It is the cache of ${baseHref}. It is a snapshot of the page. The current page could have changed in the meantime.
Tip: To quickly find your search term on this page, press Ctrl+F or ⌘-F (Mac) and use the find bar.

Revista de Odontologia da Universidade de São Paulo - PREVALENCE OF NOCTURNAL BRUXISMIN 2-11-YEAR-OLD CHILDREN

SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.12 issue1RELIABILITY OF ICE AND TETRAFLUOROETHANE FOR DETERMINING DENTAL PULP VITALITYGINGIVAL HYPERPLASIA IN CHILDREN: USE OF ANTICONVULSANTS AND ORAL HYGIENE author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Services on Demand

Article

Indicators

Related links

Share


Revista de Odontologia da Universidade de São Paulo

Print version ISSN 0103-0663

Rev Odontol Univ São Paulo vol. 12 no. 1 São Paulo Jan./Mar. 1998

http://dx.doi.org/10.1590/S0103-06631998000100006 

CONTRIBUIÇÃO AO ESTUDO DA PREVALÊNCIA DE BRUXISMO EXCÊNTRICO NOTURNO EM CRIANÇAS DE 2 A 11 ANOS DE IDADE

PREVALENCE OF NOCTURNAL BRUXISMIN 2-11-YEAR-OLD CHILDREN

 

Rosemary Sadami Arai SHINKAI*
Lucineide de Melo SANTOS**
Frederico Andrade e SILVA***
Marinês NOBRE DOS SANTOS****

 

 

SHINKAI, R. S. A.; SANTOS, L. M.; SILVA, F. A.; NOBRE DOS SANTOS, M. Contribuição ao estudo da prevalência de bruxismo excêntrico noturno em crianças de 2 a 11 anos de idade. Rev Odontol Univ São Paulo, v.12, n.1, p.29-37, jan./mar. 1998.

Uma grande variação de prevalência de bruxismo infantil é relatada na literatura (5% a 81%), dificultando o estabelecimento de parâmetros comparativos. O objetivo deste estudo foi determinar a prevalência de bruxismo excêntrico noturno (BEN) e suas características em 213 crianças de 2 a 11 anos, sendo 130 crianças atendidas na Clínica de Odontologia Infantil da FOP-UNICAMP e 83 crianças atendidas em consultório particular. Os dados foram coletados mediante entrevista dirigida ao responsável pela criança e ao seu dentista e analisados estatisticamente através dos testes c2 e de Kruskal-Wallis. Os resultados mostraram uma prevalência de BEN de 28,64% (n = 61). A diferença de freqüência entre crianças bruxômanas e não bruxômanas não foi significativa em relação ao local de atendimento (FOP versus consultório) (p > 0,05). Considerando o tipo de dentição, 39,34% das crianças com dentadura decídua e 24,34% com dentição mista eram bruxômanas (p < 0,05). Entre os bruxômanos (n = 61), 27,87% eram crianças ansiosas e 31,15% eram hiperativas. Cinqüenta e um por cento das crianças com BEN tinham problemas respiratórios e/ou alérgicos. Em relação à idade, observou-se uma maior prevalência de BEN em crianças de 2 a 5 anos e de 10 a 11 anos.

UNITERMOS: Bruxismo; Disfunção temporomandibular; Odontopediatria.

 

 

INTRODUÇÃO

O bruxismo é uma atividade parafuncional do sistema mastigatório que inclui apertar ou ranger os dentes16. Nesse último caso, ocorrem contrações rítmicas musculares, sendo mais freqüente durante o sono (bruxismo excêntrico noturno). Durante essa atividade parafuncional, que ocorre quase que inteiramente em nível subconsciente, os mecanismos de proteção neuromuscular estão ausentes16, o que pode acarretar danos ao sistema mastigatório e desordens temporomandibulares9,15,20.  

A etiologia do bruxismo é atribuída a fatores locais, sistêmicos, psicológicos e hereditários4,12,20. Em relação aos fatores locais, as interferências oclusais podem ser consideradas como o principal fator desencadeante do bruxismo1,7. Já correlações entre maloclusão e bruxismo não são consistentes19.

Distúrbios sistêmicos, tais como deficiências nutricionais, alergias, parasitoses intestinais11 e desordens endócrinas, têm sido implicados como fatores causais do bruxismo20. Distúrbios neurológicos, como autismo e paralisia cerebral, também estão fortemente indicados como fatores de risco22, e o aspecto psicológico é considerado um fator importante na psicofisiologia do bruxismo12,16,18. MOLINA14 (1983) relata que 48% das crianças com parafunção apresentavam tensão emocional aumentada.

Clinicamente, o bruxismo infantil pode ser relacionado com níveis de desgaste da superfície dentária e com desconfortos musculares e articulares1,12. Além disso, devido às forças não axiais geradas nos dentes, o bruxismo excêntrico pode atuar como um coadjuvante na progressão da doença periodontal destrutiva em crianças1. Pode também contribuir para o desenvolvimento de falsa classe III, acelerar a rizólise de dentes decíduos e provocar alterações na cronologia de erupção dos permanentes, bem como favorecer os apinhamentos dentais12. Uma correlação significativa entre bruxismo, onicofagia, sucção do polegar e desordens temporomandibulares foi demonstrada por WIDMALM22 (1995). Dessa forma, esse hábito bucal parafuncional deveria ser diagnosticado e controlado o mais cedo possível3,11,15.

A prevalência e a incidência de bruxismo em crianças têm sido objeto de estudos epidemiológicos mais recentes quando comparados aos estudos em adultos. A falta de uniformidade e padronização dos critérios para a avaliação do bruxismo infantil tem resultado em uma grande variação de sua prevalência — 5% a 81%, segundo AHMAD1 (1986), e 7% a 88%, de acordo com CASH6 (1988) —, o que dificulta o estabelecimento de parâmetros comparativos. Além disso, ainda são poucos os trabalhos similares realizados no Brasil, principalmente na faixa etária de 2 a 11 anos de idade, o que impede a formação de uma estatística nacional.

Este trabalho de levantamento epidemiológico exploratório teve por objetivo determinar a prevalência de bruxismo excêntrico noturno (BEN) em crianças de 2 a 11 anos de idade, bem como verificar uma possível correlação com o tipo de comportamento da criança, o estado de saúde geral, a ocorrência de maloclusão e a presença de outros hábitos bucais parafuncionais.

 

CASUÍSTICA E MÉTODO

Local e período

O levantamento foi realizado na Clínica de Odontologia Infantil da Faculdade de Odontologia de Piracicaba - UNICAMP, em Piracicaba, e em consultório particular de classe média, em área urbana, nas cidades de Piracicaba, Limeira e São José dos Campos. Todos os dados foram coletados durante os meses de março e abril de 1997.

Amostra estratificada

Foram avaliadas 213 crianças de 2 a 11 anos completos de idade, sendo 130 crianças atendidas na FOP-UNICAMP e 83 crianças atendidas em consultório particular. As crianças foram divididas em cinco subgrupos de faixa etária (2-3 anos, 4-5anos, 6-7 anos, 8-9 anos e 10-11 anos). Para a classificação da idade, foi utilizado o último aniversário (Tabela 1).

 

Image653.GIF (7106 bytes)

 

Entrevista padronizada

Os dados foram coletados por duas examinadoras devidamente calibradas (R. S. A. S. e L. M. S.) através de entrevista padronizada dirigida ao responsável pela criança e ao seu dentista ou aluno de Odontologia. A entrevista foi conduzida segundo um questionário estruturado e pré-codificado para o levantamento das seguintes variáveis: idade, sexo, freqüência de BEN, local de atendimento, tipo de dentadura/dentição, comportamento da criança, grau de maloclusão, condição de saúde geral e outros hábitos bucais parafuncionais. Conforme as recomendações éticas para pesquisa em seres humanos, os participantes receberam previamente as informações sobre a pesquisa para a obtenção do consentimento do responsável pela criança. Todos os procedimentos realizados receberam aprovação da Comissão de Ética da FOP-UNICAMP.

Categorização das variáveis

1. Presença ou ausência de bruxismo excêntrico noturno (BEN).
2. Freqüência de BEN: 3 vezes/semana ou mais; 1vez/semana aproximadamente; episódios isolados - intervalos desiguais.
3. Idade da criança - divisão da amostra em cinco subgrupos: 2-3 anos, 4-5 anos, 6-7 anos, 8-9anos e 10-11 anos, de acordo com o último aniversário.
4. Sexo: feminino ou masculino.
5. Local de atendimento: Clínica de Odontologia Infantil da FOP-UNICAMP (predomínio de crianças com nível sócio-econômico mais baixo); consultório particular (crianças de classe média). O nível sócio-econômico foi avaliado conforme os seguintes dados obtidos na entrevista: atividade profissional dos pais da criança, tipo de escola freqüentada pela criança (particular ou pública), telefone próprio da família.
6. Tipo de dentadura/dentição (decídua ou mista).
7. Comportamento da criança (categorias excludentes):

  • calma: criança tranqüila;
  • ansiosa: criança "preocupada" e/ou "tensa" em relação a eventos programados (viagens, passeios, provas escolares);
  • ativa: atividade psicomotora normal, não apática, em ambiente familiar e não familiar;
  • hiperativa: criança difícil de ser controlada pelos pais/professores e com elevada atividade psicomotora.

8. Grau de maloclusão (com base na classificação proposta pela OMS17):

  • ausente/leve (nenhuma anormalidade, anomalias leves, tais como um ou mais dentes com giroversão ou leve apinhamento ou espaçamento);
  • moderada/severa (mordida cruzada anterior, mordida aberta, mordida cruzada posterior, sobremordida acentuada, sobressaliência acentuada).

9. Condição de saúde geral: ausência de problemas de saúde, problemas psicológico, neurológico, respiratório (inclusive alérgicos que afetam o sistema respiratório), circulatório, imunológico (exceto alergias respiratórias), infecções/parasitoses, outros.

10. Presença de outros hábitos bucais parafuncionais: sugar o dedo/chupeta/lábio, morder lábio/objetos, roer unhas, outros.

Análise dos resultados

Os dados obtidos foram analisados estatisticamente com o auxílio do programa GMC Basic Software 6.6® através dos testes não paramétricos de qui-quadrado com correção de Yates e de Kruskal-Wallis para análise de variância por postos. O teste de qui-quadrado foi utilizado para a análise das diferenças das freqüências em tabelas de contingência 2 X 2, utilizando nível de significância de 5% (nível de confiança de 95%). A variável "idade da criança" (com cinco subgrupos) também foi analisada estatisticamente pelo teste qui-quadrado no nível de significância de 5%. O teste de Kruskal-Wallis foi realizado para a análise da variável "comportamento da criança" no nível de significância de 1% (nível de confiança de 99%).

 

RESULTADOS

A Tabela 2 apresenta os valores obtidos para a prevalência BEN quanto às variáveis "idade" e "sexo". A prevalência de BEN em crianças de 2 a 11anos de idade foi de 28,64% (n=61). Não foram observadas diferenças estatisticamente significativas de prevalência de BEN entre os cinco subgrupos de idade no nível de significância de 5% (c2 = 8,45; p = 7,63%). Da mesma forma, com relação ao sexo das crianças, também não houve diferença estatisticamente significativa na distribuição de BEN no nível de 5% (c2 = 2,57; p= 10,91%).

 

Image654.GIF (10819 bytes)

 

A maioria das 61 crianças bruxômanas (56%) apresentava BEN mais de 3 vezes por semana. Treze por cento das crianças rangia os dentes cerca de uma vez por semana e 31% demonstrava episódios isolados de BEN (Gráfico1).

 

Image655.GIF (9902 bytes)

GRÁFICO 1 - Freqüência de bruxismo excêntrico noturno (n = 61).

 

Na Tabela 3, observa-se a distribuição de BEN quanto às variáveis "local de atendimento", "tipo de dentadura/dentição" e "tipo de comportamento". Não houve diferença estatisticamente significativa na prevalência de BEN em relação ao local de atendimento (FOP-UNICAMP versus consultório particular) no nível de significância de 5% (c2 = 0,0515; p = 82,05%). No entanto, o tipo de dentadura/dentição (decídua versus mista) apresentou-se significativo no nível de 5% (c2 = 4,0879;  p = 4,32%).

 

Image656.GIF (19150 bytes)

 

O tipo de comportamento da criança foi altamente significativo na distribuição do BEN em crianças no nível de 1% (valor H de Kruskal-Wallis = 212,0000; valor do c2  = 212,00 para 7 graus de liberdade; p = 0,00%). Os resultados indicaram que a prevalência de BEN é maior em crianças hiperativas (31,15%) e em crianças ansiosas (27,87%). Dentre as crianças não bruxômanas, a maior prevalência foi de crianças consideradas calmas (36,18%). O Gráfico 2 mostra a prevalência de BEN e de outros hábitos bucais parafuncionais de acordo com o tipo de comportamento.

 

Image657.GIF (11808 bytes)

GRÁFICO 2 - Distribuição da prevalência de hábitos bucais parafuncionais de acordo com o tipo de comportamento (em porcentagem).

 

As variáveis "grau de maloclusão" e "problemas respiratórios e/ou alérgicos" são apresentadas na Tabela 4. O grau de maloclusão (ausente/leve versus moderada/severa) não foi estatisticamente significativo na prevalência de BEN no nível de significância de 5% (c2 = 0,0296; p = 86,34%). Em relação aos problemas de saúde geral, apenas os problemas respiratórios e/ou alérgicos (que afetam o sistema respiratório) puderam ser contabilizados para a análise estatística pela repetição de ocorrência. Embora cerca de 50% das crianças bruxômanas apresentasse problemas respiratórios e/ou alérgicos, a análise estatística não revelou diferença estatisticamente significativa entre a prevalência de bruxômanos e não bruxômanos no nível de significância de 5% (c2 = 2,6596; p = 10,29%).

 

Image658.GIF (17404 bytes)

 

 

O Gráfico 3 apresenta a prevalência de outros hábitos bucais parafuncionais em relação às crianças bruxômanas e não bruxômanas. Nenhum hábito pôde ser correlacionado com o bruxismo. A distribuição da prevalência de hábitos bucais parafuncionais de acordo com os cinco subgrupos de idade é mostrada no Gráfico 4. A elevada prevalência do hábito de sucção em baixas faixas etárias (subgrupos 2-3 anos e 4-5 anos) deveu-se principalmente ao hábito de usar chupeta ao dormir.

 

Image659.GIF (14557 bytes)

GRÁFICO 3 - Prevalência de outros hábitos orais parafuncionais (em porcentagem) em crianças bruxômanas e não bruxômanas.

 

 

Image660.GIF (14288 bytes)

GRÁFICO 4 - Distribuição da prevalência de hábitos bucais parafuncionais de acordo com a idade das crianças (n = 213).

 

DISCUSSÃO

A prevalência observada de bruxismo excêntrico noturno (BEN) em crianças de 2 a 11 anos de idade (28,64%) é difícil de ser comparada com outros trabalhos na literatura devido à diversidade de metodologia empregada (entrevista, questionário, exame clínico ou combinação de métodos) e às diferentes faixas etárias abrangidas. A ocorrência real de bruxismo em crianças não é fácil de ser registrada. A presença de facetas de desgaste observada em exame clínico pode indicar uma história pregressa de bruxismo, o qual pode não mais estar ocorrendo no momento do exame. Por outro lado, o início recente do hábito pode ainda não ter acarretado o desgaste dental20. Dessa forma, o método de entrevista com os pais da criança, embora subjetivo, pode ser considerado confiável para verificar a prevalência de BEN, uma vez que reflete a ocorrência de ruídos dentais produzidos pela criança e que são efetivamente percebidos pelos pais. Apesar de essa prevalência poder ser subestimada20, a ocorrência de falsos-positivos é virtualmente eliminada.

Neste estudo, embora não tenha havido diferença estatisticamente significativa de prevalência entre os subgrupos de idade, observou-se alta prevalência de BEN em crianças de 2-3 e de 4-5 anos (43,48% e 35,56%, respectivamente), bem como em crianças de 10-11 anos de idade (34,15%). Essa prevalência de BEN para 2-3 anos e 4-5 anos é compatível com os resultados de GARCIA et al.8 (1995), que, através de questionário aplicado aos pais e exame clínico, observaram uma prevalência de 40,06% em pré-escolares de 3 a 6 anos de idade (n = 342). Em relação à faixa etária de 6-7 anos e de 8-9 anos, obtiveram-se prevalências menores (16,67% e 24%, respectivamente), as quais são mais baixas que a prevalência de 47,77% encontrada por MOLINA14 (1983) em 224 crianças de 6 a 9 anos, mediante exame clínico. Em relação ao tipo de dentição, observou-se uma maior prevalência de BEN em crianças com dentadura decídua em comparação com a dentição mista, contrariando os resultados de ALVES et al.2 (1993), que encontraram maior prevalência de bruxismo em crianças no início da dentição mista (7 e 8 anos).

A predominância de alta freqüência de BEN nas crianças bruxômanas (56% apresentavam BEN mais de 3 vezes por semana e 13%, aproximadamente uma vez por semana) sugere que a maioria das crianças deve ter um fator intrínseco atuando de forma constante no desencadeamento do hábito. Embora não tenha sido objeto desta pesquisa, muitos pais relataram espontaneamente que a criança apresentava BEN há anos, sem alteração do padrão de freqüência. Parece provável que o tipo de comportamento da criança pode influenciar muito mais na ocorrência de BEN do que situações passageiras de estresse emocional. PINGITORE et al.18 (1991), em um estudo em adultos, demonstraram que o estresse emocional seria significativo em relação ao bruxismo somente quando associado ao padrão de comportamento tipo A (pessoa agressiva, persistente, competitiva, com alto grau de atividade mental e física). No presente estudo, cerca de 59% das crianças bruxômanas era ansiosa ou hiperativa, contrastando com 35% de ansiosas ou hiperativas, não bruxômanas. Crianças calmas e bruxômanas somaram 18,03% dentre todas as crianças com BEN. Tais dados estão de acordo com o estudo de VANDERAS20 (1995), que observou um aumento de atividade parafuncional no grupo de crianças não calmas (tensas, ansiosas, nervosas ou sob estresse).

Em relação a problemas de saúde de ordem geral, apenas a ocorrência de problemas respiratórios/alérgicos obteve uma freqüência suficiente para ser considerada. A associação entre bruxismo e problemas respiratórios alérgicos tem sido relatada na literatura (MARKS13, 1980). Contudo, embora 50,82% das crianças bruxômanas apresentassem problemas respiratórios/alérgicos, não houve diferença significativa em relação às crianças não bruxômanas, corroborando com os achados de WEIDEMAN et al.21 (1996), que encontraram incidências iguais de asma e infecções auditivas em crianças bruxômanas e não bruxômanas. É interessante relatar, entretanto, o caso de uma criança, filha de dentista e bruxômana desde os dois anos de idade, que abandonou o hábito imediatamente após cirurgia para desobstrução das vias aéreas superiores. Quanto às parasitoses intestinais, apontadas na literatura como um possível fator etiológico para o bruxismo1,11, foram levantadas apenas quatro ocorrências, sendo três delas em crianças bruxômanas e um caso em não bruxômana. A maioria dos pais relatou controle médico periódico e administração de vermífugos para as crianças, mas um resultado negativo verdadeiro deveria ser obtido através de exames laboratoriais.

No acompanhamento profissional do desenvolvimento da dentição e do crescimento facial da criança, recomenda-se o controle de hábitos bucais potencialmente nocivos e que possam contribuir para o estabelecimento de maloclusão3,5,10. Entretanto, neste trabalho, a presença de maloclusão não pôde ser correlacionada com o bruxismo, quer seja como causa, quer seja como conseqüência. VANDERAS; MANETAS19 (1995), em uma extensa revisão sobre o assunto, afirmam que a maloclusão não aumenta a probabilidade de ocorrer bruxismo. Em relação à ocorrência dos outros hábitos bucais parafuncionais levantados, não se observou associação com o bruxismo. A AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRIC DENTISTRY3 (1996) recomenda aconselhamento preventivo sobre hábitos bucais não nutritivos (sucção digital, chupeta) desde os 6-12 meses de idade e sobre o bruxismo, a partir da idade escolar (6-12 anos). Entretanto, frente às significativas prevalências observadas para idades inferiores a 6 anos neste estudo, parece ser lícito preconizar o acompanhamento do bruxismo desde a instalação da dentadura decídua.

A distribuição de BEN também não sofreu influências do local de atendimento das crianças (faculdade versus consultório particular) ou do sexo. Isso é um indicativo de que o BEN deve afetar igualmente meninos e meninas de diferentes níveis sócio-econômicos. Em relação ao sexo, esses resultados são condizentes com os obtidos por WIDMALM et al.22 (1995), os quais encontraram prevalências iguais de bruxismo em meninos e meninas de 4 a 6 anos de idade.

Este trabalho epidemiológico, de caráter exploratório, serviu de base para a análise de potenciais variáveis associadas ao bruxismo e que deveriam ser consideradas na realização de estudos adicionais sobre o assunto. Entretanto, para a obtenção de resultados consistentes e passíveis de comparação, é necessário que se desenvolva uma metodologia padronizada de coleta de dados. Além disso, certos dados, como duração do hábito e suas possíveis conseqüências diretas, seriam melhor analisados através de estudos longitudinais e estudos transversais amplos, com acompanhamento multidisciplinar.

 

CONCLUSÕES

Com base na metodologia empregada e nos resultados obtidos, pôde-se concluir que:

1. A prevalência de bruxismo excêntrico noturno em crianças de 2 a 11 anos de idade foi de 28,64%.

2. Observou-se maior prevalência de BEN em crianças de dentadura decídua em relação às de dentição mista, o que evidencia a necessidade do diagnóstico precoce desse hábito parafuncional.

3. O BEN não pôde ser correlacionado às seguintes variáveis: local de atendimento (faculdade versus consultório particular), sexo, problemas de saúde de ordem geral, presença de outros hábitos bucais parafuncionais e grau de maloclusão.

4. O tipo de comportamento foi significativo para a prevalência de BEN, sendo que a maioria das crianças bruxômanas apresentava comportamento do tipo ansioso ou hiperativo.

5. A prevalência de BEN foi expressiva em todas as faixas etárias (variação de 16,67% a 43,48%), devendo ser considerada no atendimento odontológico de todas as crianças de 2 a 11 anos de idade.

 

AGRADECIMENTOS

Nossos agradecimentos à C.D. Odontopediatra Mônica Beltrame Forjaz, pela contribuição na coleta de dados, e à Doutoranda em Odontopediatria Rita Sarmiento Villena, pelas oportunas sugestões.

 

 

SHINKAI, R. S. A.; SANTOS, L. M.; SILVA, F. A.; NOBRE DOS SANTOS, M. Prevalence of nocturnal bruxism in 2-11-year-old children. Rev Odontol Univ São Paulo, v.12, n.1, p.29-37, jan./mar. 1998.

Epidemiological studies have reported a wide range of incidence of bruxism in children (5% to 81%), which makes difficult the establishment of comparative parameters. The aim of this study was to record the prevalence of nocturnal bruxism (NB) and its features in two hundred and thirteen 2-11-year-old children. Interviews were performed with 130children receiving dental treatment at a school of dentistry (FOP-UNICAMP) and 83 children attended at private dental offices. A structured questionnaire was used to interview the children's parents/relatives and dentist. Data were analyzed by c2  test and Kruskal-Wallis test. Prevalence of NB was 28.64% (n = 61). Difference between frequencies of bruxers and non-bruxers was not significant concerning the place of dental treatment (p > 0.05). In relation to dentition, 39.34% of the children with primary teeth and 24.34% with mixed dentition were bruxers (p < 0.05). Among the bruxers (n = 61), 27.87% were anxious and 31.15% were hyperactive children. Fifty-one per cent of the bruxers had respiratory problems and/or allergy. High prevalence of NB was recorded for 2-5-year-old and 10-11-year-old children.

UNITERMS: Bruxism; Temporomandibular disorders; Pediatric dentistry.

 

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. AHMAD, R. Bruxism in children. J Pedodont, v.10, p.105-125, 1986.        [ Links ]

2. ALVES, V. C. S. et al. Alguns aspectos do bruxismo de interesse do odontopediatra. Rev Odontopediatr, v.3, n.2, p.157-163, jul./set. 1993.        [ Links ]

3. AMERICAN ACADEMY OF PEDIATRIC DENTISTRY. Reference manual 1996-1997. Pediatr Dent, v.18, n.6, p.1-98, 1996.        [ Links ]

4. ATTANASIO, R. Nocturnal bruxism and its clinical management. Dent Clin North Am, v.35, n.1, p.245-252, Jan. 1991.        [ Links ]

5. CARVALHO, M. P. A Fonoaudiologia e suas relações com a Odontopediatria. In: GUEDES-PINTO, A. C. Odontopediatria. 3. ed. São Paulo: Santos, 1991. Cap.46, p.1033-1059.         [ Links ]

6. CASH, R. G. Bruxism in children: review of the literature. J Pedodont, v.12, p.107-127, 1988.        [ Links ]

7. DAWSON, P. E. Avaliação, diagnóstico e tratamento dos problemas oclusais. 2. ed. São Paulo: Artes Médicas, 1993. p.492-499.        [ Links ]

8. GARCIA, P. P. N. S. et al. Verificação da incidência de bruxismo em pré-escolares. Odontol Clin, v.5, n.2, p.119-122, jul./dez. 1995.        [ Links ]

9. HADDAD, A. E. et al. Bruxismo em crianças. Rev Odontopediatr, v.3, n.2, p.91-98, abr./jun. 1994.        [ Links ]

10. LINO, A. P. Fatores extrínsecos determinantes de maloclusões. In: GUEDES-PINTO, A. C. Odontopediatria. 3. ed. São Paulo:Santos, 1991. Cap.41, p.933-944.        [ Links ]

11. LOOS, P. J.; AARON, G. A. Standards for management of the pediatric patient with acute pain in the temporomandibular joint or muscles of mastication. Pediatr Dent, v.11, n.4, p.331, 1989.        [ Links ]

12. MACIEL, R. N. Oclusão e ATM: procedimentos clínicos. São Paulo: Santos, 1996. p.195-231.        [ Links ]

13. MARKS, M. B. Bruxism in allergic children. Am J Orthod, v.77, n.1, p.48-59, 1980.        [ Links ]

14. MOLINA, O. F. Contribuição ao estudo do bruxismo em crianças de 6 a 9 anos de escolas particulares em Florianópolis. Florianópolis, 1983. 1v. Dissertação (Mestrado) - Centro de Ciências da Saúde, Universidade Federal de Santa Catarina. Apud Rev Odontopediatr, v.3, n.2, p.91-98, abr./jun. 1994.        [ Links ]

15. OKESON, J. P. Temporomandibular disorders in children. Pediatr Dent, v.11, n.4, p.325-329, 1989.        [ Links ]

16. OKESON, J. P. Fundamentos de oclusão e desordens têmporo-mandibulares. 2. ed. São Paulo: Artes Médicas. 1992. p.118-135.        [ Links ]

17. ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Levantamento epidemiológico básico de saúde bucal: manual de instruções. 3. ed. São Paulo: Santos, 1991. 53p.        [ Links ]

18. PINGITORE, G. et al. The social and psychologic factors of bruxism. J Prosthet Dent, v.65, n.3, p.443-446, 1991.        [ Links ]

19. VANDERAS, A. P.; MANETAS, K. Relationship between malocclusion and bruxism in children and adolescents: a review. Pediatr Dent, v.17, n.1, p.7-12, 1995.         [ Links ]

20. VANDERAS, A. P. Relationship between craniomandibular dysfunction and oral parafunctions in Caucasian children with and without unpleasant life events. J Oral Rehabil, v.22, p.289-294, 1995.        [ Links ]

21. WEIDEMAN, C. L. et al. The incidence of parasomnias in child bruxers versus nonbruxers. Pediatr Dent, v.18, n.7, p.456-460, 1996.        [ Links ]

22. WIDMALM, S. E. et al. Prevalence of signs and symptoms of craniomandibular disorders and orofacial parafunction in 4-6-year-old African-American and Caucasian children. J Oral Rehabil, v.22, p.87-93, 1995.        [ Links ]

 

Recebido para publicação em 01/07/97
Aceito para publicação em 15/10/97

 

 

Faculdade de Odontologia de Piracicaba - UNICAMP:
* Aluna de Mestrado em Clínicas Odontológicas, concentração em Prótese.
** Especialista em Odontopediatria e Estagiária da Disciplina de Odontopediatria.
*** Professor Livre-Docente da Disciplina de Prótese Parcial Fixa.
**** Professora Doutora da Disciplina de Odontopediatria.