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Revista Brasileira de Hematologia e Hemoterapia - Observation of autoimmune hemolytic anemia in rheumatoid arthritis

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Revista Brasileira de Hematologia e Hemoterapia

Print version ISSN 1516-8484

Rev. Bras. Hematol. Hemoter. vol.25 no.4 São José do Rio Preto  2003

http://dx.doi.org/10.1590/S1516-84842003000400011 

RELATO DE CASO CASE REPORT

 

Observação de anemia hemolítica auto-imune em artrite reumatóide

 

Observation of autoimmune hemolytic anemia in rheumatoid arthritis

 

 

Ricardo A. S. SouzaI; Henrique F. S. SouzaI; Leandro V. RangelI; Luciana V. A. NogueiraII; Mittermayer B. SantiagoIII

IMédico do Núcleo de Reumatologia
IIFundação de Hemoterapia e Hematologia da Bahia – Hemoba
IIIProfessor adjunto doutor da EBMSP e Coordenador do Núcleo de Reumatologia

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Artrite reumatóide é uma doença difusa do tecido conjuntivo que se caracteriza pelo acometimento articular e sistêmico. Disfunções hematológicas como anemia ocorrem em até 65% dos pacientes, sendo a anemia das doenças crônicas a forma mais comum. A anemia hemolítica auto-imune pode estar associada à difusa do tecido conjuntivo, sendo classicamente associada ao lúpus eritematoso sistêmico e fazendo parte dos seus critérios de classificação. A presença de anemia hemolítica auto-imune em artrite reumatóide é relatada raramente na literatura e os mecanismos etiopatogênicos para o seu desenvolvimento ainda não estão esclarecidos. Descrevemos um caso de artrite reumatóide no adulto e outro de artrite reumatóide juvenil que desenvolveram anemia hemolítica auto-imune e discutimos os prováveis mecanismos etiopatogênicos envolvidos.

Palavras-chave: Artrite reumatóide; anemia hemolítica auto-imune.


ABSTRACT

Rheumatoid arthritis is a connective tissue disease characterized by articular and systemic involvement. Hematological abnormalities such as anemia may occur in up to 65% of the patients, with chronic disease anemia being the commonest form. Autoimmune hemolytic anemia can be associated with different connective tissue diseases, particularly systemic lupus erythematosus and it is part of its classification criteria. On the other hand, the presence of autoimmune hemolytic anemia in rheumatoid arthritis has rarely been described in the literature and the pathogenic mechanisms for its development remain unclear. We describe here a case of rheumatoid arthritis and another of juvenile rheumatoid arthritis that developed to autoimmune hemolytic anemia and present the probable etiopathogenic mechanisms.

Key words: Rheumatoid arthritis; autoimmune hemolytic anemia.


 

 

Introdução

Artrite reumatóide (AR) é uma doença inflamatória crônica de causa desconhecida comprometendo principalmente as articulações porém apresentando outras manifestações sistêmicas. Anemia é a mais comum manifestação extra-articular da AR, ocorrendo freqüentemente na forma de anemia das doenças crônicas, sendo que o grau da anemia correlaciona-se melhor com a atividade clínica da doença do que com a sua duração. Mecanismos relacionados ao metabolismo prejudicado do ferro, redução da resposta da medula óssea à eritropoetina, bem como níveis reduzidos desta, eritropoese inefetiva e hemólise em baixo grau devido a maior atividade do sistema reticuloendotelial são os principais responsáveis pela forma crônica de anemia em AR. Outras manifestações hematológicas que podem ocorrer em AR são a neutropenia (Síndrome de Felty), leucocitose (doença de Still), plaquetose (atividade de doença) e linfadenopatia.

Por outro lado, a anemia hemolítica auto-imune (AHAI) devido à presença de auto-anticorpos contra antígenos da membrana dos eritrócitos, enquanto freqüentemente descrita em lúpus eritematoso sistêmico, tem sido raramente observada em pacientes com AR. Descrevemos dois casos de AR que apresentaram tal complicação e discutimos os possíveis mecanismos envolvidos.

 

Relato de Casos

Caso 1

Paciente do sexo feminino, 69 anos, com história de poliartrite simétrica de grandes e pequenas articulações há 30 anos, tendo sido confirmado o diagnóstico de artrite reumatóide. Sendo portadora também de hipertensão sistêmica e hipotireoidismo, faz uso de captopril, hidroclorotiazida e de levotiroxina sódica. Em julho de 1997 começou a apresentar dispnéia e edema de membros inferiores, sendo internada com quadro de insuficiência cardíaca secundária a anemia grave. Nessa oportunidade, apresentava ao exame físico, mucosas bastante descoradas, sinais de insuficiência cardíaca congestiva e quadro articular compatível com seqüelas de artrite reumatóide (desvio ulnar e dedos em pescoço de cisne). A avaliação laboratorial foi compatível com anemia hemolítica auto-imune: hemoglobina =5,9g% (VN= 12 a 15g%); hematócrito=17% (VN= 36 a 45%); reticulócitos =13,1% (VN= 0,5 a 1,5%); teste de Coombs direto= +++; bilirrubina total= 1,32mg/dl (VN= 0,2 a 1,0mg/dl) com fração indireta= 0,91mg/dl. Outros exames mostraram: estudo radiológico de joelhos, mãos e pés compatível com artrite reumatóide: porose justa-articular, cistos, erosões e subluxações; FAN por IFI (Células HEp-2) positivo, título=1/640, padrão homogêneo; fator reumatóide negativo (látex e Waaler Rose); anticorpo antitireoglobulina negativo. Durante a internação, a paciente fez uso de concentrados de hemácias e prednisona (1mg/kg/dia) havendo melhora do quadro hematológico.

Caso 2

Paciente do sexo masculino, 21 anos, portador de artrite reumatóide juvenil há seis anos, sem uso recente de medicações. O paciente vinha bem quando passou a cursar com febre vespertina, cefaléia, tontura seguida de síncope. Ao exame clínico apresenta-se com fácies de sofrimento agudo, PA=120x80mmHg, PR=100bpm, T=38,1ºC, mucosas descoradas ++/4, escleróticas ictéricas +/4, abdome sem visceromegalia evidente e extremidades apresentando limitação à mobilização dos punhos e cotovelos, além de dor à palpação de tornozelo direito e deformidades em articulações interfalangeanas proximais. Exames laboratoriais: hemoglobina= 4,2 mg/dl; hematócrito= 13%; leucograma= 64.500 sem desvio; Coombs direto positivo; bilirrubina total= 4,0 mg/dl com fração indireta= 2,2 mg/dl; FAN por IFI (Células HEp-2) negativo; mielograma: hipercelularidade com deseritropoiese de células vermelhas porém sem aumento de blastos. Foi iniciado tratamento com prednisona 1 mg/kg/dia e amoxicilina 1,5 g/dia mesmo sem confirmação da presença de infecção. Não havendo melhora do quadro hematológico com o uso de prednisona, foi realizado então pulsoterapia com metilprednisolona 1g/dia por três dias consecutivos, havendo, então, resposta favorável.

 

Discussão

A anemia hemolítica auto-imune (AHAI) pode se apresentar de forma primária (idiopática) ou secundária a doenças difusas do tecido conjuntivo (DDTC), infecções, neoplasias linfoproliferativas ou induzida por drogas. O mecanismo patogênico da AHAI se dá pela destruição extravascular dos eritrócitos, mediada por autoanticorpos dirigidos contra antígenos da superfície dessas células. Esses anticorpos são principalmente da classe IgG, também chamados de "anticorpos quentes". Alternativamente, pode haver anemia hemolítica de fundo auto-imune com participação de anticorpos IgM fixadores de complemento e hemólise intravascular (anticorpos frios). Doenças linfoproliferativas e infecciosas como micoplasma são causas desse tipo de anemia hemolítica.1

A AHAI, não raramente, é encontrada em lúpus eritematoso sistêmico (LES), porém tem sido muito pouco descrita na literatura em pacientes com artrite reumatóide.2-7 Nessa situação, a AHAI geralmente é decorrente da presença de anticorpos quentes, como demonstrado nos dois casos aqui apresentados. Porém, Guzzini at al6 relataram um caso de doença de Still do adulto, que apresentou AHAI por anticorpos frios (crio-aglutininas).

Como descrito acima, a anemia hemolítica pode ser desencadeada pelo uso de drogas, classicamente alfa-metildopa. Das medicações usadas pela paciente 1 (captopril, levotiroxina e hidroclorotiazida), apenas o uso de tiazídicos tem sido associado ao desenvolvimento de anemia hemolítica, por mecanismos não conhecidos.8 Além de incomum, o quadro clínico se apresenta de forma mais leve, diferente do ocorrido com essa paciente. Além disso, a paciente manteve o uso dessa medicação para controle da hipertensão arterial sistêmica sem apresentar novo quadro de hemólise (resultado não apresentado).

Curiosamente, a paciente 1 apresentava outras características de doença imunológica como FAN positivo e uma provável tireoidite auto-imune no passado, porém a mesma não tinha outras características de LES e o quadro articular não deixava dúvida quanto ao diagnóstico de AR. Além do mais, a presença de FAN positivo pode ocorrer em até 30% dos casos de AR.9

O uso de penicilinas tem sido relacionado ao surgimento de AHAI, em que os anticorpos são dirigidos contra a penicilina depositada na membrana eritrocitária.8 O paciente 2 fez uso de amoxicilina, uma penicilina semi-sintética não relacionada ao surgimento de AHAI, e a mesma foi introduzida após o quadro agudo da anemia. Deve ser lembrado que drogas usadas para o tratamento de artrite reumatóide, tais como D-penicilamina e metotrexato, também podem ser responsáveis pela indução de anemia hemolítica auto-imune,7,10 porém os nossos pacientes não estavam em uso de tais medicações.

Considerando que em ambos os pacientes o quadro de anemia hemolítica ocorreu numa fase inativa da doença reumatóide, não podemos excluir a possibilidade de que a associação de AR e AHAI seja apenas uma coincidência, não havendo relação causal entre as doenças. Dados estatísticos mostram que a prevalência de AR bem como a prevalência de AHAI na população em geral, é semelhante,11 o que pode apoiar a idéia de que o aparecimento dessas duas doenças seja independente.

Em conclusão, embora a associação de AHAI e AR possa significar diferentes formas de apresentação da perda de tolerância do sistema imunológico, a raridade de tal associação exige que outras causas de AHAI, tal como o uso de determinadas medicações, sejam excluídas.

 

Referências Bibliográficas

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2. Estrada CA, Lyons S, Terebelo H: Autoimmune hemolytic anemia and rheumatoid arthritis. South Med J 1990;83 (5):599-600.        [ Links ]

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7. Yoshida K, Kurosaka D, Ozawa Y, Yokoyama T, Tajima N. A case of rheumatoid arthritis associated with autoimmune hemolytic anemia due to weekly low-dose methotrexate therapy. Ryumachi 2000;40(4):693-8.        [ Links ]

8. Packman CH, Leddy J. Drug-related immunologic injury at erythrocytes. In: Williams WJ, Beutler E, Erslev AJ, Lichtman MA: Hematology, Fourth edition, p.681-686, 1990.        [ Links ]

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10. Masson C, Bregeon C, Ifrah N, Berton V, Housseau F, Renier JC: Evans' syndrome caused by D-penicillamine in rheumatoid arthritis. Value of the corticoids-danazol combination. Rev Rhum Mal Osteoartic 1991;58(7): 519-22.        [ Links ]

11. Allgood JW, Chaplin H: Idiopathic acquires autoimmune hemolytic anemia. Am J Med 1967;43:254-273.        [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência
Mittermayer Santiago
Núcleo de Reumatologia do HSI
Praça Almeida Couto s/n – Nazaré
40000-000 – Salvador-BA
E mail:mitter@svn.com.br

Recebido: 29/05/2003
Aceito após modificações: 06/10/2003

 

 

Núcleo de Reumatologia do Hospital Santa Izabel (HSI)/Escola Baiana de Medicina e Saúde Pública (EBMSP)
Avaliação:Editor e dois revisores externos
Conflito de interesse: não declarado