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Revista Brasileira de Psiquiatria - Risk factors and consequences of polypharmacy among elderly outpatients of a mental health service

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Revista Brasileira de Psiquiatria

Print version ISSN 1516-4446

Rev. Bras. Psiquiatr. vol.21 n.3 São Paulo Sept. 1999

http://dx.doi.org/10.1590/S1516-44461999000300006 

artigos originais


Fatores preditores e conseqüências clínicas do uso de múltiplas medicações entre idosos atendidos em um serviço ambulatorial de saúde mental

Risk factors and consequences of polypharmacy among elderly outpatients of a mental health service

 

Osvaldo P. Almeida1, Lilian Ratto1, Regiane Garrido1 e Sérgio Tamai1


 

 

RESUMO
OBJETIVO:
Investigar o padrão de uso de medicamentos, polifarmácia e uso impróprio de medicações entre indivíduos com 60 anos ou mais atendidos no serviço ambulatorial de saúde mental da Santa Casa de São Paulo, Brasil.
MÉTODOS: Cento e oitenta e quatro pacientes atendidos de forma consecutiva foram avaliados sistematicamente quanto à dosagem e tempo de utilização de medicamentos na semana que antecedeu a consulta médica. A presença de sintomas físicos e psicológicos foi avaliada com a escala Saftee-Up simplificada. O uso impróprio de medicamentos foi avaliado através dos critérios de Stuck modificado.
RESULTADOS: O número médio de medicações consumidas por paciente foi de 2,46 – 41,3% dos entrevistados utilizavam três ou mais medicamentos e 10,9% utilizavam cinco ou mais medicações por dia. Antidepressivos (42,4%), drogas anti-hipertensivas (32,6%) e benzodiazepínicos (21,2%) eram as medicações mais freqüentemente utilizadas. Pacientes utilizando três ou mais medicações apresentavam escores mais elevados na escala Saftee-Up (p=0,007). Análise de regressão logística indicou que os escores da Saftee-Up eram influenciados de forma significativa pelo número de diagnósticos clínicos (OR=1,85, p=0,030), mas não pela idade (OR=0,99, p=0,732), sexo (OR=0,67, p=0,317), número de diagnósticos psiquiátricos (OR=0,77, p=0,533) ou de medicações (OR=1,18, p=0,258). Trinta e quatro idosos (18,5%) vinham utilizando pelo menos uma medicação considerada imprópria.
CONCLUSÕES: É importante que os psiquiatras estejam cientes das diretrizes internacionais para prescrição de drogas e participem ativamente para reduzir os riscos associados à polifarmácia e uso impróprio de medicamentos em idosos.

DESCRITORES
Idoso; terceira idade; polifarmácia; medicação; droga; uso impróprio de medicação; uso inadequado de medicação; saúde mental; fator de risco

 

ABSTRACT
This study aimed to investigate the presence of polypharmacy and inappropriate use of medications among subjects aged 60 or over assessed consecutively at an outpatient mental health service in the city of São Paulo, Brazil. The names of the medications, dosage, and length of time since their introduction were investigated for all subjects — this information was gathered from an interview with the patient and carer, and by reviewing the medical notes. Psychological and physical symptoms were assessed with a simplified version of the scale Saftee-Up. The inappropriate use of medication was recorded using the modified version of the Stuck criteria. A total of 184 consecutive patients were included in the study. The mean number of medications consumed was 2.46 — 41.3% of the subjects were receiving 3 or more daily drugs, 10.9% were consuming 5 or more different medications. Antidepressants (42.4%), antihypertensives (32.6%) and benzodiazepines (21.2%) were the drugs most frequently used in this sample of patients. Subjects using 3 or more medications had significantly higher Saftee-Up scores than those using 2 or less drugs (p=0.007). Logistic regression indicated that Saftee-Up scores were influenced by the number of clinical diagnoses (OR=1.85, p=0.030), but not by age (OR=0.99, p=0.732), sex (OR=0.67, p=0.317), number of psychiatric diagnoses (OR=0.77, p=0.533) and medications (OR=1.18, p=0.258). Thirty-four subjects (18.5%) were receiving at least one medication considered inappropriate. Psychiatrists should familiarize themselves with the international guidelines for drug use in later life and be actively involved in reducing the risks associated with polypharmacy and inappropriate use of medications in the elderly.

KEYWORDS
Aged; elderly; ageing; aging; polipharmacy; medication; drug; inappropriate use of medication; mental health; risk factor

 

 

Introdução

Medicamentos são utilizados para tratar e reduzir a morbidade associada a diversas doenças. Entretanto, o uso indiscriminado e excessivo dessas drogas pode expor pacientes a efeitos colaterais desnecessários e interações potencialmente perigosas. Idosos são particularmente vulneráveis aos efeitos adversos de medicamentos — essa é uma questão importante, já que os indivíduos dessa faixa etária são aqueles que mais consomem remédios. No Reino Unido, por exemplo, os idosos recebem 39% de todas as prescrições médicas, embora eles representem apenas 18% do total da população.1 Além disso, o padrão de consumo de medicamentos entre os indivíduos desse grupo é mais um fator complicador. Cartwright e Smith1 entrevistaram 805 pessoas com idade superior a 65 anos vivendo na comunidade com o objetivo de determinar o padrão de uso de medicações dessa população. Aproximadamente 1/3 deles não tomava nenhum medicamento, 1/3 fazia uso de uma ou duas drogas, e 1/3 utilizava 3 ou mais remédios. Um em cada 10 idosos utilizava cinco ou mais medicamentos. As medicações haviam sido iniciadas há mais de 2, 5, e 10 anos em 59, 32, e 16% dos casos respectivamente. Do total de drogas prescritas, 32% visavam tratar problemas cardiovasculares e 24% transtornos neuropsiquiátricos. Entre os psicofármacos, as drogas mais freqüentemente utilizadas eram os hipnóticos, ansiolíticos, e antidepressivos.

Além de utilizarem mais medicações, os idosos também parecem receber um maior número de drogas inadequadas. O projeto americano 'National Medical Expenditure Survey' avaliou um total de 6171 pessoas com 65 ou mais anos de idade.2 Um total de 23,5% dos idosos vivendo na comunidade estavam utilizando pelo menos 1 medicamento considerado inadequado (devido a relativa baixa eficácia ou presença de efeitos colaterais potencialmente perigosos). Resultados semelhantes foram relatados para idosos vivendo em 'nursing homes'.3

Não existem, até o momento, dados sobre a utilização de medicamentos entre os idosos com problemas de saúde mental no Brasil. Por esse motivo, desenhamos o presente estudo com o objetivo de investigar o padrão de uso de medicamentos entre pessoas com 60 anos ou mais atendidas em um serviço ambulatorial de saúde mental da cidade de São Paulo.

 

Métodos

Pacientes que participaram deste estudo foram selecionados entre aqueles atendidos na Unidade de Idosos (UNID) do Departamento de Saúde Mental da Santa Casa de São Paulo, Brasil. As características desse serviço foram descritas em detalhes em uma outra publicação.4 Resumidamente, a UNID oferece atendimento médico a uma parcela relativamente carente da população idosa da área central de São Paulo. O registro de pacientes na Unidade é feito através do encaminhamento de outros profissionais de saúde e, também, de auto-encaminhamento. Para o presente estudo foram entrevistados 184 pacientes com 60 ou mais anos de idade atendidos consecutivamente na UNID entre agosto e outubro de 1997. Todos os pacientes foram informados a respeito dos objetivos do estudo e consentimento pós-informado foi obtido verbalmente diante de uma testemunha. Estes responderam, então, a uma série de perguntas que tinham como objetivo obter informações quanto à idade, sexo, estado civil, local de nascimento, escolaridade, situação trabalhista, e renda familiar per capita. Todos os diagnósticos clínicos e psiquiátricos foram registrados de acordo com as diretrizes da CID-10. Estes foram obtidos através de entrevista com o paciente e seu cuidador, bem como através de revisão do prontuário médico de cada paciente na Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. O mesmo procedimento foi utilizado para o registro dos medicamentos em uso corrente (semana que antecedeu a entrevista). Pediu-se, então, que cada paciente identificasse a presença ou ausência de uma série de sintomas e sinais médicos listados na escala de efeitos colaterais 'Saftee-Up'.5 A adequação quanto ao uso de medicamentos foi avaliada utilizando o critério de Stuck modificado (excluindo a reserpina).6

Análise dos Dados

Os dados foram analisados utilizando o pacote estatístico 'Stata-5'. Análises descritivas foram realizadas para a apresentação dos dados sociodemográficos da amostra. Análises de tabelas de contingência foram utilizadas para investigar a distribuição de variáveis categoriais (por exemplo, sexo) — o valor estatístico é distribuído como qui-quadrado (c2). O teste 't' de Student for utilizado para a comparação das médias entre dois grupos (exemplo: idade). O teste não-paramétrico de Mann-Whitney (valor estatístico normatizado = 'z') foi utilizado para a análise de variáveis numéricas ordinais (exemplo: número de medicações). O teste de Spearman (rho) foi utilizado para investigar a correlação entre o número total de medicamentos consumidos e o número de diagnósticos clínicos. Regressão logística foi empregada para investigar o impacto de variáveis demográficas e clínicas sobre o número de medicamentos utilizados e a presença de sintomatologia física e psíquica. Intervalos de confiança de 95% foram calculados para a média (IC), mediana (ICM), diferença entre as médias (ICd) e 'odds ratio' (ICOR).

 

Resultados

Cento e quarenta dos pacientes entrevistados eram mulheres (76,1%). A idade média dos pacientes era de 68,37 (IC=67,35 a 69,40). Trinta e oito pacientes eram analfabetos (20,9% — dois casos com dados perdidos) e 41,8% eram casados ou viviam com parceiro(a). Os homens tinham uma probabilidade maior de serem casados do que as mulheres (c2=13,76, p<0,001). Os diagnósticos psiquiátricos mais freqüentes entre os pacientes foram transtornos do humor (52,7%), demência (20,6%), transtornos de ansiedade (10,3%), esquizofrenia e transtornos delirantes (5,4%), e dependência de benzodiazepínicos (4,3%). Doenças cardiovasculares (41,8%), diabetes (10,9%), transtornos neurológicos (8,7%) e neoplasias (4,9%) eram as síndromes clínicas mais freqüentes.

A tabela 1 lista os grupos e respectivo tempo de uso dos medicamentos entre os pacientes avaliados. Medicações antidepressivas foram as mais freqüentemente utilizadas (42,4%). Nesse grupo, os tricíclicos continuam sendo prescritos para uma parcela significativa dos pacientes (41,0% do total), embora os inibidores seletivos de recaptura de serotonina e outros novos antidepressivos já sejam consumidos por mais de metade dos idosos recebendo tratamento antidepressivo. O tempo de uso desses medicamentos variou de 1 a 480 semanas (mediana = 20; ICM=12 a 24). Aproximadamente 1/5 dos pacientes vinham utilizando neurolépticos, com o tempo de uso variando de 3 a 400 semanas). Apenas 1 paciente relatou fazer uso de risperidona. Hipnóticos e ansiolíticos vinham sendo utilizados regularmente por 21,2% dos entrevistados (mediana do tempo de uso = 48 semanas, ICM=21 a 96 semanas). Carbonato de lítio, carbamazepina, ou valproato eram consumidos por 2,7% dos pacientes da amostra. Entre as drogas não psicotrópicas, os anti-hipertensivos eram os medicamentos mais frequentes (32,6% dos pacientes). Outros grupos de medicamentos eram utilizados por menos de 10% dos entrevistados (veja tabela 1).

 

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O número médio de medicações consumida por paciente foi de 2,46 (variação de 0 a 10). Entre os entrevistados, 41,3% utilizavam 3 ou mais medicamentos, enquanto 10,9% utilizavam 5 ou mais medicações por dia. Observou-se uma correlação significativa entre o número de medicamentos consumidos e o número de diagnósticos clínicos (rho=0,588, p<0,001). Análise de regressão logística utilizando como variável dependente o uso de três ou mais medicações revelou a ausência de um impacto significativo da idade (OR=1,00, ICOR=0,95 a 1,05, p=0,942) e sexo masculino (OR=0,51, ICOR=0,14 a 18,26, p=0,124). Por outro lado, o número de diagnósticos psiquiátricos (OR=2,31, ICOR=1,06 a 5,02, p=0,035) e médicos (OR=4,97, ICOR=2,94 a 8,40, p<0,001) estava associado ao uso de um número maior ou igual a 3 medicamentos.

A tabela 2 lista os sintomas físicos e psíquicos descritos pelos pacientes conforme entrevista baseada no 'Saftee-Up'. Indivíduos recebendo 3 ou mais medicações queixavam-se com maior freqüência de transtornos do sono, tontura e vertigem, congestão nasal, boca seca, anormalidades do movimento e coordenação, mal estar abdominal, obstipação, aumento da libido e edema. Além disso, pacientes utilizando 3 ou mais medicamentos relataram a presença de um número significativamente maior de sintomas na escala [10, 72 (IC=9,65 a 11,79) vs 8,85 (IC= 7,75 a 9,96), z=2,71; p=0,007]. Os pacientes foram, então, alocados a quatro grupos diferentes de acordo com a distribuição de escores na Saftee-Up (quartis correspondendo a 0-25%, 26-50%, 51-75%, 76-100%). Através de análise de regressão logística, investigou-se, então, o impacto do número total de medicamentos utilizados (OR=1,18, CIOR=0,89 a 1,57), idade em anos (OR=0,99, CIOR=0,94 a 1,04), sexo masculino (OR=0,67, CIOR=0,30 a 1,47), número de diagnósticos psiquiátricos (OR=0,77, CIOR=0,33 a 1,75) e clínicos (OR=1,85, CIOR=1,06 a 3,22) sobre os escores da escala. Apenas o número de diagnósticos clínicos estava associado de forma significativa aos escores da escala (p=0,030).

 

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Trinta e quatro (18,5%) dos 184 pacientes entrevistados estavam utilizando pelo menos uma medicação considerada imprópria de acordo com o critério de Stuck modificado. Três pacientes estavam utilizando 2 medicações e um outro 3 medicações consideradas impróprias. A maioria desses casos vinham utilizando drogas como o diazepam, amitriptilina e tioridazina (tabela 3). Pacientes utilizando pelo menos 1 das medicações impróprias apresentavam escore médio na escala Saftee-Up de 10,65, comparado aos 9,35 dos demais pacientes (t= -1,22, p=0,225; ICd= -0,78 a 3,29).

 

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Discussão

Os resultados deste trabalho indicam que o uso concomitante de diversos medicamentos é uma prática comum entre os idosos atendidos em um serviço 'público' de saúde mental. Mais de 40% dos entrevistados estavam utilizando pelo menos três medicações diferentes diariamente, e 10% pelo menos cinco. As classes de medicamentos mais freqüentemente utilizadas eram os antidepressivos (42,4%), drogas anti-hipertensivas (32,6%), hipnóticos e sedativos (21,2%), e neurolépticos (20,1%). Além disso, nossos dados indicam que esses medicamentos tendem a ser utilizados por tempo prolongado e, em alguns casos, excessivo. Sessenta e três por cento dos pacientes utilizando hipnóticos e ansiolíticos, por exemplo, vinham utilizando a medicação por pelo menos 6 meses, 42,9% por pelo menos 12 meses, e 31,5% por 2 anos ou mais. Diretrizes internacionais sugerem que os benzodiazepínicos não devem ser utilizados por mais do que 2 a 4 semanas.7 Entretanto, vários estudos indicam que 60-70% dos idosos utilizam esses medicamentos por períodos mais prolongados8 e ficam, portanto, expostos a uma série de efeitos colaterais potencialmente perigosos como quedas,9 comprometimento da memória,10 e acidentes.11

Quarenta e um por cento dos pacientes avaliados vinham consumindo mais do que 3 medicamentos, enquanto 10,9% utilizavam 5 ou mais drogas por dia. A elevada prevalência de polifarmácia entre esses indivíduos estava associada ao número de diagnósticos médicos presentes. Em outras palavras, quanto maior o número de problemas médicos identificados, maior a lista de prescrições. Apesar de essa ser uma relação lógica, ela pode não ser sempre adequada. Por exemplo, um paciente hipertenso recebendo propranolol que procura o serviço de saúde mental devido à presença de sintomas depressivos, ansiedade e insônia pode voltar para casa com uma prescrição que inclui propranolol, um antidepressivo, um ansiolítico, e um hipnótico. A melhor opção, nesse caso, poderia ter sido a simples substituição do propranolol por outro anti-hipertensivo. Esse é uma questão importante, pois o número de efeitos colaterais tende a aumentar com o número de medicações. De fato, pacientes recebendo 3 ou mais medicamentos apresentavam escores significativamente maiores na escala de sintomas físicos e psicológicos utilizada neste estudo, e se queixavam com maior freqüência de problemas com sono, tonturas, congestão nasal, boca seca, mal-estar estomacal, obstipação e edema. Entretanto, esses resultados precisam ser interpretados com cuidado. A escala Saftee-Up foi utilizada como um 'checklist' de sintomas, independentemente de estes estarem ou não relacionados ao uso de medicamentos. Assim, é possível que a escala tenha funcionado como um 'screening' de problemas de saúde e não de efeitos colaterais. Por esse motivo, realizamos a análise de regressão logística, a qual teve como objetivo avaliar de forma concomitante os efeitos da idade, sexo, número de medicações utilizadas e diagnósticos médicos sobre os escores da escala. A única variável que contribuiu de forma significativa para a distribuição de escores da Saftee-Up foi o número de diagnósticos clínicos não psiquiátricos.

Trinta e quatro (18,5%) dos pacientes avaliados estavam utilizando pelo menos uma medicação considerada imprópria para uso em idosos.2,3 Apesar de preocupante, essa taxa é menor do que o índice de 23,5% descrito para americanos com 65 anos ou mais vivendo na comunidade.2 Há três possíveis explicações para essa discrepância: (1) a baixa condição socioeconômica de nossos pacientes4 limita o acesso dos mesmos a medicações e reduz, portanto, o consumo de medicações potencialmente inadequadas; (2) nossos pacientes relataram consumir um número menor de medicações do que o que vinha ocorrendo na realidade; e (3) os serviços de saúde que vinham acompanhando esses pacientes foram parcialmente bem sucedidos em reduzir o número de medicações impróprias utilizadas. Nossos dados não nos permitiram esclarecer a combinação de fatores que contribuiu para limitar o uso de medicações impróprias entre nossos pacientes. Vale ressaltar, porém, que drogas como o clordiazepóxido, flurazepam e diazepam têm meia-vida longa (vários dias entre idosos), produzem sedação prolongada e aumentam o risco de quedas e fraturas. Amitriptilina produz efeitos anticolinérgicos e sedativos marcantes – seu uso deve ser evitado entre idosos. Pelos mesmos motivos, a tioridazina deve ser, também, evitada. Esses medicamentos ainda são utilizados com freqüência nos serviços de saúde mental do Brasil – seu uso em idosos deve ser certamente desencorajado.12

Uma série de fatores pode contribuir para o desenvolvimento de polifarmácia ou uso de medicações inadequadas: fácil acesso a medicações, baixa freqüência de uso de recursos não farmacológicos para o manejo de problemas médicos, e características do paciente e do médico. Por exemplo, Davidson et al.13 investigaram as características do médico associadas a taxas elevadas de prescrição de medicamentos no Canadá. Médicos com elevado índice de prescrição eram mais freqüentemente do sexo masculino, trabalhavam mais dias durante a semana, atendiam um número maior de pacientes por dia, e cobravam mais por seus procedimentos.13 Além disso, o maior número de prescrições estava associado a maior morbidade e mortalidade dos pacientes.14

Este estudo tem uma série de características que limitam a generalização de seus resultados. Os pacientes selecionados para este estudo foram recrutados em apenas um serviço de saúde mental da cidade de São Paulo. É impossível, portanto, saber se nossos achados refletem de forma adequada o que ocorre nos serviços de saúde mental de forma geral. Além disso, não é possível fazer inferências, a partir de nossa amostra, sobre o padrão de uso de medicamentos entre os idosos vivendo na comunidade. Uma outra possível limitação diz respeito à confiabilidade da informação que obtivemos sobre o uso de medicamentos. Vários dos entrevistados foram incapazes de relatar de forma precisa os medicamentos que utilizavam. Nesses casos, não foi possível estabelecer se a informação extra obtida com o acompanhante ou prontuário médico era confiável.

Em resumo, polifarmácia é freqüente entre idosos atendidos em serviços de saúde mental semelhantes ao da Santa Casa de São Paulo. Além disso, aproximadamente 1/5 dos pacientes utilizam medicações consideradas impróprias para idosos. Esses pacientes ficam, portanto, sujeitos a interações medicamentosas e efeitos adversos potencialmente perigosos. É importante que os profissionais de saúde estejam cientes das diretrizes internacionais para a utilização de medicamentos em indivíduos idosos6,7 e que a prescrição de medicações seja sempre feita de forma criteriosa.

 

Agradecimentos

Os autores agradecem a colaboração de Reche, Shirley e Giuliana na coleta de informações para este trabalho. Agradecemos, também, à Leonete pela entrada de dados no computador, e aos pacientes e seus cuidadores por terem aceitado colaborar com esta investigação.

 

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Correspondência
Osvaldo P. Almeida
Department of Psychiatry and Behavioural Sciences
of the University of Western Australia
Queen Elisabeth II Medical Centre
Nedlands, Perth, WA 6009, Australia
Fax: 61-8-93463828,
Email: osvalm@cyllene.uwa.edu.au

 

 

1. Departamento de Saúde Mental da Santa Casa de São Paulo