabilidade proporcionaria o hábito de obediência às normas, as quais, com o tempo, adquiririam caráter obrigatório. Assim, as normas dos regimes internacionais desencadeiam processos relativamente autônomos em relação aos interesses imediatos dos Estados. Porém, seriam bastante limitadas as possibilidades de se excederem os limites dos regimes, definidos pelos Estados mais relevantes (Hurrell, 1993; Martin e Simon, 1998).

O realismo considera, pois, que uma política global dos direitos humanos deveria ter caráter de princípios morais para os Estados. Se se buscasse a sua extensão geraria efeitos perversos, como a saturação da agenda interestatal e o uso de espaços para a apresentação de demandas e reclamações que revestem o interesse estratégico dos Estados6. A teoria dos regimes relativiza esses argumentos, pois coloca questões normativas nas relações internacionais e aposta no adensamento progressivo das normas de direito internacional advindas dos ganhos mútuos dos Estados. Com isso afasta a objeção realista à enunciação de um direito internacional dos direitos humanos, embora ainda permaneçam questões sensíveis quanto às relações entre a ordem interestatal e os Estados.

A concepção estatalista considera fortemente demarcados os limites entre a ordem jurídica internacional e a dos Estados nacionais. Os direitos humanos podem ter caráter moral ou, no máximo, quase-jurídico. A ação de instituições multilaterais poderia ser justificada e conveniente, mas apenas nas situações em que as violações de direitos humanos põem em risco a segurança coletiva. Essa pode ser definida em termos restritos, a estratégico-militar, ou um pouco mais amplos, que inclui os efeitos internacionais de graves violações de direitos humanos ocorridas no interior dos Estados (por ex.: migrações em massa geradas por conflitos internos e que afetam Estados vizinhos).

Noutra formulação, que se aproxima em parte do globalismo, reconhece-se a legitimidade da enunciação de normas internacionais de direitos humanos, as quais funcionam como padrões (standards) internacionais que expressam um certo consenso civilizacional global. Porém, a implementação dos direitos humanos caberia exclusivamente aos Estados, e às instituições multilaterais, o monitoramento.

Não se exclui a legitimidade da preocupação internacional com a promoção dos direitos humanos, que pode se transformar em programas de cooperação. Mas a adesão a esses programas deve ser voluntária pelos Estados, como resposta a críticas e sugestões formuladas pelas instituições multilaterais ou a opinião pública internacional.

O direito internacional dos direitos humanos ingressaria na ordem jurídica nacional especialmente pelos direitos fundamentais da Constituição. Seria fonte do direito nacional, tendo o papel de princípios que dão fundamento às normas constitucionais, e, com isso, poderiam fundamentar a crítica de dispositivos particulares da ordem jurídica interna. A interpretação e implementação dos direitos humanos estariam, em geral, a cargo dos sistemas políticos nacionais e, como isso, o estatalismo considera responder satisfatoriamente às objeções postas pelo relativismo cultural.

O estatalismo concebe a proteção e promoção dos direitos humanos no foro doméstico como resultado da atividade do Estado social e democrático de direito. Este fornece um argumento adicional em resposta aos críticos que adotam a perspectiva do relativismo cultural, pois sua estrutura institucional seria capaz de garantir a liberdade de escolha dos cidadãos entre normas de comportamento postas por sistemas culturais concorrentes (Donnelly, 1989, p.132)

Assim, para o estatalismo os direitos humanos seriam entitlements que os indivíduos possuem, os quais, em caso de violação ameaça ou violação podem ser instrumentalizados em claims dirigidos ao Estado, para que os garanta. Do mesmo modo que para o globalismo, os titulares dos direitos humanos são os indivíduos, a sua garantia é tarefa da autoridade política, seu instrumento privilegiado é o jurídico/judicial. Assim, embora haja diferenças importantes entre concepções estatalistas quanto ao conteúdo dos direitos humanos, eles tem em comum a forma de pensar os direitos humanos a partir da perspectiva institucional de direito. A adoção de políticas sociais através da democracia participativa pode ser prezada, mas não se tiram conseqüências teóricas mais amplas da negociação de políticas sociais para o modelo de direito7.

Em termos de justificação, os indivíduos tendem a serem dissolvidos na figura do cidadão, do membro da comunidade política, participante do processo de formação e de legitimação da sociedade política. Assim, a proteção dos direitos humanos pelo Estado seria decorrência do pacto constitucional. Numa outra versão, os direitos humanos poderiam ser considerados como a expressão daquelas condições essenciais para o funcionamento de um Estado democrático de direito. Seriam, assim, fundamentais, no sentido de que, a violação daquelas seria, por si mesma, sinal da ausência deste.

O Estado social e democrático de direito seria, pois, a estrutura adequada para coibir os riscos mais importantes postos atualmente aos indivíduos, os desequilíbrios políticos e econômicos gerados pela modernização das sociedades em todo o globo, a democracia e o mercado. A implementação dos direitos humanos pelos Estados apresentaria assim vantagens, que vão além do realismo na abordagem das relações internacionais. Os Estados teriam mais legitimidade e capacidade para a realização de tal tarefa. Eles ainda são os agentes políticos mais próximos dos destinatários tanto em termos institucionais como culturais e, com isso, são os mais capazes de implementar uma agenda ampla de direitos humanos, sem os problemas da alternativa do globalismo como a seletividade, baixa capacidade e etnocentrismo (Donnelly, 1989, p. 266; 1998, pp. 152-4).

No entanto, as críticas aos Estados são muitas, pois os principais violadores de direitos humanos são muitas vezes os seus funcionários, que cometem violências contra opositores, pessoas mais pobres ou parcelas minoritárias da população ou pela inação no campo das políticas sociais. Contra as suas violações, as vítimas são muitas vezes impotentes, pois não encontram espaços institucionais adequados, não têm recursos financeiros, informações, segurança e, ainda, porque fazem parte de minorias discriminadas pelas instituições e a sociedade.

Uma crítica relevante ao estatalismo é a de que é incapaz de compreender a profundidade das transformações na sociedade internacional, na qual se vê a presença de agentes de caráter verdadeiramente transnacional e a emergência de processos e problemas sistêmicos (ambiente, migrações, saúde pública), os quais não são redutíveis aos interesses dos Estados definidos militarmente nem podem ser resolvidos pela ultima ratio da guerra (Villa, 1999). Por isso, contra os realistas, afirma-se a necessidade de elaborar um conceito ampliado de segurança que compreenda esses processos e atores, outros temas e valores, bem como seja capaz de alcançar alguma institucionalidade internacional, tanto no sentido de enforcement como no da prevenção e promoção8.

3. Contextualismo

Chamamos contextualismo a variada coleção de correntes intelectuais que abordam o direito – e, por conseqüência, os direitos humanos – a partir das suas relações com as práticas sociais, valores, identidades, ritos etc9. Essas correntes têm em comum a crítica à concepção institucional do direito como ordem mandatória e a formulação de outras abordagens da normatividade social.

Criticam abordagens do direito de corte individualista e contratualista, pois consideram que a normatividade supõe sempre uma comunidade à qual está referida. O próprio direito positivo estatal seria mais um produto dessa normatividade social do que o seu criador. Consideram necessário tomar as coletividades como ponto de partida, para compreender adequadamente a normatividade social. A normatividade de uma determinada sociedade pode ser reconhecida segundo certos critérios de identidade e, assim, delimitada em relação a outras normatividades. Haveria, assim, diversas normatividades sociais que seriam coerentes, completas e auto-centradas, mas também incomensuráveis e com limitadas possibilidades de comunicação entre elas.

É a partir dessa ótica que abordam a temática dos direitos humanos, pois consideram a formulação de normas morais, com pretensão jurídica, formuladas a partir de princípios universais um resultado de processos característicos da sociedade ocidental, capitalista e liberal. Por isso, são céticos – e, alguns, abertamente contrários – em relação aos enunciados universais da Declaração Universal e de outros instrumentos jurídicos internacionais. Suas reservas compreendem a validade dos argumentos formulados para justificar esses enunciados e a conveniência e adequação de iniciativas que procuram implementá-los em contextos sociais desprovidos dos seus pressupostos sociais e históricos.

O direito internacional dos direitos humanos teria caráter de direito costumeiro, aceito por governos e sociedades apesar de não dispor de instrumentos efetivos de enforcement. Seus enunciados poderiam ser considerados uma moral internacional, no sentido de proposições gerais orientadoras das condutas no próprio plano internacional e que deveriam ser necessariamente contextualizadas pelas sociedades. Isso seria especialmente relevante para políticas internacionais de promoção dos direitos humanos, mas seria também consideração central para programas de ajuda, mesmo em situações de catástrofes coletivas, como fomes e deslocamentos populacionais.

Quanto à proteção dos direitos humanos, o contextualismo pode aceitar uma concepção forte de direito internacional, mas para uma proteção com alcance externo às comunidades, pois as instituições multilaterais deveriam limitar-se ao papel de fixar bordas, delimitar fronteiras, formular proibições que protejeriam comunidades contra agressões de grupos externos a elas, às vezes membros de seu próprio Estado nacional. Assim, seria uma concepção pluralista das esferas do direito, internacional, nacionais e subnacionais, os quais teriam, no entanto, limites claramente demarcados entre si.

A contextualização dos enunciados dos direitos humanos deve ser concebida num sentido amplo, dada a incomensurabilidade das normatividades sociais. Seriam de pouca valia os procedimentos técnicos do direito ocidental, como os julgamentos de matéria constitucional. De expressões como ‘proteção da dignidade da pessoa humana’ não se poderiam tirar conclusões de condenações a práticas culturais aceitas, dado que todas as sociedades dispõem de concepções de dignidade da pessoa humana. Mesmo o princípio do respeito à integridade física deveria ser relativizado em sistemas em que a integridade do corpo é só um aspecto da totalidade da pessoa.

Na década de noventa o contextualismo foi expresso em debates sobre os direitos de povos indígenas e de comunidades sub-nacionais; no plano das relações internacionais, também foram importantes debates a respeito das sanções à China pelo massacre da Praça da Paz Celestial. O contextualismo manifestou-se frontalmente nos debates preparatórios para a Conferência de Viena e tornou-se cada vez mais forte nas Conferências subseqüentes. Analistas consideram que essa emergência dos particularismos explica a perda da atratividade e da força do modelo das Conferências (Alves, 2001).

Uma versão do contextualismo é a defesa dos valores asiáticos, ou a concepção asiática de direitos humanos. Quanto à Conferência de Viena, salienta as dificuldades do processo, especialmente a ambiguidade do artigo 5°, o qual, após afirmar a universalidade, indivisibilidade e inter-relação de todos os direitos humanos, dispõe que a sua promoção deve levar em conta as particularidades nacionais e regionais, bem como as diversas normatividades sociais (apud Muntarbhorn, 2000: 83-4). Essa versão do contextualismo associa-se a uma abordagem realista das relações internacionais, pois considera os direitos humanos internacionais expressão da hegemonia das potências capitalistas ocidentais (Hussein, 2000).

A abordagem indica que a concepção de direito como sinônimo de uma normatividade mandatória posta pela autoridade política é uma característica de uma trajetória histórica particular, a das sociedades ocidentais. Em outras trajetórias históricas e contextos culturais há outras relações entre indivíduo, comunidade e normas sociais. Essa diversidade de relações foi posta em evidência por Michel Alliot e Etienne Le Roy, a partir de seus estudos sobre as sociedades africanas. Eles procuraram mostrar a profunda inadequação dos conceitos jurídicos ocidentais para a compreensão do direito em sociedades tradicionais ou que passaram por trajetórias históricas distintas de modernização. A partir da comparação de grandes sistemas culturais, formulam três arquétipos culturais de normatividade.

As concepções contextualistas dos direitos humanos tem sido objeto de muitas críticas dos que defendem a universalidade dos direitos humanos, que apontam para os efeitos negativos dessas concepções, como a indiferença e mesmo o cinismo, diante de violações e do sofrimento do outro. Há também a desqualificação de argumentos como os dos valores asiáticos, que seriam apenas pretextos invocados por governantes autoritários para justificar as suas práticas (Booth, 1999).

Outra crítica seria que conceber a comunidade ética a partir de uma perspectiva "hegeliana" desconsidera o processo histórico de formação dos direitos, as lutas sociais para a afirmação dos direitos, os deslocamentos, provocados pelos menos poderosos, nas concepções e práticas vigentes do direito. Isso vale também para a formação do direito internacional dos direitos humanos, cuja expansão resulta em grande parte da busca de afirmação de direitos por lideranças políticas de Estados menos poderosos, bem como a ação para a defesa e promoção dos direitos de grupos minoritários e marginalizados.

A perspectiva trans-localista critica a maneira fechada pela qual os contextualistas concebem as culturas. O translocalismo pensa que, embora façam parte de sistemas culturais diferentes, normas e valores são comunicáveis e comparáveis e, assim, é possível fazer julgamentos interculturais, encontrar valores compartilhados e também questionar, argumentar e persuadir o outro acerca das suas normas culturais. Seria possível, pois, construir valores partilhados pelas diversas culturas.

3. Trans-localismo10

Chamamos trans-localismo a perspectiva que reconhece as profundas implicações políticas no âmbito internacional e procura tirar as suas conseqüências conceituais no sentido da formulação de teorias críticas. Como nas outras posições, há várias vertentes que podem ser agrupadas sob o rótulo que adotamos, que variam em termos de oritentação teórica e de objetivos políticos. O que essas correntes têm em comum é a defesa de teses democráticas e participativas, bem como a aceitação do relativismo cultural, o que leva a concepções não exclusivamente institucionais dos direitos humanos.

Para o trans-localismo, o processo de universalização, de ampliação do escopo e de aprofundamento do alcance do direito internacional dos direitos humanos seria positivo, apesar de ser limitado em muitos aspectos e a adesão de governos, apenas verbal. O direito internacional dos direitos humanos teria o papel de um espaço potencial de crítica à globalização desigual e excludente e possibilitaria a criação de instrumentos para políticas participativas e democráticas de âmbito mundial.

Concepções do trans-localismo são algumas vezes associadas Às dos globalistas e, noutras situações, aos contextualistas. O que os diferencia dos primeiros é o seu realismo quanto às relações de poder mundial, em termos econômicos e políticos, e o seu ceticismo quanto ao potencial democratizante das instituições multilaterais. Pensam que é possível e necessária a abertura democratizante, e participativa, dessas instituições, o que só ocorrerá com o apoio de movimentos sociais e políticos externos a elas (Falk, 1992; 1998; 2001). Se a pluralidade cultural é essencial para a formulação de projetos participativos e não alientantes, o seu reconhecimento não pode implicar a indiferença e irrredutibilidade de pontos de vista nem o desejo de uma ordem mandatória que obrigue o outro exótico a comportar-se como pensamos ser adequado. Ou seja, trata-se de criticar o universalismo abstrato cujo risco é o de uma nova versão do colonialismo, e o relativismo indiferente a violações.

Desse modo, embora partilhem com os universalistas a preocupação com a proteção dos direitos humanos, colocam muitas vezes objeções a intervenções humanitárias cujos objetivos e métodos de ação consideram inadequados. Contra os estatalistas argumentam, mais freqüentemente, que as omissões das instituições multilaterais têm efeitos sistêmicos, pois situações de guerra, deslocamento forçado e genocídios provocam violações em cadeia, que têm alcance regional e, mesmo, global. Contra os contextualistas, argumentam que objeções em termos conceituais e políticos à universalidade dos direitos humanos não podem ter efeitos paralisantes diante da necessidade de proteção de populações sujeitas a violações em massa.

Do ponto de vista da promoção dos direitos humanos, apoiam políticas de promoção, levadas a efeito por instituições multilaterais. No entanto, consideram a perspectiva globalista tímida e inadequada, pois as instituições multilaterais não seriam capazes de levar em conta as necessidades do outro, de suas próprias concepções de bem, nem dos conflitos e contradições próprios à sua situação, e daí resultam políticas contraprodutivas e efeitos não esperados. A solução não seria restringir a ação de agências internacionais, mas, pelo contrário, ampliar as ações, com maior integração, democracia e participação. Mas isso só seria possível num sistema global profundamente modificado, num sentido muito mais amplo do que propõem ou esperam os globalistas.

As Conferências das Nações Unidas dos anos noventa mostrariam os limites da abertura das instituições multilaterais. Os canais de diálogo abertos foram esvaziados, à medida que os Estados mais poderosos perceberam o potencial desses espaços, nos quais formou-se uma espécie de esfera pública global, com influência crescente sobre a agenda política e a opinião pública. Os Estados mais poderosos reagiram, e promoveram o esvaziamento das Conferências e inviabilizaram o cumprimento dos seus Planos de Ação, em particular por não cumprir as diretrizes orçamentárias (Falk, 2001).

Para superar as diferenças culturais, os translocalistas propõem o diálogo intercultural, formulado em diversas versões. A versão mais fraca é a de que é possível encontrar através do diálogo um mínimo denominador comum entre as culturas, o qual poderia servir de fundamento para um direito internacional dos direitos humanos consensual, não só entre governos, mas também entre culturas (An-Naim, 1992). Outra versão é a de que o universalismo não teria o papel de fornecer princípios para uma concepção genérica de natureza humana de que poderiam ser deduzidas normas universais de direitos humanos, mas, antes, de universais humanos alcançados pelo diálogo. Trata-se de universais não naturais, mas culturalmente construídos, os quais alicerçam, sustentam as culturas e estão presentes nelas de uma ou de outra forma. Fornecem a matéria prima para a decisão sobre valores e, embora não tenham base objetiva e indisputável, teriam fundamentos na forma de razões bem-consideradas, que não são arbitrárias. A decisão sobre valores é válida para fins práticos, mas a sua defesa são é conclusive nem imune a objeções. Os universais assim alcançados teriam papel regulativo, que informam e estruturam todos os aspectos da vida moral dos homens em todas as sociedades. Eles estariam em relação dialética com as estruturas morais nacionais, pois aqueles regulam essas e essas pluralizam aqueles (Parekh, 1999: 50, 58). Em outras versões, as culturas são pensadas como sistemas irredutíveis, mas incompletos e que podem ser transformadas através do diálogo sobre valores. Trata-se da proposta de uma hermenêutica diatópica, a qual considera impossível, inadequado ou insuficiente alcançar um mínimo denominador comum cultural, dada a necessária posicionalidade dos agentes, sempre relacionados às suas próprias culturas. A hermenêutica é colocada como processo de interpretação da própria cultura e da cultura do outro, diatópica, pois a presença irredutível do outro faz parte do processo, o qual é, também o resultado (Pannikar, 1984; Le Roy, 1998). Em algumas formulações propugna-se mesmo a superação da linguagem dos direitos, dado o seu caráter incompleto e insuficiente para as necessidades do diálogo intercultural, para a construção de uma cultura da paz (Eberhard, 1998). E, noutra direção, adota-se uma versão ecumênica da Declaração Universal, propugnando-se uma vida reconciliada dos homens sobre a terra (Carta da Terra). Essa proposta foi lançada no campo da filosofia das religiões e incorporada pela antropologia do direito.

Pensamos que a perspectiva cosmoteândrica, proposta por Panikkar, enfrentam algumas dificuldades. Primeiro, o acento demasiado na harmonização das diferenças tende a limitar as dificuldades teóricas e práticas do diálogo intercultural. Essas dificuldades foram salientadas por Parekh e Boaventura. Segundo, embora a perspectiva unitária tenha relevância do ponto de vista de uma teoria crítica do direito e do pluralismo jurídico e represente um avanço face às tentativas ‘fáceis’ de enfrentar o multiculturalismo, não incorpora a necessidade de mudança no ‘modo de produção do saber’, como salientado por Boaventura, o qual afirma que o multiculturalismo é, por definição, plural, dialogal, dado que a elaboração solitária é parcial, visto que é necessariamente feita por um participante de uma das culturas, o qual é incapaz de superar completamente a parcialidade de sua própria forma de inserção no mundo. Embora Eberhard reconheça esse ponto, ele desliza para uma formulação parcial, dado o seu interesse analítico-conceitual.

Enfim, ao acentuar a dimensão cultural, não tematizam adequadamente os espaços institucionais para o diálogo. Os espaços desse diálogo seriam os permitidos pelas instituições multilaterais, seriam espaços alternativos ou, mesmo, de contestação? Quais seriam as conseqüências de sua abordagem para o formato institucional e os procedimentos das Nações Unidas? Enfim, de que modo o diálogo intercultural e a cultura da paz enfrentariam o realismo e a razão de Estado?

Aqui vemos o caráter complementar da abordagem inter ou multicultural com o debate sobre a democracia global.

Boaventura de Sousa Santos (1997) propõe que os direitos humanos sejam concebidos como uma política cultural contra-hegemônica e, para isso, a questão deve ser colocada a partir do processo contraditório de globalização. Assim, é necessário formular-se uma concepção multicultural, socialmente focada e que possa ser generalizada sem pretensões de universalidade. Essa concepção seria construída pelas redes contra-hegemônicas construídas pelas periferias e semiperiferias do sistema mundial. A fórmula seria o diálogo intercultural através da hermenêutica diatópica, que reconhece a diversidade de culturas, enriquece-as pela aceitação de sua incompletude respectiva, mas não resulta em indiferença, pois com o entrelaçamento das identidades afirmam-se também os limites do que lhes é reciprocamente aceitável ou intolerável..

Boaventura adverte contra concepções idealistas do diálogo, que não levem em conta as suas condições sociais e estruturais, dado que processos de dominação subjugam culturas e impedem-nas de se formularem enquanto tais; é também necessário que o diálogo ocorra entre as versões mais abrangentes e igualitárias das culturas envolvidas. Com isso, a linguagem dos direitos humanos poderia alcançar generalidade e especificidade, proximidade social e a formulação de utopias. Ele está atento para as condições que tornam o diálogo intercultural autêntico e, embora não desenvolva o ponto, parece cético que possa ocorrer de forma predominante nos espaços de governo mundial. Pelo contrário, nesses espaços predomina o discurso liberal universalizante do localismo globalizado. O projeto cosmopolita dos direitos humanos será desenvolvido como um projeto alternativo nos espaços de contestação da globalização hegemônica.

Pensamos que uma fraqueza da sua abordagem resulta de sua argumentação por ‘contrapontos’. Embora ele reconheça muitas vezes as tensões e ambiguidades internas de espaços e discursos hegemônicos, bem como a virtualidade de ações no interior destas, ele não leva suficientemente em consideração as mediações entre elas, assim como as transformações estruturais, institucionais e conceituais da sociedade global. Isso se vê quando ele mantém, para o discurso dos direitos humanos, a oposição de uma perspectiva liberal que prioriza os DCP e uma perspectiva marxista que privilegia os DESC. É preciso superar essa divisão no conceito de direitos humanos, assim como na análise dos processos sociais que lhes são referentes.

Mas Boaventura aponta corretamente para os riscos de uma concepção esvaziada de diálogo intercultural. Assim, o problema pode ser colocado nos termos da formulação de uma concepção de democracia global que seja compatível com a hermenêutica diatópica. Ou seja, um realismo político não regressivo, que tome os limites políticos, econômicos e culturais como problemas reais, inseridos no cerne de uma preocupação emancipadora, multicultural, que não só reconheça diferenças mas também seja capaz de identificar o novo e propor mudanças.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As mudanças nas relações internacionais e no direito internacional dos direitos humanos são profundas, mas o seu alcance e direção ainda não estão certos. As Conferências das Nações Unidas promoveram mudanças nas relações entre as instituições multilaterais e os Estados; mudanças nos direitos humanos nos planos conceitual, de instrumentos de planejamento e de procedimentos de implementação e monitoramento. Embora a direção das mudanças políticas internacionais fosse bastante indefinida, os acontecimentos de 11 de setembro de 2001 tornaram ainda mais incertos os desdobramentos futuros. Mesmo assim, a partir da trajetória apresentada neste trabalho apontamos alguns questões prioritárias para a compreensão dos direitos humanos como tema teórico.

Em primeiro lugar, não é teoricamente possível e nem politicamente conveniente buscar uma definição teórica convencional para os direitos humanos, no sentido da construção de uma teoria jurídica em sentido estrito. Os direitos humanos compreendem um "nome", disposições legais, instrumentos jurídico-processuais, recursos políticos e de discurso; constituem e perpassam instituições estatais e da sociedade civil, insuflam atitudes, valores e relações sociais. Ou seja, fazem parte de uma complexa construção intelectual e política, cuja dimensão histórica nos mostra que se trata de um processo extremamente conflituoso e, em grande medida interminável. Face a ele, definições e teorias têm aparecido sempre afirmações unilaterais e incompletas, de uso parcial e estratégico. Assim, como ressalta Boaventura, a construção dos direitos humanos está inserida no processo mesmo de diálogo e luta política, sem que possamos ou devamos esperar construções unitárias ao final.

Em segundo lugar, apesar de a oposição entre o princípio da soberania estatal e o direito internacional dos direitos humanos ter sido regrado por instrumentos jurídicos internacionais, o tema não foi superado, conceitual ou praticamente. O tema continuará a colocar problemas conceituais relevantes, em particular no debate político sobre a proteção internacional dos direitos humanos em casos de graves violações. A definição das situações em que a intervenção humanitária é justificada, as instâncias, procedimentos e critérios adequados para a tomada de decisão e, ainda, as formas de ação deverão continuar como temas de debate "quente".

Em terceiro lugar, as tensões sobre as instituições multilaterais deverão se agravar, em virtude do próprio desenvolvimento desigual do sistema mundial. Ou seja, as instituições multilaterais deverão receber crescentes demandas de proteção dos direitos humanos em situações de conflitos e catástrofes coletivas. Mas demandas de intervenção serão acompanhadas de críticas ao seu papel, como acusações de seletividade. Essas tensões indicam que a relevância da discussão sobre as formas de superação das desigualdades geradas pelo sistema mundial atual e da maneira pela qual se articulam, a nível global, direitos humanos, democracia e desenvolvimento.

Em quarto lugar, parecem-nos altamente insuficientes concepções que abordam os direitos humanos em analogia com o direito constitucional, especialmente quando trabalham os procedimentos de integração das diferenças entre princípios gerais de direitos humanos e valores culturais. Em boa parte dos casos, não se trata de integração lateral de normas, pela circunscrição das contradições ao seu conteúdo irredutível, mas de sistemas constituídos de maneiras diferentes e, pois, com elementos muito díspares.

A superação dessas concepções pode se dar, por um lado, pela afirmação do caráter político e relativo dos direitos humanos. O direito internacional dos direitos humanos seria mais um campo de lutas do que uma ordem normativa à qual deveria ser fornecida uma justificação moral. Os direitos humanos são criação política, formulada em reação às atrocidades da Segunda Guerra, que enuncia em termos universais um conjunto de preceitos que atuam como interditos absolutos, mas também, como proposições que podem ser desenvolvidas por projetos mais igualitários de sociedade. Assim, seu potencial de desenvolvimento depende não só da ação adequada de autoridades políticas, mas resulta de lutas políticas desenvolvidas nos mais diversos níveis.

 

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* Trabalho apresentado no 3° Encontro Nacional da ABCP – Associação Brasileira de Ciência Política, julho de 2002 – UFF , Niterói-RJ. Esta comunicação é resultado preliminar do Projeto "Desenvolvimento de uma Teoria Integrada dos Direitos Humanos", do Programa CEPID/FAPESP, em curso no Núcleo de Estudos da Violência (NEV), da Universidade de São Paulo. Agradeço a Paulo Sérgio Pinheiro, a Guilherme de Almeida e demais participantes do projeto as críticas e sugestões ao texto.
1 Sobre as Conferências das nações Unidas, ver Alves, 2001 e Schecheter, 2001; ver também Falk, 2000.
2 Panoramas podem ser encontrados em Shute e Hurley, 1993, An-Na'im, 1992 e Dunne e Wheeler, 1999.
3 Steven LUKES (1993) caracteriza formas de pensamento para identificar as que não aceitam o princípio dos direitos humanos: utilitarismo, comunitarismo e socialismo marxista, e outras duas que os aceitam, mas com problemas, libertarianismo e igualitarismo. Para ele, esta última é a única que formula um patamar igualitário que respeita um conjunto limitado de direitos humanos.
4 Preferimos o termo globalismo a internacionalismo ou interestatalismo, para acentuar uma concepção mais ampliada, que engloba formulações intermediárias. No entanto, são raras as formulações globalistas, que apresentam uma proposta sistemática de superação o sistema interestatal para um sistema global. A referência clássica é o pensamento de Kant, especialmente o texto À Paz Perpétua (Archibuggi, Held e Kohler, 1998; Bohmann e Bachmann, 1996; Habermas, 1996).
5 Preferimos a expressão ‘estatalismo’ a ‘estatismo’ para evitar a conotação de intervenção do Estado na economia ou sociedade, dada pelo seu uso habitual pelos liberais. Embora importantes argumentos estatalistas sejam sociais-democráticos, a discussão remete às relações Estado-ordem internacional e não Estado-economia/sociedade.
6 Ver os argumentos realistas e a sua crítica também em Habermas (1997)
7 Há interessantes contribuições sobre o significado das mudanças nas formas de regulação política para o modelo de direito em ARNAUD, 1999; Clam e Martin, 1998; Comaille, Dumoulin e Robert, 2000
8 Neste sentido, Schultz, 2000 propõe a redefinição do conceito de interesse nacional para a política externa norteamericana, no qual deverão estar presentes questões como a promoção dos direitos humanos, da democracia, do meio-ambiente, do desenvolvimento econômico e da saúde pública, objetivos que devem ser buscados de forma ativa pela diplomacia nortamericana, especialmente nos foros multilaterais.
9 Brown, 1999; Rorty, 1993.
10 Preferimos a expressão "translocalismo" a trans ou multiculturalismo ou contextualismo para ampliar a discussão, pois aqui entram em consideração não só a discussão com a relatividade de normas e valores, mas também o debate com o globalismo, que envolve questões de interesses e de poder.