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Lua Nova: Revista de Cultura e Política - Federalism and social expenditure in Brazil: tensions and tendencies

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Lua Nova: Revista de Cultura e Política

Print version ISSN 0102-6445

Lua Nova  no.52 São Paulo  2001

http://dx.doi.org/10.1590/S0102-64452001000100002 

FEDERAÇÃO E POLÍTICAS

 

Federalismo e gasto social no Brasil: tensões e tendências

 

Federalism and social expenditure in Brazil: tensions and tendencies

 

 

Celina Souza

Professora de Administração Pública da Universidade Federal da Bahia

 

 


RESUMO

As atuais características do federalismo no Brasil e suas mudanças recentes são analisadas tendo em vista discernir tendências dominantes. Fortes tensões são identificadas em vários níveis, em especial (a) entre os compromissos do Estado nacional com políticas de redução das desigualdades sociais e regionais assumidos na redemocratização e as exigências da política econômica por ele adotada; (b) entre a descentralização de políticas e as limitações de recursos por efeito das desigualdades regionais; (c)entre a ênfase federal nas unidades subnacionais e a tendência à recentralização das políticas


ABSTRACT

Present features of Federalism in Brazil together with recent changes are analyzed in search of dominant tendencies. Strong tensions are identified on several levels, specially (a) between the commitment regarding policies directed toward the reduction of social and regional inequalities taken by the national State during re-democratization and the exigencies of the economic policy which it adopted; (b) between the decentralization of policies and the limitation of resources as an effect of regional inequalities; (c) between the federal emphasis on the sub-national unities and the drive towards a recentralization of policies.


 

 

A "terceira onda" de democratização que tomou conta da América Latina e do Leste Europeu nos anos 80 tem seguido caminhos diferentes e produzido experiências e resultados também diferentes. Em muitos países, foi acompanhada da descentralização política e financeira para os governos subnacionais. Em outros, envolveu a elaboração de novas constituições, gerando novos pactos e compromissos políticos e sociais. Em alguns países federais, a redemocratização, a descentralização e as novas constituições mudaram o papel desempenhado pelos entes federativos. Essas mudanças, no entanto, foram acompanhadas de uma nova agenda econômica voltada para o controle fiscal, criando contradições e tensões para o cumprimento dos compromissos assumidos com a redemocratização.

O Brasil é um caso em que todos esses fatores ocorreram simultaneamente. A Federação brasileira, como instituição, e o gasto social, como política pública, passaram por profundas transformações, trazidas tanto pelos compromissos assumidos com a redemocratização como pelo novo paradigma econômico. Uma dessas mudanças refere-se à ampliação do papel dos governos subnacionais no gasto social, preenchendo o vazio deixado pelo governo federal. Além dos mais, os governos subnacionais também passaram a desempenhar papel importante na construção ou reconstrução das instituições democráticas.

A análise do estágio atual do federalismo brasileiro requer, portanto, maior compreensão das instituições subnacionais. Além do mais, as questões e a agenda mencionadas acima tornam-se mais complexas em países caracterizados por disparidades políticas, sociais, econômicas e regionais como o Brasil.

O federalismo é uma das instituições que foram reconstruídas após a redemocratização. No entanto, as mudanças ocorridas não devem ser vistas como um movimento radical da centralização para a descentralização. Isto porque o federalismo brasileiro não se formou pela dicotomía entre centralização versus descentralização, mas sim por um continuum entre esses processos, o qual sempre guiou as relações de poder entre as esferas central, regionais e locais.

Apesar de ter havido mudanças na Federação como resultado da redemocratização e da descentralização, profundos desequilíbrios inter e intra-regionais persistem. Pode-se ilustrar esses desequilíbrios com alguns indicadores. Em 1994, 56% do PIB estava concentrado no Sudeste e 17,5% no Sul, enquanto que o Nordeste detinha 14% e o Norte e o Centro-Oeste permaneciam com 4,8% e 7,1% respectivamente do PIB nacional. O PIB per capita regional também ilustra bem essas disparidades. O PIB per capita nacional é de US$ 5.037; no Sudeste é US$ 8.843 e no Nordeste US$ 3.085, ou seja, três vezes menor do que o do Sudeste. No caso da participação de cada estado, a concentração econômica piorou nos anos 90. Em 1985, dos 26 estados brasileiros 7 produziam 2/3 da riqueza nacional e em 1994 essa proporção atingiu 77,3% (Lavinas et al.. 1997). Ao contrário do que ocorreu nas décadas de 1970 e 1980, quando a concentração econômica regional registrou um pequeno declínio, a década de 1990 retomou a tendência à concentração. O PIB do Sudeste, que havia declinado entre 1970 e 1985 de 65,5% para 59,1 %, alcançou 59,6% no final de 1998. O PIB do Nordeste, que tinha aumentado sua participação de 11,7% para 13,6% entre 1970 e 1985, caiu para 12,6% em 1998 (Serra e Afonso 1999).1 Portanto, apesar dos esforços dos constituintes de 1988 para diminuir a concentração econômica via a distribuição dos impostos das regiões economicamente mais desenvolvidas para as menos desenvolvidas, a concentração econômica no Sudeste tem aumentado.2

Esses desequilíbrios afetam os resultados da redemocratização e da descentralização, criando contradições e tensões para o federalismo. De um lado, a descentralização política e financeira contribuiu para a consolidação democrática ao tomar o Brasil mais "federal". Isto porque as trans formações políticas e institucionais promoveram a emergência de novos atores políticos. Essas mudanças também promoveram a emergência de centros de poder alternativos, que agora competem entre si e com o governo federal. Como conseqüência desse processo, o governo federal é compelido a negociar com as esferas subnacionais o encaminhamento de questões nacionais, tornando, assim, o Brasil mais "democrático" e mais "federal". Por outro lado, a descentralização reduz as possibilidades de se enfrentar os desequilíbrios regionais pelo relativo enfraquecimento financeiro do governo federal. Esse enfraquecimento não significa que o governo federal se tornou um ator passivo ou ausente, mas sim que ele é forçado a negociar com as lideranças subnacionais questões que têm abrangência nacional.3

A literatura sobre descentralização, relações intergovernamentais e federalismo fiscal ainda não nos fornece bases suficientes para analisar teoricamente as questões acima mencionadas. A ausência de uma moldura analítica teoricamente informada acaba gerando espaço para avaliações excessivamente díspares sobre como a descentralização, as relações intergovernamentais e o federalismo fiscal afetam a forma como o federalismo opera na prática. Essa literatura é em geral normativa ou incompleta, tais como as tentativas das teorias da escolha pública e da escolha racional de explicar os efeitos da descentralização, das relações intergovernamentais e do federalismo fiscal sobre a Federação. Apesar dessas duas escolas teóricas incorporarem um elemento crucial do federalismo, ou seja, a questão da ação coletiva, permitindo a visão do federalismo como uma instituição guiada pelo conflito, elas ainda permanecem muito influenciadas pelos pressupostos da economia.4

Contrariamente ao que acontece com a literatura acima referida, a ciência política, principalmente a norte-americana, dedicou, em décadas passadas, enorme espaço para explicar o federalismo. Essa literatura caminha em várias direções. Uma enfrenta as questões específicas do federalismo, ou seja, sua definição e características, sendo os trabalhos de El azar (1984; 1987) os mais conhecidos. Outro caminho trilhado dentro da ciência política foi o de associar o federalismo à democracia, como fez Dahl (1986; 1989). Contribuição importante foi dada por Riker (1964; 1975), que buscou interpretar os fundamentos do federalismo. Esses trabalhos têm enorme importância porque nos fornecem bases teóricas para analisar as questões maiores que envolvem uma federação e também nos permitem avançar em estudos comparativos. No entanto, exatamente porque o objetivo desses trabalhos é o de responder a questões mais abrangentes e gerais do federalismo, eles nos ajudam pouco no entendimento sobre as diferenças no interior de cada Federação. Essa lacuna é particularmente importante em países como o Brasil, que sempre promoveu arranjos muito diferenciados no que se refere ao federalismo. Apesar desses arranjos diferenciados, o federalismo sempre sobreviveu e conviveu com os mais diferentes regimes políticos, inclusive com o autoritarismo. Outro fator importante para a análise do federalismo brasileiro é que a instituição foi adotada não como uma resposta às clivagens étnicas, lingüísticas e religiosas, como na maioria dos países, já que essas questões nunca assumiram relevância na agenda política brasileira.

Os estudos empíricos sobre o federalismo brasileiro também nos ajudam pouco no entendimento de uma Federação que convive com alto grau de desigualdade regional. Estudos nessa área têm sido produzidos por vários ramos das ciências sociais, tais como direito, federalismo fiscal, administração pública, história e ciência política. A maioria dessa literatura empírica, no entanto, com exceção daquela produzida pelos historiadores,5 apresenta problemas: a maior parte não se apoia em referenciais teóricos e tende a isolar as questões econômico-financeiras das questões políticas. Essa separação obscurece o melhor entendimento do federalismo no Brasil pelo fato de que as regras do sistema tributário e fiscal, incluindo a distribuição de recursos entre níveis de governo, sempre foram capítulos detalhados das constituições. Isso significa que qualquer mudança nas regras fiscais torna-se politizada porque requer mudanças na Constituição. Os trabalhos empíricos sobre federalismo fiscal, por exemplo, apesar de contribuírem com a análise de dados complexos geralmente pouco conhecidos, dificilmente escondem as agendas pessoais ou institucionais de seus autores. Essa literatura tende a rotular o sistema fiscal como ineficiente ou injusto, ora para as regiões economicamente mais desenvolvidas, ora para as menos, ora para o governo federal.

Já a literatura empírica brasileira da ciência política tem tendido a concentrar mais esforços nos resultados da descentralização e nos seus impactos nos diferentes níveis de governo do que no federalismo propriamente dito.6 Em resumo, ainda caminham lentamente as análises teoricamente informadas sobre o federalismo brasileiro que agreguem (a) a visão do federalismo como uma instituição guiada pelo conflito e (b) a relação entre os arranjos políticos e fiscais.

Na busca de uma moldura teórica capaz de enfrentar as limitações dos estudos empíricos e a abordagem excessivamente abrangente da literatura clássica sobre federalismo, opta-se aqui por seguir as formulações de Burgess (1993), nas quais o federalismo é tratado como um conceito de valor, como a recomendação e a promoção de apoio à federação. Partindo-se dessa visão, pode-se concluir que a lógica das federações é o federalismo, que é a percepção ideológica do que deve acontecer após a federalização. Mais do que uma distinção semântica, a necessidade de distinguir Federação de federalismo é importante devido à existência de grande variedade na prática dos princípios federais dentro de cada federação, como argumentam Souza (1997) e Théret (1998). Esses valores variam não apenas em relação aos seus princípios, mas também de acordo com cada circunstância histórica. Variam também de acordo com a dinâmica da economia política, dos partidos e da cultura política.7 Essas diferenças se sobrepõem a outras manifestações territoriais do federalismo, tais como a divisão de poderes dentro do legislativo e entre níveis de governo, o papel do judiciário, a alocação de recursos fiscais e de competências e as garantias constitucionais dos entes que compõem a Federação. Esses aspectos são importantes não só para análises sobre desenho constitucional e sobre a prática de cada Federação, mas também para nos ajudar a entender quais os interesses, valores e negociações que prevalecem quando ocorrem mudanças nas federações.

A importância de se incorporar a abordagem da ideologia política deve-se ao fato de que mudanças e práticas diversas dentro de cada Federação têm-se constituído no aspecto mais difícil para explicar e compreender o funcionamento dos sistemas políticos federais, para além de seus aspectos meramente formais e legais. A visão do federalismo como ideologia política, conforme propõe Burgess, não significa a inclusão de princípios normativos tais como liberdade ou democracia, mas sim a visão de que valores refletem interesses. A contribuição de Burgess ao debate sobre federalismo abre caminho para a investigação das motivações que embasam a existência de cada Federação em particular. Cada federalismo, e também cada Federação, incorpora um número variado de atributos econômicos, políticos e sócio-culturais que se interrelacionam para produzir padrões complexos de interesses e identidades. Assim, cada federalismo é guiado por um leitmotif, que também pode se expressar de diferentes formas de acordo com as peculiaridades de cada tempo histórico. A partir dessa construção, pode-se assumir que a razão de ser do federalismo brasileiro sempre foi, e continua sendo, uma forma para amortecer as enormes disparidades regionais. Em cada momento histórico, essas disparidades foram acomodadas de formas diferentes e essas diferenças se expressaram no desenho constitucional e nos arranjos tributários.

Com base nos aspectos analisados acima, examinam-se em seguida as mudanças recentes ocorridas no federalismo brasileiro e no gasto social, relacionando-as (a) à tensão trazida pelo novo paradigma econômico para o cumprimento dos compromissos assumidos com a redemocratização; e (b) às disparidades inter e intra-regionais, o que faz com que a capacidade dos governos subnacionais de prover programas sociais seja muito heterogênea.

O argumenta aqui desenvolvido é o de que o federalismo no Brasil sempre foi uma instituição amortecedora das profundas disparidades regionais e que suas características atuais conformam uma federação que constrange o "centro" e que redireciona o papel dos governos subnacionais na provisão de serviços sociais. No entanto, as profundas disparidades inter e intra-regionais tornam a capacidade dos governos regionais de responder a esse papel altamente diversificada. As tensões hoje existentes no federalismo brasileiro expressam velhos e não resolvidos conflitos políticos de um país social e regionalmente muito desigual. Essas tensões não são, todavia, produto do federalismo em si mesmo. As possibilidades dessas tensões políticas e financeiras serem enfrentadas dependem menos do federalismo enquanto instituição e mais do enfrentamento de conflitos políticos mais amplos. Argumenta-se, também, que o pacto político da redemocratização no Brasil sugeria maior comprometimento do Estado com as questões das desigualdades sociais e regionais. Esse compromisso, no entanto, tem sido difícil de cumprir, devido às restrições impostas pela política econômica. Apesar dos governos subnacionais estarem investindo mais em programas sociais, não existem indicações de que a questão das disparidades inter e intra-regionais e de renda será enfrentada no curto ou médio prazos. Não existem também garantias de que os governos subna-cionais poderão manter seus investimentos em programas sociais, devido ao seu alto endividamento e à tendência à recentralização de recursos.

Analisam-se aqui as atuais características e tensões do federalismo no Brasil e suas mudanças recentes. Para tanto, o artigo inicia com uma breve revisão dos principais fatores históricos que influenciaram a configuração do federalismo e como esses fatores se refletiram no desenho das constituições brasileiras. A segunda seção analisa a decisão tomada pelos constituintes de 1988 de fortalecer a Federação como resposta às demandas da redemocratização. A seção seguinte apresenta as principais características sociais, regionais e políticas que influenciam a Federação, em especial o papel dos governos subnacionais na provisão de serviços sociais. A última seção discute os rumos da Federação.

 

A TRAJETÓRIA DO FEDERALISMO BRASILEIRO

Seguindo a orientação teórica acima discutida, para o melhor entendimento do atual estágio do federalismo é necessário traçar sua trajetória. Isto porque o federalismo enquanto instituição tem sido moldado por arranjos políticos e territoriais construídos ao longo da nossa história. Esses arranjos se refletiram em cada uma das constituições brasileiras, mostrando como e por que as relações federalistas têm se movido através de um continuum, que saiu de um federalismo "isolado" dos primeiros anos republicanos para a centralização nos regimes autoritários até chegar à sua atual configuração.

A primeira constituição republica, promulgada em 1891, desenhou uma Federação "isolada" no sentido de que havia poucos canais de comunicação e ligação entre os níveis de governo.8 O sistema fiscal refletia o slogan republicano: "centralização, sesseção; descentralização, união", tornando a Federação brasileira muito mais descentralizada do ponto de vista fiscal do que a Argentina e o México (Love, 1993). A participação das esferas subnacionais nos recursos públicos nacionais passou de 34% em 1907 para 49% em 1930, apesar dos recursos econômicos e financeiros serem canalizados para alguns poucos estados. Ou seja, a Federação nasceu sob a égide da desigualdade.

Esse isolamento foi rompido em 1930, quando o Brasil inicia a construção da sociedade urbano-industrial, na qual o Estado foi o ator central. Não foi por acaso que a principal batalha de Getúlio Vargas se travou contra os estados, a fim de garantir a hegemonia nacional necessária para viabilizar tamanha transformação. No entanto, concessões foram feitas aos estados, tais como o perdão de suas dívidas com o governo federal, o que incluía e enorme dívida de São Paulo gerada pelos subsídios ao preço do café. Tais concessões pacificaram os descontentamentos regionais. Em 1932, Getúlio promulga a reforma eleitoral, a qual, entre outras medidas, aumentou a representação política dos estados menores e economicamente mais frágeis. Inicialmente concebido para contrabalançar o poder de alguns estados sobre o país, este princípio tem sobrevivido e tem sido uma das bases do federalismo brasileiro. Em 1934 é promulgada a nova Constituição. Os governos subnacionais perdem parte do seu poder financeiro pela extinção de vários impostos e pela expansão das bases dos impostos federais. No entanto, a medida mais importante adotada pela Constituição de 1934 foi delegar ao governo federal a competência para regular as relações fiscais externas e entre os estados. Ao negar às oligarquias regionais o direito de decidir sobre um dos mais importantes aspectos da sua vida econômica, ou seja, a definição das regras de trocas de mercadorias, Getúlio pavimentou o caminho para a industrialização, através da uniformização das regras fiscais.

A Constituição de 1934 teve vida curta. Eleições diretas foram reintroduzidas e a Constituição de 1946 foi aprovada. Ideais liberais, em especial a rejeição à intervenção do governo federal na economia, predominavam entre os constituintes de 46. No entanto, as intenções liberais não prevaleceram devido às demandas por rápido crescimento econômico, que continuou sendo liderado pelo Estado. A Constituição de 46 acabou replicando muitas das medidas da constituição anterior, com algumas adaptações. Devido ao fato de que democracia e descentralização sempre estiveram associadas no Brasil, os recursos para o município foram ampliados, com o objetivo de diminuir sua dependência dos estados. Essa constituição foi, ao mesmo tempo, centralizadora a favor do governo federal e localista, porque transferiu vários impostos estaduais para os municípios e por fazer com que os estados passassem a transferir parte de seus impostos para os municípios. O mecanismo de partilha de impostos das unidades maiores da Federação para as menores foi a primeira tentativa de enfrentar a questão do desequilíbrio fiscal entre níveis de governo. Já o equilíbrio horizontal, isto é, entre entes da mesma esfera, foi timidamente introduzido através da vinculação de certos recursos federais que deveriam ser aplicados no Norte e no Nordeste. Apesar dessas tentativas, Mahar (1976) mostrou que seus efeitos foram limitados, devido ao aumento desproporcional das competências federais, ao aumento no número de municípios, à inflação e ao não-pagamento de cotas federais às esferas subnacionais.

Em 1964, com o regime militar, a Federação passa por profunda transformação, que repercute sobre o papel dos três níveis de governo. Os militares só promulgaram uma nova Constituição em 1967, embora tenham feito várias emendas à Constituição de 46 e em 1969 nova grande emenda constitucional foi feita. Essas mudanças, juntamente com a reforma fiscal de 1966, promoveram uma centralização de recursos públicos e de poder político sem precedentes no Brasil. No entanto, os governos subnacionais e seus políticos continuaram a ter papel importante na Federação, mesmo com tamanha centralização. Como demonstram Ames (1987) e Medeiros (1986), os governos subnacionais foram grandes legitimadores do regime militar e formaram as coalizões necessárias para a sua longa sobrevivência. Apesar dos recursos estarem centralizados na esfera federal, eles eram redistribuídos através dos fundos de participação (FPE e FPM), formatados de maneira a minimizar as disparidades regionais, ampliando, portanto, a busca do equilíbrio fiscal horizontal. Além do mais, os governos subnacionais recebiam recursos via transferências negociadas, que cresceram significativamente.

Muitos trabalhos foram produzidos sobre os efeitos da centralização fiscal sobre o federalismo. Esses trabalhos podem ser divididos em dois grupos. Um, que se concentrou nas contas públicas, mostrando que a posição financeira dos municípios havia melhorado no período, ao contrário do que aconteceu com os estados (Graham, 1987; Serra e Afonso, 1991). Outro grupo de estudos interpretou a dependência política e financeira dos governos subnacionais como um rompimento do regime federativo e da Federação (Lordello de Mello, 1976) ou como o exemplo de uma Federação apenas formal, que mascarava a existência de um estado unitário (Selcher, 1989).

A redemocratização traz consigo a bandeira da descentralização política, fiscal e administrativa e da "restauração" do federalismo, juntamente com compromissos de melhorar os serviços público e de promover a distribuição da renda. A maioria dessas demandas recebeu tratamento especial na Constituição de 1988.

 

REDEMOCRATIZAÇÃO E FEDERALISMO

O desenho da Constituição de 1988 resultou do clima de entusiasmo e otimismo sobre o futuro do país. Por 20 meses, o Congresso e Brasília foram o centro da vida brasileira e se transformaram em laboratórios de um visível exercício de democracia e de participação. Entre os grupos de pressão mais influentes estavam aqueles liderados por prefeitos e governadores demandando a descentralização financeira.

A resposta dos constituintes a essas pressões foi bastante positiva. Como mostram vários trabalhos, a participação do governo federal na receita pública diminuiu e foram aumentadas as receitas subnacionais. Esse aumento foi materializado de diversas formas, mas duas são importantes para o melhor entendimento do federalismo. A primeira foi que esse aumento se deu pela transferência de vários impostos federais para os estados, aumentando suas bases tributárias, em especial a do seu principal imposto, o ICMS. A constituição também concedeu maior liberdade aos estados para determinar os critérios de cobrança do ICMS e total liberdade no seu uso, o único limite sendo a transferência de 25% para os municípios. Ao adotarem essa fórmula, os constituintes evitaram as reações contrárias dos estados economicamente mais fortes, dado que o ICMS é também o maior imposto em termos absolutos. A segunda forma de aumento das receitas subnacionais se deu pelo incremento do percentual das transferências dos impostos federais que constituem os fundos de participação. Esses fundos adotam uma fórmula que redistribui os recursos de acordo com o tamanho da população e a renda per capita, o que beneficia os estados mais frágeis economicamente, visando diminuir o desequilíbrio fiscal horizontal.

Os governos subnacionais arrecadam atualmente cerca de 32% dos impostos. Junto com as transferências federais, eles são responsáveis por 43% da receita tributária. Em relação à despesa, os governos subnacionais são responsáveis por 62% da folha de pagamento do setor público e por 78% dos investimentos públicos. O governo federal é o principal responsável pelo pagamento do sistema previdenciário e dos juros da dívida, que correspondem, respectivamente, a 80% e 90% da despesa do setor público com essas duas funções (Serra e Afonso, 1999).

A Constituição de 1988 também aprovou outras medidas de fortalecimento dos governos subnacionais, mas manteve a tradição de reter grande parte do monopólio legislativo na esfera federal, limitando sobremodo a capacidade das esferas subnacionais de adotarem políticas próprias. Esse fato, em geral pouco lembrado, é um dos paradoxos do federalismo brasileiro e o distingue das demais Federações. A Constituição determina, por exemplo, que questões que estão na esfera da competência concorrente da União com os estados, tais como energia elétrica, trânsito, tráfego, minas, recursos minerais e educação, dependem de legislação federal.

A Constituição de 1988 não só manteve como expandiu alguns mecanismos tributários e políticos desenhados para acomodar as desigualdades regionais. O mecanismo político dessa acomodação se manifesta na questão da representação estadual no Congresso Nacional, onde unidades menores e economicamente mais frágeis possuem proporcionalmente bancadas maiores do que as dos estados com maior número de eleitores. A maior diferença está entre as bancadas dos estados do Norte vis-à-vis as do Sudeste. Segundo dados de Nicolau (1997), o Norte, com 4,8% do eleitorado, tem 22,3% da representação, enquanto o Sudeste, com 46% do eleitorado, ocupa 33,6% da representação. Esta super-representação dos estados economicamente mais frágeis foi introduzida em 1932 para contrabalançar a hegemonia de São Paulo e Minas Gerais na Federação. No entanto, ela tem importância para o amortecimento das clivagens regionais e para o funcionamento do federalismo. Isto porque por esse meio as unidades economicamente mais frágeis "forçam" o sistema político, o governo federal e o Congresso a incluir eventualmente os problemas advindos das desigualdades regionais na agenda política nacional. Esse argumento é, no entanto, polêmico. Muitos acadêmicos (Stepan, 1999; Samuels e Snyder, 2000, entre outros), não compartilham essa visão. Stepan (1999), por exemplo, construiu um índice de Gini para classificar as federações de acordo com sua proximidade com a representação proporcional pura. Por esse índice, Argentina, Brasil e EUA, nessa ordem, se destacam como os países onde a maioria democrática é mais restringida em função da super-representação de unidades menores. Apesar de Stepan ter construído fórmulas sofisticadas para enquadrar os países federais em um continuum que vai do que ele chama de demos constraining, ou seja, federações que constrangem o poder da maioria, até o demos enabling, ou seja, federações que ampliam o poder da maioria, a realidade de alguns países pode forçá-los a tomar decisões caracterizadas como demos constraining para compensar a não-decisão sobre outros problemas, tais como os desequilíbrios regionais brasileiros.9

O segundo mecanismo de compensação das desigualdades regionais é tributário: desde 1946 o Brasil adotou um sistema tributário que persegue o menor desequilíbrio horizontal e vertical dos recursos públicos pela redistribuição de parcela dos impostos das regiões economicamente mais desenvolvidas para as menos desenvolvidas. Devido ao sistema de redistribuição horizontal de recursos, o sistema fiscal é altamente interdependente e toda vez que a economia dos estados mais desenvolvidos desacelera, seus efeitos são logo sentidos nas regiões menos desenvolvidas.

Contudo, quando a Constituição foi promulgada, os constrangimentos econômicos do país estavam maiores do que no início da década. À falência dos vários planos de estabilização econômica sucedeu-se a redução dos recursos públicos, a recessão e a incapacidade de controlar a inflação, constrangendo a política fiscal e o controle do déficit. Além do mais, a parcela dos recursos tributários líquidos diminuiu em relação ao PIB. Essas tendências aumentaram as clivagens distributivas entre níveis de governo, porque passou a haver menos recursos para negociar e para amortecer as clivagens regionais.

Somente após a promulgação da Constituição começaram a surgir as primeiras reações do governo federal contra suas perdas tributárias, que persistem até hoje. No entanto, essas reações sempre foram ambíguas. Os presidentes da República têm tentado culpar os governos subnacionais pelos problemas fiscais do setor público, mas, ao mesmo tempo, deles dependem para sustentar a coalizão de governo. Outra ambigüidade diz respeito ao tratamento dado à questão do endividamento dos estados e municípios. Parte da dívida dos estados foi federalizada, o que representou a transferência para os contribuintes nacionais de cerca de RS$ 50 bilhões. Dos estados da Federação, 17 assinaram acordos de federalização de suas dívidas e entre os principais devedores estão os estados economicamente mais poderosos. A federalização da dívida dos estados significa que eles agora devem ao governo federal cerca de RS$ 103,4 bilhões, ou seja, 10,3% do PIB, a ser pago em 30 anos com juros menores do que os do mercado.

Se o governo federal tem adotado posições ambíguas em relação aos estados, o mesmo não se pode dizer de suas reações contra a descentralização financeira. São vários os exemplos. Primeiro, foi adotada uma política de aumento das alíquotas das contribuições e/ou de impostos que não são partilhados com as esferas subnacionais. Segundo, o governo federal vem cortando despesas, pressionando os governos subnacionais a investirem mais nas funções/serviços que estão com menor cobertura financeira do governo federal. Em 1999, por exemplo, apenas 40,7% dos recursos alocados no orçamento para investimentos foram gastos. Os gastos federais têm se concentrado no pagamento de juros, como mostra a Tabela 1.

 

A terceira forma de recentralização refere-se à restrições aos gastos das esferas subnacionais. O principal exemplo é o FEF (Fundo de Estabilização Fiscal), que diminui transferências federais e o mais recente é a Lei de Responsabilidade Fiscal, que impõe limites à dívida e à despesa com pessoal e proíbe o socorro do governo federal se as esferas subnacionais contraírem novas dívidas. Essas reações mostram que o governo federal não tem sido um ator passivo nem tem perdido sua importância como instituição política, o que significa que os conflitos federativos estão ainda mais acirrados.

Para o melhor entendimento do federalismo após a redemocratização, duas tendências precisam ser melhor entendidas. A primeira é que existem novos papéis entre os níveis de governo, que mudaram a forma como as políticas públicas e a própria política passaram a ser conduzidas. Esses novos papéis colocam desafios e tensões no federalismo devido, por um lado, à importância das esferas subnacionais no programa de ajuste fiscal e, de outro, à capacidade dos governos subnacionais de proverem serviços sociais. A segunda tendência é a de que a descentralização política e financeira transferiu parcela de poder da esfera federal para as subnacionais, elevando o papel das elites políticas subnacionais. Por isso, o governo federal não pode prescindir do apoio dessas elites para implantar as reformas, em especial a fiscal. O papel do Congresso também está fortalecido. Assim, uma nova correlação de forças surge como resultado da redemocratização, da descentralização e do federalismo fortalecido. Essa nova correlação de forças é marcada pelo poder difuso e pela fragmentação, que são hoje as principiáis características do sistema político brasileiro, afetando, diretamente, o federalismo.

 

PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS ATUAIS

Desde o início de sua história republicana o Brasil tem sido marcado pela persistência de profundas desigualdades regionais e sociais, tanto no interior da Federação como no que se refere às classes sociais.10 Tentativas de diminuir o grau desse conflito foram feitas pelos constituintes de 88. No entanto, a persistência dessas desigualdades coloca novos desafios à Federação e tem mudado o consenso sobre o tema construído durante o processo constituinte. As características atuais do federalismo também tornam mais difíceis o enfrentamento dos complexos problemas sociais brasileiros, em especial a concentração de renda e riqueza em algumas regiões e classes sociais, dado que o sistema político tornou-se altamente fragmentado. Enquanto a transferência de recursos entre as regiões tem diminuído, a coalizão de governo vem aprofundando políticas voltadas para o mercado, que reduzem o papel do governo federal na provisão de serviços sociais. No entanto, os governos subnacionais vêm fazendo um enorme esforço para suprir o vazio deixado pelo governo federal, amortecendo, assim, as tensões sociais.

Três fontes de tensão estão hoje atuando sobre o federalismo. A primeira diz respeito ao fato de que a Constituição de 1988 adotou várias políticas voltadas para o enfrentamento dos problemas sociais e regionais do Brasil. Os constituintes ampliaram o papel do Estado no que se refere às questões sociais e regionais. Por outro lado, logo após a promulgação da Constituição, começa a política de diminuição do papel do Estado. Um novo paradigma econômico foi adotado e vem sendo perseguido. Esse paradigma se baseia no controle da até então incontrolável inflação para permitir que o Brasil se habilite a ser um jogador na economia globalizada. Os requerimentos desse novo paradigma estão se mostrando inconciliáveis com as demandas dos constituintes de aumentar o papel do Estado nas questões sociais e regionais.

A segunda tensão se relaciona com os altos níveis de heterogeneidade inter e intra-regional. Devido a essa alta heterogeneidade, os resultados da descentralização e a capacidade dos governos subnacionais de prover serviços sociais é altamente desigual. Esse fato é agravado porque a descentralização não foi precedida de um consenso social sobre seus objetivos.

Como resultado dessas duas tensões, mais de 10 anos após a promulgação da Constituição a implementação de medidas voltadas para a distribuição social e regional da renda permanece na agenda política como uma questão não-encaminhada. Além do mais, a implementação dessas políticas está se mostrando de difícil conciliação com as atuais políticas econômicas. Essas tensões tornam muito mais árduo o enfrentamento dos problemas sociais e regionais, trazendo para o centro do debate a pergunta de como conciliar a necessidade de se começar a desenhar um país menos desigual, tanto regional como socialmente, com a adoção de políticas econômicas que exigem a redução do papel do Estado nesses setores?

Neste ponto, torna-se necessário discutir, mesmo que sumariamente, os principiáis pontos das agendas econômica e fiscal da coalizão governista. Desde a eleição de Cardoso o Brasil aprofundou as políticas orientadas para o mercado, ancoradas no Plano Real, o qual, por sua vez, tem como uma de suas bases a política de juros altos. Essa política vem promovendo sensíveis e sutis mudanças no arranjo federativo desenhado pela constituição de 1988, porque requer a recentralização de recursos.11

A terceira tensão sobre as desigualdades regionais e sociais se relaciona com os resultados da descentralização. Muitos estudos têm mostrado que a descentralização foi adotada sem uma compreensão mais profunda das questões envolvidas. A descentralização da educação e da saúde, por exemplo, foi feita sem se avaliar a capacidade administrativa e financeira dos municípios, que varia enormemente. A descentralização não ocorre em um vazio, mas, ao contrário, requer um complexa engenharia político-institucional. Em muitos municípios, essas políticas apresentam resultados desanimadores, como mostram alguns estudos (Arretche, 2000; Melo, 1996; Souza, 1996).

Estudos empíricos também vêm mostrando que não existem garantias de que a descentralização desencadeia um círculo virtuoso, como promete a sua literatura. Levantamento de Bremaeker (1994), por exemplo, mostra que existem mais de 200 municípios no Nordeste que não têm condições de expandir seus recursos nem de investir em nada além do que o pagamento dos servidores públicos, muitos recebendo abaixo do salário mínimo. Esses municípios carecem de atividade econômica e são limitados pelo tamanho da pobreza de suas populações. Samuels (2000) mostra que quase 75% dos municípios brasileiros arrecada menos de 10% de seus recursos totais e que quase 90% dos municípios com população em torno de 10.000 habitantes dependem quase que inteiramente das transferências constitucionais para sua sobrevivência. Em relação aos estados, sete deles arrecadam menos de 0,5% do total do ICMS arrecadado no país (IPEA e IBAM, 1994). Portanto, a descentralização, ao deslocar recursos federais para as esferas subnacionais, atua contra as possibilidades de transferências federais para as regiões menos desenvolvidas. Mesmo considerando a existência de mecanismos de compensação financeira como o FPE e o FPM, esses mecanismos têm tido, até agora, pouco efeito no sentido de minorar os desequilíbrios regionais. Essas questões mostram os limites da descentralização em países marcados por extremas desigualdades regionais, como argumentado anteriormente (Souza, 1997; 1998).

No entanto, apesar desses constrangimentos, os governos subnacionais passaram a ser os principais provedores de serviços sociais. Muitos trabalhos vêm mostrando, que, embora devagar e de forma inconstante, as esferas subnacionais estão substituindo o governo federal em certas áreas, enquanto que outras encontram-se em uma espécie de limbo financeiro e governamental (Afonso, 1994; Rezende, 1997; Almeida, 1996). Essa transferência de responsabilidades contradiz a visão de alguns autores de que os principais constrangimentos federais resultam da falta de transferência de responsabilidades para as esferas subnacionais.

O aumento do papel dos governos subnacionais na provisão de serviços sociais pode ser visto na Tabela 2.

 

 

Apesar do governo federal permanecer como o principal investidor, 65% dos seus recursos para a área social são gastos com o sistema pre-videnciário, 17% com saúde e 8,5% com educação. Os estados investem a metade dos recursos da área social em educação e os municípios em habitação e urbanismo, seguido de transporte e saneamento (Draibe, 1999).

A despesa por região demonstra que as regiões economicamente menos desenvolvidas apresentam gastos per capita na área social duas vezes menores do que as regiões e estados com maior desenvolvimento econômico. No entanto, tem sido significativo o esforço dos três níveis de governo na região Nordeste, onde a despesa social per capita tem atingido 30% do PIB da região, enquanto que no Norte tem sido 19,5%, no Sudeste 18,1%, no Sul 17,8% e no Centro-Oeste 22% (Draibe, 1999).

Dados das contas subnacionais entre 1986 e 1995 mostram que, antes mesmo da Constituição de 1988, as capitais estaduais vêm priorizando gastos na área social. No entanto, o papel do governo municipal tem aumentado, não só devido ao maior volume de recursos investidos mas também devido à redução relativa dos gastos federais. Esses dados também mostram que as capitais estaduais estão desenvolvendo mais esforços dos que os estados para manter seus investimentos na área social e que existe uma grande tensão entre despesas com serviços sociais e o pagamento de juros da dívida (Ministério da Fazenda, 1997).

Outra área em que o papel dos governos subnacionais tem sido importante concentra-se nos programas de combate à pobreza, especialmente a bolsa-escola. Em 1999, três estados e vinte municípios adotavam o programa bolsa-escola, alcançando 140 mil famílias e 700 mil pessoas. Se em termos absolutos esses números impressionam, esses programas significam ainda pouco diante da estimativa oficial de que existem 10,3 milhões de famílias com renda per capita mensal menor do que R$ 65 (Lavinas, 1998).

Muitos trabalhos também estão mostrando que várias cidades, especialmente as capitais, adotaram políticas de aumento de suas receitas próprias, contrariando a hipótese da literatura sobre federalismo fiscal, em especial aquela informada pela teoria da escolha pública, de que quando as transferências governamentais têm peso nas receitas, os governos locais tendem a diminuir seus esforços na arrecadação de recursos próprios. A taxa de crescimento das receitas próprias de 11 capitais aumentou mais de 10% ao ano entre 1989 e 1994 (Jayme Jr. e Marquetti, 1998), diminuindo assim a dependência das transferências federal e estadual, e aumentando as possibilidades de maiores investimentos em programas considerados prioritários pela coalizão política local. No entanto, mais uma vez as disparidades inter e intra-regionais se fazem presentes, já que menos da metade das capitais adotaram essa política, o que mostra que a descentralização promoveu resultados diferenciados e gerou agendas também diferenciadas nas grandes cidades brasileiras.

Resumindo, os governos subnacionais variam consideravelmente na sua capacidade de implementar políticas e de investir em programas sociais. No entanto, a literatura sobre descentralização tende a tratar os governos subnacionais de forma uniforme e como tendo a mesma capacidade de jogar um papel expandido nas tarefas que lhes foram extra-constitucionalmente transferidas. A literatura brasileira sobre o tema, com poucas exceções, ainda resiste em considerar as enormes heterogeneidades do país e a ignorar o fato de que políticas descentralizadas podem produzir resultados altamente diferenciados.

Tomados em seu conjunto, os governos subnacionais estão realizando esforços para manter ou aumentar sua participação na provisão de serviços sociais, amortecendo, assim, as consequências da política federal de estabilização econômica. A maior presença das esferas subnacionais não significa, todavia, que o governo federal esteja ausente das políticas sociais. O financiamento dessas políticas continua a contar com recursos federais, especialmente para educação e saúde. No entanto, em ambos os setores, é necessária a contrapartida dos governos subnacionais. Esta seção também discutiu que a capacidade dos governos subnacionais de participar da provisão de serviços sociais é altamente diferenciada e que existem centenas de municípios e alguns estados que não podem sobreviver sem a ajuda federal. Mostrou também que as desigualdades regionais, tanto as econômicas como as sociais, não estão diminuindo. No entanto, os dilemas sociais, em especial as desigualdades entre classes e regiões, permanece como uma questão nacional. Apesar das esferas subnacionais estarem mais envolvidas com esses dilemas, não existem garantias de que essa tendência continuará devido, entre outros fatores, às tentativas bem sucedidas de recentralização dos recursos.12

 

CONCLUSÕES

O federalismo brasileiro incorpora hoje múltiplos centros de poder e pode ser caracterizado como um sistema complexo de dependência política e financeira entre esferas de governo, por caminhos e capacidades diferenciadas na provisão de serviços públicos e por grandes disparidades entre as regiões e no interior de uma mesma região. A trajetória do federalismo brasileiro confirma a visão de que o federalismo como mecanismo de divisão territorial de poder é mais uma forma de acomodar conflitos regionais do que de promover harmonia. Também confirma o argumento de que o federalismo é mais uma ideologia baseado em valores e interesses do que um compromisso baseado em arranjos legais e territoriais ou em propósitos democráticos. As relações federativas tendem a ser mais baseadas em interesses conflitantes, que, por sua vez, refletem outros conflitos políticos existentes na sociedade.

Desde 1988 vários centros de poder, embora desiguais, passaram a ter acesso ao processo decisorio e à implementação de políticas, em especial as sociais. Em um sistema democrático, os políticos subnacionais tornaram-se uma fonte de apoio tanto para a coalizão nacional de governo como para a provisão de serviços sociais. A força desses políticos e dessas esferas não significa, todavia, que o governo federal tornou-se um ator passivo. No entanto, essa força criou estruturas e processos extra-constitucionais que podem ser tão importantes quanto as estruturas e os processos formais.

Discutiram-se aqui algumas tensões relativas às desigualdades sociais e regionais que afetam a forma como federalismo está operando. Essas tensões nos dão as bases para discutir as perspectivas do federalismo.

A redemocratização trouxe consigo a perspectiva de aumentar o papel do Estado nas questões sociais e regionais. No entanto, essa perspectiva tem sido constrangida pelas demandas da política econômica. Embora os governos subnacionais estejam desempenhando papel importante na questão social, o enfrentamento das desigualdades regionais continua ausente das políticas públicas. As tensões mencionadas levantam algumas questões que podem impactar o federalismo no curto e médio prazos.

A primeira questão refere-se às possibilidades dos governos subnacionais de sustentarem seus investimentos em políticas sociais. A questão é importante pelo sucesso do governo federal na recentral ização dos recursos públicos. Se, por um lado, os governos subnacionais têm tido um papel importante na provisão dos serviços sociais, por outro eles constrangem o programa de estabilização fiscal pelos seus gastos. Desse modo, os governos subnacionais desempenham um papel duplo e contraditório: eles atendem parcialmente às demandas sociais, mas constrangem os objetivos econômicos da coalizão governista. Esse duplo e contraditório papel impede a criação de condições para que as questões das desigualdades sociais e regionais possam ser encaminhadas nacionalmente.

A segunda questão diz respeito ao fato de que a atual correlação de forças, caracterizada como fragmentada, não significa que cada Estado e município possua cotas semelhantes de poder político, de recursos financeiros e de capacidade de provisão de serviços sociais. Assim, existem muitas esferas subnacionais que são incapazes de desempenhar qualquer papel na provisão de serviços sociais. Esta talvez seja a questão mais complexa enfrentada pelo federalismo atual e existem poucas indicações de que esses governos subnacionais poderão melhorar essas capacidades.

A terceira questão diz respeito à provisão de serviços sociais propriamente dita. Se estados e municípios estão aumentando sua participação nos programas sociais, é necessário saber como esses serviços estão sendo providos e como os cidadãos estão tendo acesso a eles. Isto porque a maioria dos serviços sociais opera hoje dentro de uma moldura institucional muito diferente da do passado. Estimulados por políticas nacionais ou por financiamentos de organismos multilaterais, que exigem a constituição de conselhos comunitários para a liberação de recursos, os governos subnacionais criaram inúmeros desses conselhos. O objetivo a ser perseguido é o de encorajar a participação do cidadão para aumentar a transparência e a accountability dos governos. No entanto, evidências esparsas indicam que muitos desses conselhos são uma mera reprodução do que dizem as normas desses programas, não cumprindo, assim, os principais pressupostos da participação. Embora ainda existam poucos trabalhos analisando esses conselhos em profundidade e em termos comparativos, a imprensa tem divulgado casos de manipulação desses conselhos pelas elites subnacionais, assim como corrupção no uso dos recursos. Ademais, se o poder político está hoje fragmentado na esfera nacional, o mesmo não se pode dizer das esferas subnacionais. Essas questões chamam a atenção para a necessidade de se pesquisar o papel das instituições políticas subnacionais no constrangimento ou no incentivo ao acesso aos serviços sociais. Isto porque as instituições são moldadas pela história, cultura, incentivos e constrangimentos que variam e se transformam de um lugar para outro, em especial em um país cortado por grandes heterogeneidades.

A quarta questão relaciona-se com a agenda econômica do governo federal. Essa agenda pode afetar o federalismo de duas formas. Primeiro, a abertura da economia tende a tornar as relações federativas mais complexas porque aumenta as diferenças entre os estados mais ou menos desenvolvidos, contribuindo, portanto, para aumentar a tendência à concentração econômica. Segundo, porque, embora indiretamente, essa política tem afetado o Estado de São Paulo, o que tem provocado reações de poderosas elites. No entanto, diferentemente do passado, o Brasil não é mais uma Federação dominada por alguns poucos estados. A redemocratização aumentou a importância de elites regionais de vários estados e o Brasil é hoje uma sociedade urbana com uma economia industrializada. Isso significa que os conflitos se tornam mais complexos. A próxima eleição presidencial deverá certamente refletir esse conflito, talvez mais do que as eleições anteriores.

Demonstra-se assim que, apesar das mudanças que ocorreram no federalismo brasileiro e das diferenças entre o que foi desenhado pelos constituintes de 88 e o que existe hoje, as tensões existentes no federalismo se localizam em questões que não foram enfrentadas pelos regimes políticos anteriores, tais como as nossas históricas desigualdades sociais e econômicas. Ou seja, o argumento é o de que essas tensões encontram suas origens em questões históricas não resolvidas e não nas decisões tomadas pelos constituintes de 88 em relação ao federalismo e à descentralização. Soluções para as tensões políticas e financeiras discutidas acima não são, obviamente, fáceis, mas elas dependem menos do federalismo em si mesmo do que do encaminhamento de conflitos políticos mais amplos. Existem, certamente, forças que tentam mudar o caráter fragmentado e descentralizado do federalismo. No entanto, existem também forças, embora fragmentadas, que defendem a continuidade do formato que o federalismo assumiu como resultado da redemocratização. Essas últimas podem prevalecer, não só devido a interesses, mas também porque, como lembra Stepan (1999), todas as federações democráticas são, por natureza, limitadoras do "centro". Apesar do federalismo não ser uma instituição nova no Brasil, nem muito menos as desigualdades regionais, o seu formato de constranger o "centro" em condições democráticas é. Ainda é cedo para sabermos, todavia, se a democracia e suas instituições serão capazes de alterar a nossa longa história de iniqüidade regional e social.

 

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1 Sobre o impacto social e econômico das desigualdades regionais, ver Guimarães Neto (1995).
2 Essas disparidades não se manifestam apenas entre as regiões, mas também no interior de cada região? Sobre as desigualdades no interior das regiões metropolitanas do Rio de Janeiro e São Paulo, ver Ribeiro (1996) e dentro do Estado de São Paulo, ver Arretche (2000).
3 Sobre o poder do Executivo federal frente ao Congresso Nacional, ver Figueiredo e Limongi (1999). Para uma análise sobre como os interesses dos governadores vis-à-vis o do governo federal às vezes coincidem e outras não, ver Weyland (2000).
4 Para uma crítica da literatura sobre federalismo fiscal e sua aplicabilidade ao caso brasileiro, ver Aguirre e Moraes (1997) e para uma discussão sobre as limitações da literatura sobre descentralização, ver Souza (1997).
5 A contribuição dos historiadores para o entendimento do federalismo brasileiro está representada pelos trabalhos de Camargo (1993), Carvalho (1993 e 1996) e Fausto (1986).
6 A pesquisa coordenada pela FUN DAP foi uma tentativa de relacionar federalismo e descentralização. No entanto, a maioria dos trabalhos que integram essa pesquisa pouco enfrentou os problemas teóricos mencionados acima.
7 Para uma discussão sobre como o federalismo molda o sistema-partidario brasileiro, ver por exemplo, Mainwaring (1999).
8 Acalorados debates sobre como deveria ser a divisão de poder territorial ocorreram muito antes da promulgação da República. Carvalho (1993) mostra que o principal objetivo do movimento republicano era o federalismo e não a liberdade, embora eles fossem apresentados como sinônimos e estivessem associados à descentralização. Devemos aos historiadores a recuperação desses debates, que livram o Brasil da acusação de que o nosso federalismo resultou de uma mera cópia do federalismo norte-americano, com pouca ou nenhuma vinculação com as circunstâncias nacionais.
9 Interessante ressaltar que durante a constituinte de 88 foi firmado um acordo entre os parlamentares de São Paulo com as demais bancadas para aumentar em 10 o número de deputados do Estado. No entanto, o "ganho" de São Paulo foi, na prática, anulado pela criação de três novos estados, dois no Norte e um no Centro-Oeste. Paradoxalmente, a votação nominal para a criação desses novos estados contou com a aprovação unânime da bancada paulista.
10 Sobre a questão da desigualdade social no Brasil, ver os artigos publicados na Revista Brasileira de Ciências Sociais 15 (42), de fevereiro de 2000, em especial o de Barros, Henriques e Mendonça (2000).
11 Kugelmas e Sola (1999) associam o sucesso do governo federal na recentralização dos recursos públicos ao Plano Real, que teve como um dos seus resultados a restauração da tradição brasileira de presidentes fortes.
12 Outros fatores não abordados neste trabalho também contribuem para limitar as possibilidades dos governos subnacionais de manterem ou aumentarem sua participação na provisão de serviços sociais. Um desses fatores é que, na ausência de uma política nacional de industrialização, estados e municípios estão investindo maciçamente na atração de novas indústrias, gerando o que ficou conhecido como guerra fiscal, o que pode diminuir seus compromissos com programas sociais. Outro fator importante e pouco analisado é a presença crescente dos organismos multilaterais no financiamento das políticas sociais, introduzindo novas agendas e novos formatos políticos, institucionais e administrativos às políticas sociais.