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Revista Árvore - Theoretical model for understanding corporate environmentalism in the Brazilian forestry sector

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Revista Árvore

Print version ISSN 0100-6762

Rev. Árvore vol.27 no.6 Viçosa Nov./Dec. 2003

http://dx.doi.org/10.1590/S0100-67622003000600012 

Modelo teórico para compreensão do ambientalismo empresarial do setor florestal brasileiro

 

Theoretical model for understanding corporate environmentalism in the Brazilian forestry sector

 

 

Aurea Maria Brandi NardelliI; James Jackson GriffithII

IEngenheira Florestal, D.S. Ciência Florestal, Coordenadora do Programa de Certificação Florestal SGS QUALIFOR, <aurea@magister.srv.br>
IIProfessor Titular, Departamento de Engenharia Florestal da Universidade Federal de Viçosa, 36571-000 Viçosa-MG, <griffith@ufv.br>

 

 


RESUMO

O presente estudo foi desenvolvido com o objetivo de contribuir para a compreensão do "ambientalismo empresarial" do setor florestal brasileiro, particularmente sua relação com os sistemas voluntários de certificação florestal, identificando-se estratégias que possam conduzir a melhorias efetivas de seu desempenho ambiental. Desenvolveu-se um modelo teórico, utilizando a estrutura de Sistemas Abertos e técnicas do pensamento sistêmico, identificando as variáveis que compõem as dinâmicas institucional e organizacional do setor. O modelo permitiu descrever, compreender e inferir sobre o comportamento futuro do sistema, além de estabelecer hipóteses para novos estudos. A partir do modelo, verificaram-se três diferentes estratégias empresariais na adoção dos padrões para certificação, sendo elas a "Adoção Simbólica", o "Mimetismo" e a "Adoção Efetiva". Concluiu-se que a opção por uma estratégia que conduza a mudanças efetivas no setor florestal requer o estabelecimento de uma visão compartilhada de sustentabilidade, que contribua para a consolidação de instituições e que oriente as respostas empresariais.

Palavras-chave: Certificação florestal, gestão ambiental e pensamento sistêmico.


ABSTRACT

The objective of this study is to contribute to the understanding of corporate environmentalism within the Brazilian forestry sector, particularly in relation to voluntary forest certification systems. A theoretical model is developed that uses the structure of open systems and techniques of systemic thinking to identify variables which compose the institutional and organizational dynamics of the sector. The model permits description, comprehension and inference of future behavior of the system and suggests hypotheses for future studies. Based on the model, three different corporate strategies for adopting certification standards were identified: symbolic, mimetic, and effective. It is concluded that the option most likely to produce effective change in the forestry sector requires establishing a shared vision of sustainability that contributes to consolidation of institutions that guide corporate responses.

Key words: Forest certification, environmental management, systemic thinking.


 

 

1. INTRODUÇÃO

A consciência social a respeito dos problemas ambientais cresceu significativamente na última década. Entre esses problemas, questões como desmatamento, manejo sustentável e conservação das florestas passaram a ter grande destaque, incentivando campanhas ambientalistas e boicotes aos produtos provenientes de florestas tropicais, ou mesmo a substituição da madeira por produtos alternativos.

Diante dessas pressões, o setor florestal tem procurado diferentes caminhos para garantir sua eficiência e, principalmente, estar em conformidade com as expectativas do campo organizacional, que determinam a legitimidade das práticas empresariais e de seus produtos. Por outro lado, o movimento ambientalista tem buscado alternativas para garantir a conservação dos ecossistemas florestais em todo o mundo.

Uma das estratégias implementadas para alcançar esses dois objetivos convergentes foi o estabelecimento de programas para certificação voluntária do "Bom Manejo Florestal" - o manejo florestal ambientalmente adequado, socialmente benéfico e economicamente viável. Ao buscar uma certificação, as empresas estão lançando mão de um instrumento institucionalizado de diferenciação, com o objetivo de informar e garantir ao consumidor e às demais partes interessadas que determinados padrões de desempenho de seu manejo florestal estão sendo atingidos e monitorados.

A inserção da variável ambiental nos negócios, apesar de recente, sinaliza mudanças no setor florestal. Por várias décadas, a eficiência de uma empresa teve como maior foco seu campo técnico, isto é, o conjunto de aspectos relativos aos seus insumos, processos e produtos. Hoje, porém, a empresa florestal interage com as diversas demandas das partes interessadas, incluindo a opinião pública e as tendências de mercado. Entre os vários agentes envolvidos estão o governo, as organizações não-governamentais - ONGs, as comunidades vizinhas, os trabalhadores, os consumidores, os fornecedores, os competidores, os pesquisadores e os investidores. Juntos, formam o campo organizacional do setor florestal. E é este campo que irá perceber e interpretar os impactos resultantes das atividades do setor, estabelecendo os limites aceitáveis para sua realização.

Para melhoria efetiva de desempenho ambiental das empresas florestais, é fundamental identificar como os atores sociais influenciam as ações ambientais empresariais e de que maneira e porque as organizações adotam determinadas estratégias em respostas a essas pressões.

Visando responder a essas questões, o presente estudo teve como objetivos gerais descrever e interpretar os contextos nos quais vem sendo desenvolvido o ambientalismo empresarial do setor florestal brasileiro, considerando como uma de suas principais variáveis a certificação florestal. Especificamente, buscou-se:

- Compreender a evolução do campo organizacional, identificando os atores sociais que interagem com a empresa florestal e exercem influência sobre ela.

- Desenvolver um modelo teórico para representar as inter-relações entre a dinâmica institucional e organizacional do setor.

- Identificar as respostas empresarias, enfocando as diferentes estratégias gerenciais adotadas.

 

2. CONCEITUAÇÃO TEÓRICA

2.1. O Ambientalismo Empresarial

A partir da década de 90, as organizações passaram a atuar sob novas demandas institucionais, como a ética nos negócios, a responsabilidade social e, principalmente, o desenvolvimento sustentável.

Os múltiplos aspectos relacionados à legislação, às mudanças de preferências do consumidor, à ação de grupos ambientalistas e às estratégias empresariais daí decorrentes constituem uma nova regulação ambiental, contribuindo para o surgimento de um novo conjunto de valores, que corrigem ou eliminam produtos e processos não comprometidos com as práticas ambientalmente sustentáveis (Silva, 1995).

Segundo Sanches (1997), as respostas das empresas às questões ambientais podem variar muito, de acordo com o tipo de negócio envolvido, com os problemas ambientais potenciais decorrentes da atividade, com o tamanho da organização e com a complexidade da estrutura corporativa.

Criticando os modelos vagos e contraditórios de responsabilidade ambiental, Entine (1995) concluiu que as práticas éticas nos negócios são mais bem mensuradas pelo caráter demonstrado por uma empresa e seu compromisso com a transparência, do que por sua visão social ou retórica. O autor citou o caso de empresas que se dizem socialmente responsáveis, porém atuam de forma superficial, dedicando mais tempo e recursos para anunciar suas práticas ditas "verdes" do que realmente agindo.

Levy (1997) analisou o gerenciamento ambiental no discurso e na prática, desenvolvendo o argumento de que o crescimento da consciência pública sobre as questões ambientais estaria ameaçando a autonomia e a posição no mercado dos interesses corporativos dominantes e, talvez, a própria legitimidade do sistema econômico vigente. Deste modo, o gerenciamento ambiental seria uma acomodação a essa ameaça, estando mais relacionado à sustentabilidade política das empresas do que à sustentabilidade ambiental. Para o autor, o ambientalismo empresarial, juntamente com outras medidas políticas, como a formação de alianças com organizações ambientalistas, estaria contribuindo para conferir legitimidade ao bloco hegemônico existente.

Para Barkin (1998) e Layrargues (1998), a inserção do setor empresarial no ambientalismo não é resultado de sua conscientização ambiental, mas sim de uma motivação econômica. O ambientalismo empresarial corresponderia a um mero mecanismo de auto-regulação homeostática, a fim de evitar a crise ecológica. Ao abraçar causas em prol do meio ambiente, as empresas estariam, na verdade, fazendo uma apropriação ideológica dos valores ambientais das ONGs e de outros segmentos da sociedade, para fins de legitimação.

Para compreensão do ambientalismo empresarial e suas contradições, Hoffman (1997) recomendou uma abordagem sistêmica do contexto organizacional, ampliando-se o foco para além dos mecanismos políticos e legais relacionados aos problemas ambientais. Aplicando a teoria do comportamento organizacional para analisar a adoção de práticas ambientais nas indústrias químicas e petrolíferas norte-americanas, o autor observou que a atenção empresarial ao meio ambiente segue mais a oscilação da opinião pública sobre as questões ambientais do que as restrições legais e os custos. Sendo assim, a maneira como os dirigentes das empresas definem sua responsabilidade ambiental é um reflexo direto de como a sociedade percebe as questões ambientais e o papel empresarial em respondê-las.

2.2. A Certificação no Setor Florestal

As questões relativas à sustentabilidade do manejo florestal têm merecido constante atenção de vários segmentos da sociedade, nas esferas nacional e internacional. Embora amplamente endossada, a sustentabilidade é difícil de ser compreendida e interpretada para condições operacionais. Há um intenso esforço para traduzi-la em mecanismos que permitam praticar e avaliar o progresso do manejo florestal sustentável, uma vez que os instrumentos tradicionais de legislação e regulamentação adotados têm se mostrado ineficientes no controle da destruição dos ecossistemas florestais em várias partes do mundo (Evans, 1996).

O desenvolvimento de princípios, critérios e indicadores para o manejo florestal sustentável por várias iniciativas internacionais foi guiado, em grande parte, por compromissos políticos nacionais e internacionais, especialmente os documentos da United Nations Conference on Environment and Development – UNCED/92: Agenda 21, Os Princípios sobre Florestas, a Convenção da Diversidade Biológica e a Convenção do Clima. Outras iniciativas importantes incluem o "Processo de Helsinki", o "Processo de Montreal", a "Proposta de Tarapoto" e os trabalhos do Center for International Forestry Research - CIFOR. Cada um desses processos propôs critérios e indicadores pelos quais o manejo florestal sustentável pode ser monitorado, avaliado e promovido em diferentes níveis (Higman et al., 1999).

No caso de produtos florestais, a certificação surgiu no início da década de 90, como uma alternativa às campanhas que incentivavam o boicote a produtos oriundos de florestas tropicais. A iniciativa fundamentava-se no fato de que o boicote poderia agravar o desmatamento nos trópicos, uma vez que com a queda do valor da madeira e das áreas florestais poderiam ser favorecidos outros usos potencialmente predatórios da terra, como pastagens e atividades agrícolas. Em vez de prejudicar toda uma classe de produtos, foram propostos o reconhecimento e o consumo de produtos florestais produzidos sob um manejo adequado.

Atualmente, um dos mais importantes padrões para certificação florestal, em nível mundial, consiste nos Princípios e Critérios do Forest Stewardship Council – FSC. O FSC foi fundado em 1993, sendo uma organização internacional independente, formada por representantes do movimento ambiental, pesquisadores, produtores de madeira, comerciantes de produtos florestais e populações tradicionais. Por meio de um processo participativo, o FSC estabeleceu Princípios e Critérios para a certificação voluntária do "Bom Manejo Florestal", ou seja, o manejo florestal ambientalmente adequado, socialmente benéfico e economicamente viável.

Embora a certificação florestal seja uma iniciativa baseada em leis de mercado, ela tem implicações positivas para diversos atores sociais. É um instrumento útil aos governos locais, pois permite um controle independente sobre o manejo florestal, a partir de padrões que são comparáveis em todo o mundo; às comunidades, porque garante que as florestas estão sendo manejadas adequadamente, visando a manutenção de benefícios sociais e ambientais; aos consumidores e investidores, pois confere a confiança de decidir sobre a aquisição de produtos florestais e investimentos ambientalmente mais estáveis; e aos gerentes florestais, porque o atendimento aos requerimentos do "Bom Manejo Florestal" resultam em melhores decisões acerca de um empreendimento florestal (Viana, 1996).

2.3. Conceituação Teórica para o Estudo do Ambientalismo Empresarial

Uma empresa é uma organização dinâmica, complexa e sujeita a influências sociais. Pode ser considerada como uma arena, constituída por diversos grupos de atores sociais, que têm distintos interesses e objetivos; são indivíduos ou grupos que são direta ou indiretamente ameaçados ou beneficiados pelas ações organizacionais.

As partes interessadas primárias são aquelas que mantêm relações formais, oficiais ou contratuais com a organização, e têm um impacto econômico sobre ela. As partes interessadas secundárias incluem outros grupos que influenciam ou são afetados pela organização. Esses atores envolvem-se em ações, visando adquirir, aumentar e usar o poder para alcançar seus objetivos nas decisões das empresas. Por sua vez, essas ações influenciam a alocação de recursos, a definição de objetivos e programas, estabelecendo a resolução de conflitos e crises, e o ganho de influência. Assim, a dinâmica organizacional é derivada de movimentos dos atores sociais de maior poder, como também da formação e do rompimento das coalisões entre eles (Harrison & Shirom, 1999).

Para muitas empresas, o seu sucesso não depende apenas de seus produtos e serviços, mas também da maneira como elas efetivamente se relacionam com as demais partes interessadas no seu negócio. A estabilidade ambiental e social da região influenciada por uma organização é fator fundamental para a sobrevivência e o desenvolvimento desta mesma organização (Backer, 1995; Demajorovic & Sanches, 1999).

Atualmente, a evolução das práticas ambientais ocorre dentro do contexto social, político e econômico, denominado "campo organizacional". O campo organizacional consiste em um sistema aberto de interação entre os atores sociais interessados nas atividades empresariais que estão sendo realizadas. As empresas existem dentro de múltiplos campos e respondem a eles com diferentes níveis de atenção e postura (Hoffman, 1997).

Quando uma organização define seus objetivos sem considerar a amplitude do seu campo organizacional, atingir seus próprios interesses pode estar comprometendo os interesses de outros atores sociais envolvidos ou relacionados às suas atividades, podendo, numa relação sistêmica, acabar prejudicando a própria empresa. Já a definição de objetivos que incorpore os interesses do campo organizacional permite o melhor desempenho, criando valor aos produtos e serviços de uma organização. Para isso, a estratégia empresarial deve estar fundamentada em uma visão sistêmica de todo o processo (O'Malley, 1998).

De acordo com Schein (1997), existe uma interdependência entre os problemas de adaptação externa de uma organização e as soluções de integração interna. Dependendo da maneira como os aspectos externos de sobrevivência atuam sobre uma organização, fortes influências são exercidas sobre sua integração interna. Sendo assim, a cultura e a estrutura de uma empresa são um reflexo das instituições dominantes do campo organizacional.

Por instituições entende-se o conjunto de leis, normas, padrões de comportamento e valores que regem uma sociedade. A institucionalização é um processo socialmente integrado, pelo qual se busca a estabilização de idéias difusas e instáveis para conceitos mais estáveis. A partir dela, as maneiras de agir e pensar, bem como as conecções entre grupos, políticas e práticas, tornam-se mais estabilizadas. A Teoria Institucional questiona e analisa o propósito e o funcionamento das organizações e seu meio externo, e como as organizações respondem a esse meio (Selznick, 2000).

Bowring (2000), em sua revisão sobre a Teoria Institucional, citou como trabalhos clássicos nessa área Schutz (1962), Berger & Luckmann (1967), Meyer & Rowan (1977), DiMaggio & Powell (1983) e Scott (1987), e criticou a perspectiva funcionalista e linear de a organização apenas reagir ao seu meio. Para a autora, as organizações são afetadas por forças externas ao seu meio institucional e desenvolvem estruturas e comportamentos adaptados a responder a essas forças, porém os membros das organizações possuem também a capacidade de moldar seu contexto institucional. Essa relação pode ser analisada sistemicamente pela Teoria Institucional.

A abordagem sistêmica foi utilizada por Hoffman (1997), quando considerou as ações organizacionais como resultado e fonte das ações institucionais. O autor aplicou o modelo institucional de Scott (1987) como uma ferramenta para compreender como as empresas têm desenvolvido estruturas internas que refletem as demandas ambientais de seu campo organizacional. Nesse modelo, encontram-se descritos três pilares institucionais: o pilar regulativo, cuja base de legitimidade é o que está legalmente sancionado, sendo seus indicadores as regras, os regulamentos e as leis; o pilar normativo, que é moralmente governado, fundamentado na certificação e credenciamento; e o pilar cognitivo, sendo caracterizado pela prevalência de determinados valores, culturalmente suportados.

O sucesso de uma organização depende de sua adaptação às mudanças externas, gerando resultados ou produtos que são avaliados positivamente pelas partes interessadas. As normas influenciam o fluxo de recursos e a recepção dos resultados e produtos. A legitimação externa é particularmente crítica para as organizações que operam em campos institucionais dominados por organismos que estabelecem padrões (ou onde dominam instituições normativas). Diferente da situação em que os fatores técnicos predominam, o meio institucional define o uso de estruturas e processos. As regras e os requerimentos elaborados eventualmente se tornam parte da cultura das organizações (Harrison & Shirom, 1999).

As empresas submetidas a pressões comuns para mudança adotam estruturas e estratégias similares, num processo conhecido por isomorfismo. A Teoria Institucional explica a difusão de estruturas isomórficas por meio de um setor empresarial. As pressões para conformidade surgem a partir de restrições legais, normas explícitas ou simplesmente pelas tendências que outras empresas estão seguindo. Quando a maioria das organizações está estruturada de uma maneira similar, assumese que a estrutura é legítima. A adoção de padrões é impulsionada pelo tamanho ou pela visibilidade de um empreendimento, fatores esses o que o tornam vulnerável ao ataque legal e público (Martin, 2000).

Pode-se afirmar, assim, que a maneira como a questão ambiental é definida dentro da organização é dependente de como ela é definida fora da organização. Tal fato não evidencia que as ações de uma empresa são determinadas completamente pelo meio externo, mas que as decisões internas são influenciadas pelas estruturas desse meio. As empresas têm liberdade de ação, mas dentro dos "parâmetros do jogo". As mudanças oriundas dessas ações nem sempre são necessariamente melhorias ou visam maior eficiência, mas reproduzem conformidade às normas institucionais (Hoffman, 1997).

2.4. Modelagem Teórica e o Pensamento Sistêmico

Van de Ven (1999) comentou que os estudos na área de desenvolvimento organizacional fundamentam-se em modelos estáticos, lineares e voltados à experimentação. Entretanto, as organizações estão mergulhadas numa rede social, nos sistemas normativos e no contexto histórico. São dinâmicas, não-lineares, complexas e pluralísticas, não sendo compreendidas por meio de teorias unitárias e por métodos lineares.

A implementação de um gerenciamento ambiental efetivo requer uma abordagem adequada para lidar com um mundo globalmente interconectado, exigindo uma mudança de percepção, pensamentos e valores. Quanto mais são estudadas as questões ambientais, mais se percebe que elas não podem ser compreendidas isoladamente, pelo fato de serem sistêmicas, interconectadas e interdependentes (Capra, 1996).

O paradigma tradicional de gerenciamento, focalizado apenas na produção, no consumo e na eficiência, é limitado na sua aplicação em questões ambientais, podendo obscurecer a compreensão da complexa interface entre organização e meio ambiente (Shrivastava, 1995).

A abordagem holística permite examinar o contexto organizacional e o seu meio externo. Contribui para a compreensão da complexidade de fatores que afetam o desempenho das organizações e evita a adoção de modismos gerenciais, com base em raciocínios simplistas, além de alertar para os efeitos colaterais (Harrison & Shirom, 1999).

Senge (1990) comentou que a maioria dos problemas verificados hoje, no mundo, está ligada à incapacidade do homem de entender e controlar os sistemas cada vez mais complexos. O autor contribuiu para a divulgação do "pensamento sistêmico" como um método para compreensão, diagnóstico e melhoria em diferentes áreas, como administração, educação, saúde, política, entre outras.

Na área de gerenciamento ambiental, Schelley & Laur (1998) utilizaram os conceitos e métodos do pensamento sistêmico, de modo a contribuir para uma perspectiva mais ampla dos desafios econômicos, ambientais e sociais a serem enfrentados na busca pelo desenvolvimento sustentável.

No pensamento sistêmico, o princípio da interdependência postula que mudanças em qualquer um dos componentes do sistema estão associadas ou irão afetar os demais componentes. Quando uma informação flui através de um sistema, ela provoca feedback ou retroalimentação no seu estado interno e nas suas relações com o meio. Esta retroalimentação pode tanto alcançar os níveis desejáveis, e assim confirmar a aceitabilidade das ações, como revelar lacunas entre as condições esperada e atual (Harrison & Shirom, 1999).

Numa empresa, as decisões são tomadas em diferentes pontos de um sistema. Os sintomas, as ações e as soluções não estão isolados numa relação linear de causa e efeito, mas existem em uma estrutura circular e inter-relacionada. Nessa estrutura, uma ação pode induzir não apenas à correção, mas também acentuar as forças que produziram o sintoma original. À medida que as práticas interagem, o crescimento, o declínio, o alcance de objetivos e as oscilações surgem como conseqüências da dinâmica dos círculos de retroalimentação (Forrester, 1994).

Uma das técnicas do pensamento sistêmico é o diagrama de círculos de causalidade. De acordo com Goodman (1989), é uma ferramenta de fácil aprendizagem, que incentiva o usuário a conceitualizar os sistemas do mundo real, transformando uma descrição verbal em uma estrutura de retroalimentação. Permite identificar e organizar os principais componentes de um sistema, entretanto sem considerar a precisão e o nível em que eles são afetados. Para essa última abordagem são requeridas técnicas de Dinâmica de Sistemas, as quais utilizam simulações e modelos computacionais (Cover, 1996).

Independentemente das técnicas utilizadas, os modelos não descrevem todos os aspectos ou relações relevantes de uma organização. Nenhum modelo é uma representação precisa ou exata da realidade, e sim uma simplificação desta, criado para explicar determinado problema. Deve-se sempre ter em mente que a observação da realidade é influenciada pela posição do observador. A importância de um modelo teórico reside, principalmente, na sua utilização como instrumento de aprendizagem, não de predição (Geus, 1994).

A modelagem pelo pensamento sistêmico é considerada uma ferramenta útil na compreensão do funcionamento de um sistema estudado e nas possíveis intervenções a serem realizadas no mesmo (Senge, 1990).

 

3. MATERIAL E MÉTODOS

3.1. Coleta de Dados e Descrição do Problema

As informações para a construção do modelo teórico foram obtidas a partir da revisão de literatura e pelo método "Observador-Participante", descrito por Schein (1997). Por meio da participação em avaliações de campo, eventos e reuniões relacionados à certificação florestal no período de 1998 a 2000, foi possível interagir com os diversos atores sociais e conhecer os programas ambientais de diversas organizações florestais.

A partir das observações, foi possível contextualizar e descrever o problema, identificando os principais elementos que compõem o ambientalismo empresarial do setor florestal.

3.2. Ferramentas do Pensamento Sistêmico

A partir da estrutura teórica de Sistemas Abertos, conforme descrito em Harrison & Shirom (1999), foi possível identificar as variáveis que iriam compor o modelo teórico e aplicar as ferramentas propostas por Senge (1990) e Anderson & Johnson (1997), descritas a seguir:

• Sociograma

Utilizou-se a ferramenta "sociograma" para explorar as conexões entre os diversos atores sociais e outros componentes do problema, permitindo a visualização de sua amplitude e complexidade. A elaboração do sociograma iniciou-se a partir de um círculo central, representando o grupo primário relacionado ao problema. Em seguida, foram identificados os grupos secundários, posicionados em redor do círculo central. Nos últimos círculos da periferia, outros aspectos foram relacionados, além de grupos sociais. A aplicação dessa ferramenta teve como produto a geração de um mapa de interdependências.

• Diagramas de círculos de causalidade

O "círculo de causalidade" consiste em um arranjo circular de variáveis conectadas por suas relações causais, no qual uma causa inicial propaga-se ao longo das ligações do círculo, de modo que cada variável tem um efeito na próxima, até que a última retroalimentação afete a primeira variável.

Os elementos, ou as variáveis, são expressos por palavras ou frases curtas e são interligados por arcos - as > conexões. As setas, presentes nos círculos, indicam a direção de causalidade entre duas variáveis. Já os sinais indicam se o efeito da relação é no mesmo sentido da influência original (sinal positivo) ou no sentido oposto (sinal negativo). Os processos de retroalimentação podem ser de reforço (R) ou de balanceamento (B), representados pela letra no centro de cada círculo. Os círculos de reforço são propulsores de crescimento ou de declínio, já os de balanceamento buscam o equilíbrio, que é alcançado quando o comportamento tem um objetivo definido. O esquema básico do diagrama está representado na Figura 1.

 

 

Para modelar a evolução do ambientalismo empresarial do setor florestal, utilizou-se como referência o diagrama elaborado por Griffith et al. (2000). O modelo foi adaptado, identificando-se outras variáveis do sistema, tanto em nível institucional quanto organizacional.

 

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.1. A Empresa Florestal como um Sistema Aberto

A empresa ou empreendimento florestal pode ser considerada como um sistema que recebe insumos do seu meio, processa esses insumos e, então, gera produtos ou serviços. Por exemplo, no caso de plantações florestais, podem ser considerados como insumos as sementes ou mudas plantadas, os biocidas, os equipamentos e as técnicas adotadas, os combustíveis utilizados, a mão-de-obra empregada, entre outros. Essas entradas do sistema produtivo são organizadas e aplicadas em diferentes processos, de forma a gerar os produtos planejados, que podem ser, no caso citado, madeira de determinada qualidade para serraria, celulose ou carvão, entre outros. Esse conjunto de variáveis, que compreende as entradas, os processos e os resultados da empresa, constitui o seu campo técnico, conforme representado na Figura 2.

 

 

Entretanto, verificou-se que esse contexto (representado na Figura 2) tem se tornado cada vez mais complexo ao longo da história do ambientalismo do setor florestal brasileiro. Com uma percepção mais ampla da importância das relações entre as ações das empresas e o meio ambiente, vem ocorrendo uma interação entre as empresas e outros atores sociais. Sendo assim, o campo de atuação de uma empresa está sendo expandido.

A complexidade dos atores sociais que se relacionam com o setor florestal empresarial brasileiro está representada na Figura 3. Esses atores irão formar o campo organizacional do setor, influenciando as decisões tomadas pela empresa no seu campo técnico (Figura 4).

 

 

As partes interessadas, externas e internas, têm demandas institucionais sobre a empresa, expressas a partir do estabelecimento de regras, normas e conceitos comuns de comportamento. O campo organizacional define assim suas ideologias, que contribuem, junto com outros elementos, para a constituição do meio institucional (Figura 5). Deste modo, os aspectos inerentes ao campo técnico, como insumos que podem ou não ser utilizados, as práticas a serem adotadas e o valor dos produtos e serviços gerados, passam a ser influenciados pelo campo organizacional, por meio de suas instituições. A legitimidade de uma empresa ou empreendimento florestal é conferida pela sua conformidade às expectativas do campo organizacional, que, na verdade, estabelecem as "regras do jogo".

 

 

Em alguns setores econômicos, as empresas têm maior liberdade para exercer controle sobre suas estratégias corporativas. As ações são motivadas, na maioria das vezes, por objetivos internos. Em outros setores, a flexibilidade de ação é limitada. A empresa é influenciada por forças externas, sobre as quais pode ter um controle limitado, sendo suas atividades interpretadas a partir de determinantes externos de legitimidade. Como resultado, uma empresa florestal pode ser eficiente no campo técnico, mas poderá não ter legitimidade, portanto poderá perder sua competitividade.

O setor florestal apresenta uma dinâmica institucional própria, que vem alterando a maneira pela qual as empresas respondem às questões ambientais. Entre as variáveis importantes dessa dinâmica está o processo de certificação. A certificação florestal surgiu, nos últimos anos, da necessidade de um instrumento para conferir credibilidade e garantia aos diferentes membros do campo organizacional. De acordo com Upton & Bass (1995), a certificação é uma garantia ao consumidor ou cliente de que o produto ou serviço adquirido provém de uma floresta bem manejada e que não favorece práticas insustentáveis. Em outras palavras, é um instrumento de legitimação das atividades e dos produtos florestais. Entretanto, por si só, pode não trazer melhoria ao desempenho do setor florestal. Cada membro do setor apresenta diferentes estratégias para adotar e internalizar normas ou padrões, o que conduz a diferentes resultados.

4.2. Dinâmicas Institucional e Organizacional do Setor Florestal Brasileiro

A evolução do ambientalismo empresarial, segundo Hoffman (1997), está fundamentada no seguinte conceito: a ação organizacional atuando como resultado e fonte da ação institucional. O modelo apresentado na Figura 6 sintetiza a relação entre a ação institucional ("regras do jogo") e a ação organizacional, representando as "respostas do setor florestal" a essas regras. O processo de institucionalização do ambientalismo empresarial é desencadeado pela ocorrência de um evento relacionado ao meio ambiente, cuja percepção é mediada por sua história, sua cultura e seu contexto setorial. As abrangências destes fatores são representadas, respectivamente, pelos eixos X, Y e Z.

 

 

Um evento pode ser tanto conseqüência de fenômenos naturais e acidentes ambientais, como resultado de mudanças nos meios social, político e econômico. A interpretação social de um evento torna-se, em muitos casos, mais importante do que o próprio evento. Exemplos de eventos que repercutiram nos últimos anos no setor florestal foram os incêndios na Amazônia e o boicote dos países europeus às madeiras tropicais. Em decorrência deles, novos atores sociais passaram a fazer parte do campo organizacional, trazendo novas demandas e percepções quanto aos impactos causados pelas atividades florestais, o que provocou alterações no meio institucional. As organizações enfrentaram, nessa situação, um realinhamento de interesses. O efeito dos eventos estendeu-se então em nível político – ou institucional.

O modelo para a dinâmica institucional está representado na Figura 7, a partir dos círculos de causalidade R1 e B1.

 

 

A primeira variável considerada é a regulação governamental, que, para o caso florestal, consiste no conjunto de leis e demais instrumentos regulatórios referentes à atividade florestal.

A legitimidade do Estado aumenta ou decresce de acordo com a eficiência das práticas governamentais, estando também sob influência do mercado global e da política internacional. Dependendo da conjuntura nacional e internacional, a regulação governamental pode não ser considerada efetiva para garantir as demandas do campo organizacional. Na dinâmica institucional estudada, verificou-se a ocorrência de um processo de "erosão" da legitimidade do Estado na regulação de questões florestais, representada no diagrama da Figura 7 pelo círculo de reforço R1. Esse processo ocorreu tanto externamente, influenciado pela maior interdependência da economia mundial, quanto internamente, pelas denúncias de corrupção nos órgãos governamentais e ineficiência na implementação de uma política florestal sustentável.

A crise de legitimidade do Estado criou uma oportunidade política para estruturar os movimentos ambientalistas. Coube às ONGs um papel de destaque na complementação da atuação do Estado, principalmente em questões socioambientais. A atuação das ONGs no balanceamento da dinâmica institucional está representada pelo ciclo B1 (Figura 7).

No sentido lato do termo, as ONGs abrangem todo o conjunto de entidades que não têm o caráter governamental. No sentido político, podem ser entendidas como organizações privadas, autogovernadas e sem fins lucrativos, que prestam serviços e apóiam os segmentos da sociedade civil que elas representam. Na última década, o número de ONGs e a influência que elas exercem aumentaram extraordinariamente. Foram criadas novas redes em nível mundial, desempenhando um papel crucial nas grandes conferências internacionais e na coesão em torno das questões ambientais (Feam, 1998).

Verificou-se que as ONGs envolvidas na questão florestal seguem basicamente dois caminhos (Hoffman, 1997):

1. As ONGs consultoras, que tentam buscar soluções alternativas, atuando diretamente na dinâmica institucional. Neste caso, o lema é "fazer parte da solução, não do problema". A partir desse comportamento, as organizações conseguem influenciar mudanças dentro da corporação e criar pressões no campo organizacional para que as inovações se tornem institucionalizadas.

2. As ONGs ativistas, que tentam influenciar a opinião pública e denunciar problemas. Influenciam a formação de valores em nível cognitivo ou senso comum, que por sua vez irão definir a interpretação da realidade. Dessa maneira, buscam influenciar o poder público em favor da causa defendida. Essa estratégia pode ser a adoção de ações persuasivas junto aos poderes executivo e legislativo ou a pressão sobre o Estado, com respaldo da comunidade por meio de cobranças e denúncias.

A estratégia adotada pelas organizações ambientalistas foi de buscar uma parceria com as partes interessadas na utilização e conservação das florestas. A fundação do FSC, em 1993, é um exemplo de como uma ONG pode percorrer esse caminho, envolvendo os diversos atores sociais interessados nas questões florestais para, mutualmente, desenvolverem soluções aos problemas do setor. Como resultado dessa negociação e de um conseqüente processo de convergência social, foram instituídos padrões para certificação florestal voluntária, representados pelos Princípios e Critérios do FSC. Os padrões do FSC constituem, assim, uma nova instituição normativa para o setor florestal.

É importante salientar que instituições não são criadas instantaneamente; possuem sempre uma história, da qual são produtos (Berger & Luckman, 1967). Assim, os padrões para certificação florestal são o resultado de vários estudos, pesquisas, experiências e rodadas de discussão e negociação referentes ao manejo florestal sustentável, desenvolvidas em todo o mundo nas duas últimas décadas.

Como uma estratégia para maximizar seu impacto institucional, as ONGs procuram trabalhar com líderes de mercado, ou grupos que tenham o poder de atuar como agentes de mudanças institucionais. Por outro lado, as empresas que fazem parceria com as ONGs buscam fortalecer sua imagem e promover o marketing de seus produtos. Os Grupos de Compradores de Produtos Florestais Certificados são um exemplo dessa estratégia. No mundo todo, o FSC e as organizações que apóiam a iniciativa da certificação florestal buscam empresas-líderes para a formação desses grupos.

Todas as duas linhas de atuação das ONGs, seja a consultoria ou o ativismo, têm como objetivo institucionalizar valores e crenças no senso comum e influenciar políticas públicas e empresariais. Uma organização pode atuar como consultora ou parceira para determinado setor ou grupo de problemas ambientais, e continuar como ativista diante de outros. À medida que os ativistas se tornam integrados no campo organizacional e são aceitos pelas empresas e pelo governo como parceiros de trabalho cooperativo, maior é a influência concedida nas mudanças institucionais.

O modelo indica que novos eventos podem redirecionar a dinâmica institucional, fazendo com que as atividades florestais sejam continuamente interpretadas e avaliadas pelo campo organizacional. Neste caso, o papel das ONGs ativistas será fundamental para a mudança institucional.

Segundo Scott (1991), citado por Hoffman (1997), dos três pilares institucionais (regulativo, normativo e cognitivo) necessários para estabelecer a legitimação das ações ambientais, a cristalização dos valores consensuais no cognitivo é o mais importante. Deste modo, quando as normas tornam-se consolidadas e culturalmente sustentadas, elas passam a ser incorporadas como valores cognitivos do setor, formando o seu senso comum. O modelo indica que esse seria um caminho para os padrões do FSC. Os princípios e critérios do "bom manejo" florestal passariam a fazer parte da cultura do setor e influenciariam as políticas públicas, no sentido de incorporá-los na regulação governamental das atividades florestais.

Para que haja a consolidação dos padrões como um pilar cognitivo, existe ainda um caminho a ser percorrido, no que diz respeito ao consenso dentro do campo organizacional. O processo de negociação dos padrões nacionais do FSC representou um avanço nesse sentido. Entretanto, permanecem ainda conflitos fundamentais: pelo lado empresarial, existe o questionamento de que o atendimento às normas representa custos adicionais, de que a certificação consiste numa barreira não-tarifária para produtos florestais brasileiros, de que há o domínio dos ambientalistas nas discussões, de que haverá perda de competitividade do setor florestal brasileiro, entre outros; pelo lado das ONGs, questiona-se, principalmente, se os padrões não estariam legitimando a atuação de empresas com histórias passadas de degradação ambiental e social, em especial aquelas fundamentadas na monocultura florestal, e se, ao se tornarem parceiras dos empresários, não estariam perdendo sua autonomia e credibilidade.

Concluindo o círculo B1, o modelo mostra também a relação entre a consolidação de instituições normativas e sua influência na regulação governamental. Deverá ter início um novo processo de contestação e outras rodadas de negociação e convergência social para o estabelecimento de uma nova regulação governamental.

Além de alimentar a discussão de novas regulações, as normas e os padrões institucionalizados passam a influenciar diretamente as respostas das empresas florestais, conforme representado na conexão em "curto-circuito" na Figura 8.

O setor florestal responde às regras do jogo, buscando a legitimidade de suas ações. A certificação vem se tornando um instrumento de credibilidade para diversos atores, não somente para os consumidores de produtos florestais, mas para o acionista, o agente financiador ou a própria comunidade.

Por ser um instrumento de mercado, a principal motivação das empresas em aderirem aos padrões de certificação tem sido as oportunidades de negócios. De modo geral, as empresas encontram-se pressionadas por clientes internacionais e, mais recentemente, por compradores nacionais de produtos florestais. No caso das empresas de grande porte, além da procura de um diferencial para seus produtos no mercado, está o fortalecimento de sua imagem e a busca de um mecanismo para melhorar suas relações com o campo organizacional, em especial com as ONGs ativistas que apóiam o FSC.

O processo de legitimação pode levar ao isomorfismo, definido como a tendência de organizações que atuam sob condições similares se tornarem semelhantes umas às outras. Esse processo está representado na Figura 8 pelo círculo de reforço R2. O isomorfismo é coercivo e mimético, sendo sustentado por vários mecanismos e processos que induzem a um alto grau de homogeneidade (Srikantia & Bilimoria, 1997). Entretanto, ele pode levar ao simples reforço de estruturas institucionais dominantes, inibindo o setor florestal de atingir o potencial de conhecimento crítico, gerador e reflexivo necessário para sua evolução organizacional.

Existe uma grande variação na extensão pela qual as empresas florestais assumem sua responsabilidade ambiental e social e incorporam essas considerações em suas políticas e operações. Algumas das variações podem ser atribuídas às diferenças em valores e estratégias gerenciais.

Uma das estratégias, a "Adoção Simbólica", permite a realização de atividades legitimadas. As empresas podem considerar mais conveniente construir sua imagem verde e seus produtos como tais, do que dedicar investimentos para reduzir seus verdadeiros impactos ambientais negativos. Assim, os riscos de problemas ambientais podem ser minimizados pela negação no discurso público, reduzindo a ameaça de uma regulação mais restritiva. No curto prazo, é uma alternativa para gerenciar a crise de legitimidade, porém está relacionada mais à sustentabilidade política do que ambiental. É um caminho de difícil sustentação, por cair na retórica e na superficialidade, revelando contradições estruturais profundas entre as atividades empresariais e o meio ambiente.

Na estratégia do "Mimetismo", a organização copia estruturas e práticas já estabelecidas com sucesso no seu setor ou praticadas por empresas-líderes. A adoção dessas práticas pode conferir legitimidade entre os órgãos reguladores, as agências financiadoras, as partes interessadas externas e o público em geral. Porém, a efetividade das novas práticas e dos modismos gerenciais não é interpretada e testada para a realidade organizacional. Em épocas de crise, os "seguidores" abandonam essas iniciativas, fracamente suportadas.

Como pode ser verificado no modelo, mesmo a adoção simbólica e o mimetismo permitem a realização de atividades legitimadas, no curto prazo. Por razões de legitimidade, as empresas que seguem essas estratégias poderiam ser iguais àquela que adota efetivamente o "bom manejo". Daí a necessidade de um sistema de certificação independente, participativo e transparente, para que seja mantida a credibilidade dos resultados das avaliações e do próprio certificado.

Essas duas estratégias carregam o risco de que as empresas desenvolvam uma estrutura culturalmente inconsistente, construída a partir de artefatos, diminuindo a eficiência do setor. A longo prazo, as opções de Adoção Simbólica e de Mimetismo, por atuarem em detrimento de uma atuação efetiva sobre as questões ambientais, resultam no acúmulo de impactos negativos, fazendo com que as empresas que as adotaram se tornem mais suscetíveis aos futuros eventos e mais vulneráveis às mudanças no campo organizacional. Este comportamento de "ciclo vicioso" está representado na Figura 8, pelo círculo R3.

A estratégia da "Adoção Efetiva" leva a mudanças internas na organização e a reinterpretação dos padrões para a sua realidade. Permite que suas necessidades internas e externas sejam alcançadas, possibilitando maior eficiência ambiental e contribuindo para que, a longo prazo, haja redução dos impactos ambientais negativos. Essa estratégia permite o balanceamento do sistema, como mostrado no círculo B2.

Com a legitimação de suas atividades, a partir da adoção de estruturas e processos apropriados, do ponto de vista da instituição dominante, as empresas florestais passam a sofrer menores pressões dos demais membros do campo organizacional. Assumindo que as operações internas da empresa estão sendo conduzidas de maneira adequada, as partes interessadas externas exercem um controle menor sobre o dia-a-dia da empresa, a não ser que ocorra uma violação óbvia dos padrões ou um novo evento ou distúrbio ambiental.

Concluindo o modelo, numa reação do campo organizacional, um novo evento pode levar a uma crise de legitimidade, retroalimentando a dinâmica institucional (R1 e B1). A partir de algum evento que perturbe a estabilidade existente, o modelo mostra como ocorre um reajuste do sistema social, visando uma nova estabilidade. Após o último distúrbio, a estabilidade será ainda mais transitória se as estratégias gerenciais escolhidas não forem adequadas para tratar os eventos ambientais futuros.

A estrutura e a cultura organizacionais refletem o compromisso ambiental de uma empresa no longo prazo (Hoffman, 1997). Sendo assim, a opção por uma estratégia que conduza a mudanças efetivas e a uma melhoria contínua de desempenho - econômico, social e ambiental - do setor florestal requer o estabelecimento de uma visão compartilhada de sustentabilidade, que contribua na consolidação de instituições e que oriente as respostas empresariais.

Nesse sentido, o modelo teórico permitiu o estabelecimento das seguintes hipóteses, testadas por Nardelli (2001):

• De acordo com a dinâmica institucional, as normas e os padrões de comportamento tornam-se gradualmente compartilhados e incorporados ao senso comum. Para o setor florestal brasileiro, espera-se que os elementos presentes na visão de sustentabilidade, expressa pelos membros do campo organizacional, estejam também contemplados nos princípios e critérios de certificação florestal.

• As partes interessadas, internas e externas, defendem diferentes critérios e graus de importância no que se refere aos elementos que compõem uma visão de sustentabilidade para o setor florestal. Apesar da convergência social em torno da criação dos padrões nacionais para certificação florestal, existem ainda conflitos culturais entre os grupos que representam os interesses sociais, econômicos e ambientais.

 

5. CONCLUSÕES

O modelo teórico desenvolvido permitiu identificar as principais variáveis que compõem o ambientalismo empresarial do setor florestal brasileiro. A aplicação do modelo, a partir do trabalho de Hoffman (1997), foi considerada apropriada para a compreensão das dinâmicas institucional e organizacional que afetam o desempenho ambiental das empresas florestais no Brasil, permitindo descrever, identificar e inferir sobre o comportamento futuro do sistema, além de estabelecer hipóteses para novos estudos.

A metodologia utilizada na construção do modelo - a concepção da empresa florestal como um sistema aberto - proporcionou uma visão geral do problema estudado, seus principais subcomponentes e seu contexto. Esse estrutura teórica pode ser complementada com o uso das ferramentas do pensamento sistêmico, permitindo identificar os atores sociais envolvidos com a questão e as relações causais entre as variáveis que afetam o sistema.

A aplicação da Teoria Institucional contribuiu para a compreensão dos padrões para certificação florestal como uma instituição normativa. Permitiu ainda, a partir de fatos concretos da realidade brasileira, avaliar o processo de consolidação dos Princípios e Critérios do FSC. Mesmo ocupando uma lacuna aberta pela regulação governamental, os padrões para certificação não atuam de modo a erodir a legitimidade do Estado ou competem com o mesmo na regulação de questões ambientais. Com a cristalização das práticas do "bom manejo" no senso comum, a tendência é que essas questões passem a influenciar as políticas públicas e sejam incorporadas na negociação de novas leis.

O modelo enfatizou o papel dos eventos externos na mudança institucional e organizacional. Apesar das críticas do empresariado, o papel das ONGs em catalisar eventos foi decisivo para nortear a institucionalização de normas e conceitos comuns de comportamento para o setor. Na ausência de eventos mais evidentes, as mudanças poderiam ser lentas ou o comportamento do sistema poderia ser imprevisível ou sem rumo. Em ambas as situações, o setor florestal brasileiro perderia sua eficiência e sua competitividade. A institucionalização da certificação florestal vem conferir, assim, maior estabilidade e previsibilidade ao setor.

Quanto às respostas empresariais, verificou-se que a dinâmica organizacional é movida pela busca da legitimidade, e não, explicitamente, por uma maior eficiência técnica. Algumas práticas adotadas pelas empresas florestais cumprem funções tanto instrumentais quanto simbólicas, enquanto outras visam legitimar ou conferir uma imagem organizacional "verde", sem contribuir diretamente no seu desempenho ambiental e, ou, financeiro. Quando as práticas são voltadas a atender primariamente às funções simbólicas, deve-se proceder a uma avaliação cuidadosa de sua real contribuição na melhoria do desempenho do setor florestal.

Observando o modelo, conclui-se que as organizações que aderem ao ambientalismo simbólico ou mimético podem contribuir para desacreditar as iniciativas ambientais do setor ou mesmo o sistema de certificação, fazendo com que o setor florestal fique mais vulnerável a futuros eventos e críticas.

Entre os grandes desafios para o ambientalismo do setor florestal estão a consolidação das práticas do manejo florestal sustentável no senso comum e o direcionamento das empresas para a adoção efetiva dessas práticas, necessitando, para isto, de uma mudança de paradigma. Um ponto de alavancagem identificado no modelo foi o estabelecimento de uma visão de sustentabilidade para o setor florestal, compartilhada pelos membros do campo organizacional.

Os problemas ambientais não são estáticos na sua forma e na sua interpretação, fazendo com que a legitimidade de uma organização não seja nem absoluta, nem estável. Contudo, o modelo teórico desenvolvido pode fornecer informações importantes para a compreensão da dinâmica do ambientalismo empresarial e da certificação, além de seus reflexos no comportamento do setor florestal.

O modelo oferece diretrizes gerais que podem ser usadas para analisar o ambientalismo em outros setores, podendo ser adaptado para incluir as variáveis pertinentes a cada caso. Entretanto, deve-se considerar que cada setor empresarial está sujeito a diferentes pressões, de acordo com os impactos e riscos potenciais e com a visibilidade de suas práticas, e, assim, irão apresentar dinâmicas institucionais e organizacionais próprias.

 

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Recebido para publicação em 14.2.2003
Aceito para publicação em 4.11.2003