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Jornal de Pneumologia - Tracheoesophageal fistula as a late complication of tracheostomy

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Jornal de Pneumologia

Print version ISSN 0102-3586

J. Pneumologia vol.27 no.2 São Paulo Mar./apr. 2001

http://dx.doi.org/10.1590/S0102-35862001000200010 

RELATO DE CASO

 


Fístula traqueoesofágica como complicação tardia de traqueostomia*

MARLOS DE SOUZA COELHO1, JOSÉ ANTÔNIO ZAMPIER2, SÉRGIO AUGUSTO ZANIN3, ELISÂNGELA DE MATTOS E SILVA4, PAULO DE SOUZA FONSECA GUIMARÃES4

 

 

A fístula traqueoesofágica como complicação tardia de traqueostomia é uma ocorrência rara, com incidência menor do que 1%, mas que deve ser conhecida, diagnosticada e tratada rapidamente, para que se evite evolução desfavorável. Relata-se o caso de uma mulher de 41 anos que permaneceu com traqueostomia prolongada, devido a acidente vascular cerebral. Após a alta hospitalar, apresentou insuficiência respiratória aguda e observou-se a saída de material da sonda nasogástrica traqueostomia. O diagnóstico de fístula traqueoesofágica foi feito por exame endoscópico e a paciente foi submetida a uma traqueoplastia, com boa evolução. (J Pneumol 2001;27(2):119-122)


Tracheoesophageal fistula as a late complication of tracheostomy

Tracheoesophageal fistula as a late complication of tracheostomy is rare and its incidence is less than 1%. Nonetheless, it should be known, diagnosed, and promptly treated in order to prevent an unfavorable evolution. The authors report on a 41-year-old female who had had tracheostomy a long time before, due to a cerebrovascular accident. Following hospital discharge, the patient presented acute respiratory insufficiency and it was observed that some material was secreted through the tracheostomy nasogastric probe. Tracheoesophageal fistula was endoscopically diagnosed, the patient was submitted to a tracheoplasty and showed good evolution.


 Descritores ¾ Fístula traqueoesofágica. Traqueostomia. Unidades de terapia intensiva.
Key words ¾ Tracheostomy. Tracheal tubes. Intubation. Tracheoesophageal fistula. Intensive care units.

Siglas e abreviaturas utilizadas neste trabalho
FTE ¾ Fístula traqueoesofágica
UTI ¾ Unidade de terapia intensiva
SNG ¾ Sonda nasogástrica


 

 

INTRODUÇÃO

A traqueostomia, quando efetuada por cirurgião experiente, é bem tolerada e apresenta baixa taxa de mortalidade. Suas complicações podem ser tanto precoces como tardias e devem ser bem conhecidas a fim de ser diagnosticadas rapidamente e com tempo suficiente para a implantação do tratamento adequado, evitando-se evolução desfavorável.

Entre as principais complicações tardias observadas, temos a fístula traqueoesofágica ocupando o terceiro lugar em freqüência, conforme já havia sido relatado por Thomas em 1973(1), precedida apenas da estenose e hemorragia respectivamente(2,3).

O objetivo deste trabalho é relatar um caso de fístula traqueoesofágica (FTE) como complicação de traqueostomia, em uma paciente com longa permanência em UTI, admitida no Pronto-Socorro do Hospital Universitário Cajuru, bem como revisar e discutir a literatura.

 

RELATO DO CASO

Mulher, 41 anos, com história prévia de internamento em outro serviço para troca de valva tricúspide, evoluindo com acidente vascular cerebral hemorrágico e necessitando de cuidados de UTI, com ventilação mecânica e traqueostomia devido à intubação prolongada.

Após três dias de alta hospitalar apresentou piora do estado geral, sendo atendida num posto de saúde e encaminhada para o Pronto-Socorro do Hospital Universitário Cajuru, com insuficiência cardíaca congestiva e fibrilação atrial. Ao exame físico: traqueostomizada e com SNG, sudorese, extremidades cianóticas, pupilas midriáticas, ritmo respiratório de Cheyne Stokes, pressão sistólica de 70mmHg com pulso femoral palpável, saturação de O2 de 83% em oxímetro de pulso e ausculta pulmonar com murmúrio vesicular diminuído à direita e crepitantes em base esquerda. Na emergência foi compensada clinicamente, necessitando flebotomia e internamento. Foi realizado exame radiográfico de tórax, que mostrou opacidade paratraqueal à direita.

No segundo dia de internação observou-se saída de secreção amarelada pela traqueostomia, semelhante à dieta alimentar administrada via SNG, sendo solicitada avaliação do Serviço de Cirurgia Torácica e Endoscopia Respiratória. Foram realizados exame radiográfico de tórax e endoscopia respiratória, a qual evidenciou fístula traqueoesofágica de aproximadamente 1cm de extensão em seu maior diâmetro, localizada na parede posterior do terceiro anel traqueal, com herniação esofágica para o seu interior (Figuras 1 e 2). Como a paciente estava com o estado geral comprometido, foi necessária compensação clínica pré-operatória por 14 dias. No 15º dia de internação foi submetida a traqueoplastia com ressecção do segmento traqueal contendo a fístula e anastomase término-terminal da traquéia, esofagorrafia após debridamento e interposição de flap muscular entre o esôfago e a traquéia, gastrostomia e jejunostomia. Evoluiu sem infecção local, recidiva da fístula e/ou estenose traqueal, recebendo alta da Cirurgia Torácica no 21º dia de pós-operatório com dieta via oral e controle endoscópico da traqueoplastia (Figura 3), permanecendo internada no Serviço de Neurocirurgia e Cardiologia para tratamento das patologias afins.

 

 

 

 

DISCUSSÃO

A fístula traqueoesofágica apresenta diversas etiologias, com alta taxa de morbidade e mortalidade, podendo ser encontrada em associação com a patologia toracopulmonar complexa ou processo infeccioso de pulmão, pleura e mediastino. Entretanto, comunicações adquiridas entre o esôfago e o sistema traqueal são mais comumente encontradas por causas iatrogênicas ou traumáticas e, menos freqüentemente, infecciosas(3,4).

A FTE como complicação de traqueostomia é rara, sendo relatada na literatura incidência inferior a 1% de todas as complicações(1-4). Apesar disso, ocupa o 3º lugar entre as complicações tardias e, portanto, sua suspeita e reconhecimento são de grande importância(2,3). O Quadro 1 ilustra as principais complicações precoces e tardias secundárias à traqueostomia.

 

 

FTE por cuffs de tubos traqueais foi relatada em 1961 e, a partir de então, diversos autores vêm descrevendo casos semelhantes(1). As causas são tanto mecânicas como biológicas e, na maioria dos casos, a fístula é atribuída à necrose traqueal por cânula inadequada ou excesso de pressão no cuff, com grave dano à parede(3). O cuff representa o principal fator mecânico e a SNG pode estar relacionada ao aumento da incidência de FTE, por promover erosão na parede comum entre a traquéia e esôfago. Como fatores biológicos pode-se citar a depleção do estado geral, evidenciada por perda de peso, anemia e hipoalbuminemia. Além disso, a dependência prolongada do ventilador está associada à diminuição da ingesta calórica e aumento da demanda metabólica. A morbidade é diretamente relacionada à duração da intubação(1).

O local mais comum de aparecimento da FTE devido ao cuff da cânula traqueal é entre a 6ª vértebra cervical e a 1ª torácica, porém pode ser encontrada até a altura da 3ª vértebra torácica. A fístula pode ocorrer a partir do 7º dia de uso da cânula, com média de 30 dias, o que a diferencia da fístula traumática, que freqüentemente aparece entre o 4º e 5º dia após a lesão, próximo à carina e associada ao surgimento de enfisema subcutâneo ou mediastinal.

Os sintomas da FTE são muitas vezes inespecíficos, brandos ou, até mesmo, inexistentes, o que dificulta o seu diagnóstico. A FTE deve ser suspeitada num paciente traqueostomizado que apresentar: 1) secreção copiosa; 2) tosse, principalmente após ingesta alimentar; 3) vômitos e aspiração ou alimentos visualizados na área da traqueostomia; 4) ar ao redor do cuff visualizado à radiografia; 5) distensão abdominal; 6) e, em alguns casos, infecção pulmonar recorrente(3,5).

Nenhum desses achados clínicos pode firmar com segurança a existência de FTE, principalmente se encontrados de forma isolada. Aerofagia pode ser observada, com freqüência, em pacientes traqueostomizados. Secreções podem ser acumuladas na hipofaringe e ser aspiradas quando o cuff é desinsuflado. A aspiração ainda é um problema freqüente em pacientes com tubos traqueais, SNG ou alteração do estado de consciência, podendo ser agravada por incompetência do esfíncter esofagogástrico, dilatação gástrica ou distensão abdominal. Paralisia ou parestesia de cordas vocais, algumas vezes associadas à aspiração, podem ocorrer após a remoção do tubo traqueal.

O diagnóstico definitivo é firmado com a visualização direta do trajeto fistuloso através de: 1) esofagoscopia e/ou traqueoscopia; 2) visualização radiológica por métodos de imagem; 3) cirurgia ou ainda; 4) autópsia. Na esofagoscopia, alguns casos podem não mostrar o orifício da fístula, assim como a traqueoscopia ou broncoscopia negativas não descartam completamente a hipótese de sua existência. A SNG ou corante (azul de metileno) instilado através do esôfago podem ser visualizados pela traqueoscopia, assim como a cânula traqueal pode ser visibilizada através da esofagoscopia, facilitando o diagnóstico.

A cirurgia é indicada tão logo as condições do paciente permitam. É tratamento definitivo em quase todos os casos, com o objetivo de interromper a comunicação entre o tubo digestivo e a árvore respiratória. Apesar disso, alguns trabalhos relatam tratamento conservador da FTE com sucesso, pois os sintomas podem ser controlados temporariamente pelo posicionamento do cuff de uma cânula traqueal mais longa entre a carina e a fístula. Entretanto, o ar continua indo para o estômago e uma SNG ou tubo de gastrostomia é essencial para prevenir aspiração e distensão abdominal(1,4).

O reparo cirúrgico normalmente é possível através de incisão cervical; entretanto, uma extensão torácica pode ser necessária. Mais comumente a lesão traqueal é maior e pode exigir um patch de musculatura cervical, em comparação com a esofagiana, que requer reparo simples e fácil(6).

Calvo Medina et al.(7) revisaram 18 casos de FTE, sendo que sete foram tratados apenas com fechamento simples da fístula, metade deles requerendo uma segunda cirurgia para correção de estenose traqueal. Ressecção e anastomose foram realizadas nos outros 11 casos, com apenas um caso de reoperação por estenose.

Quando a FTE já estiver associada à estenose traqueal ou malacia, o reparo simples deve ser evitado já que é acompanhado de uma taxa de 25-50% de complicações, como reestenose, pneumonia ou recorrência da fístula. Nesses casos, a ressecção com anastomose deve ser preferida(8,9).

A traqueostomia é um dos mais antigos procedimentos cirúrgicos e nas últimas décadas vem sendo o método de escolha para pacientes que requerem ventilação mecânica por tempo prolongado(10). Recentemente, diversas técnicas alternativas vêm surgindo para esse procedimento, como a intubação por punção percutânea, introduzida em 1985. Essa técnica vem-se mostrando tão efetiva e segura quanto a traqueostomia convencional e com taxas de morbimortalidade comparáveis à mesma, porém mais barata(10-12).

Vários estudos vêm sendo realizados no sentido de comparar a técnica convencional com a punção percutânea. Diversos autores relatam maior incidência de complicações perioperatórias relacionadas à técnica percutânea e mais complicações pós-operatórias a médio e longo prazo com a traqueostomia cirúrgica convencional(10,12-14).

Esses dados não podem ser considerados definitivos, já que pesquisas ainda se encontram em andamento no que diz respeito à nova técnica, porém, esta pode vir a ser uma alternativa eficaz no sentido de diminuir as complicações tardias da traqueostomia.

 

REFERÊNCIAS

1. Thomas AN. The diagnosis and treatment of tracheoesophageal fistula caused by cuffed tracheal tubes. J Thorac Cardiovasc Surg 1973;65: 612-619.         [ Links ]

2. Heffner JE, Miller S, Sahn SA. Tracheostomy in the intensive care unit. Part 1: Indications, technique, management. Chest 1986;90:269-274.         [ Links ]

3. Heffner JE, Miller S, Sahn SA. Tracheostomy in the intensive care unit. Part 2: Complications. Chest 1986;90:430-436.         [ Links ]

4. Carreño JR, Cicero RS. Esophageal fistulae. Results of conservative treatment. Int Surg 1995;80:251-255.         [ Links ]

5. Anderson RP, Sabiston DC. Acquired bronchoesophageal fistula of benign origin. Surg Gynecol Obstet 1965;261-266.         [ Links ]

6. Villalba Caloca J, Téllez Becerra JL, Morales Gómez J, Molina Barrera EA, López Flores D. Surgical treatment of non-malignant tracheoesophageal fistula. Gac Med Mex 1998;134:397-405.         [ Links ]

7. Calvo Medina V, Galán Gil G, Sales Badía G, et al. Benign acquired tracheoesophageal fistula. Arch Bronconeumol 1997;33:577-581.         [ Links ]

8. Shaari CM, Biller HF. Staged repair of cervical tracheoesophageal fistulae. Laryngoscope 1996;106:1398-1402.         [ Links ]

9. Waldron J, Padgham ND, Hurley SE. Complications of emergency and elective tracheostomy: a retrospective study of 150 consecutive cases. Ann R Coll Surg Engl 1990;72:218-220.         [ Links ]

10. Wease GL, Frikker M, Villalba M, Glover J. Bedside tracheostomy in the intensive care unit. Arch Surg 1996;131:552-554.         [ Links ]

11. Westphal K, Byhahn C, Lischke V. Tracheostomy in intensive care. Anaesthesist 1999;48:142-156.         [ Links ]

12. Trottier SJ, Hazard PB, Sakabu AS, et al. Posterior tracheal wall perforation during percutaneous dilational tracheostomy: investigation into its mechanism and prevention. Chest 1999;115:1383-1389.         [ Links ]

13. Díaz Regañón Valverde G, Morrondo Valdeolmillos P, Iribarren Sarrías JL, et al. Comparative study of percutaneous tracheostomy and conventional surgical tracheostomy in patients with prolonged intubation. Rev Esp Anestesiol Reanim 1999;46:67-70.         [ Links ]

14. Dulguerov P, Gysin C, Perneger TV, Chevrolet JC. Percutaneous or surgical tracheostomy: a meta-analysis. Crit Care Med 1999;27:1617-1625.         [ Links ]

 

 

* Trabalho realizado na Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Hospital Universitário Cajuru, Curitiba, PR.

1. Mestre em Cirurgia pela PUC do Paraná; Chefe do Serviço de Cirurgia Torácica e Endoscopia Respiratória.

2. Preceptor da Residência Médica em Cirurgia Torácica.

3. Residente de Cirurgia Torácica.

4. Acadêmico de Medicina.

Endereço para correspondência ¾ Marlos de Souza Coelho, Av. das Torres, 2.429 ¾ 81520-000 ¾ Curitiba, PR. Tels.: (41) 266-3500/9974-0600; Fax: (41) 266-4349; E-mail: elismattos@zipmail.com.br
Recebido para publicação em 13/7/00. Aprovado, após revisão, em 15/9/00.