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Revista Brasileira de Anestesiologia - Ventilation in anesthesia: a retrospective study

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Revista Brasileira de Anestesiologia

Print version ISSN 0034-7094

Rev. Bras. Anestesiol. vol.52 no.6 Campinas Nov./Dec. 2002

http://dx.doi.org/10.1590/S0034-70942002000600013 

ARTIGO DIVERSO

 

Padrões de ventilação em anestesia.Estudo retrospectivo *

 

Ventilation in anesthesia. A retrospective study

 

Patrones de ventilación en anestesia. Estudio retrospectivo

 

 

Joaquim Edson Vieira, TSA I; Basílio Afonso Ribeiro Silva II; Daniel Garcia Júnior II

IProfessor Colaborador da Disciplina de Clínica Geral, Depto Clínica Médica; Assistente Doutor da Divisão de Anestesiologia do ICHC, FMUSP; Pesquisador Responsável Substituto do Laboratório Terapêutica Experimental I, FMUSP
IIME2 do CET/SBA do ICHC, FMUSP

Endereço para Correspondência

 

 


RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: Alterações da mecânica pulmonar, diminuição da Capacidade Residual Funcional e formação de atelectasias têm sido descritas durante anestesia geral. O objetivo desta investigação foi avaliar de forma retrospectiva os padrões de ventilação mecânica adotados nas salas operatórias do Instituto Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).
MÉTODO: Foram registrados dados de 240 pacientes sob anestesia geral, curarizados em ventilação mecânica. Foram observados os padrões de ventilação aplicados: volume corrente em ml (VC), freqüência respiratória por minuto, pressões de vias aéreas em cmH2O e fluxo de gases frescos em L.min-1, SpO2 e PETCO2. Dados demográficos: sexo, idade, peso, altura foram registrados e calculado o índice de massa corpórea (IMC). Os pacientes foram separados em grupos quanto ao IMC em: < 20; 20-25; 25-30; > 30 kg/m2.
RESULTADOS: Observou-se relação linear entre volume corrente (VC) e peso (r=0,640) e IMC (r=0,467). VC por peso corpóreo (ml.kg-1) mostrou-se inversamente relacionado ao IMC: IMC < 20 com 10,74 ± 1,39; IMC 20-25 em 9,67 ± 1,08; IMC 25-30 para 8,54 ± 1,09; IMC > 30 com 7,86 ± 1,26 (p < 0,001, ANOVA). Não houve diferença entre esses grupos para a freqüência respiratória instalada. No momento dos registros, homens (n = 123) e mulheres (n = 117) apresentaram semelhantes SpO2 e PETCO2. O IMC foi semelhante em ambos os grupos. Utilizou-se pressão positiva no final da expiração (PEEP) em 78 dos procedimentos (33%).
CONCLUSÕES: Estes dados descritivos permitem afirmar que os padrões de ventilação mecânica em anestesia no HCFMUSP adotam volume corrente próximo de 9 ml.kg-1, freqüência respiratória em 10 incursões por minuto. O uso de PEEP não é disseminado e, quando utilizado, está próximo de 4 cmH2O. Há correlação positiva para peso e IMC com VC. A relação entre VC por massa corpórea é inversamente relacionada ao IMC.

Unitermos: ANESTESIA; VENTILAÇÃO: controlada mecânica


SUMMARY

BACKGROUND AND OBJECTIVES: Lung mechanics impairment, Functional Residual Capacity decrease and atelectasis have been described during general anesthesia. This study aimed at retrospectively evaluating ventilation standards in place at the Central Institute, Hospital das Clinicas, Medical School, University of São Paulo (HCFMUSP).
METHODS: Data on 240 patients under general anesthesia, neuromuscular block and mechanical ventilation were recorded. Ventilation standards - tidal volume in ml (VT), respiratory rate per minute, airway pressure in cmH2O, fresh gas flow in L.min-1, SpO2 and PETCO2 - were recorded, as well as gender, age, weight and height. Body mass index (BMI) was calculated and patients were distributed in four groups: BMI < 20; 20-25; 25-30 and > 30 kg/m2.
RESULTS: There has been a linear correlation between tidal volume (VT) and weight (r=0.640), and BMI (r=0.467). VT by body mass (ml.kg-1) has shown to be inversely related to BMI: BMI < 20 with 10.74 ± 1.39; BMI 20-25 with 9.67 ± 1.08; BMI 25-30 to 8.54 ± 1.09; BMI > 30 to 7.86 ± 1.26 (p < 0.001, ANOVA). There have been no differences among groups in respiratory rate. During data collection, males (n = 123) and females (n = 117) had similar SpO2 and PETCO2, as well as BMI. Positive end-expiratory pressure (PEEP) was installed in 78 procedures (33%).
CONCLUSIONS: These descriptive data allow us to state that mechanical ventilation standards in anesthesia at HCFMUSP use a tidal volume close to 9 ml.kg-1 and a respiratory rate of 10 incursions per minute. PEEP is not widely applied, but when installed it is approximately 4 cmH2O. Weight and BMI had a positive correlation with VT, and VT/weight (ml.kg-1) ratio was inversely related to BMI.

Key Words: ANESTHESIA; VENTILATION: mechanical controlled


RESUMEN

JUSTIFICATIVA Y OBJETIVOS: Alteraciones de la mecánica pulmonar, disminución de la Capacidad Residual Funcional y formación de atelectasias han sido descritas durante anestesia general. El objetivo de esta investigación fue evaluar de forma retrospectiva los patrones de ventilación mecánica adoptados en las salas operatorias del Instituto Central del Hospital de las Clínicas de la Facultad de Medicina de la Universidad de San Paulo (HCFMUSP).
MÉTODO: Fueron registrados datos de 240 pacientes bajo anestesia general, curarizados en ventilación mecánica. Fueron observados los patrones de ventilación aplicados: volumen corriente en ml (VC), frecuencia respiratoria por minuto, presiones de vías aéreas en cmH2O y flujo de gases frescos en L.min-1, SpO2 y PETCO2. Datos demográficos: sexo, edad, peso, altura fueron registrados y calculado el índice de masa corpórea (IMC). Los pacientes fueron separados en grupos cuanto al IMC en: <20; 20-25; 25-30; >30 kg/m2.
RESULTADOS: Se observó relación linear entre volumen corriente (VC) y peso (r=0,640) y IMC (r=0,467). VC por peso corpóreo (ml.kg-1) se mostró inversamente relacionado al IMC: IMC<20 con 10,74 ± 1,39; IMC20-25 en 9,67 ± 1,08; IMC25-30 para 8,54 ± 1,09; IMC>30 con 7,86 ± 1,26 (p < 0,001, ANOVA). No hubo diferencia entre esos grupos para la frecuencia respiratoria instalada. En el momento de los registros, hombres (n=123) y mujeres (n=117) presentaron semejantes SpO2 y PETCO2. El IMC fue semejante en ambos grupos. Se utilizó presión positiva en el final de la expiración (PEEP) en 78 de los procedimientos (33%).
CONCLUSIONES: Estos datos descriptivos permiten afirmar que los patrones de ventilación mecánica en anestesia en el HCFMUSP adoptan volumen corriente próximo de 9 ml.kg-1, frecuencia respiratoria en 10 incursiones por minuto. El uso de PEEP no es diseminado y, cuando utilizado, está próximo de 4 cmH2O. Hay correlación positiva para peso y IMC con VC. La relación entre VC por masa corpórea es inversamente relacionada al IMC.


 

 

Introdução

Durante anestesia geral obtém-se analgesia, hipnose, proteção neurovegetativa e relaxamento muscular. Este último muitas vezes determina a necessidade de ventilação mecânica com intubação traqueal, como resultado do impedimento de qualquer esforço ventilatório por parte do paciente. Como fenômeno intercorrente pode ocorrer hipoxemia, sendo que vários mecanismos têm sido descritos como responsáveis pelo seu desenvolvimento e, embora sejam fenômenos interdependentes, entre os mais importantes encontram-se: a) má distribuição dos gases e alteração dos volumes pulmonares, b) propriedades mecânicas do sistema respiratório, c) controle da ventilação 1. Em pacientes em posição supina, a anestesia geral pode levar ao aparecimento de áreas de atelectasia, redução do volume pulmonar, diminuição da capacidade residual funcional (CRF) e alterações na mecânica respiratória, fatores esses que podem levar a anormalidades no processo de troca gasosa 2,3.

A anestesia pode também promover redução da complacência do sistema respiratório e aumento da resistência das vias aéreas ao fluxo de gases em conseqüência da redução do volume pulmonar 4. Nessas condições o trabalho respiratório pode se intensificar ainda mais com o aumento do índice de massa corpórea (IMC). Em conseqüência da formação de atelectasias observa-se uma relação linear entre o aumento do IMC e a redução da capacidade residual funcional 5.

Atribui-se como uma das causas para o desenvolvimento de hipoxemia a diminuição na distribuição da ventilação em zonas dependentes do pulmão. A perda do tônus diafragmático durante indução anestésica torna seus movimentos passivos e dependentes das pressões relativas das cavidades torácica e abdominal 6. Além do efeito shunt devido à atelectasia, a hipoxemia ainda pode ser intensificada pela inibição do reflexo de vasoconstrição hipóxica induzida pela anestesia 7,8. Este fenômeno pode causar ainda maior desequilíbrio na relação ventilação-perfusão por aumento do fluxo sangüíneo para regiões mal ventiladas.

Algumas manobras têm sido estudadas com o objetivo de prevenir ou evitar esses fenômenos. O recrutamento alveolar, pela expansão pulmonar até sua capacidade vital, associado à aplicação de pressão positiva ao final da expiração (PEEP) são importantes recursos na prevenção do colapso de unidades alveolares. Manutenção da expansão pulmonar após manobras de recrutamento mostrou-se eficaz em diminuir áreas com aumento da densidade, observadas na tomografia computadorizada de tórax 9.

O uso de FiO2 a 100% mostra que a composição do ar inspirado possui importante papel na recorrência de colapso de regiões previamente expandidas 10. Esse efeito durante a anestesia tem sido o fenômeno mais estudado e provavelmente envolvido na evolução de complicações pulmonares pós-operatórias. No acompanhamento de pacientes através de tomografias computadorizadas de tórax observou-se a persistência das áreas de atelectasia no período pós-operatório. Esse achado indica que as complicações pulmonares pós-operatórias podem ter se desenvolvido durante a anestesia 3.

Até o presente ainda não se pode afirmar que exista uma padronização em termos de ventilação mecânica em anestesia, considerando-se diferentes situações como duração do procedimento, tipos de intervenções cirúrgicas e capacidade pulmonar pré-operatória. O Hospital das Clínicas de São Paulo realiza cerca de 2.000 cirurgias por mês. Dada a variada amostra de especialidades, os padrões de ventilação podem se apresentar bastante distintos, constituindo um ambiente ideal em termos de amostragem de assistência ventilatória.

O objetivo deste estudo foi avaliar de forma retrospectiva os padrões de ventilação mecânica adotados nas salas operatórias do Instituto Central do Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP).

 

Método

Foram incluídos no estudo os procedimentos realizados sob anestesia geral, com bloqueio neuromuscular e ventilação mecânica, de rotina ou de urgência, no Centro Cirúrgico do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP) no período de 10 semanas compreendido entre fevereiro e abril de 2001, sendo escolhidos de forma aleatória dois dias por semana para registro das fichas de anestesia realizadas durante a manhã. Foram excluídos do estudo pacientes menores de 16 anos de idade bem como aqueles previamente internados em Unidades de Terapia Intensiva mantidos em intubação traqueal sob ventilação mecânica. O protocolo foi aprovado pela Comissão de Ética da Diretoria Clínica do HCFMUSP.

O número total de procedimentos cirúrgicos no período citado situou-se próximo de 3.500. Foram classificadas 1.064 fichas de anestesia que ocorreram no período da manhã e aproveitadas neste estudo 240 fichas adequadamente preenchidas nas quais a assistência ventilatória mecânica foi registrada, com anotações dos padrões de ventilação aplicados no início do procedimento cirúrgico. Foram colhidos também os dados demográficos do paciente, tipo de cirurgia e de anestesia. A PETCO2 e a SpO2 registradas neste estudo foram aquelas medidas logo após a intubação traqueal.

Foram comparados os padrões ventilatórios em dois grupos (masculino e feminino). Foram também anotados o fluxo da mistura de gases e a utilização de PEEP. O volume corrente ajustado para peso corpóreo (ml.kg-1), a freqüência respiratória e a pressão traqueal medida foram comparados para grupos definidos de acordo com o IMC independente do sexo. Quatro grupos foram considerados para o IMC: acima de 30, 30-25, 25-20 e abaixo de 20.

A análise estatística constou de Análise de Variância (ANOVA) entre os grupos IMC, utilizando teste de Tukey para comparação entre as médias obtidas para VC e VC/peso (dados paramétricos) ou teste de Dunn entre as médias de freqüência respiratória e a pressão traqueal (análise escalonada, dados não-paramétricos). Foi utilizado o teste t de Student para comparação da média obtida para idade, peso, altura e IMC, fluxos de gases, SpO2 e PETCO2 entre os dois grupos masculino e feminino. Foi estudado o coeficiente de correlação de Spearman entre volume corrente e peso e volume corrente e IMC. O nível de significância foi considerado para p < 0,05.

 

Resultados

Foram observados 240 pacientes sob anestesia geral e ventilação mecânica. Cento e dezessete mulheres e 123 homens compuseram os grupos. Os dados demográficos dos grupos masculino e feminino são apresentados como média e desvio padrão na tabela I. A idade situou-se em 49,43 ± 16,96 anos; peso em 67,33 ± 14,14 kg; altura em 1,64 ± 0,09 metros e o IMC em 24,87 ± 4,65 kg/m2. Não houve diferença para idade e índice de massa corpórea (IMC) entre homens e mulheres, mas ela foi significativa para peso e altura (p < 0,0001).

Com a divisão da amostra total em quatro grupos observou-se relação linear entre volume corrente (VC) e peso (r=0,640) (Figura 1), e entre VC e IMC (r=0,467) (Spearman). O valor de r2 (0,4449) explica 45% da variabilidade no valor do volume corrente relacionado à variação de peso do paciente. Cinqüenta e cinco por cento da variação do VC devem estar relacionados a outros fatores. A relação entre VC/peso (ml.kg-1) foi de 8,98 ± 1,51. Esta relação mostrou-se inversamente relacionada com média de IMC nos grupos definidos. Para IMC < 20 essa relação situou-se em 10,74 ± 1,39 ml.kg-1; com IMC20-25 a relação mostrou 9,67 ± 1,08 ml.kg-1; para IMC 25-30 8,54 ± 1,09 ml.kg-1 e para IMC > 30 esteve em 7,86 ± 1,26 ml.kg-1 (p < 0,001, ANOVA). Não houve diferença entre estes grupos para a freqüência respiratória instalada nos ventiladores (p = 0,087, Kruskal-Wallis ANOVA on ranks). O volume corrente utilizado mostrou-se diferente entre estes grupos (p < 0,001), bem como a pressão traqueal medida (p = 0,003) utilizando-se do teste de Dunn (Tabela II).

Como esperado, para pesos diferentes entre os grupos masculino e feminino, o VC foi menor entre pacientes do sexo feminino (574,37 ± 86,95 ml) em relação aos pacientes de sexo masculino (638,49 ± 85,31 ml) (p < 0,001; teste t de Student). No entanto, não foi encontrada diferença entre os valores dos IMC. No momento dos registros, ambos os grupos apresentavam saturação de oxigênio (SpO2) e fração expirada de gás carbônico (PETCO2) semelhantes (Tabela III). Não houve registro de episódios de hipoxemia nem hipercapnia durante esses procedimentos.

A anestesia adotada utilizou fluxos de oxigênio (1,03 ± 0,46 ml, n = 240), ar comprimido (0,88 ± 0,36 ml, n = 69) ou óxido nitroso (1,12 ± 0,52 ml, n = 166) que não diferiram para os grupos masculino ou feminino (Tabela III). Entre todos os procedimentos registrados, utilizou-se pressão positiva ao final da expiração (PEEP) somente em 78 (33%), com valores em 4,44 ± 0,86 cmH2O.

 

Discussão

Os dados apresentados neste estudo descritivo permitem afirmar que os padrões de ventilação mecânica em anestesia no HCFMUSP tendem a adotar volume corrente próximo de 9 ml.kg-1 corpóreo, com freqüência respiratória em 10 incursões por minuto, atingindo pressão traqueal entre 16 e 22 cmH2O. O uso de PEEP não é rotineiro e quando utilizado está próximo de 4 cmH2O.

Os fluxos de gases frescos utilizados estiveram acima do previsto para se caracterizar anestesia de baixo fluxo (1 L.min-1). Houve sempre associação de oxigênio e um segundo gás fresco, ar ambiente (29% da amostra) ou óxido nitroso (69% da amostra), somando aproximadamente 2 L.min-1.

Em estudo anterior nesta mesma instituição, o consumo de gases fresco mostrou-se elevado (2,9 L.min-1) para 1000 anestesias registradas 11. Considerando-se que ambos levantamentos tenham observado apenas anestesia para adultos, a técnica de baixo fluxo ainda é pouco praticada no HCFMUSP. A economia de recursos propiciada por tal técnica, de acordo com Torres e col. 11, poderia ser revertida para instalação de programas de educação continuada em Anestesiologia.

Neste levantamento pode ser observada relação direta entre volume corrente, peso e o IMC. No entanto, a melhor relação ocorreu para peso, conforme esperado uma vez que o ajuste se faz por tal parâmetro, seja ideal ou real. As populações feminina e masculina não se mostraram diferentes para IMC, mas sim para o peso, explicando o maior VC encontrado na população masculina. O índice de massa corpórea (IMC), uma relação entre peso e altura, estabelece uma faixa de IMC considerada ideal. Utilizando os dados registrados, foi possível observar que essa relação entre IMC e VC/peso corpóreo reflete uma inversão. As equações abaixo ilustram esta relação:

Equação 1

IMC =   peso  
         altura2

Û peso = IMC x altura2

Equação 2

VC =   ml  
       peso

Equação 3

VC =        ml         
        IMC x altura2

A equação 3 relaciona o IMC com o volume corrente obtido para o peso corpóreo. Para qualquer IMC estabelecido, o volume corrente mesmo que diretamente relacionado ao peso, não atingirá a mesma relação para o IMC considerado ideal, que relaciona pesos ideais para a faixa entre 20 a 25. Nesta situação, o VC estabelecido para pacientes com IMC elevado refletirá uma relação VC/peso real menor, dado peso real está acima do peso ideal. Essa relação inversa é previsível, pois o IMC considera uma situação ideal, incluindo uma faixa de "normalidade" entre 20 a 25.

Pacientes considerados obesos mórbidos têm maior chance de desenvolver pior troca gasosa durante anestesia. A mecânica respiratória também se mostra mais alterada neste grupo. A instalação de PEEP (10 cmH2O) em pacientes com IMC superior a 40 kg/m-2 mostrou-se satisfatória para garantir melhor função respiratória, notadamente reduzindo a elastância. No entanto, para pacientes com IMC inferior a 25, esta medida não resultou em nenhuma alteração no sistema respiratório 12. Apesar da amostra neste estudo não se constituir de obesos mórbidos, a PEEP foi instalada em apenas 4 (18%) dos pacientes com IMC acima de 30 kg/m-2. Considera-se, ainda, que apenas 78 pacientes (33%) receberam esse recurso de ventilação, utilizado mais provavelmente de acordo com o tipo de aparelho de anestesia disponível do que pela indicação clínica.

Pode ser importante definir se há necessidade de modos de ventilação diferenciados para VC por peso corpóreo em anestesias prolongadas, com ou sem instalação de PEEP. O uso de volume corrente elevado (15 ml.kg-1) aparentemente não acarreta lesão pulmonar, investigada por níveis plasmáticos de mediadores pró-inflamatórios como interleucinas e fator de necrose tumoral, durante ventilação mecânica por uma hora em pacientes previamente hígidos 13. No entanto, não se poderia afirmar com certeza que a ventilação mecânica mantida por intervalos de tempo mais elevados deva estar isenta de alterações sobre o sistema respiratório. A ocorrência de shunt parece estar relacionada diretamente à existência de maiores áreas de dependência pulmonar e com menor capacidade residual funcional 14. Pode ser interessante investigar como maior VC associado ou não à PEEP pode influenciar a formação destas áreas e também a ocorrência de desvios da relação ventilação/perfusão.

Os dados desta investigação apontam para uma padronização da ventilação mecânica e o registro de padrões pode ser a base para estudos futuros de intervenção sobre os mesmos. Seria preciso documentar a evolução clínica destes pacientes para se determinar necessidades relacionadas ao tempo de anestesia, características demográficas e relativas, como IMC, e situações quando há necessidade de instalação de pressão positiva ao final da expiração (PEEP) durante a anestesia.

 

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Endereço para Correspondência
Dr. Joaquim Edson Vieira
Av. Dr. Arnaldo 455, Sala 1216
01246-903 São Paulo, SP
E-mail: joaquimev@hotmail.com

Apresentado (Submitted) em 23 de novembro de 2001
Aceito (Accepted) para publicação em 02 de maio de 2002

 

* Recebido do (Received from) Instituto Central do Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), São Paulo, SP